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Estamos em São Jorge Maior, em frente
ao Grande Canal, em Veneza.
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E nós estamos olhando "A Última Ceia",
de Tintoretto.
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Está localizada no santuário da igreja,
na parede direita.
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E é enorme.
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Esta é uma versão não tradicional
deste assunto, muito maneirista.
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Estamos tão acostumados a olhar para
"A Última Ceia" de da Vinci, em Milão.
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Isso é uma pintura onde a mesa é traçada
de lado a lado horizontalmente
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que é um exemplo Alto Renascentista
do uso da perspectiva linear
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com Cristo como o ponto de fuga
bem no centro da pintura.
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No centro da mesa.
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E aqui, tudo é torto.
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E Leonardo usa a luz natural,
sem auréolas.
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Cristo é emoldurado
por uma janela.
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Mas aqui, a figura de Cristo realmente
brilha interiormente
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em um retorno ao simbolismo espiritual.
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E o espiritual permeia todo o espaço desta
pintura de um modo muito evidente.
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Luz é fundamental para compreender
esta pintura.
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Há realmente apenas duas fontes de luz
nesta pintura muito escura.
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Próximo a nós, na parte superior
esquerda, há uma lanterna
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que apenas dança com luz
e enfumaça e inflama.
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E depois há a emanação divina.
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E a partir daquela lâmpada na parte
superior esquerda,
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os anjos são iluminados.
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E nós os vemos flutuando
por todo o teto.
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Não é a maneira da Alta Renascença
indicar o espiritual através do natural,
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através da realidade.
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Aqui, Tintoretto não tem medo
de pintar anjos.
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Há uma espécie de revelação divina.
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A luz que emana de auréola de Cristo
parece ser bastante forte.
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Se olharmos para a mulher que
se ajoelha em primeiro plano,
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ligeiramente à direita,
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veremos que, à luz de Cristo, sua cabeça
projeta uma sombra profunda
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criando uma diagonal que aponta
para Cristo.
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E então os apóstolos ao redor da mesa
também têm auréolas luminosas,
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embora menores em luz que a de Cristo.
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Mas esta pintura é toda sobre energia.
É tudo sobre o drama.
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Olhe para a forma como a diagonal primária
da mesa nos move para trás
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com uma velocidade incrível de volta
para o ponto de fuga
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no canto superior direito.
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E, na verdade, eu não tenho certeza se
é um uso correto da perspectiva linear.
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Essa mesa se inclina para a frente,
então ele está brincando
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com essas mesmas idéias que eram
tão cruciais para a Alta Renascença.
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Como a perspectiva linear.
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Os espaços pictóricos parecem literalmente
ter acabado.
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O espaço sobe tão abruptamente e de forma
tão dramática, tão rapidamente.
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E a forma em si parece ter se dissolvido
sob o poder de sua linha e cor.
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Tintoretto disse que seu objetivo era
unir as duas tradições diferentes:
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o Renascimento Florentino e
o Renascimento Veneziano.
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Linha tradicional toscana de Michelangelo
com a cor de Ticiano.
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Ele tinha uma placa escrita na parede de
seu estúdio que dizia exatamente isso.
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Ao olhar esta pintura, me sinto
puxada em direções diferentes.
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Me sinto puxada pela velocidade
das ortogonais da mesa.
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E então me sinto puxada pela luz
ao redor de Cristo.
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E também me sinto puxada para detalhes
anedóticos que estão na periferia.
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A figura que serve comida à direita,
por exemplo, ou em primeiro plano.
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Ou os apóstolos reagindo e falando
uns com os outros,
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após as palavras de Cristo:
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"Tome este pão, este é meu corpo".
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"Tome este vinho, este é meu sangue".
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E Cristo se levantou e virou, parece estar
oferecendo o pão.
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E assim temos a promulgação literal
da Eucaristia.
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É muito mais ativa.
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Eu quero voltar a essa ideia do anedótico.
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A mulher está servindo comida, mas note
que ela está chegando em uma cesta
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e um gato está olhando essa cesta também.
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Há este evento muito solene acontecendo.
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Porém, ao mesmo tempo, está cercado por
elementos que não são importantes
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e fazem deste um evento humano.
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Está certo, o torna mais real
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em comparação com a harmoniosa
e equilibrada imagem
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de Leonardo na "A Última Ceia".
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E é isso que eu acho tão incongruente
sobre esta pintura escura.
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Toda a sua solenidade, sim,
mas toda a sua energia
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dentro deste ambiente calmo da igreja
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por Palladio, em San Giorgio Maggiore.
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Estamos em um edifício branco imaculado
e essa pintura é tão escura e misteriosa.
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E Palladio fez tudo evidente para nós
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com o seu classicismo, sua ordem,
sua precisão,
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sua lógica e sua racionalidade.
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E então, neste Tintoretto, entramos no
reino do espiritual, o sobrenatural.
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Este não é o domínio total do racional.
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Nos movemos da Alta Renascença,
do classicismo de Palladio
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para o maneirismo de um Tintoretto.
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Traduzido por Jessica Mazzini