Comer, jejuar e viver muito tempo | Françoise Wilhelmi De Toledo | TEDxAnnecy

Françoise descobriu o jejum aos 17 anos e jejua regularmente, de 12 a 16 horas por dia, bem como durante períodos de duas a três semanas por ano. O jejum é uma função fisiológica dos animais e dos humanos, indispensável para a vida no planeta Terra. Antes de existirem as tecnologias que permitem a conservação dos alimentos, os seres vivos jejuavam em ciclos, quando a produção de alimentos diminuía, por exemplo. O consumo do alimento exterior (comer) era substituído pela utilização do alimento interior, a partir do tecido adiposo (jejum), para permanecerem vivos. Melhor ainda, no "modo jejum", os tecidos e células metabolizam suas estruturas deterioradas, autodigerem algumas células envelhecidas e renovam os tecidos. Observamos a diminuição da inflamação, melhora do humor e aumento da resistência ao estresse. Após o jejum, as células-tronco ativadas rejuvenescem nossos tecidos. Uma comunidade em estado de jejum é pacífica e solidária, e o ser humano se volta para o seu interior, vive com mais consciência e mais intuitivamente, sem ter fome. No retorno à alimentação, após o paladar ter sido reduzido a zero, tudo tem um sabor sublime. Podemos reencontrar as sensações de fome e de saciedade. O jejum é uma terapia, uma reinicialização do metabolismo, e uma fonte de inspiração.

Ainda adolescente, nascida em uma família patriarcal de Genebra, a vida de Françoise Willhemi De Toledo mudou completamente durante o movimento de 1968. Ela descobriu o fio condutor de sua vida hoje: a liberdade de pensar, a alimentação saudável, a ioga, a ecologia, o feminismo, e acima de tudo, o jejum. Atualmente, ela é médica especializada em jejum e nutrição, e trabalha há 40 anos em uma empresa familiar de clínicas de jejum. Sua motivação é ajudar homens e mulheres a descobrirem seus potenciais inatos e desconhecidos. Redescobrir sua capacidade de jejuar não significa apenas mobilizar seu potencial de autocura, mas também provar que o impossível é possível, não só lá como em muitas outras esferas.

Esta palestra foi dada em um evento TEDx, que usa o formato de conferência TED, mas é organizado de forma independente por uma comunidade local. Para saber mais, visite http://ted.com/tedx

Viver bem, mesmo após ficar
sem comer voluntariamente,

por 16 horas, 2 dias, 10 dias,

pode parecer impossível,
ou talvez perfeitamente normal,

porque você já passou
por essa experiência.

Deixem que eu explique
para vocês o que é jejum,

e contar a minha história

sobre como eu descobri
e redescobri a capacidade

que cada ser humano possui em si,
a mesma dos animais.

Com 15 anos, uma adolescente em Genebra,
fui pega pelo turbilhão de 1968.

Claro, eram festivais de música,

a luta contra a autoridade,
sobretudo a abundância de ideias novas,

que surgiam e alargavam
o nosso horizonte.

Escutei pela primeira vez palavras
como ecologia, ioga, meditação,

e feminismo que hoje são assuntos

integrados à minha vida
e à vida de meus contemporâneos.

Renunciar à culinária amanteigada
da mesa de almoço da família

para pedir legumes, cereais integrais

e óleos prensados a frio

é sem dúvida uma revolução familiar.

Então, quando tinha 17 anos,
resolvi fazer jejum.

Na ocasião não ousei falar com ninguém,
muito menos minha família.

Simplesmente parei de comer,
assim, para emagrecer, por curiosidade.

Eu não tinha nenhuma noção
do metabolismo do jejum,

como praticar, o que devia fazer,
era totalmente improvisado.

E foi uma experiência inesquecível!

Após um ou dois dias,
parecia que eu tinha mais energia,

estava alegre, quase eufórica.

Tinha facilidade de conversar com todos,

embora ninguém entendesse de fato
o que estava acontecendo.

Eu mesma estava espantada.

Não sentia fome.

E estava feliz,

o que não era muito frequente
naquela adolescência atormentada.

Minha pele estava lisa,
a acne desapareceu,

algo maravilhoso para uma adolescente.

Além disso, pela manhã,
acordava sem dificuldades.

Caminhava quilômetros e não me cansava.

Também tinha a impressão
de estar conectada à natureza.

Depois de 11 dias vivendo
esta experiência extraordinária,

pensei: "Talvez fosse melhor
voltar a me alimentar".

E então, como fazer para parar o processo?

Eu não tinha ninguém para me guiar,
não sabia como fazer.

Então voltei a comer de maneira
caótica e fiquei doente.

Todos os meus problemas voltaram,
os familiares e de ordem profissional.

Então entendi que tinha
de fazer diferente.

Mais tarde, quando me tornaria médica
e especialista em jejum terapêutico,

teria um cuidado especial
para preparar meus pacientes

ao retorno à alimentação,
e sobretudo ao retorno à rotina,

que deve ocorrer progressivamente
e de maneira bem consciente.

De fato, tive a chance de conhecer,
através de uma amiga, médica também,

um centro de jejum
com acompanhamento médico

fundado em 1953.

O fundador foi um médico
alemão, Otto Buchinger,

que se curou de um reumatismo
articular agudo,

uma inflamação generalizada
de todas as articulações,

que o tinha deixado inválido,

com 19 dias de jejum.

Descobri que existia um método conhecido,

baseado em experiência clínica,

que havia regras a serem seguidas
e rituais para realizar um jejum.

Comecei a aprender,

e ao mesmo tempo, tive a oportunidade
de conhecer o neto do fundador,

que se tornou meu marido.

Então, somos a terceira geração

que desenvolveu o método de jejum
medicinal mais praticado do mundo.

Desenvolvemos centros de jejum

que agora são conduzidos
e dirigidos pela quarta geração.

Os jovens se interessam pelo jejum.

O que mais me espanta
é que esta experiência tão esplêndida,

e todas as melhorias clínicas
que presenciei nos centros,

não eram incluídas
nos estudos da medicina.

Durante toda minha formação como médica,

em nenhum momento
aprendi algo sobre o jejum,

nem sobre sua fisiologia,

nem mesmo em relação aos animais,

porque todos os animais
ao nosso redor jejuam.

Por exemplo, uma lagarta
se torna borboleta

quando fica em um casulo
e jejua por vários meses.

Sem comer, ocorre uma transformação
totalmente extraordinária.

Ainda há casos muito mais conhecidos,
como as marmotas, os ursos,

os pássaros migratórios e, claro,
os pinguins da Antártica.

Talvez falassem do jejum bem rapidamente,
nos casos de diabetes descompensada,

e, também, como um péssimo
método de emagrecimento.

No entanto, foi preciso esperar
a ciência da longevidade,

e as publicações desses últimos anos,

para compreender os mecanismos
que fazem com que o jejum terapêutico

tenha efeito extraordinário e excepcional
sobre a saúde e a longevidade.

Talvez vocês digam:

"Mas que vantagem há em renunciar
aos prazeres extraordinários da mesa?

Por que motivo eu deveria jejuar?"

Para começar, digo, é fascinante,

é a maravilha do nosso código genético.

Temos, dentro de nosso corpo,
uma sabedoria milenar.

E por que não redescobri-la?

Para começar, claro, é preciso entender

que o jejum não oferece riscos,
se for feito corretamente.

E o que é o jejum? O que é jejuar?

Na verdade, é simplesmente
a passagem de uma forma de vida

que depende da alimentação externa,

que absorvemos e digerimos,
cujos componentes queimamos,

durante a combustão das gorduras
armazenadas em nosso corpo.

Está claro que jejuar é parar de comer,

mas, do ponto de vista celular,

é essencialmente trocar de combustível,
comer de outra maneira,

nutrir as células de outra forma.

Vocês entenderão melhor, talvez,

se eu comparar as células do organismo
com carros híbridos:

eles podem passar
da gasolina para eletricidade

indiferentemente, entre uma ou outra.

Em nosso corpo,
as células são igualmente capazes

de passar de uma alimentação exterior

para uma alimentação interior,
armazenada em nossas reservas.

Claro, quais são os efeitos desta mudança?

A princípio, ocorrem mudanças
em nosso metabolismo.

A glicemia vai baixar, o açúcar do sangue.

A insulina cairá, e três hormônios
vão assumir o controle:

a adrenalina, o glucagon
e o hormônio do crescimento.

Esses três hormônios vão começar
a mobilizar nossas reservas,

primeiro uma pequena reserva de açúcar
dentro do fígado, chamada glicogênio,

seguindo pelas maiores reservas de gordura

que quase todos nós temos depois
de certa idade, em grande quantidade,

e que sempre queremos muito eliminar.

O princípio básico do jejum,
no nível metabólico,

é guardar as proteínas.

O que pode ser tratado com o jejum?

Que mecanismos ele utiliza?

A princípio, há uma ativação
do sistema celular.

Imaginem só, o corpo está faminto.

Então, ele vai pegar primeiro
todas as estruturas modificadas, velhas.

Podem ser células inteiras,

que serão capturadas e autodigeridas,
isto se chama autofagia.

Os elementos recuperados podem ser
reaproveitados ou eliminados.

Há meios de eliminação natural
que o jejum bem conduzido vai estimular.

Primeiro são os rins, que estimulamos
bebendo muita água e muita tisana.

Depois estimulamos os pulmões,
para expelirem o gás carbônico,

e a pele através da transpiração,

por meio de exercícios físicos
e métodos naturais.

Depois devemos estimular também
o fígado e o intestino, de forma natural.

Há outra ferramenta que explica

porque as dores e as tensões
diminuem durante o jejum:

os processos inflamatórios diminuem.

É um efeito extraordinário
que pode ser percebido rapidamente.

Pessoas que chegam com artrite nas mãos,
por exemplo, dizem:

"Estou jejuando há três dias
e consigo fechar minhas mãos".

Então, isso nos permite explicar
a melhora de muitas doenças.

No que diz respeito ao metabolismo,
ocorre a diminuição do peso, claro,

a diminuição da circunferência abdominal,

e a normalização da pressão arterial,

do açúcar do sangue, do colesterol,

tudo isso enquanto o bem-estar
físico e emocional aumenta a cada dia.

Para alguém que nunca jejuou,
tudo parece completamente fora do normal.

Pensamos que vamos passar mal,
ter fome o tempo inteiro,

e definitivamente não é o caso.

Nós documentamos

todas essas melhoras
e mudanças de parâmetros,

em um estudo publicado em janeiro de 2019,

que tratou de 1422 casos
de homens e mulheres,

que jejuaram durante 5, 10, 15 ou 20 dias

com o método Buchinger.

Então, a conclusão é:

o que pode ser tratado com jejum,
do ponto de vista médico?

E essa foi a segunda motivação,

após a fascinação da descoberta
desses sistemas intrínsecos.

São as doenças conhecidas
como "doenças de metabolismo",

por exemplo, a obesidade,
a diabetes tipo 2,

as taxas elevadas de colesterol
e ácido úrico.

São fatores de risco também
para doenças cardíacas e vasculares.

Então, é como uma prevenção
contra um infarto ou AVC.

Há um segundo grande grupo,
as doenças inflamatórias crônicas,

em geral, aquelas que trazem dor,
que causam sofrimento,

começando pela artrite
e as doenças reumáticas,

também gastrites, colites,
tudo que termina em "ite",

além de alergias, enxaqueca e asma.

Há um terceiro grupo, menos conhecido,
são todos os tipos de depressão,

situações de esgotamento
físico e psicológico,

já que o jejum eleva o ânimo

e também aumenta a energia
nos casos de pré-exaustão.

Atualmente, como eu disse antes,

amplas pesquisas são feitas no mundo,

para estudar os efeitos
dos tipos de jejuns:

curtos, longos, modificados e recorrentes.

Constatamos o efeito sobre certas doenças

que não considerávamos há 20 anos,

talvez, como câncer, Alzheimer,
pelo menos na sua prevenção,

como, igualmente, a artrite reumatoide,
a esclerose múltipla e Parkinson.

São novas áreas de pesquisa

que vão ser esclarecidas
durante os anos que virão.

Vocês vão se perguntar, talvez:

"Devo ir fundo e tentar fazer um jejum?"

Neste momento, eu diria:

"Atenção! O jejum não é
como uma caminhada de domingo.

É uma corrida de montanha
de intensidade média".

É preciso conhecer o itinerário,
ter um bom guia.

É preciso se preparar para isso
e não se superestimar.

Há o grupo de pessoas
que tomam medicamentos,

e têm doenças, já citadas,
com indicações para o jejum.

Nestes casos, o jejum deve ser realizado
somente em um centro especializado,

onde os médicos são especialistas
na terapia do jejum.

As pessoas com boa saúde podem
tentar uma experiência individual,

se possível, com um bom manual,
um grupo e um orientador,

e então praticar o que chamamos
de "jejum intermitente".

Talvez, por exemplo, uma coisa que dá
bons resultados e que não é difícil,

é não comer por um longo período,
inclusive durante a noite.

Podem ser períodos de 16 horas,
por exemplo.

A sua última refeição é às 18h,
e seu café da manhã às 10h.

É o chamado "jejum intermitente 16x8".

Também pode ser feito
de 1 a 5 dias de jejum,

ou com restrição calórica,
por volta de 600 kcal.

E os bons de garfo,
o que dizem de tudo isso?

Principalmente os franceses,
que adoram a gastronomia!

Por que se privar desse prazer?
Isso não é antigastronomia?

Eu diria que não, claro, durante
um curto período não há o prazer de comer.

Ele será substituído por outros prazeres,
que temos em abundância no jejum.

A princípio, o prazer de ter tempo,

e ficar livre de tantas regras sociais.

Encontrar o prazer de ler um bom livro,
escutar música,

estar em contato com a natureza,
fazer caminhadas,

ter tempo para seu corpo
e para si próprio.

Sem esquecer que no final do jejum,
quando você recomeça a se alimentar,

então, o sabor é maravilhoso.

Qualquer alimento parece
uma refeição cinco estrelas.

Ainda mais, após um jejum, reavaliamos
a sensação de fome e de saciedade,

o que nos permitirá, talvez,

retornar a um comportamento
alimentar normal.

Também há uma dimensão
espiritual no jejum.

Estamos agora no período
da quaresma cristã,

mas em todas as religiões
há períodos de jejum,

pois há uma dimensão espiritual
e também comunitária.

Então o jejum é uma possibilidade
de rejuvenescer seu organismo,

porque no retorno à alimentação,
as células-tronco vão poder se regenerar.

São células embrionárias,
então ocorre rejuvenescimento celular.

Além disso, tivemos a oportunidade
de meditar sobre nossa própria existência

e direcionar a vida para um bom caminho.

Tenho que falar um pouco
sobre a metodologia.

Um jejum deve ser vivido
de uma maneira diferente,

se possível, do quotidiano e longe dele.

Existem cuidados a serem tomados
no período pré-jejum,

diminuindo aos poucos a alimentação,
fazendo um dia de monodieta.

E entrar em um período de jejum

significa ter uma rotina diária
completamente diferente,

alternando bem repouso e exercício físico,

e também rituais, encontros com outros,

uma convivência, por exemplo,
ao redor de um suco de frutas

ou de uma sopa de legumes.

Além disso, o retorno à alimentação
deve ser progressivo e consciente.

Em resumo, eu gostaria de dizer:

encantem-se por este programa milenar,
por essa sabedoria milenar,

que se encontra dentro do seu corpo,
que talvez você nunca tenha descoberto.

Se você decidir fazer jejum,
faça com um bom acompanhamento,

com um bom método, e se estiver doente,
com supervisão médica.

Espero também que fujam
de comidas industrializadas

e que confiem no programa do jejum,

que provavelmente vai ajudar vocês
a se prevenirem de doenças,

a viverem mais tempo com boa saúde,

e a terem, em alguns casos,
uma experiência espiritual profunda

e um redirecionamento da sua vida.

(Aplausos)