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A razão por que estamos confusos acerca do consentimento — reescrevendo as nossas histórias de sedução | Michele Meek | TEDxProvidence

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    Olá.
  • 0:30 - 0:35
    Há uns anos, a minha filha e eu
    assistimos à exibição do filme de 1993
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    "The Sandlot", na associação de basebol.
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    A história acompanha o crescimento
    de um grupo de rapazes pré-adolescentes
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    que estão a aprender a vida
    e a descobrir o amor pelo basebol.
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    O filme tem muito poucas
    personagens femininas,
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    e uma delas é uma nadadora-salvadora
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    por quem todos os rapazes
    têm uma paixoneta.
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    Numa cena, um dos rapazes
    finge estar a afogar-se
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    para que a nadadora-salvadora intervenha,
    o salve e lhe faça respiração boca-a-boca.
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    Nesse momento, ele agarra-lhe a cabeça
    e começa a beijá-la.
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    Depois, surge um comentário
    em "off" de outro rapaz que diz:
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    "O que ele fez
    foi traiçoeiro, mau e baixo
  • 1:22 - 1:25
    "— e fixe, porque ele teve a coragem
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    "de dar um beijo longo
    e como deve ser a uma mulher."
  • 1:29 - 1:34
    Foi precisamente aí que percebi
    que este é o tipo de cenas
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    que passam, muitas vezes,
    sem nos apercebermos e sem comentarmos.
  • 1:38 - 1:40
    No entanto, são estas cenas
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    que nos ensinam a nós
    e aos nossos filhos o consentimento.
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    Embora, enquanto pais,
    educadores e treinadores,
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    nos esforçássemos por proteger as crianças
    de cenas explícitas de violência e sexo,
  • 1:53 - 1:56
    estávamos mesmo assim a partilhar
    histórias de coação
  • 1:56 - 2:03
    que eram supostamente engraçadas,
    inofensivas ou admiráveis.
  • 2:04 - 2:05
    Ao longo da minha carreira,
  • 2:05 - 2:10
    trabalhei como cineasta,
    jornalista de cinema e professora.
  • 2:10 - 2:14
    Como passei os últimos anos
    a estudar histórias de consentimento,
  • 2:14 - 2:16
    creio que há um obstáculo decisivo
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    a impedir-nos de compreender
    melhor o consentimento
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    e de reduzir a agressão sexual.
  • 2:21 - 2:25
    Embora digamos "Um não significa não"
    e "Um sim significa sim",
  • 2:25 - 2:30
    continuamos a ver e a partilhar histórias
    em que "Um não significa talvez"
  • 2:30 - 2:32
    ou "Um não significa insiste mais."
  • 2:33 - 2:38
    Em suma, as nossas histórias de sedução
    são também, muitas vezes, de coação.
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    Quando digo uma "história de sedução",
  • 2:42 - 2:45
    refiro-me à clássica história
    de um rapaz que conhece uma rapariga,
  • 2:45 - 2:48
    mas agora estas histórias
    exigem medidas mais drásticas:
  • 2:48 - 2:55
    mentira, dissimulação, degradação
    e, tipicamente, um toque de violência.
  • 2:57 - 2:59
    Vamos examinar este conjunto
    de experiências sexuais.
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    Por um lado, temos "Um sim significa sim",
  • 3:02 - 3:07
    o que inclui o sexo consensual,
    o desejo mútuo e a disponibilidade.
  • 3:07 - 3:10
    Por outro lado,
    temos o "Um não significa não",
  • 3:10 - 3:14
    o que inclui agressão e coação sexual,
    e relutância.
  • 3:14 - 3:17
    Mas a minha sugestão é que
    continuamos a confundir os dois,
  • 3:17 - 3:20
    e é isto que eu quero dizer com sedução.
  • 3:21 - 3:25
    Dependendo de como a situação é lida
    pelos participantes e pelos outros,
  • 3:25 - 3:29
    a sedução pode ser vista como a persuasão
    de uma pessoa disposta a participar
  • 3:29 - 3:33
    ou como a coação de uma pessoa
    que está relutante em participar.
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    Este padrão atravessa todos os espetros
    de género e de preferências sexuais.
  • 3:39 - 3:44
    Quero deixar claro que não encaro
    a sedução como uma zona cinzenta.
  • 3:44 - 3:48
    Encaro-a mais como uma zona amarela,
    onde se "avança com cuidado".
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    A sedução retrata o sexo
    como uma conquista,
  • 3:51 - 3:55
    como uma caçada
    entre o predador e a presa.
  • 3:55 - 3:58
    Pensem no filme "As 50 Sombras de Grey",
  • 3:58 - 4:00
    no qual a universitária Anastasia Steele
  • 4:00 - 4:03
    é seduzida pelo multimilionário
    Christian Grey.
  • 4:03 - 4:06
    Christian está tão obcecado
    com o consentimento
  • 4:06 - 4:10
    que chega a sacar de um contrato escrito
    muito detalhado para Anastasia assinar,
  • 4:10 - 4:12
    coisa que ela nunca chega a fazer.
  • 4:12 - 4:16
    Mas como parte da sua sedução,
    ele entra no apartamento dela,
  • 4:16 - 4:19
    despe-a enquanto ela está inconsciente,
  • 4:19 - 4:23
    e vende o carro dela,
    tudo sem a sua permissão.
  • 4:24 - 4:28
    Assim, muitos ficaram chocados
    quando a argumentista do filme disse
  • 4:28 - 4:32
    que Christian era um herói
    romântico e à moda antiga.
  • 4:33 - 4:36
    Mas, de facto, a história não é nova.
  • 4:37 - 4:42
    Muitos de vocês da minha geração
    lembrar-se-ão de como todos nós
  • 4:42 - 4:46
    vimos ou queríamos ver o filme de 1986,
    "Nove Semanas e Meia",
  • 4:46 - 4:49
    especificamente pelas cenas de sexo
    tingidas de violência.
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    Mas esta história é muito mais antiga.
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    Há "A Fera Amansada" de Shakespeare,
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    em que Petrúquio derruba
    as defesas de Catarina,
  • 4:58 - 5:03
    que, a princípio, não tem interesse
    em Petrúquio nem em qualquer homem.
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    Para terem noção de até onde
    este tema de facto remonta,
  • 5:11 - 5:13
    podemos olhar para a mitologia grega,
  • 5:13 - 5:18
    em que a deusa Hera recusa inicialmente
    a proposta de casamento de Zeus.
  • 5:18 - 5:20
    Zeus aparece à janela dela
    disfarçado de pássaro
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    e, quando ela o deixa entrar,
  • 5:22 - 5:26
    ele viola-a e depois ela aceita
    a proposta de casamento dele.
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    Por vezes, à primeira vista,
  • 5:29 - 5:33
    as histórias de sedução podem parecer
    perfeitamente inofensivas.
  • 5:33 - 5:36
    Pensem na série televisiva
    "Stranger Things,"
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    na qual Steve, o namorado de Nancy,
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    reage aos "Nãos" dela
    como um vendedor reagiria
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    — insiste mais.
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    Ela recusa encontrar-se com ele.
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    Ela recusa encontrar-se com ele,
    por isso, ele entra pela janela.
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    Ela foge do beijo dele,
    portanto ele tenta novamente.
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    O mesmo sucede em "Parks and Recreation",
  • 5:59 - 6:02
    com a forma como Tom tenciona
    converter o "Não" de Ann num "Sim".
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    E a vasta maioria das comédias
    de sexo adolescente
  • 6:05 - 6:08
    de "American Pie: A Primeira Vez"
    a "Super Baldas"
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    retrata rapazes que estão obcecados
    em seduzir raparigas.
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    Uma tal confusão
    entre consentimento e coação
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    não é menos desconcertante
    quando os papéis de género se invertem.
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    Considerem como um filme
    como "A Primeira Noite"
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    simplesmente altera o agressor
    para a personagem da mulher mais velha,
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    que anda atrás da sua contraparte
    masculina, mais jovem e inocente.
  • 6:29 - 6:33
    Isto também começou a surgir
    em comédias adolescentes mais recentes,
  • 6:33 - 6:35
    como "Os Empatas"
    e "A Lista dos... Prazeres!",
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    onde as raparigas andam ativamente atrás
    das suas próprias conquistas sexuais,
  • 6:40 - 6:41
    por vezes sem pensar
  • 6:41 - 6:45
    que, primeiro, precisam de obter
    o consentimento dos parceiros masculinos.
  • 6:47 - 6:51
    O problema é que isto não é só
    no domínio dos afetos.
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    Uma em três mulheres são vítimas
    de agressões sexuais ao longo da vida.
  • 6:55 - 6:58
    E um em seis homens também.
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    A maioria das agressões sexuais
    não são denuciadas.
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    Só para destacar um exemplo:
  • 7:05 - 7:09
    80% das agressões sexuais
    a estudantes universitárias,
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    entre 1995 e 2013,
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    não foram denunciadas à polícia,
    de acordo com o Departamento de Justiça.
  • 7:15 - 7:20
    Por isso, quando realçamos um problema
    como a violência sexual nos "campus",
  • 7:20 - 7:23
    falando só das situações a preto e branco,
  • 7:23 - 7:29
    estamos a perder a oportunidade de falar
    sobre os casos nesta zona amarela.
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    Um dos problemas
    com o consentimento sexual
  • 7:34 - 7:37
    é que, habitualmente,
    não o obtemos por escrito
  • 7:38 - 7:40
    — talvez alguns de vocês o façam —
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    ou até verbalmente:
    não necessariamente.
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    Portanto, confiamos no comportamento.
  • 7:46 - 7:49
    Sabemos que isto pode levar a problemas.
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    Um exemplo comum é que o riso
    pode ser encarado como consentimento
  • 7:53 - 7:56
    mas poderá na verdade significar
    que a pessoa está muito nervosa
  • 7:56 - 7:59
    e não sabe bem como dizer não.
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    Parte da forma como aprendemos
    a comportar-nos é através de histórias.
  • 8:03 - 8:06
    E as histórias não são só
    os filmes e a televisão.
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    Temos as aulas na escola,
  • 8:08 - 8:10
    há coisas que os pais nos dizem,
  • 8:10 - 8:12
    histórias que os amigos nos contam,
  • 8:12 - 8:16
    e coisas que vemos nas notícias
    e nos meios de comunicação social.
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    Todas as histórias sobre sexo são também
    histórias sobre consentimento sexual.
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    Então, o que é que estamos a aprender?
  • 8:25 - 8:28
    Brad Perry, o coordenador de prevenção
    de violência sexual e escritor
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    fala sobre como, quando era mais novo,
    os amigos lhe ensinaram
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    que seduzir raparigas exigia substâncias
    para descontraírem, como drogas e álcool.
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    Só quando uma amiga dele
    foi violada e tentou o suicídio
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    é que ele percebeu o quão semelhantes
    as suas táticas eram às do violador dela.
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    Confissões como esta
    são muito raras.
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    No reverso da medalha,
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    as raparigas ainda são desencorajadas
    — com demasiada frequência —
  • 8:56 - 8:58
    de se verem a si mesmas
    como agentes sexuais.
  • 8:58 - 9:02
    Como persistem os padrões duplos,
    e o sentimento de vergonha,
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    as raparigas limitam-se a reagir
    aos avanços dos parceiros masculinos,
  • 9:06 - 9:10
    em vez de saberem o que querem
    sexualmente e de tomarem a iniciativa.
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    Nas minhas aulas de estudos de género,
    eu pergunto aos meus alunos:
  • 9:16 - 9:18
    "O que aprenderam em educação sexual?"
  • 9:18 - 9:20
    e "O que queriam aprender?"
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    Todos os anos é a mesma coisa.
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    Foram instruídos sobre as doenças
    sexualmente transmissíveis,
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    sobre a abstinência e sobre a gravidez.
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    Mas preferiam ter aprendido mais
  • 9:31 - 9:35
    sobre consentimento, violência,
    prazer e relacionamentos.
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    Eu adoro filmes e vou continuar
    a partilhá-los com os meus filhos,
  • 9:42 - 9:44
    mas, quando vir uma cena
    que sei que está errada,
  • 9:44 - 9:47
    vou ter uma conversa com eles
    sobre o assunto.
  • 9:47 - 9:53
    Também vou continuar a procurar histórias
    que sejam melhores histórias de sedução.
  • 9:55 - 9:59
    Estou certa de que, ao mudar
    as histórias que contamos
  • 9:59 - 10:02
    podemos mudar o modo como pensamos
    sobre o consentimento,
  • 10:02 - 10:05
    e o modo como agimos
    em relação ao consentimento sexual.
  • 10:05 - 10:06
    Obrigada.
  • 10:06 - 10:09
    (Aplauso)
Title:
A razão por que estamos confusos acerca do consentimento — reescrevendo as nossas histórias de sedução | Michele Meek | TEDxProvidence
Description:

Quando o assunto é consentimento sexual, defendemos que "Não significa não" e "Sim significa sim", para prevenir agressões sexuais. Ainda assim, as histórias de sedução que vemos e partilharmos retratam, muitas vezes, o "Não" como significando "Talvez" ou "Insiste mais". Nesta palestra, Michele Meek mostra como os momentos que confundem o consentimento com coação muitas vezes passam nos apercebermos e sem um comentário e, no entanto, estão de facto a instruir-nos a nós e aos nossos filhos a respeito do consentimento. Michele Meek faz um apelo para que prestemos atenção às histórias de sedução que partilhamos, para que possamos começar a reescrevê-las.

A Dr.ª Michele Meek é uma escritora e cineasta estabelecida em Providence, e é Professora Assistente de Estudos de Comunicação na Universidade do Estado de Bridgewater. As suas publicações académicas recentes concentram-se nos "problemas de consentimento", ou representações ética e esteticamente ambíguas do consentimento sexual, e Michele publicou recentemente uma edição compilada de "Independent Female Filmmakers: A Chronicle through Interviews, Profiles, and Manifestos" com a editora Routledge. Meek escreveu e realizou várias curtas-metragens premiadas, e é também a fundadora do NewEnglandFilm.com.

Esta palestra foi dada num evento TEDx, utilizando o formato de conferência TED, mas foi organizada de forma independente por uma comunidade local. Saiba mais em https://www.ted.com/tedx.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
10:16

Portuguese subtitles

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