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Persona
Tradução: Rodrigo Borges
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"...de graça recebestes, de graça dai." Mt 10.8
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Queria falar comigo, doutora?
Já viu a Sra. Vogler, irmã?
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- Ainda não.
- Vou explicar a situação dela...
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...e o motivo pelo qual foi
contratada para cuidar dela.
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A Sra. Vogler é uma atriz, como sabe.
se apresentando em Electra.
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No meio da apresentação ficou silente
e olhou ao redor como se estivesse surpresa.
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Ela ficou silente por um minuto.
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Ela se desculpou depois, dizendo
que sentiu vontade de rir.
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No dia seguinte ligaram do teatro e
perguntaram se ela esqueceu o ensaio.
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Quando a empregada entrou
ela estava ainda na cama.
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Ela estava acordada, mas
não respondia nem se movia.
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Ela continua na mesma por três meses.
E já fez todos os tipos de testes.
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O resultado é claro. Está perfeitamente
saudável, física e mentalmente.
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Não existe nem um tipo
de reação histérica.
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Alguma pergunta, irmã Alma?
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Não? Agora pode ir ver a Sra. Vogler.
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Bom dia, Sra. Vogler.
Meu nome é irmã Alma.
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Fui contratada para cuidar
um pouco de você.
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Talvez eu deva falar um pouco de mim.
Eu tenho 25, noiva...
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Consegui meu certificado de
enfermeira há dois anos.
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Meus pais tem um sítio. Minha mãe
também foi enfermeira antes de casar.
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Vou buscar seu jantar.
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Fígado frito e salada de frutas.
Uma delícia.
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Você quer levantar sua cabeça?
Assim está bom?
-
lrmã Alma.
Qual foi sua primeira impressão?
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Não sei o que dizer, doutora.
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Primeiro tem um semblante suave,
quase infantil. Mas ao olhar seus olhos...
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Ela ganha um aspecto severo, eu acho.
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- Eu Não sei. Eu não deveria...
- O que estava pensando?
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- Pensei que deveria rejeitar este trabalho.
- Alguma coisa incomodou você?
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Não, mas ela merecia uma enfermeira
mais velha e mais experiente.
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- Experiente na vida. Eu posso não suportar.
- Suportar?
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Mentalmente.
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Se o silêncio e imobilidade da Sra. Vogler
forem resultado de uma decisão...
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...deve ser tão forte quanto era saudável.
- E daí?
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É uma decisão que mostra grande força
mental. Talvez eu não seja capaz de lidar.
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Você talvez gostaria de ver o pôr-do-sol,
Sra. Vogler. Eu posso descrevê-lo depois.
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Posso ligar o rádio?
Há uma peça, eu acho.
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Perdoe-me, meu amor.
Oh, você deve me perdoar.
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Eu não desejo nada além do seu perdão.
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Do que está rindo, Sra. Vogler?
A artista é engraçada?
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O que você sabe sobre compaixão?
O que você sabe?
-
O que você sabe sobre compaixão?
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Eu não entendo coisas como essa,
Sra. Vogler.
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Sou interessada por filme e teatro,
mas não vou tanto.
-
Tenho enorme admiração
por artistas.
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Penso que a arte tem uma enorme
importância na vida.
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Especialmente para pessoas que tem
problemas de algum tipo.
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Não deveria falar sobre coisas como essa
com você. Estou esquiando em gelo fino.
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Vou ver se encontro alguma música.
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Esta está boa?
-
Boa noite, Sra. Vogler. Durma bem.
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Droga!
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É estranho.
Pode-se ir a qualquer lugar antigo.
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Fazer-se qualquer coisa antiga.
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Me casarei com Karl-Henrik e teremos
filhos que criarei.
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Tudo está decidido. E faz parte de mim.
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Não há o que ponderar.
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É um imenso sentimento de segurança.
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Então eu tenho um emprego que gosto
e estou feliz com isso.
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Isso é bom também. Mas por outro lado...
-
Mas isso é bom... bom.
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Isso é bom.
-
Me pergunto... o que há de
errado com ela?
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Elisabet Vogler...
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Elisabet.
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"...hoje, entre as artilharias americanas
e vietnamitas
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"e a desesperada guerrilha do Vietcongue"
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"que ataca a base vital costeira."
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"Aviões da Marinha e a Força Aérea
Americana em Quang"
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"Estão bombardeando as posições
do exército Vietcongue em Tay Ninh."
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"Hoje os aviões saíram em
mais de 48 missões de bombardeio."
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"Em outras ações, vários batalhões
de tropas dos EEUU"
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"desembarcaram ontem perto da costa."
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"onde foram capturados mais de 2000 Vietcongues."
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"na maior operação dos últimos três meses.
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"Hoje os protestos na rua"
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"mandaram para os tribunais mais de
141 Vietcongues.
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Você gostaria que eu abrisse a
carta, Sra. Vogler?
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Devo lê-la?
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Devo lê-la para você?
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"Querida Elisabet: Como tenho
permissão de vê-la, escrevo."
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"Se você não quer ler minha
carta pode ignorá-la."
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"Eu não posso evitar procurar
esse contato com você"
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"Estou atormentado com uma
dúvida constante:"
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"Magoei você de algum modo?
Machuquei você sem querer?"
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"Há algum terrível mal entendido
entre nós dois?"
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Devo continuar a ler?
-
"Tanto como entendo, nós estávamos
felizes recentemente. Nós nunca estivemos..."
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"...tão perto um do outro"
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"Você se lembra dizendo: Agora eu
entendo o que casamento significa?"
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"Ensinou-me que..."
Não consigo entender o que está escrito aqui.
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"Ensinou-me que..." Agora entendi...
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"Ensinou-me que devemos nos ver
como duas crianças ansiosas"
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"tomadas de boa vontade
e melhores intenções"
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"Mas diri..."
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Agora entendo. "Mas dirigidos por
poderes que controlamos parcialmente"
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"Você se lembra dizendo tudo isso?"
-
"Estávamos andando no bosque
e você parou e segurou meu cinto..."
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Há uma foto com a carta.
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Uma foto do seu filho.
Eu não sei se...
-
Gostaria de vê-la, Sra. Vogler?
-
Ele parece um doce.
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Estive pensando, Elisabet. Eu não
acho que deva permanecer no hospital.
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Penso que é prejudicial.
Como você não quer ir para casa...
-
...você e irmã Alma podem ir
para minha casa de verão na praia. Hmm?
-
Não imagina que entendo?
O sonho sem esperança de ser.
-
Não parecer, mas ser.
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Consciente a todo momento. Vigilante.
-
Ao mesmo tempo o abismo entre o que
você é para os outros e para si mesmo.
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O sentimento de vertigem e o desejo
constante de por fim ser exposta.
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Para ser vista por dentro, cortada,
talvez mesmo aniquilada.
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Cada tom de voz uma mentira, cada gesto
uma mentira, cada sorriso uma careta.
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Cometer suicídio? Ah, não!
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Isso é feio. Você não faria isso.
-
Mas você pode ficar imóvel, pode silenciar.
Assim, pelo menos, você não precisa mentir.
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Você pode se isolar,
e mesmo se calar.
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Então não precisa interpretar papéis,
mostrar faces ou gestos falsos.
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Você pensa...
-
Mas você vê, a realidade é sanguinária.
Seu esconderijo não é bem vedado.
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A vida penetra em todas as partes.
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Você é forçada a reagir.
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Ninguém pergunta se é real ou irreal,
se você é verdadeira ou falsa.
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Isso só é importante no teatro.
Talvez nem ali.
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Eu entendo você, Elisabet. Eu entendo que
você está em silêncio, que está imóvel.
-
Que você colocou esta falta de vontade
em um sistema fantástico.
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Eu entendo e admiro você.
-
Acho que deveria representar
este papel até que se esgote.
-
Até que ele não seja mais interessante.
Então você poderá deixá-lo.
-
Assim como pouco a pouco abandona
todos os outros papéis.
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Sra. Vogler e Irmã Alma se mudaram
para a casa da médica no final do verão.
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A estada perto do mar surtiu
efeito favorável sobre a atriz.
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A apatia que a machucava no hospital
dá lugar a longas caminhadas,
-
pescarias, cozinhar, escrever cartas
e outras diversões.
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Irmã Alma desfruta sua reclusão rural e
tem maior cuidado com sua paciente.
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Não sabe que é má sorte
comparar as mãos?
-
Elisabet, posso ler um pouco
do meu livro para você?
-
Ou estou incomodando? Ouça isso:
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"Toda a ansiedade que suportamos,
todos os nossos sonhos frustrados"
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"a crueldade incompreensível,
nosso temor de extinção"
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"a percepção dolorosa
de nossa condição terrena"
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"lentamente desgastou nossa esperança
em qualquer outra salvação"
-
"O grito de nossa fé e dúvida
contra a escuridão e o silêncio"
-
"é uma das provas mais terríveis
de nosso abandono"
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"e nosso aterrorizado e indescritível conhecimento."
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Você acha que é assim?
-
Eu não acredito.
-
Fazer alterações... meu pior defeito é
que sou tão preguiçosa.
-
E então percebo aquela má consciência.
Karl-Henrik grita-me a falta de ambição.
-
Diz que eu ando por aí sonâmbula.
Penso que isso é injusto.
-
Era a melhor em meu grupo com os exames.
Mas ele provavelmente se refere a algo mais.
-
Você sabe...
-
Desculpe. Sabe o que eu às vezes penso?
-
No hospital onde eu fiz meu exame,
há uma casa para enfermeiras velhas.
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Umas que sempre foram enfermeiras,
vivendo para seu trabalho. Sempre de uniforme.
-
Vivem em seus quartos pequenos.
Imagine dedicar sua vida inteira a algo.
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Quero dizer, acreditando em algo.
Realizando algo.
-
Acreditando que a vida tem um propósito.
Gosto de coisas assim.
-
Cumprindo algo intensamente, sem importar
com nada. Acho isso um dever.
-
Significar algo para outras pessoas.
Você não acha também?
-
Eu sei que parece infantil,
mas eu acredito nisso.
-
Céus, está chovendo muito!
-
Ah, sim. Ele era casado. Nós tivemos
um relacionamento de cinco anos.
-
Então ele se cansou, é claro.
-
Eu estava muito apaixonada, com certeza.
E ele foi o primeiro.
-
Lembro-me de tudo como um grande tormento.
-
Longos períodos de dor e,
em seguida, curtos momentos quando...
-
É como se você me ensinasse a fumar.
Ele fumava muito.
-
Pensar nisso depois, é realmente banal.
Uma ficção barata.
-
De certa forma,
nunca foi real.
-
Eu não sei como descrevê-lo. Ao menos,
eu nunca era bastante real para ele.
-
Minha dor era real, isso com certeza.
-
De certo modo era como se fosse
parte dele, de modo desagradável.
-
Como se tivesse de ser assim.
-
Incluindo as coisas que
dissemos uns aos outros ...
-
Dizem que sou uma boa
ouvinte. Não é engraçado?
-
Ninguém nunca se importou em me ouvir.
Como você está agora. Está ouvindo.
-
Eu acho que você é a primeira
pessoa que me ouviu.
-
Não pode ser tão interessante.
Mais valeria a você ler um livro.
-
Deus, e continuo...
Não estou irritando?
-
É tão bom conversar.
Me sinto tão bem e aquecida.
-
Sinto-me como eu nunca senti
em minha vida inteira.
-
Sempre quis uma irmã.
Só tenho um monte de irmão. Sete.
-
Engraçado, não? E depois cheguei.
Fui cercada por rapazes toda a vida.
-
Gosto de meninos. Você sabe disso,
com toda sua experiência de atriz.
-
Gosto tanto de Karl-Henrik, mas...
você sabe, só amamos uma vez.
-
Sou fiel a ele. Em minha profissão
há oportunidades, posso te contar.
-
Karl-Henrik e eu alugamos um
chalé na praia uma vez.
-
Era Junho e estávamos sozinhos.
-
Um dia ele foi até a cidade.
Eu fui à praia sozinha.
-
Era um dia quente e agradável.
-
Havia uma outra garota lá.
Ela tinha vindo de outra ilha...
-
pois a nossa praia era ao sul
e mais tranquila.
-
Nos deitamos nuas e
tomamos sol...
-
tiramos cochilos, acordamos, e
passamos bronzeador.
-
Usávamos uns chapéus, você
sabe, aqueles baratos de palha.
-
O meu tinha uma fita azul.
-
Eu estava olhando debaixo
do chapéu.
-
admirando a paisagem,
o mar e o sol.
-
Foi tão curioso.
-
De repente eu vi duas pessoas
sobre as rochas abaixo de nós.
-
Eles se esconderam
e ficaram nos olhando.
-
"Há dois meninos nos olhando", disse
a ela. Seu nome era Katarina.
-
"Bem, deixe que olhem", disse ela,
e virou-se de costas.
-
Foi um sentimento estranho.
-
Eu queria correr e colocar minhas
roupas, mas eu permanecia ali...
-
De bruços com a bunda para cima,
totalmente desembaraçada e calma.
-
E Katarina estava ao meu lado
com seus seios e coxas fartas.
-
Ela continuava ali, rindo
e se divertindo consigo mesma.
-
Notei que os meninos se aproximavam.
Continuaram olhando para nós.
-
Eu vi que eram muito jovens.
-
Depois um deles, o mais corajoso
-
Veio até nós e, agachado,
ao lado Katarina.
-
Fingiu estar ocupado cutucando
os dedos do pé.
-
Me senti totalmente estranha.
-
De repente Katarina disse a ele...
-
"Por que você não vem aqui?"
-
Então ela pegou sua mão e o
ajudou a tirar a calça e a camisa.
-
De repente ele estava por cima.
E ela o ajudou a penetrar por trás.
-
O outro menino apenas
ficou olhando.
-
Ouvi Katarina sussurrar no ouvido
do menino e rir.
-
Seu rosto estava ao lado do meu.
-
Estava vermelho e inchado.
-
Então eu me virei e disse...
"Não quer vir comigo também?"
-
Katarina disse: "vá com ela agora."
Ele a largou e veio para cima de mim.
-
...ele veio sobre mim, com intensidade.
Ele agarrou meu seio.
-
Deus, doeu tanto!
-
Fiquei excitava e gozei na hora.
Acredita nisso?
-
la justamente dizer a ele: "cuidado
para não me engravidar"
-
quando ele gozou eu senti.
-
Senti algo que nunca sentira na vida
como ele jorrou dentro de mim.
-
Ele segurou meus ombros e inclinou para
trás. E eu gozei uma e outra vez.
-
Katarina ficou olhando
e o segurando por trás.
-
Depois que ele gozou ela o abraçou
e usou a mão dele para gozar.
-
E quando ela gozou
deu um grande grito.
-
Nós três começamos a rir.
-
Chamamos o outro menino sentado
no declive. Seu nome era Peter.
-
Ele parecia confuso e
tremia sob a luz do sol.
-
Katarina desabotoou sua calça
e começou a brincar com ele.
-
Quando ele gozou ela
colocou em sua boca.
-
Ele se inclinou e a beijou
nas costas.
-
Ela olhou a volta, segurou a cabeça dele
com as duas mãos e ofereceu seu seio.
-
O outro menino ficou tão excitado
que começamos de novo.
-
Foi tão bom quanto antes.
-
Então nadamos partimos. Quando eu
voltei, Karl-Henrik havia voltado.
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Então Jantamos e tomamos o vinho
tinto que estava com ele.
-
Depois fizemos amor.
-
Nunca havia sido tão bom, antes ou depois.
Você pode entender isso?
-
Então eu fiquei grávida, é claro.
-
Karl-Henrik estudava medicina e me
levou a um colega que fez o aborto.
-
Ficamos satisfeitos.
Não queríamos ter nenhum filho.
-
Não na época, de qualquer modo.
-
Não faz sentido.
Nada se encaixa.
-
Então temos uma má consciência por
pequenas coisas. Entende isso?
-
E o que acontece com tudo o que você
acredita? Não é necessário?
-
É possível ser uma e a mesma pessoa
ao mesmo tempo?
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Quero dizer, tornei-me duas pessoas?
Deus, que bobagem...
-
Eu não tenho qualquer razão para começar
a choramingar, de qualquer jeito.
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Espere, vou pegar um lenço.
-
Está quase amanhecendo...
e ainda está chovendo.
-
Imagine, tenho conversado sem parar.
Conversei e você me escutou.
-
Que entediante para você. De que interesse
pode ser minha vida para você?
-
Eu devia ser como você.
-
Sabe o que pensei depois
que vi seu filme aquela noite?
-
Quando cheguei em casa e olhei no
espelho, pensei: Somos parecidas.
-
Não me leva a mal. Você é muito mais
bonita, mas somos parecidas numa parte.
-
Eu acho que poderia me tornar você
se fizesse um real esforço.
-
Quero dizer, por dentro.
-
Você poderia tornar-se eu, justo assim.
-
Embora sua alma seja grande demais,
ia ficar para fora do corpo.
-
Você deve ir para a cama. Ou então
vai acabar dormindo na mesa.
-
Não, eu preciso ir para a cama.
Senão eu vou dormir na mesa.
-
Não seria confortável.
-
Boa noite.
-
Escute, Elisabet...
-
Você falou comigo ontem à noite?
-
Esteve no meu quarto?
-
Quer que eu leve também
sua correspondência?
-
Posso provar?
-
Adeus.
-
"Querida doutora: Eu viveria assim para
sempre. Este silêncio, vivendo isolada
-
Sentir como a alma maltratada
começa finalmente a curar-se.
-
A Alma me cativa da
maneira mais comovedora.
-
Eu acho, a propósito, que ela está gostando
de si e tem grande estima por mim.
-
Mesmo entusiasmada de modo inconsciente
e delicioso. É divertido estudá-la.
-
Às vezes chora por
pecados do passado.
-
Uma efêmera orgia com um menino
desconhecido, seguido de um aborto.
-
Ela concorda que suas noções de vida
não estão de acordo com suas ações."
-
Vejo que você está lendo uma peça. Isso é
um sinal saudável, vou dizer ao médico.
-
Não achas que deveríamos sair em breve?
Começo a sentir saudade da cidade.
-
Você não?
-
Gostaria de me fazer
realmente feliz?
-
Sei que é um sacrifício, mas necessito
de sua ajuda agora mesmo.
-
Não é nada perigoso. Mas
quero que converse comigo.
-
Não tem de ser especial. Qualquer coisa.
O que nós temos para o jantar...
-
Se a água está fria depois da tempestade.
Se está muito frio para nadar.
-
Só precisamos falar de alguns minutos.
Um minuto.
-
Você pode ler a partir de seu livro.
Basta dizer algumas palavras.
-
Devo tentar não ficar irritada. Você
permanece calada e essa é sua idéia.
-
Mas agora preciso que fale comigo.
-
Minha cara mulher, você não pode dizer
somente uma única palavra?
-
Eu sabia que você recusaria.
Você não imagina como me sinto.
-
Eu sempre pensei que grandes artistas
sentiam grande compaixão pelos outros.
-
Que criavam a partir do sentimento de
grande simpatia e necessidade de ajudar.
-
Isso foi estúpido de minha parte.
-
Você me usou. Agora que não
necessita de mim, me joga fora.
-
Sim, eu ouço muito bem como soa,
como falso isso soa!
-
Você me usou, agora me descarta.
Toda palavra!
-
E então estes óculos!
-
Você realmente me machucou.
Riu de mim nas minhas costas.
-
Eu li a carta que enviou ao médico.
-
Basta pensar, não foi selada!
E a li cuidadosamente!
-
Você me fez falar. Me fez falar coisas
que eu nunca disse a ninguém.
-
E você contou.
E que análise, heim? Você não...
-
Você vai falar agora! Se tem algo
a dizer, diga, droga...
-
Não! Pare!
-
Está realmente com medo agora, não?
-
Por um segundo você estava
realmente com medo, não?
-
Um verdadeiro medo da morte, não?
Alma ficou louca, você pensou.
-
Que tipo de pessoa você é, realmente?
-
Ou você pensa assim:
"Me lembrarei daquela face.
-
Aquele tom de voz, aquela expressão."
Eu vou lhe dar algo que não vai esquecer.
-
Você está rindo, não está?
-
Não é tão simples para mim.
Nem tão engraçado, também.
-
Mas você sempre teve seu riso.
-
Tem de ser assim?
-
É realmente importante não mentir,
para falar a verdade,
-
para falar com um tom de voz genuíno?
-
Pode alguém viver absolutamente
sem conversar livremente?
-
Mentir, desviar-se e fugir das coisas.
-
Não é melhor permitir a si mesma
ser preguiçosa, desleixada e falsa?
-
Talvez se torne um pouco melhor
se apenas deixar que seja o que é.
-
Não, você não compreende.
Você não entende o que estou dizendo.
-
Você é inacessível.
-
Disseram que você era mentalmente
saudável, mas a sua loucura é o pior.
-
Está atuando de modo saudável.
Age tão bem que todos acreditam em você.
-
Todos menos eu, porque eu sei
como você é podre.
-
O que estou fazendo?
-
Elisabet! Elisabet, perdoe-me.
-
Me comportei como uma idiota,
não sei o que deu em mim.
-
Estou aqui para ajudá-la. Então
houve aquela terrível carta.
-
Fiquei tão decepcionada. Você me
pediu para falar de mim mesmo.
-
Foi bom, você parecia tão compreensiva.
Eu tinha bebido muito...
-
É tão bom falar sobre tudo isso.
-
Fiquei feliz por uma grande atriz
como você me ouvir.
-
Achei que seria bom se
isso a ajudasse.
-
Mas é tão horrível, não?
É exibicionismo.
-
Elisabet, quero que me perdoe.
-
Eu gosto de você tanto,
você significa tanto para mim.
-
Aprendi muito com você,
eu não quero inimizade.
-
Não quer me perdoar.
Você é orgulhosa demais.
-
Não quer se rebaixar
porque você não precisa.
-
Não vou, não vou... !
-
Não falamos... não ouvimos...
não entendemos...
-
- Elisabet?
- Que significa ser capaz?
-
Quando dormes tem a face flácida.
-
Sua boca fica inchada e feia.
-
Tem uma ruga feia na testa.
-
Você tem cheiro de
sono e lágrimas.
-
Posso ver seu batimento
no pescoço.
-
Você tem uma cicatriz que normalmente
cobre com maquiagem.
-
Elisabet!
-
Ele está chamando de novo.
-
Vou descobrir o que ele quer de nós.
-
Fora daqui, longe de nossa solidão.
-
Elisabet?
-
Elisabet? Desculpe-me se te assustei.
-
- Eu não sou Elisabet.
- Não venho exigir nada.
-
Não queria incomodar.
Acha que não entendo?
-
A doutora explicou uma série
de coisas para mim.
-
O mais difícil é explicar para o menino.
Estou fazendo o meu melhor.
-
Há algo que está mais profundo,
difícil de entender.
-
Você ama alguém, ou mais correctamente,
diz que ama alguém, é...
-
É compreensível. Tangível como
as palavras são, isto é.
-
Sr. Vogler, não sou sua esposa.
-
Você também é amada.
Construiu um vínculo.
-
Gera segurança. Você vê a
possibilidade de suportar, não?
-
Como posso me explicar sem
me perder, aborrecendo você?
-
Eu amo você, tanto quando amava.
-
Não, não fique tão ansiosa, minha querida.
Temos um ao outro.
-
Temos fé, sabemos um os
pensamentos do outro.
-
Amamos um ao outro.
É verdade, não é?
-
É o esforço que é o mais importante,
não o que nós conseguimos. Não é?
-
Ver cada um como criança. Atormentada,
desamparada, solitária criança.
-
- Elisabet.
- Diga ao menino que estou indo em breve.
-
Mamãe ficou doente mas ela
deseja ver seu pequeno menino.
-
Lembre-se de comprar um presente para ele.
Da mamãe, não se esqueça.
-
Você sabe que eu sinto
essa ternura por você.
-
É difícil de suportar.
-
Não sei o que fazer
com a minha ternura.
-
Eu vivo de seu carinho.
-
Elisabet, você gosta de estar comigo?
Isso é bom?
-
- Você é um amante maravilhoso. Você sabe.
- Minha querida...
-
Maldize-me... livre-se de mim!
-
Não, não posso, não posso suportar mais!
-
Me deixe em paz!
É uma vergonha, tudo uma vergonha!
-
Deixe-me em paz!
Estou fria, podre e indiferente!
-
É tudo mentira e imitação,
tudo do mesmo!
-
Elisabet, o que você tem aí?
-
O que está escondendo na mão?
Deixe-me ver.
-
É a foto do seu menino.
A que você rasgou.
-
Temos de falar sobre isso.
-
Conte-me sobre ele, Elisabet.
-
Então me vou.
-
Foi uma noite em uma festa, não?
Ficou tarde e muito barulhento.
-
Pela manhã alguém
do grupo disse:
-
"Elisabet, você tem tudo
como mulher e artista."
-
"Mas carece de sentimentos maternos."
-
Você riu porque
pensou que era bobagem.
-
Mas depois de um tempo reparou
e pensou sobre o que ele disse.
-
Ficou mais e mais preocupada.
Deixou seu marido engravidar você.
-
Você queria ser uma mãe.
-
Quando percebeu que era definitivo,
ficou assustada.
-
Assustada com a responsabilidade,
de se prender, de deixar o teatro.
-
Assustada de dor, com a morte, assustada
com o seu corpo inchando.
-
Mas assumiu o papel. O papel de uma
feliz, jovem e futura mãe.
-
Todo o mundo disse, "Ela não é linda?
Ela nunca foi tão linda"
-
Entretanto você tentou de abortar
o feto várias vezes.
-
Mas fracassou.
-
Quando viu que era irreversível,
começou a odiar o bebê.
-
E desejou que fosse natimorto.
-
Desejou que o bebê estivesse morto.
-
Desejou um bebê morto.
-
Foi um parto difícil e longo.
-
Sofreu agonia durante dias. Finalmente
o bebê chegou com fórceps.
-
Olhou com repugnância e terror seu
bebê gritando e sussurrou:
-
"Você não pode morrer em breve?
Não pode morrer?"
-
Mas ele sobreviveu.
-
O menino gritava dia e noite.
-
E você o odiava. Estava com medo,
teve uma má consciência.
-
Finalmente, o menino foi cuidado
por parentes e uma babá.
-
Podia levantar-se da cama de
doente e retornar ao teatro.
-
Mas o sofrimento não terminou.
-
O menino foi tomado por um
incomensurável amor por sua mãe.
-
Você se defendeu sozinha.
Você se defendeu em desespero.
-
Você sente que não pode retribuir.
Então, você tenta e tenta...
-
Mas só havia cruéis estranhos
encontros entre vocês.
-
Você não conseguia.
Você está fria e indiferente.
-
Ele olha para você.
Ele te ama e é tão gentil.
-
Você quer bater porque ele
não a deixa sozinha.
-
Você o achava repulsivo, com seus
lábios grossos e corpo feio.
-
Seus olhos umedecidos e carentes.
Ele é repulsivo e você está assustada.
-
O que você está escondendo
sob a sua mão? Deixe-me ver.
-
É a foto de seu menino.
A que você rasgou.
-
Temos de falar sobre isso.
-
Conte-me sobre isso, Elisabet.
-
Então eu vou.
-
Foi uma noite em uma festa,
não é mesmo?
-
Ficou tarde e muito barulhento.
-
Pela manhã alguém do grupo disse:
-
"Elisabet, você tem tudo
como mulher e artista."
-
"Mas carece de sentimentos maternos."
-
Você riu porque
pensou que era bobagem.
-
Mas depois de um tempo reparou
e pensou sobre o que ele disse.
-
Ficou mais e mais preocupada.
Deixou seu marido engravidar você.
-
Você queria ser uma mãe.
-
Quando percebeu que era definitivo,
ficou assustada.
-
Assustada com a responsabilidade,
de se prender, de deixar o teatro.
-
Assustada de dor, com a morte, assustada
com o seu corpo inchando.
-
Mas assumiu o papel. O papel de uma
feliz, jovem e futura mãe.
-
Todo o mundo disse, "Ela não é linda?
Ela nunca foi tão linda"
-
Entretanto você tentou de abortar
o feto várias vezes.
-
Mas fracassou.
-
Quando viu que era irreversível...
-
...começou a odiar o bebê.
-
E desejou que fosse natimorto.
-
Desejou que o bebê estivesse morto.
-
Desejou um bebê morto.
-
Foi um parto difícil e longo.
-
Sofreu agonia durante dias. Finalmente
o bebê chegou com fórceps.
-
Olhou com repugnância e terror seu
bebê gritando e sussurrou:
-
"Você não pode morrer em breve?
Não pode morrer?"
-
O menino gritava dia e noite.
E você o odiava.
-
Estava com medo,
teve uma má consciência.
-
Finalmente, o menino foi cuidado
por parentes e uma babá.
-
Podia levantar-se da cama de
doente e retornar ao teatro.
-
Mas o sofrimento não terminou.
-
O menino foi tomado por um
incomensurável amor por sua mãe.
-
Você se defendeu em desespero.
Você sente que não pode retribuir.
-
Então você tenta, e tenta...
-
Mas só havia cruéis estranhos
encontros entre vocês.
-
Você não consegue.
Você está fria e indiferente.
-
Ele olha para você.
Ele te ama e é tão gentil.
-
Você quer bater porque ele
não a deixa sozinha.
-
Você o achava repulsivo, com seus
lábios grossos e corpo feio.
-
Seus olhos umedecidos e carentes.
Ele é repulsivo e você está assustada.
-
Não!
-
Eu não sou como você. Não me sinto como você.
-
Sou a irmã Alma.
Estou aqui para ajudá-la.
-
Eu não sou Elisabet Vogler.
Você é Elisabet Vogler.
-
Eu gostaria de ter...
-
Eu amo...
-
Não tenho...
-
Eu aprendi bastante.
-
Veremos quanto tempo eu aguento.
-
Eu nunca vou ser como você, nunca.
Eu mudo o tempo todo.
-
Você pode fazer o que quiser,
você não vai me afetar.
-
Falar não adianta de nada.
Corte uma vela.
-
É como ser outro.
Não agora, não. Não, não.
-
Alerta e sem tempo.
Imprevisto.
-
Quando se supôs que ocorreria
não aconteceu, por isso, fracasso.
-
Fique onde estás.
Mas eu devo fazê-lo.
-
Não interiormente, não...
Recolha e avise os outros...
-
Os desconsolados, talvez...
-
Por exemplo, sim...
mas qual é o mais próximo...?
-
Como se chama...? Não, não, não...
-
Nós, nós, eu, eu...
-
Muitas palavras e essa náusea...
Dor incompreensível.
-
Agora me escute.
Repita depois de mim.
-
Nada...
-
Nada. Não, nada...
-
Nada.
-
É isso. Muito bom.
É assim que deveria ser.