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Como salvar o amor? | Yann Dall'Aglio | TEDxParis

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    O que é o amor?
  • 0:08 - 0:10
    É um termo difícil de definir
  • 0:10 - 0:13
    na medida em que a sua
    aplicação é muito ampla.
  • 0:14 - 0:16
    Eu posso amar correr,
  • 0:16 - 0:18
    posso amar um livro, um filme.
  • 0:18 - 0:20
    Posso amar um escalope...
  • 0:21 - 0:23
    Posso amar a minha mulher.
  • 0:23 - 0:26
    (Risos)
  • 0:28 - 0:32
    Mas existe uma grande diferença entre
    um escalope e a minha mulher,
  • 0:32 - 0:34
    por exemplo.
    (Risos)
  • 0:36 - 0:39
    É que eu valorizo o escalope,
  • 0:39 - 0:43
    mas o escalope, por outro lado,
    em troca, não me valoriza,
  • 0:45 - 0:48
    enquanto a minha mulher,
    ela chama-me...
  • 0:48 - 0:50
    o sol da sua vida.
  • 0:52 - 0:55
    Apenas uma outra consciência
    que deseja, portanto,
  • 0:55 - 0:58
    me pode eleger como um ser desejável.
  • 0:58 - 1:00
    Isto eu sei, e é por isso
    que consigo definir o amor
  • 1:00 - 1:02
    duma forma mais precisa,
  • 1:02 - 1:05
    como sendo o desejo de se ser desejado.
  • 1:06 - 1:08
    Daí o eterno problema do amor:
  • 1:09 - 1:13
    Como nos tornarmos desejáveis
    e como permanecermos desejáveis?
  • 1:15 - 1:18
    Então, a resposta para este problema,
  • 1:18 - 1:21
    o indivíduo encontrava-a antigamente
  • 1:21 - 1:24
    submetendo a sua vida
    às regras da comunidade.
  • 1:24 - 1:26
    Ele tinha um papel preciso a manter,
  • 1:26 - 1:28
    de acordo com o seu sexo, a sua idade,
  • 1:28 - 1:32
    o seu estatuto social
    e bastava que ele o mantivesse
  • 1:32 - 1:36
    para ser valorizado e amado
    por toda a sua comunidade.
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    Pensem na jovem rapariga, que deve
    permanecer virgem até ao casamento.
  • 1:40 - 1:43
    Pensem no jovem rapaz que deve
    obediência ao irmão mais velho,
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    que, por sua vez,
    deve obediência ao patriarca.
  • 1:50 - 1:55
    Mas começou um fenómeno,
  • 1:55 - 1:58
    a partir do século XIII,
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    mas sobretudo no Renascimento,
    no Ocidente,
  • 2:01 - 2:05
    que causou a maior crise de identidade
  • 2:05 - 2:07
    da história da humanidade.
  • 2:07 - 2:09
    Este fenómeno... é a modernidade.
  • 2:09 - 2:11
    Podemos resumi-la, por alto,
  • 2:11 - 2:13
    como um processo, primeiramente,
  • 2:13 - 2:18
    um processo de racionalização
    da procura científica,
  • 2:18 - 2:20
    que acelerou o progresso técnico.
  • 2:21 - 2:25
    Depois, um processo
    de democratização política
  • 2:25 - 2:28
    que desenvolveu os direitos do indivíduo.
  • 2:28 - 2:33
    E por fim, um processo de racionalização
    da produção económica
  • 2:33 - 2:36
    e de liberalização das trocas comerciais.
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    Estes três processos, intercalados,
  • 2:39 - 2:41
    destruíram completamente
  • 2:41 - 2:45
    todos os pontos de referência tradicionais
    das sociedades ocidentais.
  • 2:45 - 2:48
    A consequência,
    para o indivíduo, é enorme.
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    A partir daí, o indivíduo é livre
  • 2:51 - 2:54
    de valorizar ou de depreciar
  • 2:54 - 2:57
    tal atitude, tal escolha, tal objeto.
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    Mas, de repente, essa mesma pessoa
  • 3:03 - 3:07
    é confrontada com essa mesma
    liberdade que os outros têm
  • 3:07 - 3:09
    de o valorizar ou de o depreciar.
  • 3:11 - 3:15
    Dizendo de outra forma, antigamente,
  • 3:15 - 3:19
    eu garantia o meu valor, submetendo-me
    às autoridades tradicionais.
  • 3:20 - 3:23
    Agora, está cotado na bolsa.
  • 3:25 - 3:30
    No mercado livre dos desejos individuais
  • 3:30 - 3:32
    eu negoceio o meu valor diariamente.
  • 3:34 - 3:37
    Daí a angústia do homem contemporâneo.
  • 3:37 - 3:41
    A sua obsessão:
    "Serei desejável, a que nível?"
  • 3:41 - 3:43
    "Quantas pessoas me vão amar?"
  • 3:44 - 3:46
    E como é que ele responde a esta angústia?
  • 3:46 - 3:50
    Acumulando, histericamente,
  • 3:50 - 3:53
    os símbolos da desejabilidade.
  • 3:58 - 4:00
    (Risos)
  • 4:00 - 4:02
    Esta acumulação, eu chamo-lhe
  • 4:02 - 4:05
    entre outras coisas,
    de capital de sedução.
  • 4:05 - 4:09
    É no capital de sedução que assenta,
    em grande parte, na verdade,
  • 4:09 - 4:11
    a nossa sociedade de consumo.
  • 4:13 - 4:17
    Diz-se, a propósito do consumo, que
    esta é uma época materialista.
  • 4:17 - 4:21
    Mas é falso!
    Se acumulamos objetos,
  • 4:21 - 4:23
    é para comunicarmos
    com outros espíritos.
  • 4:23 - 4:27
    É para nos fazer amar
    pelos outros, seduzi-los.
  • 4:29 - 4:33
    Nada menos materialista,
    nada mais sentimental,
  • 4:33 - 4:36
    do que um adolescente que compra
    um par de calças de ganga novas,
  • 4:36 - 4:39
    que as rasgas nos joelhos,
  • 4:39 - 4:41
    porque quer agradar à Jennyfer.
  • 4:41 - 4:43
    (Risos)
  • 4:44 - 4:47
    O consumismo não é o materialismo,
  • 4:47 - 4:49
    mas sim a matéria engolida,
  • 4:49 - 4:52
    sacrificada em nome do deus Amor,
  • 4:52 - 4:55
    ou antes, em nome do capital de sedução.
  • 4:57 - 5:02
    Assim, a partir desta observação
    sobre o amor atual,
  • 5:02 - 5:05
    como considerar o amor dos anos futuros?
  • 5:05 - 5:08
    Podemos considerar duas hipóteses.
  • 5:08 - 5:12
    A primeira consiste em
    apostar no agravamento
  • 5:12 - 5:15
    destes processos de
    capitalização narcisista.
  • 5:16 - 5:20
    Que forma terá este agravamento,
    é muito difícil de dizer,
  • 5:20 - 5:22
    pois depende em grande parte
  • 5:22 - 5:25
    dos progressos sociais e técnicos,
  • 5:25 - 5:29
    que são, por definição,
    difíceis de prever.
  • 5:30 - 5:32
    Mas podemos, por exemplo,
  • 5:32 - 5:35
    imaginar um "website" de encontros
  • 5:35 - 5:38
    em que, um pouco como os pontos S'Miles,
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    funcionamos com pontos de capital de sedução
  • 5:43 - 5:47
    que variam de acordo com a minha
    idade, a minha altura e peso,
  • 5:47 - 5:49
    a minha formação académica, o meu salário
  • 5:49 - 5:52
    ou o número de cliques
    acumulados no meu perfil.
  • 5:54 - 5:57
    Podemos também imaginar
  • 5:57 - 6:01
    um tratamento químico da rotura amorosa
  • 6:01 - 6:03
    que diminui o sentimento de afeto.
  • 6:04 - 6:08
    Aliás, já existe um programa na MTV,
  • 6:09 - 6:13
    em que professores de sedução
  • 6:13 - 6:15
    tratam o desgosto de amor
    como uma doença.
  • 6:17 - 6:19
    Estes professores chamam-se
    de "pick-up artists".
  • 6:20 - 6:23
    Então, "artist" em português
    é fácil, é artista
  • 6:24 - 6:26
    e depois "pick-up" é elevação,
  • 6:26 - 6:29
    mas não é uma elevação qualquer,
    é elevação da mulher.
  • 6:29 - 6:32
    Portanto, são artistas de
    elevação da mulher.
  • 6:33 - 6:34
    (Risos)
  • 6:34 - 6:39
    E eles chamam ao desgosto
    de amor "one-itis",
  • 6:39 - 6:43
    "itis", em inglês, é um sufixo
    que significa infeção.
  • 6:43 - 6:46
    Então, "one-itis" pode traduzir-se
    como a infeção do único.
  • 6:46 - 6:49
    É um bocado nojento.
  • 6:49 - 6:53
    De facto, para os "pick-up artists",
    ter uma fixação amorosa por alguém
  • 6:55 - 6:58
    é perder tempo, é desperdiçar
    o seu capital de sedução
  • 6:58 - 7:02
    e, então, deve ser eliminada como
    se fosse uma doença, uma infeção.
  • 7:04 - 7:07
    Podemos ainda considerar
  • 7:07 - 7:10
    o uso amoroso do mapa genético,
  • 7:12 - 7:14
    cada um traria o seu consigo,
  • 7:14 - 7:17
    depois apresentá-lo-ia
    como um cartão de visita
  • 7:18 - 7:22
    para verificar se a sedução não
    pode conduzir à reprodução.
  • 7:23 - 7:25
    (Risos)
  • 7:26 - 7:31
    Então, claro, esta corrida para seduzir,
  • 7:31 - 7:33
    como qualquer competição feroz,
  • 7:33 - 7:38
    vai criar grandes disparidades
    de satisfação narcisista
  • 7:38 - 7:42
    e também muita solidão,
    muita frustração.
  • 7:42 - 7:45
    Então, é necessário esperar
    que a própria modernidade,
  • 7:45 - 7:49
    no princípio do capital de sedução,
    seja posta em causa.
  • 7:49 - 7:52
    Eu penso especialmente nas
    reações "comunitaristas",
  • 7:52 - 7:56
    do tipo neofascistas ou religiosas.
  • 7:57 - 8:02
    Mas bem, um futuro assim
    não é uma fatalidade.
  • 8:03 - 8:06
    Pode ser possível uma outra forma
    de pensar o amor.
  • 8:09 - 8:10
    Mas como?
  • 8:10 - 8:14
    Como renunciar à exigência
    histérica de se ser valorizado?
  • 8:15 - 8:18
    E bem, ganhar consciência
    da minha nulidade.
  • 8:18 - 8:20
    (Risos)
  • 8:21 - 8:22
    E sim,
  • 8:22 - 8:23
    eu sou nulo.
  • 8:24 - 8:26
    Mas sosseguem:
  • 8:26 - 8:27
    vocês também.
  • 8:28 - 8:30
    (Risos)
  • 8:30 - 8:33
    (Aplausos)
  • 8:34 - 8:37
    Nós somos todos nulos.
  • 8:38 - 8:40
    É muito fácil demonstrar essa nulidade
  • 8:40 - 8:43
    porque, para ser valorizado,
  • 8:44 - 8:47
    eu exijo do Outro que me deseje,
  • 8:47 - 8:49
    então, eu não tenho valor por mim mesmo,
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    não tenho valor em si mesmo.
  • 8:53 - 8:56
    Todos temos, todos fingimos ter um ídolo;
  • 8:57 - 9:01
    todos fingimos sermos um ídolo
    para alguém mas, na verdade,
  • 9:01 - 9:02
    somos todos impostores,
  • 9:02 - 9:06
    como aquele que passa
    indiferente pela rua,
  • 9:07 - 9:09
    mas que tudo previu,
    tudo calculou,
  • 9:09 - 9:12
    para que todos os olhos
    estejam em cima dele.
  • 9:13 - 9:17
    Penso que tomar consciência
    desta impostura geral,
  • 9:17 - 9:19
    que nos diz respeito a todos,
  • 9:19 - 9:21
    pacifica as nossas relações amorosas.
  • 9:21 - 9:23
    É porque quero ser adorado,
  • 9:23 - 9:24
    total e completamente,
  • 9:24 - 9:26
    justificado em todas as minhas escolhas,
  • 9:26 - 9:28
    que há uma histeria da sedução.
  • 9:29 - 9:32
    E, de repente, quero parecer perfeito,
  • 9:32 - 9:33
    para que o Outro me ame.
  • 9:33 - 9:35
    Eu quero que seja perfeito,
  • 9:35 - 9:37
    para que ele me tranquilize
    em relação ao meu valor
  • 9:37 - 9:40
    e isso dá aos casais,
  • 9:40 - 9:41
    obcecados com o desempenho
  • 9:41 - 9:43
    e que se vão separar, precisamente,
  • 9:43 - 9:46
    ao mínimo mau desempenho.
  • 9:46 - 9:49
    Então, no lado oposto desta atitude,
  • 9:50 - 9:53
    invoco o carinho, o amor
    enquanto carinho.
  • 9:53 - 9:54
    O que é o carinho?
  • 9:54 - 9:58
    É ser meigo, é aceitar as
    fraquezas do ser amado.
  • 9:58 - 10:02
    Oh, não é para se transformarem
    num casal triste de auxiliares de saúde.
  • 10:02 - 10:04
    (Risos)
  • 10:05 - 10:09
    Pelo contrário, há muito encanto,
    muita alegria no carinho.
  • 10:09 - 10:11
    Refiro-me, em particular,
    a um tipo de humor
  • 10:11 - 10:13
    que, infelizmente, é muito pouco praticado
  • 10:13 - 10:16
    e que é uma espécie de poesia
    da falta de jeito assumida,
  • 10:16 - 10:19
    penso em autorridicularização.
  • 10:19 - 10:21
    Para um casal que já não está unido,
  • 10:21 - 10:24
    mantido pelas imposições da tradição,
  • 10:24 - 10:25
    penso que a autorridicularização
  • 10:25 - 10:28
    é uma das melhores formas de durar.
  • 10:28 - 10:31
    E há muita beleza, muito humanismo,
  • 10:31 - 10:37
    na compreensão de que sou
    muito pequeno, muito ridículo,
  • 10:37 - 10:40
    para afrontar o Outro,
    fazer-lhe mal e vice-versa.
  • 10:41 - 10:44
    A este respeito, quero
    concluir esta palestra
  • 10:44 - 10:47
    deixando-vos contemplar e meditar
  • 10:47 - 10:50
    sobre uma frase que talvez já conheçam
  • 10:50 - 10:53
    mas que creio vale a pena
    verdadeiramente, verdadeiramente,
  • 10:53 - 10:55
    redescobrir a cada dia:
  • 10:56 - 10:59
    ♪ "Não somos ninguém para
    nos magoarmos ♪
  • 11:01 - 11:04
    ♪ "uns aos outros." ♪
  • 11:04 - 11:06
    (Aplausos)
Title:
Como salvar o amor? | Yann Dall'Aglio | TEDxParis
Description:

O filósofo Yann Dall'Aglio explica-nos como a nossa sociedade evoluiu na sua relação com o amor. O que significa amar hoje em dia? Porque amamos? O que procuramos no outro? Uma reflexão muito acertada que discute a importância do estatuto social e da família nos nossos relacionamentos amorosos, que mudou drasticamente ao longo do tempo.

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Video Language:
French
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
11:07
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