Felicidade de corpo e alma
-
0:01 - 0:03Aposto que estão preocupados
-
0:04 - 0:05(Risos)
-
0:05 - 0:09Eu estava preocupada.
Foi por isso que comecei esta peça. -
0:09 - 0:12Tinha preocupações sobre as vaginas.
-
0:13 - 0:16Preocupava-me o que pensamos
sobre as vaginas -
0:16 - 0:19e preocupava-me ainda mais com o facto
de não pensarmos nelas. -
0:19 - 0:21Estava preocupada com a minha vagina.
-
0:21 - 0:26Precisava de um contexto, de uma cultura,
de uma comunidade de outras vaginas. -
0:26 - 0:30Há tanta escuridão e secretismo
à volta das vaginas. -
0:30 - 0:34É como o Triângulo das Bermudas,
ninguém nos dá notícias desse lugar. -
0:35 - 0:36(Risos)
-
0:36 - 0:40Em primeiro lugar, não é lá muito fácil
encontrar a vossa vagina. -
0:40 - 0:43Passam-se dias, semanas, meses
sem que as mulheres olhem para ela. -
0:43 - 0:45Entrevistei uma poderosa
mulher de negócios; -
0:45 - 0:48ela disse-me que não tinha tempo.
-
0:48 - 0:51"Olhar para a vagina" disse-me,
"é trabalho para um dia inteiro". -
0:51 - 0:52(Risos)
-
0:52 - 0:56"Temos de nos deitar de costas
em frente dum espelho de corpo inteiro., -
0:57 - 0:59Temos de encontrar
a posição e a luz perfeitas -
0:59 - 1:02e depois fica na sombra
dado o ângulo em que estamos. -
1:02 - 1:05Temos de virar a cabeça,
arquear as costas, é cansativo". -
1:05 - 1:08Ela era muito ocupada, não tinha tempo.
-
1:08 - 1:11Por isso, decidi falar com as mulheres
sobre as suas vaginas. -
1:11 - 1:14Começaram por ser
entrevistas informais sobre a vagina -
1:14 - 1:17e tornaram-se nos "Monólogos da vagina".
-
1:17 - 1:19Conversei com mais de 200 mulheres.
-
1:19 - 1:22Falei com mulheres mais velhas,
mulheres mais jovens, -
1:22 - 1:24mulheres casadas,
lésbicas, mulheres solteiras -
1:24 - 1:27Falei com empresárias,
professoras universitárias, -
1:27 - 1:29actrizes, profissionais do sexo.
-
1:29 - 1:33Falei com mulheres afro-americanas,
mulheres asiático-americanas, -
1:33 - 1:37mulheres nativo-americanas,
mulheres caucasianas, mulheres judias. -
1:37 - 1:40A princípio as mulheres
estavam um pouco tímidas, -
1:40 - 1:42um pouco relutantes em falar.
-
1:42 - 1:45Depois de começarem a falar,
não conseguias pará-las. -
1:45 - 1:49As mulheres adoram falar
das suas vaginas — gostam mesmo. -
1:49 - 1:52Principalmente porque nunca
ninguém lhes pediu isso. -
1:52 - 1:53(Risos)
-
1:53 - 1:57Comecemos pela palavra "vagina".
-
1:58 - 2:01Soa a uma infecção,
na melhor das hipóteses. -
2:01 - 2:03Talvez um instrumento médico.
-
2:03 - 2:05"Depressa, enfermeira, traga a vagina."
-
2:05 - 2:06(Risos)
-
2:06 - 2:08Vagina, vagina, vagina.
-
2:08 - 2:10Por mais que digamos esta palavra,
-
2:10 - 2:12ela nunca soa a uma palavra
que queiramos dizer. -
2:13 - 2:17É uma palavra totalmente ridícula,
nada sensual. -
2:17 - 2:20Se a usarmos no acto sexual,
tentando ser politicamente correcta, -
2:20 - 2:24"Querido, podias acariciar
a minha vagina?", -
2:24 - 2:26pomos fim ao acto imediatamente.
-
2:26 - 2:27(Risos)
-
2:27 - 2:31Preocupo-me com o que lhe chamamos
e com o que não lhe chamamos. -
2:31 - 2:34Em Great Neck, Nova Iorque,
chamam-lhe "pussy-cat" -
2:34 - 2:36Uma mulher de lá disse-me
que a mãe lhe dizia: -
2:36 - 2:38"Querida, não uses cuecas
debaixo do pijama. -
2:38 - 2:40precisas de arejar a tua 'pussy-cat'".
-
2:41 - 2:43(Risos)
-
2:44 - 2:49Em Westchester chamam-lhe "pooky"
e em Nova Jérsia "twat". -
2:49 - 2:54Também se usa poder-box, derriere,
pooky, poochy, poopy -
2:54 - 2:58poopaloo, pooninana,
padepachetchki, pow e pêssego. -
2:58 - 3:00(Risos)
-
3:00 - 3:06Há também os nomes toadie, dee dee,
nishi, dignity, coochie, snorcher, cooter -
3:06 - 3:11labi, gladis siegelman, va, wee-wee,
-
3:11 - 3:14whore-spot, nappy dugout,
-
3:14 - 3:20mungo, ghoulie, powder-box,
uma "mimi" em Miami, -
3:20 - 3:25uma "split knish" em Filadélfia
e uma "schmende" no Bronx -
3:26 - 3:27(Risos)
-
3:27 - 3:29Preocupo-me com as vaginas.
-
3:29 - 3:33É assim que começam
"Os Monólogos da Vagina" -
3:33 - 3:35Mas não foi exactamente aí que começaram.
-
3:35 - 3:38Tudo começou numa conversa com uma mulher.
-
3:38 - 3:41Estávamos a falar sobre a menopausa,
-
3:41 - 3:43e chegámos ao tópico da vagina,
-
3:43 - 3:46— o que acontece quando se fala
sobre a menopausa. -
3:46 - 3:48Ela disse coisas sobre a sua vagina
que me chocaram -
3:48 - 3:52— que ela estava seca, acabada, morta —
e eu fiquei em choque. -
3:52 - 3:55Uma vez disse a uma amiga:
"O que é que pensas da tua vagina?" -
3:56 - 3:58Essa mulher disse algo
mais extraordinário, -
3:58 - 4:00e outra depois disse algo
ainda mais extraordinário. -
4:00 - 4:02Num repente, todas as mulheres me diziam
-
4:02 - 4:06que eu tinha de falar com outra mulher
que tinha uma história fantástica, -
4:06 - 4:08e assim fui empurrada
para o trilho da vagina. -
4:08 - 4:10(Risos)
-
4:10 - 4:12E não consegui sair mais de lá.
-
4:12 - 4:14Se me tivessem dito,
quando eu era mais nova, -
4:14 - 4:17que quando fosse grande
e entrasse numa sapataria, -
4:17 - 4:19as pessoas iam gritar:
"Olha, é a senhora da Vagina", -
4:19 - 4:22eu não saberia se essa iria ser
a ambição da minha vida. -
4:22 - 4:24(Risos)
-
4:23 - 4:25Mas eu quero falar um pouco
sobre felicidade -
4:25 - 4:28e a relação com esta viagem da vagina,
-
4:28 - 4:31porque tem sido uma viagem extraordinária
que começou há oito anos. -
4:31 - 4:34Acho que, antes de ter feito
"Os Monólogos da Vagina", -
4:34 - 4:37eu não acreditava na felicidade.
-
4:37 - 4:40Para ser honesta, pensava
que apenas os idiotas eram felizes. -
4:40 - 4:43Lembro-me que, quando comecei
a praticar budismo há 14 anos, -
4:43 - 4:46e me disseram que esta prática
tinha como objectivo -
4:46 - 4:48alcançar a felicidade, eu disse:
-
4:48 - 4:50"Como posso ser feliz
e viver neste mundo de sofrimento -
4:50 - 4:52e viver neste mundo de dor?"
-
4:52 - 4:56Confundi felicidade
com muitas outras coisas, -
4:56 - 5:00como entorpecimento,
decadência ou egoísmo. -
5:00 - 5:03Durante os "Monólogos da Vagina"
e desta viagem -
5:03 - 5:07é que eu comecei a compreender
um pouco mais a felicidade. -
5:08 - 5:10Há três qualidades de que eu quero falar.
-
5:10 - 5:14Uma é ver aquilo
que está mesmo à nossa frente, -
5:14 - 5:16falar sobre isso e afirmá-lo.
-
5:16 - 5:19Penso que aquilo que aprendi
ao conversar sobre a vagina, -
5:19 - 5:22e ao falar sobre a vagina,
é que esta era a coisa mais óbvia -
5:22 - 5:25— estava localizada no centro do meu corpo
e no centro do mundo — -
5:25 - 5:28e, apesar disso, ninguém falava dela.
-
5:28 - 5:32A segunda coisa, é que o que aconteceu
por eu falar na vagina -
5:32 - 5:35foi abrir-se uma porta que me permitiu ver
-
5:35 - 5:38que havia uma forma
de servir o mundo e torná-lo melhor. -
5:38 - 5:42E é daí que brota
a mais profunda felicidade. -
5:42 - 5:46E o terceiro princípio da felicidade,
de que só recentemente me apercebi. -
5:46 - 5:50Há oito anos este ímpeto,
esta energia, esta "Onda-V"... -
5:50 - 5:53— e apenas posso descrevê-la como "Onda-V"
porque, sinceramente, -
5:53 - 5:57eu não a compreendo plenamente,
sinto-me ao serviço dela — -
5:57 - 6:00... esta onda começou
e, se eu a questionar, -
6:00 - 6:03ou tentar pará-la ou olhar para ela,
-
6:03 - 6:06tenho frequentemente
a sensação duma chicotada -
6:06 - 6:09ou sinto que posso partir o pescoço.
-
6:09 - 6:12Mas se me deixar ir com a onda,
confiar nela e me mover com ela, -
6:12 - 6:14eu chego a um novo lugar.
-
6:14 - 6:17e tudo acontece de forma lógica,
orgânica e verdadeira. -
6:18 - 6:22Comecei esta peça, especialmente
a partir de histórias e narrativas, -
6:22 - 6:25falando com uma mulher,
fui levada a outra mulher -
6:25 - 6:27que a seguir me dirigiu para outra mulher.
-
6:27 - 6:31Depois escrevi essas histórias
e confrontei-as com outras pessoas. -
6:31 - 6:34No início, de todas as vezes
que fiz o espectáculo, -
6:34 - 6:36as mulheres faziam fila à saída
-
6:36 - 6:39porque queriam
contar-me as suas histórias. -
6:39 - 6:40A princípio pensei:
-
6:40 - 6:43"Óptimo, vou ouvir histórias
de orgasmos incríveis, -
6:43 - 6:46óptimas vidas sexuais, como as mulheres
gostam das suas vaginas." -
6:46 - 6:48Mas não era isso que as mulheres
me queriam contar. -
6:48 - 6:54Queriam contar-me como tinham sido
violadas, maltratadas, espancadas, -
6:54 - 6:57violadas por grupos de homens
em parques de estacionamento -
6:57 - 6:59e abusadas incestuosamente por tios.
-
6:59 - 7:01Desejei deixar de fazer
"Os Monólogos da Vagina" -
7:01 - 7:03porque era muito desconcertante.
-
7:03 - 7:05Sentia-me como uma fotógrafa de guerra
-
7:05 - 7:08que fotografa coisas terríveis,
mas não intervém em sua defesa. -
7:08 - 7:11Então, em 1997, disse:
-
7:11 - 7:13"Vamos reunir as mulheres.
-
7:13 - 7:15"O que podemos fazer com esta informação
-
7:15 - 7:18"de que todas estas mulheres
estão a ser violadas?" -
7:18 - 7:22Aconteceu que, depois de pensar
e de investigar, descobri -
7:22 - 7:24— e as Nações Unidas
disseram o mesmo recentemente — -
7:24 - 7:27que 1 em cada 3 mulheres, neste planeta,
-
7:27 - 7:30são espancadas ou violadas
durante a sua vida. -
7:30 - 7:35É essencialmente um dos sexos;
um dos recursos do planeta, as mulheres. -
7:35 - 7:39Por isso, em 1997 reunimos
estas mulheres incríveis e dissemos: -
7:39 - 7:41"Como usar esta peça, esta energia,
-
7:41 - 7:43para pôr termo à violência
contra as mulheres?" -
7:43 - 7:46Criámos um evento num teatro
na cidade de Nova Iorque. -
7:46 - 7:47Vieram todas estas grandes actrizes,
-
7:47 - 7:50desde a Susan Sarandon
à Glenn Close, à Whoopi Goldberg, -
7:50 - 7:54fizemos uma só representação
numa só noite. -
7:54 - 7:57Isso foi o catalisador
desta onda, desta energia. -
7:57 - 8:01Cinco anos depois, começou a acontecer
uma coisa extraordinária. -
8:01 - 8:04Uma mulher captou essa energia e disse:
-
8:04 - 8:08"Quero levar esta onda, esta energia,
para as universidades," -
8:08 - 8:10Assim, agarrou na peça e disse:
-
8:10 - 8:13"Vamos representar a peça
uma vez por ano, -
8:13 - 8:16para angariar dinheiro para pôr fim
à violência contra as mulheres, -
8:16 - 8:18nas comunidades locais de todo o mundo."
-
8:18 - 8:21Num ano, fomos a 50 universidades e
depois expandimo-nos. -
8:21 - 8:24Nos últimos 6 anos, espalhou-se
-
8:24 - 8:27espalhou-se, e espalhou-se
e espalhou-se por todo o globo. -
8:28 - 8:31Eu aprendi duas coisas.
-
8:31 - 8:36Uma: a epidemia da violência
contra as mulheres é chocante. -
8:36 - 8:39É tão global, profunda e devastadora
-
8:39 - 8:43— em cada recanto de cada pequena cratera,
de cada pequena sociedade — -
8:43 - 8:47que nós nem a reconhecemos
porque se tornou uma coisa vulgar. -
8:47 - 8:50Esta viagem levou-me ao Afeganistão,
-
8:50 - 8:53onde tive a honra
e o privilégio extraordinários -
8:53 - 8:57de visitar partes do Afeganistão
sob domínio Talibã. -
8:57 - 9:01Vesti-me com uma burca
e visitei um grupo extraordinário -
9:01 - 9:04chamado Associação Revolucionária
das Mulheres do Afeganistão -
9:04 - 9:07e observei em primeira mão
como as mulheres foram espoliadas -
9:07 - 9:11de todos os direitos
que é possível roubar a um mulher -
9:11 - 9:17desde o direito ao ensino, ao emprego,
até ao direito de comer gelados. -
9:17 - 9:21Para quem não sabe, era ilegal
comer gelados no regime dos Talibãs. -
9:21 - 9:24Vi e conheci mulheres
que foram chicoteadas -
9:24 - 9:27por serem apanhadas
a comer gelados de baunilha. -
9:27 - 9:30Levaram-me a um local secreto,
numa pequena cidade, -
9:30 - 9:32onde se podia comer gelados,
-
9:32 - 9:34Fomos para uma sala das traseiras,
onde as mulheres -
9:34 - 9:38estavam rodeadas por uma cortina,
enquanto serviam gelado de baunilha. -
9:38 - 9:41As mulheres levantavam as burcas
e comiam o gelado. -
9:41 - 9:45Acho que nunca tinha sentido
o que era o prazer até aí, -
9:45 - 9:48mas as mulheres encontraram uma forma
de manter vivo o seu prazer. -
9:48 - 9:51Esta viagem levou-me também a Islamabad,
-
9:51 - 9:54onde testemunhei e conheci
mulheres desfiguradas. -
9:54 - 9:58Levou-me a Juaréz, no México,
onde estive na semana passada. -
9:58 - 10:01Estive em parques de estacionamento
-
10:01 - 10:04onde tinham sido lavados
e despejados ossos de mulheres -
10:04 - 10:07lado a lado com latas de Coca-Cola.
-
10:07 - 10:10Levou-me a universidades, em todo o país,
-
10:10 - 10:13onde há raparigas violadas
e drogadas durante encontros. -
10:13 - 10:16Eu vi uma violência terrível,
terrível, terrível. -
10:16 - 10:20Mas também compreendi,
enquanto assistia a tanta violência, -
10:20 - 10:26que viver as coisas e presenciar
o que está mesmo à nossa frente -
10:26 - 10:28é o antídoto para a depressão
-
10:28 - 10:32e para os sentimentos
de falta de préstimo e de objectivo. -
10:32 - 10:34Posso dizer que,
antes dos "Monólogos da Vagina", -
10:34 - 10:3680% da minha consciência estava fechada
-
10:36 - 10:40àquilo que estava
a acontecer na realidade. -
10:40 - 10:43Esse isolamento também impedia
a vitalidade e a energia da minha vida. -
10:44 - 10:47O que também aconteceu
no decorrer destas viagens -
10:47 - 10:49— e tem sido uma coisa extraordinária —
-
10:49 - 10:54é que em cada lugar a que fui no mundo,
conheci uma nova espécie. -
10:54 - 10:57Eu adoro ouvir falar de todas as espécies
que vivem no fundo do mar. -
10:57 - 11:00E estava aqui a pensar nas pessoas
extraordinárias deste painel, -
11:00 - 11:05quer abaixo, para além dele, e no meio
-
11:05 - 11:08e em como a vagina se adequa
a todas essas categorias. -
11:08 - 11:09(Risos)
-
11:09 - 11:12Mas uma das coisas que vi é esta espécie.
-
11:12 - 11:15É uma espécie e é um novo paradigma,
-
11:15 - 11:18que não é noticiado na imprensa
nem nos media -
11:18 - 11:21porque, segundo parece,
as boas notícias nunca são notícias, -
11:21 - 11:24e não me parece que as pessoas
que estão a transformar o planeta -
11:24 - 11:26sejam as que dão audiências
aos programas de TV. -
11:26 - 11:29Mas em cada país que visitei
-
11:29 - 11:31— e nos últimos seis anos estive
em cerca de 45 países, -
11:31 - 11:34em muitas pequenas aldeias,
vilas e cidades — -
11:34 - 11:38vi uma coisa que comecei a denominar
de "Guerreiras da Vagina". -
11:38 - 11:43Uma "Guerreira da Vagina" é uma mulher,
— ou um homem amigo da vagina — -
11:43 - 11:46que testemunhou ou sofreu
uma violência tremenda -
11:46 - 11:50e que, em vez de pegar numa AK-47,
ou em armas de destruição maciça, -
11:50 - 11:56ou numa catana,
conteve a violência do seu corpo -
11:56 - 12:00fez o seu luto, experimentou-a
e depois saiu e dedicou a vida -
12:00 - 12:04a assegurar que esse tipo de violência
não atinja mais ninguém. -
12:04 - 12:07Conheci essas mulheres
em todos os lugares do planeta. -
12:07 - 12:09E quero contar algumas histórias
porque acredito -
12:09 - 12:12que as histórias são a forma
de transmitir informação, -
12:12 - 12:15de forma a que ela entre no nosso corpo.
-
12:15 - 12:18Penso que uma das coisas muito interessante
quanto a eu estar aqui no TED -
12:18 - 12:22é que eu vivo muito no meu corpo,
já não vivo muito na minha cabeça. -
12:22 - 12:25E este é um lugar muito dedicado à cabeça.
-
12:25 - 12:28Tem sido muito interessante
estar na minha cabeça -
12:28 - 12:30nos dois últimos dias
— tenho estado muito desorientada — -
12:30 - 12:33porque penso que o mundo
e a palavra começada por V, -
12:33 - 12:35estão muito mais no nosso corpo.
-
12:35 - 12:38Este é um mundo corpóreo
e a espécie existe no corpo. -
12:38 - 12:40Penso que é uma coisa muito significativa
-
12:40 - 12:43termos os corpos ligados às cabeças.
-
12:43 - 12:49Esta separação criou uma divisão que,
por vezes, separa o propósito da intenção. -
12:49 - 12:54E a ligação entre a cabeça e o corpo
volta a unir essas duas coisas. -
12:55 - 12:58Quero falar sobre três pessoas que conheci,
-
12:58 - 13:01guerreiras da vagina, que transformaram
a minha compreensão -
13:01 - 13:03deste princípio e espécie.
-
13:03 - 13:06Uma delas é uma mulher
chamada Marsha Lopez. -
13:06 - 13:09Marsha Lopez é uma mulher
que conheci na Guatemala. -
13:09 - 13:15Tinha 14 anos, era casada
e o marido batia-lhe regularmente. -
13:15 - 13:20Ela não conseguia deixá-lo
porque estava viciada na relação -
13:20 - 13:21e não tinha dinheiro.
-
13:21 - 13:26Há uns anos fizemos um concurso
em Nova Iorque para "parar com a violação" -
13:26 - 13:30e a irmã mais nova candidatou-se,
na esperança de vir a ser finalista -
13:30 - 13:32e, dessa forma, poder trazer a irmã.
-
13:32 - 13:36Veio a ser uma das finalistas
e trouxe a Marsha para Nova Iorque. -
13:36 - 13:38Nessa altura organizámos
um extraordinário Dia-V -
13:38 - 13:41no Madison Square Garden
onde esgotámos este edifício -
13:41 - 13:43totalmente impregnado de testosterona.
-
13:43 - 13:47Ergueram-se 18 000 pessoas
para dizer "sim" às vaginas, -
13:47 - 13:49o que foi uma transformação incrível.
-
13:49 - 13:52Ela veio, assistiu a isso e então decidiu
-
13:52 - 13:54que iria regressar e deixar o marido,
-
13:54 - 13:57e que iria levar o Dia-V para a Guatemala.
-
13:57 - 13:58Tinha 21 anos.
-
13:58 - 14:01Eu fui à Guatemala e ela tinha conseguido
esgotar a lotação -
14:01 - 14:03do Teatro Nacional da Guatemala.
-
14:03 - 14:08Eu vi-a caminhar para o palco
de vestido vermelho, de saltos altos, -
14:08 - 14:10e ali no palco ela disse:
-
14:10 - 14:14"Chamo-me Marsha. Durante 5 anos
fui espancada pelo meu marido. -
14:14 - 14:17Ele quase me matou. Eu deixei-o
e tu podes fazer o mesmo." -
14:17 - 14:21As 2000 pessoas ficaram
em completa euforia. -
14:21 - 14:23Há uma mulher chamada Esther Chavez
-
14:23 - 14:25que conheci em Juárez, México.
-
14:25 - 14:29Esther Chavez era uma contabilista
brilhante no México. -
14:29 - 14:31Tinha 72 anos e estava
a pensar reformar-se. -
14:32 - 14:36Foi a Juaréz para tomar conta de uma tia
e, no decorrer dessa visita, -
14:36 - 14:39começou a descobrir
o que estava a acontecer -
14:39 - 14:41com mulheres assassinadas
e desaparecidas em Juaréz. -
14:42 - 14:44Abandonou a sua vida, mudou-se para Juarez
-
14:44 - 14:46e começou a escrever as histórias
-
14:46 - 14:49que documentavam
a vida das mulheres desaparecidas. -
14:49 - 14:51Numa cidade fronteiriça.
desapareceram 300 mulheres. -
14:51 - 14:52Como eram escuras e pobres
-
14:52 - 14:55não houve qualquer resposta pública
ao seu desaparecimento -
14:55 - 14:57e nenhuma pessoa foi criminalizada.
-
14:57 - 14:59Ela começou a documentar o caso.
-
14:59 - 15:01Abriu um centro chamado Casa Amiga
-
15:01 - 15:04e, ao fim de 6 anos,
conseguiu trazer esta história -
15:04 - 15:05para a consciência global.
-
15:05 - 15:09Estivemos lá há uma semana, numa altura
em que havia 7000 pessoas na rua, -
15:09 - 15:11foi verdadeiramente um milagre.
-
15:11 - 15:13À medida que andávamos pelas ruas,
as pessoas de Juárez, -
15:13 - 15:17que normalmente nem saem à rua
porque as ruas são perigosas, -
15:17 - 15:20saíram e choraram ao ver
que tinham aparecido pessoas -
15:20 - 15:23de outras partes do mundo,
para apoiar a sua comunidade. -
15:24 - 15:26Há outra mulher chamada Agnes.
-
15:26 - 15:30Para mim a Agnes resume
o que é uma guerreira da vagina. -
15:30 - 15:33Conheci-a há três anos no Quénia.
-
15:33 - 15:39A Agnes foi mutilada quando era menina,
foi circuncidada contra a sua vontade, -
15:39 - 15:41quando tinha 10 anos,
-
15:41 - 15:47e decidiu que não queria que esta prática
continuasse a existir na sua comunidade. -
15:47 - 15:49Por isso, já mais velha,
criou uma coisa incrível. -
15:49 - 15:53É uma escultura anatómica
do corpo duma mulher, -
15:53 - 15:55é metade do corpo duma mulher.
-
15:55 - 15:57Passeou pelo Grande Vale do Rift.
-
15:57 - 16:00Tinha uma vagina
e "peças sobressalentes" da vagina -
16:00 - 16:04com que ensinava raparigas, pais e rapazes,
qual o aspecto duma vagina saudável, -
16:04 - 16:07e qual o aspecto duma vagina mutilada.
-
16:07 - 16:12No decorrer da sua viagem,
passou 8 anos no Grande Vale do Rift, -
16:12 - 16:14no meio da poeira, dormindo no chão.
-
16:14 - 16:17Como os Massais são nómadas,
ela tinha de os procurar, -
16:17 - 16:21depois eles mudavam de local
e ela tinha de os encontrar novamente. -
16:21 - 16:24Salvou 1500 raparigas de serem mutiladas.
-
16:24 - 16:27Foi nessa altura que ela criou
um ritual alternativo -
16:27 - 16:30que permitia às raparigas atingirem
a maioridade sem serem mutiladas. -
16:30 - 16:32Quando a conhecemos
há três anos, dissemos-lhe: -
16:32 - 16:35"O que é que o Dia-V pode fazer?"
e ela disse: -
16:35 - 16:38"Se me arranjassem um jipe,
eu deslocava-me muito mais depressa." -
16:38 - 16:39(Risos)
-
16:39 - 16:40Comprámos-lhe um jipe.
-
16:40 - 16:44No ano em que ela teve o jipe, salvou
4500 raparigas de serem mutiladas. -
16:45 - 16:47Então dissemos:
"Agnes, que mais podemos fazer por ti?" -
16:48 - 16:50E ela: "Eve, se me desses algum dinheiro,
-
16:50 - 16:53eu podia abrir uma casa,
as raparigas podiam fugir e salvar-se." -
16:54 - 16:57Eu quero contar a história
dos meus começos -
16:57 - 17:00porque está muito relacionada
com a felicidade e com a Agnes. -
17:01 - 17:02Quando eu era pequena
-
17:02 - 17:07cresci numa comunidade abastada,
de brancos de classe média-alta, -
17:07 - 17:10que tinha todas as tentações e o aspecto
-
17:10 - 17:14do que seria uma vida boa,
fantástica, excelente. -
17:14 - 17:17Era suposto que todos fossem felizes
nessa comunidade -
17:17 - 17:19mas a minha vida era um inferno.
-
17:19 - 17:21Vivia com um pai alcoólico
que me batia e molestava, -
17:21 - 17:24e esta realidade estava
dentro dessa fachada. -
17:24 - 17:28Durante toda a minha infância
eu sonhava que alguém viria salvar-me. -
17:28 - 17:32Eu até criei uma personagem
cujo nome era Sr. Jacaré -
17:32 - 17:34e eu ligava-lhe quando as coisas
ficavam feias -
17:34 - 17:36e dizia-lhe que era altura
de me vir buscar. -
17:36 - 17:40Eu preparava a mochila com a minha bagagem
e ia esperar a chegada do Sr. Jacaré. -
17:40 - 17:43O Sr. Jacaré nunca apareceu,
-
17:43 - 17:47mas a ideia da chegada do Sr. Jacaré
salvou a minha saúde mental -
17:47 - 17:49e permitiu-me continuar a viver
-
17:49 - 17:53porque eu achava que, num futuro distante
alguém apareceria para me salvar. -
17:53 - 17:57Avançando 40 anos, vamos ao Quénia,
-
17:57 - 18:02chegamos para a inauguração dessa casa.
-
18:02 - 18:04A Agnes não me deixara
entrar na casa durante dias -
18:04 - 18:06porque estavam a preparar um ritual.
-
18:06 - 18:08Vou contar-vos uma grande história.
-
18:08 - 18:09Quando a Agnes começou a sua luta
-
18:09 - 18:12para acabar com a mutilação genital
feminina na sua comunidade, -
18:12 - 18:15tornou-se numa marginal,
estava exilada, tinha sido difamada -
18:15 - 18:17e tinha toda a comunidade contra ela.
-
18:17 - 18:20Mas, como guerreira da vagina,
ela continuou -
18:20 - 18:23e manteve o seu compromisso
de transformar as consciências. -
18:23 - 18:28Na comunidade Massai, as cabras e as vacas
são as posses mais valiosas. -
18:28 - 18:32São como os Mercedes-Benz
do Grande Vale do Rift. -
18:32 - 18:36Ora, dois dias antes de abrir a casa,
duas pessoas diferentes -
18:36 - 18:39foram até lá para lhe oferecer uma cabra,
e ela disse-me: -
18:39 - 18:42"Eu soube nesse momento
que a mutilação genital feminina em África -
18:42 - 18:44iria terminar um dia."
-
18:44 - 18:47De qualquer forma, quando lá chegámos,
-
18:47 - 18:51havia centenas de raparigas
com vestidos artesanais vermelhos, -
18:51 - 18:54que é a cor dos Massai e a cor do V-Day.
-
18:54 - 18:57Cumprimentaram-nos
e tinham preparado canções -
18:57 - 19:00sobre o fim do sofrimento
e o fim da mutilação, -
19:00 - 19:03cantaram-nas para nós
e conduziram-nos ao longo do caminho. -
19:03 - 19:05Foi um belo dia debaixo do sol africano.
-
19:05 - 19:07O pó a voar e as raparigas a dançar.
-
19:07 - 19:12Havia aquela casa, onde estava escrito:
" Casa Segura para as Raparigas V-Day." -
19:12 - 19:17Naquele momento percebi
que tinha demorado 47 anos, -
19:17 - 19:20mas o Sr. Jacaré finalmente aparecera.
-
19:20 - 19:22E tinha aparecido, obviamente,
-
19:22 - 19:27numa forma que me levaria imenso tempo
a compreender, ou seja, -
19:27 - 19:31quando damos ao mundo
aquilo que mais queremos, -
19:31 - 19:34conseguimos curar a parte ferida
que se encontra dentro de cada um de nós. -
19:35 - 19:37Eu sinto, nos últimos oito anos,
-
19:37 - 19:40que esta viagem,
esta milagrosa viagem da vagina, -
19:40 - 19:44me ensinou esta coisa realmente simples:
-
19:44 - 19:47A felicidade existe na acção,
-
19:47 - 19:51existe ao dizemos a verdade
e quando dizemos qual é a nossa verdade -
19:51 - 19:55e existe quando damos
aquilo que mais queremos. -
19:55 - 19:59Eu sinto que o conhecimento e essa viagem
-
19:59 - 20:02foram um privilégio extraordinário,
-
20:02 - 20:05e sinto-me verdadeiramente abençoada
por estar aqui hoje a comunicá-la a vocês. -
20:05 - 20:07Muito obrigada.
-
20:07 - 20:09(Aplausos)
- Title:
- Felicidade de corpo e alma
- Speaker:
- Eve Ensler
- Description:
-
Eve Ensler, criadora dos "Monólogos da Vagina", partilha nesta conversa, como uma discussão com as suas amigas sobre a menopausa a levou a falar sobre todo o tipo de actos sexuais em palco, dando início a uma campanha global para pôr fim à violência contra as mulheres, e lhe permitiu encontrar a sua própria felicidade.
- Video Language:
- English
- Team:
closed TED
- Project:
- TEDTalks
- Duration:
- 20:09
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