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O dia que lutei com um jacaré | Deise Nishimura | TEDxAmazonia

  • 0:15 - 0:17
    (Aplausos)
  • 0:17 - 0:20
    Obrigada.
  • 0:32 - 0:39
    A minha paixão pela Amazônia começou
    por causa desse bichinho aqui.
  • 0:39 - 0:42
    O boto-cor-de-rosa, o boto-vermelho.
  • 0:42 - 0:46
    Diz a lenda que os botos
    seduzem as mulheres.
  • 0:46 - 0:49
    E eu acho que essa lenda tem
    um pouquinho de verdade também.
  • 0:49 - 0:54
    Eu me mudei em 2009, em abril de 2009,
  • 0:54 - 0:58
    eu me mudei da cidade grande
    para o coração da Amazônia.
  • 0:58 - 1:04
    Bem naquele pontinho branco,
    lá na bifurcação.
  • 1:04 - 1:08
    Essa foi a casa onde eu morei por 9 meses.
  • 1:08 - 1:11
    Era uma casa flutuante,
    como esse auditório,
  • 1:11 - 1:14
    numa escala menor, lógico.
  • 1:14 - 1:16
    Eu estava vivendo o meu sonho.
  • 1:16 - 1:19
    Essa era a vista
    que eu tinha do meu quarto.
  • 1:19 - 1:21
    Todas as manhãs,
    eu acordava com essa vista.
  • 1:21 - 1:24
    E o único trânsito que eu pegava
  • 1:24 - 1:29
    era esperar um bando de mergulhões
    passar na frente do barco.
  • 1:29 - 1:33
    Quando estava na Amazônia,
    eu aprendi a dirigir barco,
  • 1:33 - 1:35
    não sabia dirigir carro em São Paulo.
  • 1:35 - 1:43
    Aprendi a limpar peixe, aprendi a remar,
    a segurar o remo do jeito certo.
  • 1:43 - 1:47
    Aprendi a dormir na rede,
    sem ficar com dor nas costas.
  • 1:47 - 1:50
    Aprendi a tirar foto.
  • 1:50 - 1:52
    Aprendi a subir na árvore.
  • 1:52 - 1:55
    Então, eu estava vivendo
    o sonho da minha vida.
  • 1:55 - 1:58
    Eu estava vivendo tudo o que eu queria.
  • 1:58 - 2:03
    Mas, a vida traz dificuldades.
  • 2:03 - 2:06
    E foi num dia em que eu estava
    limpando peixe,
  • 2:06 - 2:09
    preparando o almoço,
  • 2:09 - 2:12
    eu estava limpando peixe
    no deck de fora da minha casa,
  • 2:12 - 2:15
    e foi quando um jacaré me atacou.
  • 2:15 - 2:19
    Eu estava na parte de fora da casa,
    o jacaré veio por trás,
  • 2:19 - 2:22
    eu estava sentada no chão,
    limpando no chão,
  • 2:22 - 2:26
    e o jacaré veio por trás
    e pulou mais de um metro,
  • 2:26 - 2:30
    abocanhou a minha perna
    e ele me levou para o fundo d'água.
  • 2:30 - 2:33
    A mais ou menos uns 3 metros,
  • 2:33 - 2:37
    é que eu não tenho muita noção, mas acho
    que foi mais ou menos uns 3 metros.
  • 2:37 - 2:39
    Aí, ele começou a me girar.
  • 2:39 - 2:42
    Não sei se vocês já viram
    um jacaré atacando uma presa,
  • 2:42 - 2:45
    mas eles pegam a presa
    e começam a girar, girar, girar,
  • 2:45 - 2:48
    até arrebentar
    o pedaço da presa que ele quer.
  • 2:48 - 2:51
    E foi isso que ele fez comigo,
    eu lembro de estar girando, girando,
  • 2:51 - 2:54
    parecia que eu estava num liquidificador.
  • 2:54 - 2:57
    E aí, foi quando me veio à cabeça:
  • 2:57 - 3:01
    "Qual seria a parte
    mais sensível do jacaré?"
  • 3:01 - 3:04
    Daí, eu lembro
    de colocar a minha mão assim, atrás,
  • 3:04 - 3:07
    e sentir dois buracos na cabeça do jacaré.
  • 3:07 - 3:11
    E, eu acho que, possivelmente,
    eram os olhos ou o nariz, não sei.
  • 3:11 - 3:13
    Mas eu lembro de colocar os meus dedos
    assim, bem forte,
  • 3:13 - 3:17
    apertar com toda força, com tanta força,
    que eu até quebrei minha unha. (Risos)
  • 3:17 - 3:20
    Aí, foi quando o jacaré me soltou.
  • 3:20 - 3:26
    Aí, eu consegui subir para a superfície
    de novo e eu consegui respirar.
  • 3:26 - 3:33
    Aí, eu tentei subir de volta para casa,
    pelo mesmo lugar que ele me puxou.
  • 3:33 - 3:38
    Mas, eu estava sem uma perna,
  • 3:38 - 3:40
    eu percebi que eu estava sem uma perna já,
  • 3:40 - 3:43
    e eu não tinha força no braço
    para me erguer.
  • 3:43 - 3:45
    Então, eu fui nadando
    até a frente da casa,
  • 3:45 - 3:49
    onde tem uma rampa,
    onde a gente estaciona os barcos,
  • 3:49 - 3:51
    e eu subi por lá.
  • 3:51 - 3:55
    Eu fiquei nessa rampa um tempo,
    gritando por ajuda,
  • 3:55 - 3:58
    porque eu tinha visto um pescador
    passar lá de manhã,
  • 3:58 - 4:00
    e eu achei
    que ele ainda estaria por perto.
  • 4:00 - 4:04
    Mas, depois de algum tempo lá, eu pensei:
  • 4:04 - 4:07
    "Nossa", a água estava toda vermelha
    de sangue,
  • 4:07 - 4:10
    e a chance de atrair mais jacarés
    era muito grande,
  • 4:10 - 4:14
    então eu queria sair de perto da água
    o mais rápido possível.
  • 4:14 - 4:19
    Foi aí que eu lembrei, também,
    que a gente tem um rádio dentro da casa
  • 4:19 - 4:22
    que é conectado com toda a reserva
    onde eu estava morando.
  • 4:22 - 4:25
    Então, essa foi a parte mais difícil,
    eu acho,
  • 4:25 - 4:28
    que foi subir a rampa numa perna só,
  • 4:28 - 4:31
    então eu pulava, eu rolava, me arrastava.
  • 4:31 - 4:33
    Porque, de repente,
    você está sem uma perna,
  • 4:33 - 4:35
    você perde totalmente o equilíbrio.
  • 4:35 - 4:40
    Mas, eu consegui chegar dentro da casa,
    peguei o rádio, chamei por ajuda,
  • 4:40 - 4:43
    e depois de mais ou menos uns 10 minutos,
  • 4:43 - 4:48
    uns guias turísticos de uma pousada
    que fica lá perto chegaram.
  • 4:48 - 4:51
    E eles fizeram um torniquete
    na minha perna, tudo...
  • 4:51 - 4:53
    Mas, já tinham passado 10 minutos.
  • 4:53 - 4:57
    E, não sei se vocês sabem, mas
    a gente tem uma artéria muito grossa aqui,
  • 4:57 - 4:58
    que chama artéria femoral,
  • 4:58 - 5:03
    e eles falam que,
    se você leva um tiro nessa artéria,
  • 5:03 - 5:06
    você morre em questão de minutos,
    4, 5 minutos, você já está morto.
  • 5:06 - 5:11
    E, milagrosamente,
    eu estava viva e estava consciente.
  • 5:11 - 5:18
    E os médicos falam que, pode ser
    que quando o jacaré estava me atacando,
  • 5:18 - 5:22
    ele torceu a minha perna e acabou
    torcendo a artéria femoral também.
  • 5:22 - 5:26
    E outros médicos dizem que quando
    uma artéria grande como essa arrebenta,
  • 5:26 - 5:30
    a artéria contrai
    e faz um torniquete natural.
  • 5:30 - 5:35
    Mas, de qualquer forma,
    me colocaram numa voadeira,
  • 5:35 - 5:39
    que são aqueles barquinhos pequenos.
  • 5:39 - 5:40
    E me levaram para o hospital
  • 5:40 - 5:45
    e, no meio do caminho, ele me trocaram
    para um barco maior e mais rápido.
  • 5:45 - 5:47
    Foi aí que eu comecei a sentir muita dor,
  • 5:47 - 5:49
    porque, até então,
    eu não tinha sentido nada,
  • 5:49 - 5:51
    graças a Deus, existe a adrenalina.
  • 5:51 - 5:56
    Eu fiquei no hospital em Tefé,
    que é uma cidade a 600km de Manaus.
  • 5:56 - 5:58
    Fiquei lá por 10 dias,
  • 5:58 - 6:03
    onde eu tive que fazer
    uma cirurgia de emergência.
  • 6:03 - 6:08
    E depois que me estabilizei,
    fui transferida para São Paulo, de avião.
  • 6:08 - 6:11
    E fiquei mais 5 dias no hospital.
  • 6:11 - 6:18
    E depois de 6 meses de reabilitação,
    e de fisioterapia intensa, todos os dias,
  • 6:18 - 6:20
    eu sentia muita, muita dor ainda
  • 6:20 - 6:25
    e tive que me submeter
    a outra cirurgia, de correção,
  • 6:25 - 6:28
    para tirar a dor que eu estava sentindo.
  • 6:28 - 6:32
    E, para mim,
    essa foi a parte mais difícil,
  • 6:32 - 6:35
    mais difícil do que lutar com o jacaré,
  • 6:35 - 6:42
    mais difícil do que suportar a dor
    era ter que começar de novo.
  • 6:42 - 6:47
    E assim, eu vivia
    na imensidão do Amazonas,
  • 6:47 - 6:50
    independente, vivendo o meu sonho
  • 6:50 - 6:53
    e, de repente, de uma hora para outra,
  • 6:53 - 6:56
    eu estava confinada
    num quarto em São Paulo,
  • 6:56 - 7:02
    num hospital, dependente de todo mundo
    para fazer tudo.
  • 7:02 - 7:06
    Essa foi uma parte bem difícil para mim.
  • 7:06 - 7:08
    Mas, é por isso que eu estou aqui!
  • 7:08 - 7:11
    Eu estou aqui para falar para vocês,
    não só do ataque,
  • 7:11 - 7:12
    que é uma história incrível,
  • 7:12 - 7:16
    mas eu estou aqui para falar
    da superação que eu estou vivendo
  • 7:16 - 7:19
    e ainda estou superando.
  • 7:19 - 7:23
    Eu confesso que, mudar assim de vida,
    de repente, de uma hora para outra,
  • 7:23 - 7:27
    não é uma coisa fácil.
  • 7:27 - 7:30
    Não consegui fazer as coisas
    como eu fazia antigamente,
  • 7:30 - 7:33
    como subir uma escada,
    por exemplo, sem ajuda,
  • 7:33 - 7:35
    é uma coisa difícil,
  • 7:35 - 7:38
    e eu não vou mentir
    que eu não fico triste,
  • 7:38 - 7:39
    chateada, às vezes.
  • 7:39 - 7:42
    Mas, eu não estou aqui
    para vocês sentirem dó ou pena de mim,
  • 7:42 - 7:46
    eu acho que, muitas vezes,
    as pessoas não sabem direito como reagir
  • 7:46 - 7:49
    com um deficiente físico
    ou deficiente mental,
  • 7:49 - 7:53
    mas assim, eu não queria
    que vocês sentissem dó ou pena de mim.
  • 7:53 - 7:58
    Uma vez, eu estava na academia,
    e a mulher veio para mim...
  • 7:58 - 7:59
    Eu estava andando de muleta.
  • 7:59 - 8:01
    Daí, a mulher veio para mim e falou:
  • 8:01 - 8:05
    "Ai, coitadinha, o que aconteceu?
    Você torceu o pé?"
  • 8:05 - 8:07
    Aí, eu levantei assim e falei:
  • 8:07 - 8:11
    "Não, não, é que eu sou amputada
    e estou aprendendo a andar ainda".
  • 8:11 - 8:17
    Aí, ela: "Ai! Que pena! Tão novinha!
    Coitadinha! Acabou com o seu futuro, né?"
  • 8:17 - 8:22
    Aí, eu falei assim: "Olha, minha senhora,
    me desculpe, mas assim,
  • 8:22 - 8:25
    eu estou ótima, eu estou animadíssima
    quanto ao meu futuro.
  • 8:25 - 8:30
    E a senhora? Como é que a senhora está?"
    (Risos)
  • 8:30 - 8:36
    Mas, já as crianças... (Aplausos)
  • 8:36 - 8:39
    Agora, eu vou contar outra coisa.
  • 8:39 - 8:43
    Já as crianças, eu adoro crianças
    porque elas são super espontâneas.
  • 8:43 - 8:44
    Eu estava no Rio de Janeiro,
  • 8:44 - 8:47
    estava andando de shorts,
    numa feirinha de artesanato.
  • 8:47 - 8:49
    Aí, chegou um menininho e falou:
  • 8:49 - 8:53
    "Pô! Que manero! Tu tem perna de robô!"
  • 8:53 - 8:55
    E saiu correndo para contar
    para os amiguinhos dele,
  • 8:55 - 8:57
    para mostrar para eles.
  • 8:57 - 8:59
    Então, acho que é assim,
  • 8:59 - 9:01
    não é uma perna que define quem você é,
  • 9:01 - 9:05
    não são os problemas
    que vocês enfrentam hoje
  • 9:05 - 9:07
    que fazem quem vocês são hoje.
  • 9:07 - 9:11
    Como vocês lidam com esses problemas.
  • 9:11 - 9:15
    Hoje, literalmente,
    cada passo para mim é uma conquista.
  • 9:15 - 9:20
    Antes, levantar da cama para
    ir ao banheiro era um desafio.
  • 9:20 - 9:24
    Depois, andar de muletas
    era outro desafio.
  • 9:24 - 9:27
    Depois, andar com a prótese
    está sendo um desafio para mim.
  • 9:27 - 9:33
    Mas, passar por esses obstáculos
    é o que me motiva a continuar.
  • 9:33 - 9:38
    E, depois do ataque,
    eu aprendi a dirigir carro,
  • 9:38 - 9:41
    eu aprendi a nadar com uma perna só.
  • 9:41 - 9:46
    E, tem uma coisa muito legal
    que eu quero mostrar para vocês.
  • 9:46 - 9:52
    É que eu tenho uma mesa portátil,
    aonde quer que eu vá. (Risos)
  • 9:52 - 9:57
    (Aplausos)
  • 9:57 - 10:02
    E, um dos meus maiores desejos,
  • 10:02 - 10:05
    desde a época
    em que eu estava no hospital, em Tefé,
  • 10:05 - 10:09
    era voltar para a Amazônia,
    que é a minha grande paixão.
  • 10:09 - 10:13
    Eu lembro de falar para os meus pais:
  • 10:13 - 10:14
    "Olha, ainda quero voltar".
  • 10:14 - 10:17
    Todo mundo achava que eu era louca.
  • 10:17 - 10:20
    Mas, eu posso contar a vocês,
    de primeira mão agora, que,
  • 10:20 - 10:22
    depois de amanhã, depois do TED,
  • 10:22 - 10:24
    eu estarei voltando à reserva,
  • 10:24 - 10:27
    estarei voltando
    ao meu projeto com os botos,
  • 10:27 - 10:30
    e estarei voltando ao meu sonho.
    (Aplausos)
  • 10:30 - 10:35
    Só para terminar,
    como eu li num blog uma vez.
  • 10:35 - 10:38
    "Viver não é esperar
    as tempestades passarem,
  • 10:38 - 10:40
    mas aprender a dançar na chuva".
  • 10:40 - 10:41
    Obrigada.
  • 10:41 - 10:47
    (Aplausos)
Title:
O dia que lutei com um jacaré | Deise Nishimura | TEDxAmazonia
Description:

A bióloga Deise Nishimura costumava estudar botos na reserva amazônica de Mamirauá, onde há 90 jacarés para cada humano. Na noite do ano novo de 2010, enquanto ela limpava um peixe em sua casa flutuante, um jacaré imenso a surpreendeu e a arrastou para a água. Deise lutou por sua vida e ganhou. Ela perdeu uma perna, mas conseguiu se virar para subir de volta, alcançar o rádio e pedir ajuda. Ela está ansiosa para retornar à Amazônia e continuar sua pesquisa.

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Video Language:
Portuguese, Brazilian
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
10:54
  • A legenda estava de excelente qualidade, praticamente não fiz ajustes.

    Quanto ao título, adequei ao novo formato que é separar por barras o título do nome do palestrante e do evento. Também removi a data do título, já que nunca deve estar presente. Esses padrões podem ser encontrados aqui http://translations.ted.org/wiki/How_to_Tackle_a_Transcript#Title_and_description_format

    Traduzi tanto o título quanto a descrição, uma vez que essa é uma legenda em português, não faz sentido tê-los em inglês!

    Abraço!

Portuguese, Brazilian subtitles

Revisions