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O poder do vício e o vício em poder | Gabor Maté | TEDxRio+20

  • 0:10 - 0:14
    Vim hoje falar sobre vício,
    sobre o poder do vício,
  • 0:14 - 0:16
    mas também sobre vício em poder.
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    Trabalho como médico
    em Vancouver, no Canadá,
  • 0:20 - 0:22
    e tenho trabalhado com pessoas
    extremamente viciadas,
  • 0:22 - 0:26
    pessoas que usam heroína,
    que injetam cocaína,
  • 0:27 - 0:29
    que bebem, usam metanfetamina
  • 0:29 - 0:31
    e todo tipo de droga
    que se possa imaginar.
  • 0:31 - 0:33
    Essas pessoas sofrem.
  • 0:33 - 0:38
    Se o sucesso de um médico for mensurado
    pelo tempo de vida de seus pacientes,
  • 0:38 - 0:40
    então sou um fracasso,
  • 0:40 - 0:44
    pois meus pacientes morrem muito jovens,
    relativamente falando.
  • 0:44 - 0:46
    Morrem de AIDS,
  • 0:46 - 0:48
    morrem de hepatite C,
  • 0:48 - 0:50
    morrem de infecções
    nas válvulas do coração,
  • 0:50 - 0:53
    morrem de infecções no cérebro,
    na coluna vertebral,
  • 0:53 - 0:56
    no coração e no sangue.
  • 0:56 - 1:02
    Morrem de suicídio, de overdose,
    por violência ou em acidentes.
  • 1:02 - 1:04
    Quando olhamos pra eles,
  • 1:05 - 1:09
    vêm-nos à mente as palavras do grande
    novelista egípcio Naguib Mahvouz,
  • 1:09 - 1:10
    que escreveu:
  • 1:10 - 1:13
    "Nada registra mais explicitamente
    os efeitos de uma vida triste
  • 1:13 - 1:15
    do que o corpo humano".
  • 1:15 - 1:17
    Porque essas pessoas perdem tudo:
  • 1:17 - 1:20
    a saúde, a beleza,
  • 1:20 - 1:24
    os dentes, a riqueza,
  • 1:24 - 1:26
    relacionamentos
  • 1:26 - 1:28
    e, por fim, geralmente perdem a vida.
  • 1:28 - 1:32
    Ainda assim, nada os faz deixar o vício.
  • 1:32 - 1:35
    Nada consegue forçá-los
    a abrir mão do vício.
  • 1:35 - 1:36
    Os vícios são poderosos,
  • 1:36 - 1:39
    e a pergunta é: por quê?
  • 1:39 - 1:41
    Um dos meus pacientes me disse:
  • 1:41 - 1:45
    "Não tenho medo de morrer.
    Tenho mais medo de viver".
  • 1:45 - 1:50
    A pergunta que devemos fazer é:
    por que as pessoas têm medo da vida?
  • 1:50 - 1:54
    Se quisermos entender o vício,
  • 1:54 - 1:56
    não podemos olhar
    para o que há de errado no vício.
  • 1:56 - 1:58
    Temos que analisar o que há de certo.
  • 1:58 - 2:00
    Em outras palavras,
    o que a pessoa ganha com o vício?
  • 2:00 - 2:03
    O que estão ganhando
    que não têm sem o vício?
  • 2:03 - 2:08
    O que os viciados ganham
    é o alívio da dor.
  • 2:08 - 2:12
    Ganham uma sensação de paz,
    uma sensação de controle,
  • 2:13 - 2:16
    uma sensação de calma,
    muito, muito temporária.
  • 2:16 - 2:20
    A pergunta é: por que essas coisas
    estão em falta na vida deles?
  • 2:20 - 2:22
    O que aconteceu pra que ficassem assim?
  • 2:22 - 2:27
    Se analisarmos drogas como a heroína,
    como a morfina, como a codeína,
  • 2:28 - 2:32
    ou como a cocaína, como o álcool,
  • 2:32 - 2:34
    todas são analgésicas.
  • 2:34 - 2:36
    De uma forma ou de outra,
    todas aliviam a dor.
  • 2:36 - 2:40
    Por isso, a verdadeira questão no vício
    não é: "Por que o vício?"
  • 2:40 - 2:42
    A questão é: "Por que a dor?"
  • 2:42 - 2:46
    Bem, acabei de ler
    a biografia de Keith Richards,
  • 2:46 - 2:48
    o guitarrista dos Rolling Stones.
  • 2:48 - 2:50
    Como vocês provavelmente sabem,
  • 2:50 - 2:54
    todos ainda ficam surpresos
    com o fato de Richards ainda estar vivo,
  • 2:54 - 2:57
    porque ele foi extremamente viciado
    em heroína durante muito tempo.
  • 2:57 - 3:03
    Em sua biografia, ele revela que o vício
    tinha tudo a ver com esquecimento,
  • 3:03 - 3:05
    com uma busca por esquecer.
  • 3:05 - 3:08
    Ele diz: "As contorções
    pelas quais passamos
  • 3:08 - 3:12
    só pra não sermos quem somos
    por algumas horas".
  • 3:12 - 3:14
    Eu mesmo entendo muito bem essa sensação,
  • 3:14 - 3:17
    porque conheço esse tipo
    de desconforto comigo mesmo,
  • 3:17 - 3:20
    conheço esse desconforto
    de estar na minha própria pele,
  • 3:20 - 3:24
    conheço esse desejo de escapar
    da minha própria mente.
  • 3:24 - 3:30
    O grande psiquiatra britânico
    R. D. Laing disse
  • 3:30 - 3:32
    que existem três coisas
    das quais as pessoas têm medo:
  • 3:32 - 3:37
    da morte, de outras pessoas
    e de suas próprias mentes.
  • 3:38 - 3:42
    Durante muito tempo, quis me distrair
    da minha própria mente.
  • 3:42 - 3:45
    Eu tinha medo de ficar
    com meus próprios pensamentos.
  • 3:45 - 3:46
    E como eu me distraía?
  • 3:46 - 3:50
    Bem, nunca usei drogas,
    mas me distraía trabalhando,
  • 3:51 - 3:54
    me enchendo de atividades.
  • 3:54 - 3:57
    Também me distraía comprando:
  • 3:57 - 4:02
    no meu caso, comprando música clássica,
    CDs de música clássica.
  • 4:02 - 4:04
    Eu era viciado nisso.
  • 4:04 - 4:07
    Uma semana, gastei US$ 8 mil
    em CDs de música clássica,
  • 4:07 - 4:09
    não porque eu quisesse,
  • 4:09 - 4:12
    mas porque não conseguia
    parar de voltar à loja.
  • 4:12 - 4:14
    Como médico, já fiz diversos partos.
  • 4:14 - 4:17
    Uma vez, deixei uma gestante
    em trabalho de parto no hospital
  • 4:17 - 4:21
    e saí pra comprar
    um CD de música clássica.
  • 4:22 - 4:26
    Eu conseguiria voltar ao hospital a tempo,
  • 4:26 - 4:28
    mas, depois de entrar na loja,
    eu não conseguia sair,
  • 4:28 - 4:33
    por causa daqueles vendedores
    de CDs malvados nos corredores:
  • 4:33 - 4:37
    "Ei, amigão, já ouviu o ciclo sinfônico
    mais recente de Mozart?"
  • 4:37 - 4:38
    Não? Então..."
  • 4:38 - 4:40
    Então, perdi o parto do bebê.
  • 4:40 - 4:43
    Quando voltei pra casa,
    menti pra minha esposa a respeito.
  • 4:43 - 4:47
    Como qualquer viciado, eu mentia
    e ignorava meus próprios filhos
  • 4:47 - 4:50
    por causa da minha obsessão
    por trabalho e por música.
  • 4:50 - 4:53
    Então, sei bem como é
    essa fuga de si mesmo.
  • 4:53 - 4:55
    Minha definição de vício
  • 4:55 - 4:59
    é qualquer comportamento
    que te dê alívio temporário,
  • 4:59 - 5:01
    prazer temporário,
  • 5:01 - 5:05
    mas que, a longo prazo, prejudique,
    traga consequências negativas
  • 5:05 - 5:07
    e que você não consiga largar,
  • 5:07 - 5:09
    apesar das consequências negativas.
  • 5:09 - 5:12
    A partir dessa perspectiva,
    podemos compreender
  • 5:12 - 5:16
    que existem diversos tipos de vício.
  • 5:16 - 5:18
    Sim, existe o vício em drogas,
  • 5:18 - 5:21
    mas também o vício em consumo,
  • 5:21 - 5:24
    o vício em sexo,
  • 5:24 - 5:26
    em internet,
  • 5:26 - 5:28
    em compras,
  • 5:28 - 5:29
    em comida.
  • 5:30 - 5:33
    Os budistas creem na ideia
    de espíritos famintos.
  • 5:33 - 5:37
    Os espíritos famintos são criaturas
    com estômagos enormes e vazios
  • 5:37 - 5:40
    e pescoços pequenos e magros
    e bocas minúsculas,
  • 5:40 - 5:41
    que nunca conseguem se saciar,
  • 5:41 - 5:44
    nunca conseguem preencher
    esse vazio que têm dentro de si.
  • 5:44 - 5:47
    Somos todos espíritos famintos
    nesta sociedade,
  • 5:47 - 5:48
    todos temos esse vazio,
  • 5:48 - 5:52
    e muitos de nós tentamos
    preenchê-lo de fora pra dentro.
  • 5:52 - 5:57
    O vício se resume a tentar
    preencher esse vazio de fora pra dentro.
  • 5:58 - 6:03
    Se quisermos descobrir
    por que as pessoas estão sofrendo,
  • 6:03 - 6:06
    não podemos analisar sua genética.
  • 6:06 - 6:08
    Temos que analisar suas vidas.
  • 6:08 - 6:12
    No caso dos meus pacientes,
    os extremamente viciados,
  • 6:12 - 6:14
    a razão por que sofrem é bem clara.
  • 6:14 - 6:16
    Eles sofreram abusos durante toda a vida.
  • 6:16 - 6:19
    Começaram a sofrer abusos
    desde a infância.
  • 6:19 - 6:22
    Todas as mulheres com quem trabalhei
    por mais de 12 anos, centenas delas,
  • 6:22 - 6:25
    todas haviam sido abusadas
    sexualmente na infância.
  • 6:25 - 6:27
    Os homens também haviam sofrido traumas:
  • 6:27 - 6:32
    tinham sido abusados sexualmente,
    sofrido negligência, violência física,
  • 6:32 - 6:36
    sido abandonados e emocionalmente
    feridos repetidas vezes.
  • 6:36 - 6:38
    Por isso sofrem.
  • 6:38 - 6:40
    E há mais uma razão:
  • 6:41 - 6:42
    o cérebro humano.
  • 6:42 - 6:48
    O cérebro humano, como sabemos,
    desenvolve uma interação com o ambiente.
  • 6:48 - 6:50
    Ele não é apenas geneticamente programado.
  • 6:50 - 6:53
    O tipo de ambiente em que uma criança vive
  • 6:53 - 6:57
    irá moldar o desenvolvimento
    de seu cérebro.
  • 6:57 - 7:00
    Posso contar a vocês sobre dois
    experimentos feitos com camundongos.
  • 7:00 - 7:07
    Coloque comida na boca de um camundongo
    e ele vai comer, saborear e engolir,
  • 7:07 - 7:11
    mas, se colocar a comida no chão,
    a alguns centímetros de seu nariz,
  • 7:11 - 7:13
    ele não vai andar pra comer.
  • 7:13 - 7:16
    Vai morrer de fome, em vez de comer.
  • 7:16 - 7:17
    Por quê?
  • 7:17 - 7:19
    Geneticamente falando,
  • 7:19 - 7:23
    eles não possuem receptores pra uma
    substância no cérebro chamada dopamina.
  • 7:23 - 7:26
    A dopamina é a substância
    da motivação, do incentivo.
  • 7:26 - 7:29
    A dopamina flui no corpo
    sempre que estamos motivados,
  • 7:29 - 7:33
    empolgados, vibrantes,
    curiosos em relação a algo,
  • 7:33 - 7:35
    quando buscamos comida
    ou um parceiro sexual.
  • 7:35 - 7:38
    Sem a dopamina, não temos motivação.
  • 7:38 - 7:40
    O que vocês acham
    que os viciados ganham?
  • 7:40 - 7:41
    Quando consomem cocaína,
  • 7:41 - 7:45
    cristais de metanfetamina
    ou praticamente qualquer outra droga,
  • 7:45 - 7:47
    ganham um pico de dopamina no cérebro.
  • 7:47 - 7:52
    A pergunta é: o que deixou
    o cérebro deles assim?
  • 7:52 - 7:55
    Porque é um mito dizer
    que as drogas são viciantes.
  • 7:55 - 7:57
    As drogas em si não são viciantes,
  • 7:57 - 8:01
    pois a maioria das pessoas experimenta
    muitas drogas e nunca se viciam.
  • 8:01 - 8:02
    Então, a pergunta é?
  • 8:02 - 8:05
    por que algumas pessoas
    são vulneráveis ao vício?
  • 8:05 - 8:08
    Da mesma forma, a comida não vicia,
    mas é um vício pra alguns;
  • 8:08 - 8:11
    as compras não viciam,
    mas são um vício pra alguns;
  • 8:11 - 8:14
    a televisão não vicia,
    mas é um vício pra alguns.
  • 8:14 - 8:17
    A pergunta é: por que algumas pessoas
    têm essa suscetibilidade?
  • 8:19 - 8:22
    Há outro pequeno experimento
    feito com camundongos
  • 8:22 - 8:26
    em que filhotes de camundongo,
    quando separados de suas mães,
  • 8:26 - 8:27
    não chamam por elas.
  • 8:27 - 8:29
    O que isso significa na natureza?
  • 8:29 - 8:31
    Eles morreriam,
  • 8:31 - 8:34
    pois só as mães protegem
    e alimentam as crias.
  • 8:34 - 8:35
    Por quê?
  • 8:35 - 8:38
    Porque, geneticamente,
    eles não possuem os receptores,
  • 8:38 - 8:42
    as áreas de ligação química,
    no cérebro, para as endorfinas.
  • 8:42 - 8:47
    As endorfinas são substâncias incríveis,
    parecidas com a morfina.
  • 8:47 - 8:50
    As endorfinas são
    nossos analgésicos naturais.
  • 8:52 - 8:56
    As endorfinas também tornam possível
    a experiência do amor.
  • 8:56 - 8:59
    Tornam possível a experiência
    de apego dos filhos aos pais
  • 8:59 - 9:01
    e dos pais aos filhos.
  • 9:01 - 9:05
    Esses pequenos camundongos,
    sem receptores de endorfina no cérebro,
  • 9:05 - 9:07
    não chamarão por suas mães.
  • 9:07 - 9:09
    Em outras palavras,
  • 9:09 - 9:14
    o vício nessas drogas,
    e na heroína e na morfina...
  • 9:14 - 9:18
    Essas drogas agem no sistema de endorfina.
  • 9:18 - 9:19
    Por isso elas "funcionam".
  • 9:20 - 9:21
    Então,
  • 9:22 - 9:23
    a pergunta é:
  • 9:23 - 9:27
    o que faz com que as pessoas precisem
    dessas substâncias, de fora pra dentro?
  • 9:27 - 9:30
    Bem, o que acontece é que,
    como sofreram abuso na infância,
  • 9:30 - 9:33
    esses circuitos não
    se desenvolvem nessas pessoas.
  • 9:33 - 9:36
    Quando não temos amor
    e ligação afetiva na vida
  • 9:36 - 9:38
    quando somos muito jovens,
  • 9:38 - 9:42
    esses importantes circuitos cerebrais
    não se desenvolvem de forma apropriada.
  • 9:43 - 9:46
    Sob condições de abuso, as coisas
    não se desenvolvem adequadamente.
  • 9:46 - 9:52
    O cérebro dessas pessoas
    fica então suscetível ao uso de drogas.
  • 9:52 - 9:54
    Elas se sentem normais,
    sentem alívio do sofrimento,
  • 9:54 - 9:56
    sentem amor.
  • 9:56 - 10:00
    Uma paciente uma vez me disse:
    "A primeira vez que usei heroína,
  • 10:00 - 10:03
    foi como um abraço gostoso e caloroso,
  • 10:03 - 10:05
    como o de uma mãe abraçando seu bebê".
  • 10:09 - 10:11
    Já tive esse mesmo vazio,
  • 10:11 - 10:13
    não tão grande quanto
    o dos meus pacientes.
  • 10:13 - 10:18
    No meu caso, eu nasci em 1944,
    em Budapeste, na Hungria,
  • 10:18 - 10:19
    de pais judeus,
  • 10:19 - 10:22
    pouco antes de os alemães
    ocuparem a Hungria.
  • 10:22 - 10:26
    E todos sabem o que aconteceu
    com os judeus no leste europeu.
  • 10:26 - 10:30
    Eu tinha dois meses de idade
    quando os alemães invadiram Budapeste.
  • 10:30 - 10:34
    Um dia depois de fazerem isso,
    minha mãe ligou para o pediatra
  • 10:34 - 10:35
    e disse:
  • 10:35 - 10:39
    "Por favor, venha ver o Gabor,
    porque ele não para de chorar".
  • 10:39 - 10:42
    O pediatra então disse:
    "Claro, vou até aí para vê-lo,
  • 10:42 - 10:45
    mas preciso dizer que todos
    os bebês judeus estão chorando".
  • 10:46 - 10:47
    Mas por quê?
  • 10:47 - 10:51
    O que os bebês sabem sobre Hitler,
    sobre o genocídio ou sobre a guerra?
  • 10:51 - 10:52
    Nada.
  • 10:52 - 10:56
    Na verdade, estávamos absorvendo
    o estresse, os terrores
  • 10:56 - 10:58
    e a tristeza das nossas mães.
  • 10:58 - 11:03
    Isso, na verdade, molda
    o cérebro da criança.
  • 11:04 - 11:07
    É claro que o que acontece
  • 11:07 - 11:10
    é que a mensagem que recebo
    é a de que o mundo não me quer.
  • 11:10 - 11:14
    Se minha mãe não está feliz perto de mim,
    é porque ela não me quer.
  • 11:15 - 11:18
    Por que me torno um viciado
    em trabalho mais tarde?
  • 11:18 - 11:21
    Porque, se não me querem,
    pelo menos vão precisar de mim.
  • 11:21 - 11:25
    Eu serei um médico importante,
    e vão precisar de mim.
  • 11:25 - 11:26
    Assim, posso compensar
  • 11:26 - 11:29
    a sensação de não ter sido
    quisto na infância.
  • 11:29 - 11:31
    O que isso significa?
  • 11:31 - 11:35
    Significa que trabalho o tempo todo
    e, quando não estou trabalhando,
  • 11:35 - 11:38
    tenho a necessidade de comprar música.
  • 11:38 - 11:40
    Que mensagem meus filhos
    recebem com isso?
  • 11:40 - 11:43
    A mesma: de que eles não são quistos.
  • 11:43 - 11:47
    E, assim, passamos isso adiante,
    passamos adiante o trauma,
  • 11:47 - 11:49
    passamos adiante o sofrimento,
    inconscientemente,
  • 11:49 - 11:52
    de uma geração à outra.
  • 11:53 - 11:56
    Obviamente, há muitas, muitas formas
    de preencher esse vazio.
  • 11:56 - 11:59
    Cada pessoa tem uma forma diferente
    de preencher esse vazio,
  • 11:59 - 12:01
    mas o vazio sempre se deve
  • 12:01 - 12:07
    àquilo que não recebemos
    quando éramos bem pequenos.
  • 12:08 - 12:11
    Aí, vemos um viciado em drogas
    e dizemos a ele:
  • 12:11 - 12:13
    "Como você pode fazer isso consigo mesmo?
  • 12:13 - 12:17
    Como pode injetar essa substância
    terrível em seu corpo,
  • 12:17 - 12:19
    que pode te matar?"
  • 12:19 - 12:21
    Mas vejam só o que estamos
    fazendo com a Terra.
  • 12:21 - 12:24
    Estamos injetando
    todo tipo de coisa na atmosfera,
  • 12:24 - 12:26
    nos oceanos,
  • 12:26 - 12:28
    no meio ambiente,
  • 12:28 - 12:31
    que estão nos matando,
    que estão matando a Terra.
  • 12:31 - 12:33
    Qual dos vícios é pior?
  • 12:33 - 12:36
    O vício em petróleo? Em consumo?
  • 12:36 - 12:38
    Qual desses vícios é mais prejudicial?
  • 12:38 - 12:40
    Mas julgamos o viciado em drogas
  • 12:40 - 12:44
    porque, na verdade,
    vemos que ele é como nós,
  • 12:44 - 12:45
    e não gostamos disso.
  • 12:45 - 12:49
    Aí dizemos: "Você é diferente,
    é pior do que eu".
  • 12:49 - 12:51
    (Aplausos)
  • 12:56 - 13:01
    No voo para São Paulo e Rio de Janeiro,
  • 13:01 - 13:04
    vim lendo o "The New York Times",
    no dia 9 de junho,
  • 13:04 - 13:06
    e havia um artigo sobre o Brasil.
  • 13:06 - 13:10
    O artigo falava sobre um homem
    chamado Nísio Gomes,
  • 13:11 - 13:14
    líder do povo guarani, na Amazônia,
  • 13:14 - 13:16
    que foi morto em novembro passado.
  • 13:16 - 13:19
    Vocês provavelmente ouviram falar dele.
  • 13:19 - 13:22
    Ele foi morto porque estava
    protegendo seu povo
  • 13:22 - 13:25
    de grandes fazendeiros e empresas
  • 13:25 - 13:29
    que estão tomando e destruindo
    a floresta tropical
  • 13:29 - 13:32
    e destruindo o habitat
    dos povos indígenas aqui no Brasil.
  • 13:32 - 13:36
    Posso dizer que o mesmo
    aconteceu no Canadá.
  • 13:36 - 13:40
    Muitos dos meus pacientes
    são nativos indígenas,
  • 13:40 - 13:41
    de povos indígenas nativos do Canadá.
  • 13:41 - 13:44
    Eles estão extremamente viciados.
  • 13:44 - 13:47
    Eles compõem uma pequena
    parcela da população,
  • 13:47 - 13:50
    mas compõem grande parte
    da população carcerária,
  • 13:50 - 13:51
    das pessoas viciadas,
  • 13:51 - 13:53
    das pessoas com doenças mentais,
  • 13:53 - 13:56
    das que comentem suicídio. Por quê?
  • 13:56 - 13:57
    Porque suas terras lhes foram tiradas
  • 13:57 - 14:02
    e porque foram mortos, violentados,
    durante gerações e gerações.
  • 14:03 - 14:04
    A pergunta que faço é:
  • 14:04 - 14:07
    se podemos entender o sofrimento
    desses povos indígenas
  • 14:07 - 14:12
    e como esse sofrimento
    os faz buscar alívio nos vícios,
  • 14:12 - 14:14
    e as pessoas que estão
    causando esse sofrimento?
  • 14:14 - 14:16
    São viciadas em quê?
  • 14:16 - 14:18
    São viciadas em poder,
  • 14:18 - 14:19
    são viciadas em riqueza,
  • 14:19 - 14:21
    são viciadas em adquirir.
  • 14:21 - 14:23
    Querem se tornar maiores.
  • 14:23 - 14:26
    Quando busquei tentar entender
    o vício em poder,
  • 14:26 - 14:29
    analisei algumas das pessoas
    mais poderosas da história.
  • 14:29 - 14:33
    Analisei Alexandre, o Grande;
    analisei Napoleão; analisei Hitler;
  • 14:33 - 14:36
    analisei Gengis Khan; analisei Stalin.
  • 14:36 - 14:39
    É muito interessante
    analisar essas pessoas.
  • 14:39 - 14:42
    Primeiro, por que
    precisaram tanto de poder?
  • 14:42 - 14:44
    Curiosamente,
  • 14:44 - 14:46
    todos eram pessoas de baixa estatura,
  • 14:46 - 14:48
    como eu.
  • 14:49 - 14:51
    Ou menores; menores até.
  • 14:52 - 14:56
    Eles era "forasteiros",
  • 14:56 - 14:59
    não faziam parte da população local.
  • 14:59 - 15:01
    Stalin era georgiano, não russo.
  • 15:01 - 15:04
    Napoleão era da Córsega, não francês.
  • 15:06 - 15:09
    Alexandre era macedônio, não grego.
  • 15:09 - 15:14
    Hitler era austríaco, não alemão.
  • 15:14 - 15:16
    Há uma grande sensação
    de insegurança e inferioridade.
  • 15:16 - 15:20
    Eles precisavam de poder
    para se sentirem bem consigo mesmos,
  • 15:20 - 15:21
    para se sentirem maiores,
  • 15:21 - 15:24
    e, para obter esse poder,
    se dispuseram a guerras,
  • 15:24 - 15:26
    a matar muita gente,
  • 15:26 - 15:29
    só para manterem esse poder.
  • 15:29 - 15:32
    Não estou dizendo que só
    pessoas baixas são famintas por poder,
  • 15:32 - 15:35
    mas é interessante
    analisar esses exemplos,
  • 15:35 - 15:37
    porque o poder, o vício em poder,
  • 15:37 - 15:41
    sempre tem a ver com o vazio
    que tentamos preencher de fora pra dentro.
  • 15:41 - 15:45
    Napoleão, mesmo em exílio
    na Ilha de Santa Helena,
  • 15:45 - 15:47
    depois de perder seu poder, disse:
  • 15:47 - 15:50
    "Eu amo o poder. Eu amo o poder".
  • 15:50 - 15:53
    Ele não conseguia
    se imaginar sem ter poder.
  • 15:53 - 15:57
    Ele era incapaz de se imaginar
    sem ser poderoso externamente.
  • 15:57 - 15:59
    Isso é bem interessante
  • 15:59 - 16:03
    quando comparado a pessoas
    como Buda ou Jesus,
  • 16:03 - 16:06
    porque, se analisarmos as histórias
    de Jesus e de Buda,
  • 16:06 - 16:08
    ambos foram tentados pelo diabo,
  • 16:08 - 16:14
    e uma das coisas que o diabo
    lhes ofereceu foi poder, poder terreno,
  • 16:14 - 16:16
    e ambos recusaram.
  • 16:16 - 16:18
    Mas por que eles recusaram?
  • 16:18 - 16:24
    Recusaram porque tinham
    poder dentro de si mesmos.
  • 16:24 - 16:26
    Não precisavam de poder externo.
  • 16:26 - 16:29
    E ambos recusaram porque
    não queriam controlar os outros,
  • 16:29 - 16:30
    mas ensinar os outros.
  • 16:30 - 16:36
    Queriam ensinar os outros
    através do exemplo, de palavras mansas,
  • 16:36 - 16:39
    da sabedoria, não da força.
  • 16:39 - 16:41
    Por isso recusaram o poder.
  • 16:41 - 16:44
    É muito interessante
    o que eles disseram sobre isso.
  • 16:46 - 16:51
    Jesus disse que o poder, na realidade,
  • 16:51 - 16:53
    não está no exterior, mas no interior.
  • 16:53 - 16:57
    Ele disse que o reino de Deus
    está aqui dentro.
  • 16:57 - 16:59
    Buda, antes de morrer
  • 16:59 - 17:03
    e seus monges chorarem
    sua morte e se comoverem,
  • 17:03 - 17:06
    disse: "Não chorem por mim,
    e não me adorem.
  • 17:06 - 17:08
    Encontrem luz dentro de si mesmos.
  • 17:08 - 17:13
    Sejam luz para si mesmos,
    encontrem-na internamente".
  • 17:13 - 17:17
    Enquanto vemos esse mundo difícil,
    com a perda do meio ambiente,
  • 17:17 - 17:22
    com o aquecimento global,
    com a depredação dos oceanos,
  • 17:22 - 17:25
    não podemos esperar que as pessoas
    no poder mudem esse cenário.
  • 17:25 - 17:28
    As pessoas no poder, arrisco dizer,
  • 17:28 - 17:31
    geralmente estão
    entre as mais vazias do mundo,
  • 17:31 - 17:33
    e não vão mudar as coisas por nós.
  • 17:33 - 17:36
    Precisamos encontrar essa luz
    dentro de nós mesmos,
  • 17:36 - 17:38
    precisamos encontrar a luz nas comunidades
  • 17:38 - 17:42
    e em nossa própria sabedoria
    e nossa própria criatividade.
  • 17:42 - 17:45
    Não podemos esperar que as pessoas
    no poder melhorem as coisas pra nós,
  • 17:45 - 17:49
    porque nunca farão isso,
    a não ser que as obriguemos a isso.
  • 17:53 - 17:58
    Dizem que a natureza humana é competitiva,
    que a natureza humana é agressiva,
  • 17:58 - 18:00
    que a natureza humana é egoísta.
  • 18:00 - 18:04
    É exatamente o contrário:
    a natureza humana é cooperativa,
  • 18:04 - 18:09
    a natureza humana é generosa,
    a natureza humana é voltada à comunidade.
  • 18:09 - 18:13
    O que vemos aqui nesta conferência,
    com pessoas compartilhando informação,
  • 18:13 - 18:17
    pessoas recebendo informação,
    pessoas comprometidas com um mundo melhor,
  • 18:17 - 18:19
    isso é que é a natureza humana.
  • 18:19 - 18:20
    O que quero dizer a vocês
  • 18:20 - 18:24
    é que, se encontrarmos essa luz interior
    e nossa própria natureza,
  • 18:24 - 18:28
    seremos mais gentis com nós mesmos
    e também com a natureza.
  • 18:28 - 18:29
    Obrigado.
  • 18:29 - 18:32
    (Vivas) (Aplausos)
Title:
O poder do vício e o vício em poder | Gabor Maté | TEDxRio+20
Description:

Se o sucesso de um médico for mensurado pela longevidade de seus pacientes, o psiquiatra Gabor Maté, canadense, nascido na Hungria após o genocídio nazista, é um fracasso. Como especialista em doenças terminais, dependentes químicos e pacientes soropositivos, o Dr. Maté é um escritor renomado e um colunista famoso por seu conhecimento sobre transtorno do déficit de atenção, estresse, doença crônica e relações parentais.

Seu tema no TEDxRio+20 foi o vício: do vício em drogas ao vício em poder, todos provenientes da falta de amor ao desejo de fugir de si mesmo, da susceptibilidade do ser até o poder interior, nada escapa. Ele arrisca uma receita genérica e generosa: "Descubra a sua natureza e seja gentil consigo mesmo".

Esta palestra foi dada em um evento TEDx, que usa o formato de conferência TED, mas é organizado de forma independente por uma comunidade local. Para saber mais visite http://ted.com/tedx

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
18:47

Portuguese, Brazilian subtitles

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