Olá.
Há uns anos, a minha filha e eu
assistimos à exibição do filme de 1993
"The Sandlot", na associação de basebol.
A história acompanha o crescimento
de um grupo de rapazes pré-adolescentes
que estão a aprender a vida
e a descobrir o amor pelo basebol.
O filme tem muito poucas
personagens femininas,
e uma delas é uma nadadora-salvadora
por quem todos os rapazes
têm uma paixoneta.
Numa cena, um dos rapazes
finge estar a afogar-se
para que a nadadora-salvadora intervenha,
o salve e lhe faça respiração boca-a-boca.
Nesse momento, ele agarra-lhe a cabeça
e começa a beijá-la.
Depois, surge um comentário
em "off" de outro rapaz que diz:
"O que ele fez
foi traiçoeiro, mau e baixo
"— e fixe, porque ele teve a coragem
"de dar um beijo longo
e como deve ser a uma mulher."
Foi precisamente aí que percebi
que este é o tipo de cenas
que passam, muitas vezes,
sem nos apercebermos e sem comentarmos.
No entanto, são estas cenas
que nos ensinam a nós
e aos nossos filhos o consentimento.
Embora, enquanto pais,
educadores e treinadores,
nos esforçássemos por proteger as crianças
de cenas explícitas de violência e sexo,
estávamos mesmo assim a partilhar
histórias de coação
que eram supostamente engraçadas,
inofensivas ou admiráveis.
Ao longo da minha carreira,
trabalhei como cineasta,
jornalista de cinema e professora.
Como passei os últimos anos
a estudar histórias de consentimento,
creio que há um obstáculo decisivo
a impedir-nos de compreender
melhor o consentimento
e de reduzir a agressão sexual.
Embora digamos "Um não significa não"
e "Um sim significa sim",
continuamos a ver e a partilhar histórias
em que "Um não significa talvez"
ou "Um não significa insiste mais."
Em suma, as nossas histórias de sedução
são também, muitas vezes, de coação.
Quando digo uma "história de sedução",
refiro-me à clássica história
de um rapaz que conhece uma rapariga,
mas agora estas histórias
exigem medidas mais drásticas:
mentira, dissimulação, degradação
e, tipicamente, um toque de violência.
Vamos examinar este conjunto
de experiências sexuais.
Por um lado, temos "Um sim significa sim",
o que inclui o sexo consensual,
o desejo mútuo e a disponibilidade.
Por outro lado,
temos o "Um não significa não",
o que inclui agressão e coação sexual,
e relutância.
Mas a minha sugestão é que
continuamos a confundir os dois,
e é isto que eu quero dizer com sedução.
Dependendo de como a situação é lida
pelos participantes e pelos outros,
a sedução pode ser vista como a persuasão
de uma pessoa disposta a participar
ou como a coação de uma pessoa
que está relutante em participar.
Este padrão atravessa todos os espetros
de género e de preferências sexuais.
Quero deixar claro que não encaro
a sedução como uma zona cinzenta.
Encaro-a mais como uma zona amarela,
onde se "avança com cuidado".
A sedução retrata o sexo
como uma conquista,
como uma caçada
entre o predador e a presa.
Pensem no filme "As 50 Sombras de Grey",
no qual a universitária Anastasia Steele
é seduzida pelo multimilionário
Christian Grey.
Christian está tão obcecado
com o consentimento
que chega a sacar de um contrato escrito
muito detalhado para Anastasia assinar,
coisa que ela nunca chega a fazer.
Mas como parte da sua sedução,
ele entra no apartamento dela,
despe-a enquanto ela está inconsciente,
e vende o carro dela,
tudo sem a sua permissão.
Assim, muitos ficaram chocados
quando a argumentista do filme disse
que Christian era um herói
romântico e à moda antiga.
Mas, de facto, a história não é nova.
Muitos de vocês da minha geração
lembrar-se-ão de como todos nós
vimos ou queríamos ver o filme de 1986,
"Nove Semanas e Meia",
especificamente pelas cenas de sexo
tingidas de violência.
Mas esta história é muito mais antiga.
Há "A Fera Amansada" de Shakespeare,
em que Petrúquio derruba
as defesas de Catarina,
que, a princípio, não tem interesse
em Petrúquio nem em qualquer homem.
Para terem noção de até onde
este tema de facto remonta,
podemos olhar para a mitologia grega,
em que a deusa Hera recusa inicialmente
a proposta de casamento de Zeus.
Zeus aparece à janela dela
disfarçado de pássaro
e, quando ela o deixa entrar,
ele viola-a e depois ela aceita
a proposta de casamento dele.
Por vezes, à primeira vista,
as histórias de sedução podem parecer
perfeitamente inofensivas.
Pensem na série televisiva
"Stranger Things,"
na qual Steve, o namorado de Nancy,
reage aos "Nãos" dela
como um vendedor reagiria
— insiste mais.
Ela recusa encontrar-se com ele.
Ela recusa encontrar-se com ele,
por isso, ele entra pela janela.
Ela foge do beijo dele,
portanto ele tenta novamente.
O mesmo sucede em "Parks and Recreation",
com a forma como Tom tenciona
converter o "Não" de Ann num "Sim".
E a vasta maioria das comédias
de sexo adolescente
de "American Pie: A Primeira Vez"
a "Super Baldas"
retrata rapazes que estão obcecados
em seduzir raparigas.
Uma tal confusão
entre consentimento e coação
não é menos desconcertante
quando os papéis de género se invertem.
Considerem como um filme
como "A Primeira Noite"
simplesmente altera o agressor
para a personagem da mulher mais velha,
que anda atrás da sua contraparte
masculina, mais jovem e inocente.
Isto também começou a surgir
em comédias adolescentes mais recentes,
como "Os Empatas"
e "A Lista dos... Prazeres!",
onde as raparigas andam ativamente atrás
das suas próprias conquistas sexuais,
por vezes sem pensar
que, primeiro, precisam de obter
o consentimento dos parceiros masculinos.
O problema é que isto não é só
no domínio dos afetos.
Uma em três mulheres são vítimas
de agressões sexuais ao longo da vida.
E um em seis homens também.
A maioria das agressões sexuais
não são denuciadas.
Só para destacar um exemplo:
80% das agressões sexuais
a estudantes universitárias,
entre 1995 e 2013,
não foram denunciadas à polícia,
de acordo com o Departamento de Justiça.
Por isso, quando realçamos um problema
como a violência sexual nos "campus",
falando só das situações a preto e branco,
estamos a perder a oportunidade de falar
sobre os casos nesta zona amarela.
Um dos problemas
com o consentimento sexual
é que, habitualmente,
não o obtemos por escrito
— talvez alguns de vocês o façam —
ou até verbalmente:
não necessariamente.
Portanto, confiamos no comportamento.
Sabemos que isto pode levar a problemas.
Um exemplo comum é que o riso
pode ser encarado como consentimento
mas poderá na verdade significar
que a pessoa está muito nervosa
e não sabe bem como dizer não.
Parte da forma como aprendemos
a comportar-nos é através de histórias.
E as histórias não são só
os filmes e a televisão.
Temos as aulas na escola,
há coisas que os pais nos dizem,
histórias que os amigos nos contam,
e coisas que vemos nas notícias
e nos meios de comunicação social.
Todas as histórias sobre sexo são também
histórias sobre consentimento sexual.
Então, o que é que estamos a aprender?
Brad Perry, o coordenador de prevenção
de violência sexual e escritor
fala sobre como, quando era mais novo,
os amigos lhe ensinaram
que seduzir raparigas exigia substâncias
para descontraírem, como drogas e álcool.
Só quando uma amiga dele
foi violada e tentou o suicídio
é que ele percebeu o quão semelhantes
as suas táticas eram às do violador dela.
Confissões como esta
são muito raras.
No reverso da medalha,
as raparigas ainda são desencorajadas
— com demasiada frequência —
de se verem a si mesmas
como agentes sexuais.
Como persistem os padrões duplos,
e o sentimento de vergonha,
as raparigas limitam-se a reagir
aos avanços dos parceiros masculinos,
em vez de saberem o que querem
sexualmente e de tomarem a iniciativa.
Nas minhas aulas de estudos de género,
eu pergunto aos meus alunos:
"O que aprenderam em educação sexual?"
e "O que queriam aprender?"
Todos os anos é a mesma coisa.
Foram instruídos sobre as doenças
sexualmente transmissíveis,
sobre a abstinência e sobre a gravidez.
Mas preferiam ter aprendido mais
sobre consentimento, violência,
prazer e relacionamentos.
Eu adoro filmes e vou continuar
a partilhá-los com os meus filhos,
mas, quando vir uma cena
que sei que está errada,
vou ter uma conversa com eles
sobre o assunto.
Também vou continuar a procurar histórias
que sejam melhores histórias de sedução.
Estou certa de que, ao mudar
as histórias que contamos
podemos mudar o modo como pensamos
sobre o consentimento,
e o modo como agimos
em relação ao consentimento sexual.
Obrigada.
(Aplauso)