Além dos rótulos, o poder das mulheres sauditas | Sofana Dahlan | TEDxBarcelonaWomen

Nesta palestra, Sofana Dahlan evoca a identidade e as capacidades da mulher saudita. Pensando em sua filha, ela explica os obstáculos e as barreiras sociais que as mulheres enfrentam. Ela encoraja as mulheres de todo o mundo a superarem as dificuldades e definirem suas próprias identidades com base no que querem para elas mesmas, em vez do que a sociedade pode querer para elas.

Sofana Dahlan é advogada, fundadora e CEO da Tashkeil, uma empresa social da Arábia Saudita que incuba e promove empreendedores criativos.

Esta palestra foi dada em um evento TEDx, que usa o formato de conferência TED, mas é organizado de forma independente por uma comunidade local. Para saber mais visite http://ted.com/tedx

Quando você olha para as mulheres
na Arábia Saudita, você vê isto:

capas pretas,

como a capa preta
de um pequeno livro preto.

Mas não se costuma dizer:

"Não julgue um livro pela capa"?

Meu nome é Sofana Dahlan.

Eu adoro óculos gatinho,
sorvete e a cor roxa,

mas, acima de tudo,
tenho orgulho de ser saudita.

Em março de 2010,

horas após o nascimento
da minha segunda filha,

enquanto eu a segurava em meus braços,

minha filha de três anos
olhou para mim e disse: "Mamãe".

Ela me fez uma pergunta,

e essa pergunta me fez pensar
sobre minha vida,

minhas experiências
e minha identidade enquanto saudita.

Ela disse: "Mamãe, o que a Huda
vai ser quando ela crescer?"

Naquele momento, minha recém-nascida
abriu os olhos pela primeira vez na vida.

Ela estava olhando para mim
como se antecipasse minha resposta.

Naturalmente, minha resposta seria:
"O que ela quiser ser".

Mas uma resposta mais realista seria:
"O que permitirem que ela seja".

Meus olhos se encheram de lágrimas.

Eu fiquei sem ar, pensando
em qual seria minha resposta.

Quais são as perspectivas dela?
Que obstáculos ela encontrará?

Ela será uma mulher saudita.

Eu direi a ela que, se quiser viajar,

arrumar um emprego ou estudar,

ela precisará do consentimento
de um homem responsável primeiro?

Eu direi a ela que suas escolhas
de estudo e carreira são limitadas?

E direi a ela que ela vai crescer
tendo sua mobilidade limitada?

E direi a ela que não importa
o quanto seja bem-sucedida,

o mundo ainda a verá
como oprimida e marginalizada

e olhará para ela com pena

em vez de reconhecer sua conquista?

Bem,

não podemos fingir
que ser uma garota saudita

não tenha limitações e expectativas.

Porém,

não seria tentador

se ela não encontrasse
nenhum problema, nenhum obstáculo,

nenhuma injustiça e nenhuma frustração?

Se tivéssemos o poder em nossas mãos,

não concederíamos
esse desejo a nossos filhos?

Mas também não podemos ignorar

que grande parte do nosso caráter
é formado pelos obstáculos,

problemas e injustiças
que enfrentamos e superamos.

O que posso dizer é que os obstáculos
enfrentados pela minha mãe e avó

talvez sejam a razão
pela qual eu estou aqui hoje.

E digo também que espero
que as coisas pelas quais passei

ajudem de verdade as minhas filhas
a chegarem mais longe.

O caminho para a realização
não foi fácil para mim.

Ao longo da vida,
encontrei muitos problemas,

muitos obstáculos e barreiras sociais.

Mas foi justamente isso
que fez com que eu me adaptasse,

fez com que eu aprendesse a ser flexível

e fez com que eu remodelasse meu caminho.

Eu cresci na Arábia Saudita.

Eu frequentei uma escola local.
O árabe era o idioma principal.

Mas meus pais investiram em programas
de aprimoramento após a escola.

Eu era uma criança muito curiosa

e fazia perguntas o tempo todo.

Quanto mais elas eram respondidas,
mais perguntas eu criava.

"Mas por quê?" era uma frase
que eu usava sem parar.

Aos 12 anos, eu era rebelde,

o pior pesadelo da minha mãe.

Sentei-me com ela um dia e disse:

"Mãe, escuta, isso tem que acabar.

Nenhum dos meus amigos
tem aula depois da escola".

A resposta dela foi:

"A escola que você frequenta de manhã
é para você pertencer

e, assim, entender sua sociedade,

e seus estudos em casa são obrigatórios

para você construir
e desenvolver sua personalidade.

Só vamos negociar isso
quando você tiver 17 anos".

E, obviamente, eu discuti e fui punida.

E foi muito depois dos 17 anos
que percebi que ela estava certa.

Quando estava no ensino médio,
eu queria estudar arquitetura,

pois não era permitido na Arábia Saudita
e não havia esse curso lá.

Era uma passagem para ir embora de lá.

Até que um dia,

ouvi a história de uma mulher

que cresceu órfã

e casou com um homem rico.

Quando ele faleceu, os filhos dele
de um casamento anterior

tiraram-na à força de casa
e impediram que ela recebesse a herança.

Quando ela buscou a ajuda
de um advogado homem,

isso foi usado contra ela.

Ela foi acusada de ter um caso com ele,

um ato pecaminoso em meu país.

Naquele momento,

eu percebi

que ser representada
legalmente por uma mulher

é uma necessidade no meu país.

Por isso fui estudar direito,

algo em que eu acreditava e queria muito.

E então, obviamente,

direito não era permitido
na Arábia Saudita.

Eu estava assumindo um grande risco.

Mas meu pai teve uma visão

de que as coisas acabariam
evoluindo na Arábia Saudita,

e que as mulheres acabariam tendo direito
de serem aceitas no campo judicial.

Assim,

eu fiz uma solicitação
ao Ministro de Educação Superior

para estudar direito.

E ela foi aprovada.

Então, fui para o Egito.

Matriculei-me na Universidade de Cairo,

uma das primeiras faculdades
de direito do mundo árabe.

E, depois disso, fiz mestrado
em estudos islâmicos.

Esse foi um ponto crucial em minha vida.

Conheci diversas escolas
de pensamento, filosofia e religião.

Eu estava explorando
os direitos das mulheres

em diferentes religiões e seitas.

Isso me ajudou a entender

a estrutura em que a justiça social
e o valor operam na minha sociedade.

(Suspiro)

E, obviamente, após a graduação,

a devastação aconteceu.

Após a graduação, solicitei a validação
do meu diploma egípcio na Arábia Saudita.

Todos os meus colegas do direito
da Arábia Saudita conseguiram.

Eu não,

pois não tinha como provar que estava
na companhia de um homem responsável

durante a universidade.

Eu trabalhei como consultora jurídica
na área administrativa.

A frustração começou a se crescer,

pois todas as pessoas ao meu redor
avançaram em suas carreiras

e eu ainda estava lá, inútil.

Comecei a me sentir
cada vez mais devastada,

pois percebi que essas
limitações me impediam

de defender uma pessoa
muito querida para mim

condenada injustamente
por um crime que nunca cometeu

e sentenciada à prisão.

Então, eu segui com a minha vida.

Eu segui com a minha vida
e decidi me casar

e, aos 25 anos, me mudei para o Kuwait.

Eu também comecei a pensar
nas oportunidades.

Eu queria voltar a atuar na área jurídica.

Todas as empresas jurídicas
em que me inscrevi

exigiam uma licença jurídica.

E eu não tinha.

Com exceção de uma empresa jurídica.

Eu tive a oportunidade
de trabalhar no direito societário,

mas descobri que estava grávida

de uma criança com problemas de saúde

e que precisava de atenção
e cuidados especiais.

Então, decidi suspender meu sonho
e focar na minha filha.

Quanto mais eu tentava fazer
meu casamento dar certo, pior ele ficava.

E,

sabe, o momento mais difícil da vida

não é quando as pessoas não entendem você.

É quando você mesmo não se entende.

Quem é você?

Quem sou eu? O que estou fazendo?
O que eu quero?

Como eu farei a diferença?

As respostas a essas perguntas me ajudaram
a identificar portas de oportunidade.

O truque estava em construir
as etapas para alcançar essas portas.

Para mim, elas consistiam em ter fé,

conhecer minha força e habilidade,

identificar minhas fraquezas
e encontrar motivação e inspiração,

e dominar a criatividade.

O que é criatividade?

A criatividade envolve fugir
dos padrões estabelecidos

para ver as coisas de maneira diferente.

A criatividade reestrutura seu sonho
e redefine sua missão.

Hoje, estou em uma missão
de inovação, de novidade,

de uma dimensão multifacetada.

Estou comprometida em criar pontes

e facilitar o caminho
para a realização e a satisfação.

Em promover criatividade e inovação

e preservar nossa rica herança artística.

Meu objetivo é contribuir com o
desenvolvimento social da minha região.

Em 2010, o mesmo ano
em que minha segunda filha nasceu,

eu decidi ser mãe solteira

e ir atrás do meu sonho.

Eu abri uma empresa de consultoria
jurídica e empresarial

para promover empreendedores criativos:

a Tashkeil, a primeira plataforma
do Oriente Médio

que promove a criatividade
ao incubar, facilitar e promovê-los.

A Tashkeil tem o objetivo de reintroduzir
os designers no Oriente Médio

como investidores ativos na arena global.

Dito isso, nunca deixei de buscar meu
direito de ser reconhecida como advogada.

Em 2012, fiz outra solicitação

e em 24 de novembro de 2013,

tenho orgulho de dizer que sou
uma das dez advogadas mulheres

que já tiveram o direito
de atuar na área jurídica

no Reino da Arábia Saudita.

(Vivas) (Aplausos)

Porque...

(Aplausos)

Porque eu acreditei no meu sonho,

porque eu acreditei nas minhas escolhas,

e porque eu nunca desisti
dos meus direitos.

Eu acredito que foi isso que meus pais
viram quando olharam nos meus olhos.

Estava refletido no nome
que escolheram para mim,

Sofana, que significa "a pérola rara".

É também uma homenagem à filha de um
famoso personagem de uma fábula árabe,

Hatim al-Ta'i,

conhecido por sua generosidade.

Muito depois da morte dele, ela estava
entre os primeiros prisioneiros do Islã.

Ela foi feita refém.

Mas, por conta de seu aguçado
senso de negociação,

ela conseguiu dialogar para fazer com que
ela e outras pessoas fossem libertadas

e se submetessem ao Islã de boa vontade.

Sabe, minha cultura está incorporada
em cada aspecto meu.

Assim como a resiliência,
a perseverança e o desafio.

Esta é minha história,

a história de muitas outras mulheres
sauditas que não são reconhecidas

por conta da percepção geral errônea
e do julgamento que fazem delas.

Hoje, as mulheres na Arábia Saudita
estão liderando a mudança.

Elas estão fazendo escolhas.

Lá você vê grandes avanços
na medicina, na ciência, na arte,

nas finanças e no empreendedorismo.

E hoje,

olhando nos olhos das minhas filhas,

aqueles olhos grandes e curiosos
olhando de volta para mim,

pedindo para que eu faça
as escolhas certas para elas,

até que um dia elas possam fazer
suas próprias escolhas,

posso dizer que tudo isso valeu a pena.

Vocês acham que eu perdi
o hábito de fazer perguntas?

Óbvio que não.

(Risos)

E vocês?

Vocês têm a força?

Vocês têm a perseverança, o desafio?

E vocês têm a resiliência
do espírito de uma mulher saudita?

O que vocês fazem para lutar
contra a injustiça?

Como vocês mudam as leis nos seus países?

Quais obstáculos estão
no caminho de vocês hoje?

Se conseguimos superar

as regras rígidas de um país
como a Arábia Saudita,

se conseguimos funcionar
em um sistema dominado pelos homens,

trabalhar com isso e desafiar isso,

acho que vocês conseguem
fazer o mesmo aqui.

Obrigada.

(Vivas) (Aplausos)