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O que a alucinação revela sobre a nossa mente.

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    Nós vemos com os olhos
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    mas também vemos com o cérebro.
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    E ver com o cérebro é muitas vezes
    apelidado de imaginação.
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    Conhecemos as paisagens
    da nossa própria imaginação,
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    as nossas paisagens interiores.
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    Vivemos com elas toda a vida.
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    Mas também há as alucinações.
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    E as alucinações
    são totalmente diferentes.
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    Não parecem ser criadas por nós.
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    Não parecem estar sob o nosso controlo.
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    Parecem vir do exterior,
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    Parecem imitar a perceção.
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    Por isso, vou falar de alucinações
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    e de uma espécie específica
    de alucinação visual
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    que observo em muitos dos meus pacientes.
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    Há uns meses, recebi um telefonema
  • 0:52 - 0:54
    de uma casa de repouso onde trabalho.
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    Disseram-me que uma das residentes,
    uma senhora nonagenária,
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    estava a "ver" coisas.
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    Pensavam que ela tinha enlouquecido.
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    Ou, talvez por ser uma senhora idosa,
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    que talvez tivesse sofrido um ACV,
    ou a doença de Alzheimer.
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    Por isso, pediram-me para ir lá
    e observar a Rosalie,
  • 1:15 - 1:16
    a senhora idosa.
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    Eu fui vê-la.
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    A primeira coisa evidente
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    era que ela estava perfeitamente saudável,
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    lúcida e com excelente raciocínio.
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    Mas estava muito agitada e muito confusa
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    porque ela andava a "ver" coisas.
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    E disse-me
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    — as enfermeiras não o tinham referido —
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    que era cega,
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    que cegara completamente,
    de degeneração da mácula, cinco anos antes.
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    Mas agora, nos últimos dias,
    ela "via" coisas.
  • 1:49 - 1:51
    Então perguntei-lhe:
    "Que género de coisas?"
  • 1:51 - 1:55
    E ela respondeu:
    "Pessoas com trajes orientais,
  • 1:55 - 1:58
    "vestes drapeadas,
    a subir e a descer escadas.
  • 1:58 - 2:01
    "Um homem que se volta para mim e sorri.
  • 2:01 - 2:05
    "Mas tem dentes enormes
    num dos lados da boca.
  • 2:05 - 2:07
    "Também vejo animais.
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    "Vejo um edifício branco.
    Está a nevar, a nevar levemente.
  • 2:11 - 2:15
    "Vejo um cavalo, com arreios,
    a limpar a neve.
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    "Uma noite, o cenário muda.
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    "Vejo gatos e cães a andar
    na minha direção.
  • 2:22 - 2:24
    "Chegam a um determinado ponto e param.
  • 2:25 - 2:27
    "Depois muda tudo de novo.
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    "Vejo muitas crianças.
    Elas sobem e descem escadas.
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    "Usam cores claras, cor-de-rosa e azul
  • 2:32 - 2:34
    "como as roupas orientais."
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    "Às vezes, antes de aparecerem pessoas,
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    "eu podia ter alucinações
    de quadrados rosas e azuis no chão,
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    "que pareciam chegar ao teto".
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    Perguntei:
    "E é parecido com um sonho?"
  • 2:49 - 2:53
    E ela respondeu: "Não, não é um sonho.
    É como um filme."
  • 2:53 - 2:56
    Ela afirmou:
    "Tem cor. Tem movimento.
  • 2:56 - 2:59
    "Mas é completamente silencioso,
    como um filme mudo."
  • 2:59 - 3:01
    E acrescentou que era um filme
    muito aborrecido.
  • 3:01 - 3:04
    Disse: "Todas aquelas pessoas
    com roupas orientais,
  • 3:04 - 3:09
    "a subir e a descer, é muito repetitivo,
    muito limitado."
  • 3:09 - 3:11
    (Risos)
  • 3:11 - 3:13
    Ela tem sentido de humor.
  • 3:13 - 3:15
    Ela sabia que era uma alucinação.
  • 3:15 - 3:17
    Mas estava com medo.
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    Tinha 95 anos e nunca tinha tido
    uma alucinação.
  • 3:21 - 3:23
    Afirmou que as alucinações
    não estavam relacionadas
  • 3:23 - 3:27
    com nada que pensasse,
    sentisse ou fizesse.
  • 3:28 - 3:31
    Pareciam aparecer ou desaparecer
    por si mesmas.
  • 3:31 - 3:33
    Não tinha controlo sobre elas.
  • 3:34 - 3:37
    Disse que não reconhecia
    nenhuma das pessoas ou lugares
  • 3:37 - 3:39
    das alucinações.
  • 3:39 - 3:42
    E nenhuma das pessoas ou animais,
  • 3:42 - 3:45
    parecia aperceber-se dela.
  • 3:45 - 3:48
    Ela não sabia o que se estava a passar.
  • 3:48 - 3:50
    Perguntava-se se estaria a enlouquecer,
  • 3:50 - 3:52
    ou a perder a razão.
  • 3:52 - 3:54
    Eu examinei-a cuidadosamente.
  • 3:54 - 3:57
    Era uma senhora notável.
    Perfeitamente sã.
  • 3:58 - 4:00
    Não tinha problemas médicos.
  • 4:00 - 4:03
    Não tomava nenhuma medicação
    que provocasse alucinações.
  • 4:03 - 4:05
    Mas era cega.
  • 4:05 - 4:07
    Então disse-lhe:
  • 4:08 - 4:10
    "Acho que sei o que a senhora tem.
  • 4:10 - 4:13
    "Há uma forma especial
    de alucinação visual
  • 4:13 - 4:17
    que pode acontecer com a deterioração
    da visão, ou a cegueira.
  • 4:18 - 4:21
    "Isto foi descrito pela primeira vez,
  • 4:21 - 4:23
    "em meados do século XVIII,
  • 4:23 - 4:25
    "por um homem chamado Charles Bonnet.
  • 4:25 - 4:28
    "A senhora tem a síndrome
    de Charles Bonnet.
  • 4:28 - 4:31
    "Não há nada de errado
    com o seu cérebro.
  • 4:31 - 4:34
    "A senhora tem a síndrome
    de Charles Bonnet."
  • 4:34 - 4:37
    Ela ficou muito aliviada com isso,
  • 4:37 - 4:40
    que não se passava nada de grave,
  • 4:40 - 4:42
    e também ficou muito curiosa.
  • 4:43 - 4:45
    Perguntou: "Quem é esse Charles Bonnet?"
  • 4:46 - 4:48
    E acrescentou: "Ele também tinha isto?
  • 4:49 - 4:51
    "Diga a todas as enfermeiras
  • 4:51 - 4:54
    "que eu tenho a síndrome
    de Charles Bonnet."
  • 4:54 - 4:56
    (Risos)
  • 4:56 - 4:59
    "Não estou louca. Não estou demente.
    Eu tenho a síndrome de Charles Bonnet."
  • 5:00 - 5:02
    Então, fui contar às enfermeiras.
  • 5:03 - 5:05
    Para mim, isto é uma situação comum.
  • 5:05 - 5:08
    Trabalho sobretudo em lares de idosos.
  • 5:08 - 5:10
    Lido com muita gente idosa
  • 5:10 - 5:13
    com dificuldades auditivas
    ou dificuldades visuais.
  • 5:13 - 5:16
    Cerca de 10% das pessoas
    com dificuldades auditivas
  • 5:16 - 5:18
    têm alucinações musicais.
  • 5:18 - 5:21
    E cerca de 10% das pessoas
    com dificuldades visuais
  • 5:21 - 5:23
    têm alucinações visuais.
  • 5:23 - 5:26
    Não é necessário ser completamente cego,
  • 5:26 - 5:28
    basta ter dificuldades visuais.
  • 5:28 - 5:31
    Segundo a primeira descrição
    feita no século XVIII,
  • 5:31 - 5:34
    Charles Bonnet não as tinha.
  • 5:34 - 5:37
    O avô dele sofria dessas alucinações.
  • 5:37 - 5:40
    O seu avô era magistrado
    e um homem idoso.
  • 5:40 - 5:42
    Foi operado às cataratas.
  • 5:42 - 5:44
    A sua visão era muito fraca.
  • 5:45 - 5:49
    E em 1759 descreveu ao seu neto
  • 5:49 - 5:51
    várias coisas que via.
  • 5:51 - 5:55
    A primeira coisa que ele disse que via
    era um lenço no meio do ar.
  • 5:55 - 5:59
    Era um grande lenço azul
    com quatro círculos cor de laranja.
  • 5:59 - 6:02
    E ele sabia que era uma alucinação.
  • 6:02 - 6:05
    Os lenços não andam no meio do ar.
  • 6:05 - 6:08
    Depois, viu uma grande roda no meio do ar.
  • 6:08 - 6:13
    Mas às vezes ele não tinha a certeza
    se estava com alucinações ou não.
  • 6:13 - 6:17
    porque as alucinações coincidiam
    com o contexto das visões.
  • 6:17 - 6:22
    Numa certa ocasião, quando recebeu
    a visita das netas, perguntou:
  • 6:22 - 6:25
    "Quem são estes jovens distintos
    que vos acompanham?"
  • 6:25 - 6:29
    E elas responderam: "Avô, não estão aqui
    nenhuns jovens distintos."
  • 6:30 - 6:32
    Então, os jovens distintos desapareceram.
  • 6:33 - 6:36
    É típico destas alucinações
  • 6:36 - 6:39
    que apareçam num instante
    e desapareçam noutro.
  • 6:39 - 6:42
    Geralmente não se materializam
    ou desmaterializam.
  • 6:42 - 6:45
    Aparecem subitamente.
    E mudam subitamente.
  • 6:45 - 6:47
    Charles Lullin, o avô,
  • 6:47 - 6:50
    viu centenas de personagens diferentes,
  • 6:50 - 6:53
    e diferentes paisagens de todo o tipo.
  • 6:53 - 6:56
    Numa ocasião viu um homem de roupão
    a fumar cachimbo,
  • 6:56 - 6:59
    e apercebeu-se de que era ele próprio.
  • 6:59 - 7:02
    Foi a única personagem que reconheceu.
  • 7:03 - 7:06
    Numa certa ocasião quando andava
    pelas ruas de Paris,
  • 7:06 - 7:09
    ele viu — isto era real — um andaime.
  • 7:09 - 7:13
    Mas quando voltou para casa,
    viu uma miniatura do andaime
  • 7:13 - 7:16
    com quinze centímetros de altura,
    em cima da sua secretária.
  • 7:16 - 7:19
    Esta repetição da perceção
  • 7:19 - 7:22
    é algumas vezes chamada palinopsia.
  • 7:23 - 7:26
    Com ele, e com a Rosalie,
  • 7:26 - 7:28
    o que parecia acontecer
  • 7:28 - 7:31
    e a Rosalie perguntou
    "O que é que se passa?"
  • 7:31 - 7:34
    eu respondi que à medida
    que alguém perde a visão
  • 7:34 - 7:37
    como as partes visuais do cérebro
    já não recebem qualquer informação,
  • 7:37 - 7:39
    tornam-se hiperativas e excitáveis.
  • 7:39 - 7:42
    Começam a disparar espontaneamente,
  • 7:42 - 7:44
    e começamos a ver coisas.
  • 7:44 - 7:48
    As coisas que podemos ver
    podem ser coisas muito inquietantes.
  • 7:48 - 7:51
    Uma outra doente minha,
  • 7:51 - 7:53
    que ainda tinha alguma visão,
  • 7:55 - 7:57
    tinha visões que podiam ser inquietantes.
  • 7:58 - 8:01
    Numa ocasião descreveu que via
  • 8:01 - 8:03
    um homem com uma camisa
    às riscas num restaurante.
  • 8:03 - 8:06
    Ele voltou-se e dividiu-se
  • 8:06 - 8:09
    em seis figuras idênticas
    de camisa às riscas,
  • 8:09 - 8:11
    que começaram a caminhar na sua direção.
  • 8:11 - 8:14
    Depois as seis figuras juntaram-se de novo,
    como uma concertina.
  • 8:15 - 8:18
    Uma vez, enquanto guiava,
    ou melhor, o seu marido guiava,
  • 8:18 - 8:21
    a estrada dividiu-se em quatro.
  • 8:21 - 8:24
    E ela sentou-se a seguir simultaneamente
    por quatro estradas.
  • 8:25 - 8:29
    Também sofria
    de muitas alucinações móveis.
  • 8:30 - 8:32
    Muitas delas tinham a ver com um carro.
  • 8:32 - 8:35
    Às vezes via um rapaz adolescente
  • 8:35 - 8:37
    sentado no capô do carro.
  • 8:37 - 8:40
    Era muito enérgico
    e movia-se muito graciosamente
  • 8:40 - 8:42
    quando o carro fazia as curvas.
  • 8:42 - 8:44
    Depois, quando paravam,
  • 8:44 - 8:48
    o rapaz levantava voo na vertical,
    subitamente, ficava a 30 metros no ar
  • 8:48 - 8:50
    e depois desaparecia.
  • 8:50 - 8:55
    Uma outra doente minha
    tinha um tipo diferente de alucinação.
  • 8:55 - 8:58
    Essa doente não tinha nenhum
    problema com os olhos,
  • 8:58 - 9:00
    mas com as partes visuais do cérebro,
  • 9:01 - 9:03
    um pequeno tumor no córtex occipital.
  • 9:04 - 9:08
    Ela via, normalmente, desenhos animados.
  • 9:08 - 9:13
    Estes desenhos eram transparentes
  • 9:13 - 9:17
    e cobriam metade
    do seu campo visual, como um écran.
  • 9:17 - 9:22
    O desenho animado
    que ela mais via era o sapo Cocas.
  • 9:22 - 9:23
    (Risos)
  • 9:24 - 9:27
    Eu não vejo a Rua Sésamo.
  • 9:28 - 9:30
    Mas ela tinha razão em perguntar:
  • 9:30 - 9:33
    "Porquê o Cocas?
    O sapo Cocas não significa nada para mim
  • 9:33 - 9:36
    "Estive a pensar
    nos determinantes freudianos.
  • 9:36 - 9:38
    "Porquê o Cocas?
  • 9:38 - 9:41
    "O sapo Cocas não significa
    nada para mim."
  • 9:41 - 9:43
    Ela não se incomodava muito
    com os desenhos animados.
  • 9:43 - 9:47
    Mas o que a incomodava era ter imagens
    muito persistentes
  • 9:47 - 9:49
    ou alucinações de rostos
  • 9:49 - 9:53
    e tal como acontecia com a Rosalie,
    os rostos eram muitas vezes deformados,
  • 9:53 - 9:56
    com grandes dentes, ou grandes olhos.
  • 9:56 - 9:59
    E isto assustava-a.
  • 9:59 - 10:03
    O que é que se passa com estas pessoas?
  • 10:03 - 10:06
    Como médico, tenho tentado
    definir o que se passa,
  • 10:06 - 10:09
    e serenar as pessoas.
  • 10:09 - 10:12
    Especialmente para lhes assegurar
    que não estão a enlouquecer.
  • 10:13 - 10:15
    Cerca de 10%, como disse,
  • 10:15 - 10:18
    das pessoas com dificuldades visuais
    têm alucinações.
  • 10:18 - 10:22
    Mas apenas 1% das pessoas
    admitem que as têm.
  • 10:22 - 10:25
    Porque têm medo que as vejam
    como loucas, ou algo do género.
  • 10:26 - 10:28
    E se, por acaso, falam disso
    aos seus médicos
  • 10:28 - 10:30
    podem acabar por ser mal diagnosticados.
  • 10:30 - 10:32
    Particularmente, porque há a ideia
  • 10:32 - 10:35
    que, se alguém vê coisas ou ouve coisas,
    está a enlouquecer.
  • 10:35 - 10:38
    Mas as alucinações psicóticas
    são muito diferentes.
  • 10:38 - 10:41
    As alucinações psicóticas,
    quer sejam visuais ou vocais,
  • 10:41 - 10:43
    dirigem-se a nós.
  • 10:43 - 10:45
    Elas acusam-nos. Seduzem-nos.
  • 10:45 - 10:47
    Humilham-nos. Troçam de nós.
  • 10:48 - 10:50
    Nós interagimos com elas.
  • 10:51 - 10:54
    Esta característica de se dirigirem a nós
  • 10:54 - 10:57
    não acontece
    nas alucinações de Charles Bonnet.
  • 10:57 - 11:01
    É como um filme. Vemos um filme
    que não tem nada a ver connosco.
  • 11:01 - 11:04
    Ou, pelo menos, é o que as pessoas acham.
  • 11:04 - 11:08
    Há uma doença rara chamada
    epilepsia do lobo temporal.
  • 11:08 - 11:10
    Às vezes, se alguém a tiver,
  • 11:10 - 11:13
    pode sentir-se como que teletransportado
  • 11:13 - 11:15
    para um tempo e lugar no passado.
  • 11:15 - 11:18
    Estamos num cruzamento
    de estradas particular,
  • 11:18 - 11:20
    cheira-nos a castanhas assadas.
  • 11:20 - 11:23
    Ouvimos o trânsito.
    Todos os sentidos estão envolvidos.
  • 11:23 - 11:25
    E estamos à espera da namorada.
  • 11:25 - 11:28
    É aquela terça-feira à tarde de 1982.
  • 11:29 - 11:33
    As alucinações do lobo temporal
    são todas as alucinações multissensoriais,
  • 11:33 - 11:36
    plenas de emoções,
    plenas de familiaridade,
  • 11:36 - 11:38
    localizadas no espaço e tempo,
  • 11:38 - 11:40
    coerentes, dramáticas.
  • 11:40 - 11:42
    As de Charles Bonnet são muito diferentes.
  • 11:43 - 11:46
    Nas alucinações de Charles Bonnet,
  • 11:46 - 11:48
    temos uma série de níveis,
  • 11:48 - 11:50
    desde alucinações geométricas,
  • 11:50 - 11:53
    os quadrados rosa e azuis
    que a idosa tinha,
  • 11:53 - 11:58
    até às alucinações muito elaboradas
  • 11:58 - 12:00
    com personagens e rostos específicos.
  • 12:00 - 12:04
    Rostos, e às vezes rostos deformados
  • 12:04 - 12:08
    são o único elemento comum
    neste tipo de alucinações.
  • 12:08 - 12:12
    Um dos elementos secundários
    mais comuns são os desenhos animados.
  • 12:12 - 12:14
    Então, o que é que se passa?
  • 12:14 - 12:17
    De modo fascinante, nos últimos anos,
  • 12:17 - 12:20
    tornou-se possível obter
    imagens do cérebro funcional,
  • 12:20 - 12:25
    fazendo ressonâncias magnéticas funcionais
    a doentes, durante as alucinações.
  • 12:25 - 12:30
    Encontrar quais as diferentes partes
    do cérebro visual
  • 12:30 - 12:33
    que são ativadas enquanto
    estão a ocorrer as alucinações.
  • 12:33 - 12:36
    Quando as pessoas têm estas
    alucinações geométricas simples,
  • 12:36 - 12:40
    é ativado o córtex visual primário.
  • 12:40 - 12:44
    É a parte do cérebro
    da perceção de arestas e padrões.
  • 12:44 - 12:47
    As imagens não se formam
    no nosso córtex visual primário.
  • 12:48 - 12:50
    Quando as imagens se formam,
  • 12:50 - 12:53
    uma grande parte do córtex visual
  • 12:53 - 12:55
    é envolvido no lobo temporal.
  • 12:56 - 12:59
    Em particular, uma área do lobo temporal
  • 12:59 - 13:02
    a que chamamos giro fusiforme.
  • 13:02 - 13:05
    Sabe-se que, quando as pessoas
    têm danos no giro fusiforme,
  • 13:05 - 13:09
    podem perder a capacidade
    de reconhecer rostos.
  • 13:09 - 13:13
    Mas se houver uma atividade anormal
    do giro fusiforme,
  • 13:13 - 13:16
    podem provocar alucinações com rostos.
  • 13:16 - 13:19
    É exatamente o que acontece
    com algumas destas pessoas.
  • 13:19 - 13:22
    Há uma área na parte anterior deste giro
  • 13:23 - 13:27
    onde os dentes
    e os olhos são representados.
  • 13:27 - 13:30
    Essa parte do giro é ativada
  • 13:31 - 13:34
    quando as pessoas
    têm as alucinações deformadas.
  • 13:34 - 13:36
    Há outra parte do cérebro
  • 13:36 - 13:38
    que é especialmente ativada
  • 13:38 - 13:41
    quando vemos desenhos animados.
  • 13:41 - 13:44
    É ativada quando reconhecemos
    os desenhos animados,
  • 13:44 - 13:47
    quando os desenhamos,
    e quando os vemos nas alucinações,
  • 13:47 - 13:50
    É muito interessante
    que isto seja específico.
  • 13:50 - 13:53
    Há ainda outras partes do cérebro
    que são especialmente envolvidas
  • 13:53 - 13:56
    no reconhecimento e alucinação.
  • 13:56 - 13:58
    de edifícios e paisagens.
  • 13:58 - 14:00
    Por volta de 1970 descobriu-se
  • 14:00 - 14:03
    que não só estavam envolvidas
    partes particulares do cérebro,
  • 14:03 - 14:04
    mas células particulares.
  • 14:04 - 14:08
    As "células da face" foram descobertas
    por volta de 1970.
  • 14:08 - 14:12
    E agora sabemos que existem
    centenas de outros tipos de células,
  • 14:12 - 14:14
    que podem ser muito, muito específicas.
  • 14:14 - 14:18
    Por isso, podemos ter células "carro"
  • 14:18 - 14:21
    mas também podemos ter
    células "Aston Martin".
  • 14:21 - 14:23
    (Risos)
  • 14:24 - 14:26
    Hoje de manhã vi um Aston Martin.
  • 14:26 - 14:28
    Tive de o trazer.
  • 14:28 - 14:31
    E agora está algures aqui dentro.
  • 14:32 - 14:38
    Bem, neste nível,
    a que chamamos córtex infra temporal.
  • 14:38 - 14:41
    só existem imagens visuais,
  • 14:41 - 14:43
    ou representações ou fragmentos.
  • 14:43 - 14:46
    É apenas nos níveis superiores
  • 14:46 - 14:48
    que os outros sentidos se juntam
  • 14:48 - 14:51
    e são geradas as ligações
    entre a memória e a emoção.
  • 14:51 - 14:53
    N síndrome de Charles Bonnet
  • 14:53 - 14:55
    não se chega a esse níveis mais altos.
  • 14:55 - 14:59
    Ficamos nos níveis
    do córtex visual inferior
  • 14:59 - 15:01
    onde encontramos milhares
    e dezenas de milhares
  • 15:01 - 15:03
    e milhões de imagens,
  • 15:03 - 15:06
    ou representações,
    ou representações fragmentadas,
  • 15:06 - 15:08
    todas neurologicamente codificadas,
  • 15:08 - 15:12
    em células especiais
    ou pequenos grupos de células.
  • 15:12 - 15:14
    Normalmente, estas fazem parte
  • 15:14 - 15:18
    do sistema integrado da perceção,
    ou imaginação.
  • 15:19 - 15:21
    E ninguém tem consciência delas.
  • 15:21 - 15:25
    Só através de alguém
    com dificuldades visuais, ou cego
  • 15:25 - 15:28
    é que o processo é interrompido.
  • 15:28 - 15:30
    Em vez de termos uma perceção normal,
  • 15:30 - 15:35
    temos uma anárquica
    estimulação convulsiva,
  • 15:35 - 15:38
    ou libertação de todas
    aquelas células visuais
  • 15:38 - 15:40
    no córtex infra temporal.
  • 15:40 - 15:43
    Então, subitamente vemos um rosto.
    Subitamente, vemos um carro.
  • 15:43 - 15:45
    Subitamente isto, subitamente aquilo.
  • 15:45 - 15:48
    A mente faz o melhor
    que pode para organizar
  • 15:48 - 15:51
    para conferir algum tipo
    de coerência nisto.
  • 15:51 - 15:53
    Mas não tem muito sucesso.
  • 15:53 - 15:55
    Quando as alucinações
    foram descritas pela primeira vez
  • 15:55 - 15:58
    pensou-se que talvez pudessem
    ser interpretadas como sonhos.
  • 15:58 - 16:00
    Mas, de facto, as pessoas dizem:
  • 16:00 - 16:04
    "Eu não reconheço as pessoas.
    Eu não consigo associá-las a nada".
  • 16:04 - 16:07
    "O Cocas não significa nada para mim".
  • 16:07 - 16:11
    Não se chega a lado nenhum
    se pensarmos nelas como sonhos.
  • 16:12 - 16:16
    Já disse mais ou menos o que queria.
  • 16:16 - 16:19
    Acho que só quero recapitular
  • 16:19 - 16:21
    e afirmar que isto é comum.
  • 16:21 - 16:24
    Pensem no número
    de pessoas cegas que existem.
  • 16:24 - 16:26
    Deve haver centenas
    de milhares de pessoas cegas
  • 16:26 - 16:28
    que têm estas alucinações,
  • 16:28 - 16:30
    mas têm demasiado medo de as revelar.
  • 16:30 - 16:32
    Por isso, este tipo de coisas
    precisa de ser divulgado
  • 16:32 - 16:37
    aos doentes, aos médicos, ao público.
  • 16:38 - 16:43
    Por fim, acho que são infinitamente
    interessantes, e valiosas,
  • 16:43 - 16:47
    por nos darem alguma pistas
    sobre como o nosso cérebro funciona.
  • 16:47 - 16:51
    Charles Bonnet disse, há 250 anos
  • 16:51 - 16:55
    perguntou-se como,
    ao pensar nestas alucinações,
  • 16:55 - 16:57
    como, nas palavras dele,
    "o teatro da mente
  • 16:57 - 17:01
    "podia ser gerado
    pela maquinaria do cérebro"..
  • 17:01 - 17:03
    Agora, 250 mais tarde,
  • 17:03 - 17:06
    acho que começamos a vislumbrar
    como é que isto acontece.
  • 17:07 - 17:08
    Muito obrigado
  • 17:08 - 17:11
    (Aplausos)
  • 17:12 - 17:14
    Chris Anderson:
    Foi soberbo. Muito obrigado.
  • 17:14 - 17:17
    Fala destas coisas com tanto conhecimento
  • 17:17 - 17:19
    e empatia pelos seus pacientes.
  • 17:19 - 17:24
    Alguma vez sofreu de alguma
    das síndromes sobre as quais escreve?
  • 17:24 - 17:26
    Oliver Sacks:
    Receava que me perguntasse isso.
  • 17:26 - 17:28
    (Risos)
  • 17:28 - 17:30
    Sim, de muitas delas.
  • 17:30 - 17:33
    Na verdade também tenho
    algumas dificuldades visuais.
  • 17:33 - 17:36
    Sou cego de um olho,
    e vejo muito mal do outro.
  • 17:37 - 17:40
    Tenho alucinações geométricas.
  • 17:40 - 17:42
    Mas é só o que tenho.
  • 17:42 - 17:44
    CA: E como é que elas não o perturbam?
  • 17:44 - 17:47
    Porque compreende o que as causa?
    Isso não o preocupa?
  • 17:47 - 17:50
    OS: Não me incomodam mais
    do que os zumbidos que ouço.
  • 17:51 - 17:53
    Os quais ignoro.
  • 17:54 - 17:55
    Ocasionalmente interessam-me.
  • 17:55 - 17:58
    Tenho muitas imagens delas
    nas minhas anotações.
  • 17:58 - 18:01
    Fiz uma ressonância magnética funcional
  • 18:01 - 18:04
    para ver como é
    que o meu córtex visual reage.
  • 18:04 - 18:08
    E quando vejo uma quantidade de hexágonos
  • 18:08 - 18:10
    e coisas complexas, que também vejo,
  • 18:10 - 18:13
    em enxaquecas visuais,
  • 18:13 - 18:15
    pergunto-me se toda a gente
    vê coisas assim,
  • 18:15 - 18:18
    e se coisas como a arte rupestre,
    ou a arte ornamental
  • 18:18 - 18:20
    pode ter derivado delas um pouco.
  • 18:20 - 18:22
    CA: Foi uma palestra
    verdadeiramente fascinante.
  • 18:22 - 18:24
    Muito obrigada pela partilha.
  • 18:24 - 18:26
    - Obrigado.
    - Obrigado.
  • 18:26 - 18:28
    (Aplausos)
Title:
O que a alucinação revela sobre a nossa mente.
Speaker:
Oliver Sacks
Description:

O autor e neurologista Oliver Sacks chama-nos a atenção para a Síndrome de Charles Bonnet — doença em que os doentes com dificuldades visuais experimentam alucinações lúcidas. Descreve as experiências dos seus doentes com um detalhe comovente, e guia-nos pela biologia deste fenómeno pouco relatado.

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English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
18:32
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for What hallucination reveals about our minds
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