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Mulheres radicais que mantêm a tradição

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    Salaam. Namaskar.
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    Bom dia.
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    Tendo em conta o meu perfil no TED,
    devem estar à espera
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    que eu vá falar sobre
    as últimas tendências filantrópicas
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    aquelas que fazem vibrar
    Wall Street e o Banco Mundial,
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    ou seja, como investir em mulheres,
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    como dar-lhes poder, como salvá-las.
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    Eu cá não.
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    Eu estou interessada em saber
    como as mulheres estão a salvar-nos.
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    Estão a salvar-nos redefinindo
    e reimaginando
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    um futuro que questiona
    e obscurece polaridades aceites,
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    polaridades que tomámos por certas
    durante muito tempo,
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    como aquelas entre modernidade e tradição,
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    entre Primeiro Mundo e Terceiro Mundo,
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    entre opressão e oportunidade.
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    No meio de desafios assustadores
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    que enfrentamos como comunidade global,
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    há algo nesta terceira forma de melodia
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    que faz o meu coração cantar.
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    O que mais me intriga
  • 0:57 - 1:00
    é a forma como as mulheres
    estão a fazer isto,
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    apesar de um conjunto de paradoxos
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    que são tão frustrantes como fascinantes.
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    Porque é que, por um lado,
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    as mulheres são cruelmente
    oprimidas pelas práticas culturais
  • 1:10 - 1:12
    e por outro, no entanto,
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    são quem preserva as culturas
    na maior parte das sociedades?
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    O "hijab" ou o lenço da cabeça
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    será um símbolo de submissão
    ou de resistência?
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    Quando tantas mulheres e raparigas
  • 1:24 - 1:28
    são espancadas, violadas,
    mutiladas, diariamente,
  • 1:28 - 1:30
    em nome de todo o tipo de causas
  • 1:30 - 1:32
    — honra, religião, nacionalidade —
  • 1:32 - 1:35
    o que é que permite
    que as mulheres replantem árvores,
  • 1:35 - 1:37
    reconstruam sociedades,
  • 1:37 - 1:39
    liderem movimentos radicais não violentos
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    para uma mudança social?
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    São mulheres diferentes
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    as que praticam a preservação
    e a radicalização?
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    Ou são uma só?
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    Seremos nós culpadas,
    como nos recordou Chimamanda Adichie
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    na conferência de TED em Oxford,
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    por assumirmos que há apenas uma história
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    da luta das mulheres pelos seus direitos
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    quando, de facto, há muitas?
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    E o que é que os homens
    têm a ver com isso?
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    Uma boa parte da minha vida
    tem sido uma busca
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    de respostas a estas perguntas.
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    Levou-me a correr mundo
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    e apresentou-me a pessoas maravilhosas.
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    Durante isso, reuni alguns fragmentos
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    que me ajudaram
    a solucionar o quebra cabeças.
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    Entre aqueles que me ajudaram
    a abrir os olhos
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    a uma terceira forma
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    estão uma devota muçulmana
    no Afeganistão,
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    um grupo musical de lésbicas na Croácia
  • 2:29 - 2:32
    e uma quebradora de tabus na Libéria.
  • 2:32 - 2:34
    Estou em dívida para com elas,
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    assim como para com os meus pais,
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    que devido a alguns erros
    na sua vida anterior,
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    foram abençoados
    com três filhas nesta vida.
  • 2:42 - 2:45
    E por razões igualmente
    pouco claras para mim,
  • 2:45 - 2:47
    parecem extremamente
    orgulhosos de nós três.
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    Nasci e criei-me aqui na Índia
  • 2:50 - 2:52
    e aprendi desde tenra idade
  • 2:52 - 2:55
    a desconfiar profundamente das tias e tios
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    que se abaixavam, davam-nos
    uma palmadinha na cabeça
  • 2:58 - 3:00
    e depois diziam aos meus pais,
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    sem problema nenhum:
  • 3:02 - 3:04
    "Coitadinhos. Vocês só têm três filhas.
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    "Mas são novos, podem tentar outra vez."
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    O meu sentido de indignação
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    sobre os direitos das mulheres
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    atingiu o ponto de ebulição
    quando eu tinha uns 11 anos.
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    A minha tia, uma mulher
    extremamente bem-falante e brilhante,
  • 3:20 - 3:22
    tinha enviuvado cedo.
  • 3:22 - 3:25
    Um rebanho de parentes
    caíram-lhe em cima.
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    Tiraram-lhe o sari colorido.
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    Fizeram-na vestir um sari branco.
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    Tiraram-lhe o "bindi" da testa.
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    Partiram-lhe as pulseiras.
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    A filha dela, Rani,
    uns anos mais velha que eu,
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    sentou-se ao colo dela, confusa,
  • 3:42 - 3:45
    sem saber o que acontecera
    àquela mulher confiante
  • 3:45 - 3:47
    que outrora conhecera como mãe.
  • 3:47 - 3:51
    Naquela noite, ouvi a minha mãe
    implorar ao meu pai:
  • 3:51 - 3:54
    "Por favor faz alguma coisa Ramu.
    Não podes intervir?"
  • 3:54 - 3:58
    E o meu pai, em voz baixa, murmurou:
  • 3:58 - 4:01
    "Eu sou só o irmão mais novo,
    não há nada que possa fazer.
  • 4:01 - 4:03
    "Isto é a tradição"
  • 4:04 - 4:06
    Foi nessa noite que aprendi as regras
  • 4:06 - 4:09
    do que significa ser mulher neste mundo.
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    Não são as mulheres que fazem estas regras
  • 4:11 - 4:13
    mas elas definem-nos
  • 4:13 - 4:16
    e definem as nossas oportunidades
    e as nossas hipóteses.
  • 4:16 - 4:18
    Os homens também
    são afetados por estas regras.
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    O meu pai, que lutou em três guerras,
  • 4:22 - 4:26
    não pôde salvar a própria irmã
    daquele sofrimento.
  • 4:31 - 4:32
    Aos 18 anos, portanto,
  • 4:32 - 4:34
    sob a excelente tutela da minha mãe,
  • 4:34 - 4:38
    eu era, como devem esperar,
    abertamente feminista.
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    Nas ruas a entoar:
  • 4:40 - 4:42
    [Hindi]
  • 4:42 - 4:44
    [Hindi]
  • 4:45 - 4:47
    Nós somos as mulheres da Índia.
  • 4:47 - 4:49
    Não somos flores,
    somos faíscas de mudança.
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    Quando cheguei a Pequim, em 1995,
  • 4:52 - 4:54
    para mim estava claro que a única maneira
  • 4:54 - 4:57
    de alcançar igualdade de género
  • 4:57 - 5:00
    era derrubando séculos
    de tradição opressiva.
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    Pouco depois de voltar de Pequim,
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    aproveitei a oportunidade de trabalhar
    para esta maravilhosa organização,
  • 5:06 - 5:08
    fundada por mulheres,
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    para apoiar organizações
    de direitos da mulher em todo o mundo.
  • 5:12 - 5:14
    Mas depois de uns escassos
    seis meses no meu novo trabalho
  • 5:15 - 5:16
    conheci uma mulher
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    que me forçou a questionar
    todas as minhas premissas.
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    Chama-se Sakena Yacoobi.
  • 5:21 - 5:23
    [Muçulmana devota]
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    Ela entrou no meu escritório
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    numa época em que, nos EUA,
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    ninguém sabia onde era o Afeganistão.
  • 5:32 - 5:35
    E disse-me: "O problema não é a burka."
  • 5:35 - 5:38
    Ela era a defensora
    dos direitos das mulheres
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    mais determinada que eu já ouvira.
  • 5:40 - 5:42
    Disse-me que as mulheres
    tinham escolas clandestinas
  • 5:42 - 5:44
    nas suas comunidades, no Afeganistão
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    e que a organização dela,
    o Instituto Afegão de Aprendizagem,
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    tinha aberto uma escola no Paquistão.
  • 5:50 - 5:54
    E disse: "A primeira coisa
    que qualquer muçulmano sabe
  • 5:54 - 5:57
    "é que o Corão requer
  • 5:57 - 6:00
    "e apoia fortemente a alfabetização.
  • 6:00 - 6:04
    "O profeta queria que cada crente
    conseguisse ler o Corão por si mesmo."
  • 6:05 - 6:06
    Eu tinha ouvido bem?
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    Era uma defensora
    dos direitos das mulheres
  • 6:09 - 6:11
    a invocar a religião?
  • 6:11 - 6:13
    Mas Sakena desafia etiquetas.
  • 6:13 - 6:16
    Usa sempre um lenço na cabeça
  • 6:16 - 6:18
    mas passeei com ela ao longo da praia
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    e ela tinha o seu longo cabelo
    a voar na brisa.
  • 6:21 - 6:23
    Começa cada lição com uma oração
  • 6:24 - 6:26
    mas é uma mulher solteira, combativa,
  • 6:26 - 6:28
    economicamente independente
  • 6:28 - 6:31
    num país onde as raparigas
    se casam aos 12 anos.
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    Também é imensamente pragmática.
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    "Este lenço da cabeça
    e estas roupas", diz ela,
  • 6:38 - 6:41
    "dão-me liberdade para fazer o que preciso
  • 6:41 - 6:44
    "para falar com aqueles
    cujo apoio e assistência
  • 6:44 - 6:46
    "são essenciais para este trabalho.
  • 6:46 - 6:49
    "Quando tive de abrir a escola
    no campo de refugiados
  • 6:49 - 6:50
    "fui ter com o imã
  • 6:50 - 6:52
    "e disse-lhe: 'Sou crente.
  • 6:52 - 6:55
    " 'As mulheres e as crianças
    nestas terríveis condições
  • 6:55 - 6:58
    " 'precisam da sua fé para sobreviver'."
  • 6:58 - 7:00
    Ela sorri com malícia.
  • 7:00 - 7:02
    "Ele ficou lisonjeado.
  • 7:02 - 7:05
    "Começou a vir ao meu centro
    duas vezes por semana
  • 7:05 - 7:07
    "porque as mulheres não podiam
    ir à mesquita.
  • 7:07 - 7:09
    "Depois de ele sair,
  • 7:09 - 7:11
    "as mulheres e as crianças ficavam.
  • 7:11 - 7:13
    "Começámos com
    uma pequena aula de alfabetização
  • 7:13 - 7:15
    "para ler o Corão,
  • 7:15 - 7:18
    "depois uma aula de matemática,
    depois inglês e depois computador.
  • 7:18 - 7:21
    "Passadas umas semanas,
    toda a gente do campo de refugiados
  • 7:21 - 7:23
    "estava nas nossas aulas".
  • 7:24 - 7:26
    Sakena é professora
  • 7:26 - 7:29
    num tempo em que ensinar mulheres
  • 7:29 - 7:31
    é algo perigoso no Afeganistão.
  • 7:31 - 7:34
    Ela está na lista de alvos dos Talibãs.
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    Preocupo-me com ela cada vez
    que viaja para aquele país.
  • 7:37 - 7:40
    Ela encolhe os ombros quando
    lhe faço perguntas sobre a segurança.
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    "Kavita jaan, não podemos
    permitir-nos ter medo.
  • 7:43 - 7:45
    "Olha para aquelas meninas
    que voltam para a escola
  • 7:45 - 7:47
    "quando lhes atiram ácido à cara."
  • 7:47 - 7:49
    Eu sorrio e aceno com a cabeça,
  • 7:49 - 7:52
    percebendo que estou a ver
    mulheres e raparigas
  • 7:52 - 7:54
    a usar as suas tradições
    e práticas religiosas,
  • 7:54 - 7:56
    transformando-as em instrumentos
  • 7:56 - 7:59
    de oposição e de oportunidade.
  • 7:59 - 8:01
    É o caminho delas
  • 8:01 - 8:05
    e vai na direção de um Afeganistão
    que será diferente.
  • 8:06 - 8:10
    Ser diferente é algo que as mulheres
    de Lesbor em Zagreb, na Croácia
  • 8:10 - 8:12
    conhecem demasiado bem.
  • 8:12 - 8:16
    Ser lésbica, homossexual
  • 8:16 - 8:20
    na maior parte do mundo,
    incluindo aqui, no nosso país, na Índia,
  • 8:20 - 8:22
    é ocupar um lugar
    de imenso desconforto
  • 8:22 - 8:24
    e preconceito extremo.
  • 8:25 - 8:27
    Em sociedades pós-guerras
    como a Croácia,
  • 8:27 - 8:30
    onde o hipernacionalismo
    e a religiosidade
  • 8:30 - 8:32
    criaram um ambiente insuportável
  • 8:32 - 8:36
    para quem possa ser considerado
    um pária da sociedade.
  • 8:36 - 8:38
    Então, entrar num grupo
    de lésbicas assumidas,
  • 8:38 - 8:41
    raparigas que adoram música antiga
  • 8:41 - 8:43
    que outrora se espalhou naquela região
  • 8:43 - 8:45
    da Macedónia à Bósnia,
  • 8:45 - 8:47
    da Sérvia à Eslovénia.
  • 8:47 - 8:50
    Estas cantoras de "folk"
    conheceram-se na universidade,
  • 8:50 - 8:52
    num curso de estudos de género.
  • 8:52 - 8:54
    Muitas andam pelos 20 anos,
    algumas são mães.
  • 8:54 - 8:57
    Muitas delas lutaram para
    sair do armário nas suas comunidades,
  • 8:57 - 9:00
    em famílias em que as crenças religiosas
    tornam difícil aceitar
  • 9:01 - 9:02
    que as filhas não estão doentes,
  • 9:02 - 9:05
    são apenas "gays".
  • 9:05 - 9:07
    Como diz Leah,
    uma das fundadoras do grupo:
  • 9:07 - 9:10
    "Eu gosto muito de música tradicional,
  • 9:10 - 9:12
    "também gosto de 'rock and roll'.
  • 9:12 - 9:14
    "Então fundimos as duas coisas.
  • 9:14 - 9:16
    "Eu vejo a música tradicional
    como um tipo de rebelião,
  • 9:16 - 9:19
    "em que as pessoas podem
    ter voz própria,
  • 9:19 - 9:21
    "especialmente nas canções tradicionais
  • 9:21 - 9:24
    "de outras partes da
    antiga República da Jugoslávia.
  • 9:24 - 9:26
    "Depois da guerra,
    muitas destas canções perderam-se
  • 9:26 - 9:29
    "mas elas fazem parte da nossa infância
    e da nossa história
  • 9:29 - 9:30
    "e não deveríamos esquecê-las."
  • 9:30 - 9:33
    De forma pouco provável,
    este coro LGBT
  • 9:33 - 9:36
    demostrou como as mulheres
  • 9:36 - 9:38
    estão a investir na tradição
    para criar a mudança,
  • 9:38 - 9:41
    como alquimistas, transformando
    a discórdia em harmonia.
  • 9:41 - 9:45
    O repertório inclui
    o hino nacional croata,
  • 9:45 - 9:48
    uma canção de amor bósnia
    e duetos sérvios.
  • 9:49 - 9:51
    E Leah acrescenta com um sorriso:
  • 9:51 - 9:54
    "Kavita, nós estamos especialmente
    orgulhosas da nossa música de Natal
  • 9:54 - 9:57
    "porque demostra que estamos abertas
    a práticas religiosas
  • 9:57 - 10:01
    "apesar de a Igreja Católica
    odiar os LGBT."
  • 10:01 - 10:03
    Os concertos delas atraem
  • 10:03 - 10:05
    gente das suas comunidades,
  • 10:05 - 10:07
    mas também de uma geração mais velha,
  • 10:07 - 10:10
    uma geração que talvez seja desconfiada
    quanto à homossexualidade
  • 10:11 - 10:14
    mas é nostálgica da música
    e do passado que elas representam.
  • 10:15 - 10:17
    Um pai, que inicialmente
    tinha rejeitado a filha,
  • 10:17 - 10:19
    por "sair do armário"
    neste tipo de coro,
  • 10:19 - 10:21
    agora escreve-lhes canções.
  • 10:21 - 10:23
    Na Idade Média, os trovadores
  • 10:23 - 10:25
    viajavam pela região
  • 10:25 - 10:28
    cantando os seus contos
    e partilhando versos.
  • 10:28 - 10:31
    As Lesbor viajam assim pelos Balcãs,
  • 10:31 - 10:33
    cantando, unindo pessoas divididas
  • 10:33 - 10:36
    pela religião, pela nacionalidade
    e pela língua.
  • 10:36 - 10:38
    Bósnios, croatas e sérvios
  • 10:38 - 10:41
    encontram um raro espaço partilhado
    de orgulho na sua história
  • 10:41 - 10:43
    e as Lesbor recordam-lhes
  • 10:43 - 10:46
    que as canções que um grupo
    reclama como sendo só dele
  • 10:46 - 10:48
    na verdade pertencem a todos.
  • 10:49 - 10:50
    (Cantos)
  • 11:08 - 11:11
    Ontem, Mallika Sarabhai mostrou-nos
  • 11:11 - 11:12
    que a música pode criar um mundo
  • 11:12 - 11:14
    mais recetivo a diferenças
  • 11:14 - 11:17
    do que aquele que nos foi dado.
  • 11:17 - 11:19
    O mundo que foi dado a Leymah Gbowee
  • 11:19 - 11:21
    foi um mundo em guerra.
  • 11:21 - 11:25
    A Libéria foi dilacerada
    por conflitos civis durante décadas.
  • 11:25 - 11:28
    Leymah não era ativista,
    era mãe de três filhos.
  • 11:28 - 11:30
    Mas estava doente de preocupação.
  • 11:30 - 11:33
    Preocupava-a que o seu filho
    fosse sequestrado
  • 11:33 - 11:35
    e levado para ser uma criança soldado,
  • 11:35 - 11:37
    preocupava-a que as suas filhas
    fossem violadas,
  • 11:37 - 11:39
    preocupava-se pela vida deles.
  • 11:39 - 11:41
    Uma noite, teve um sonho.
  • 11:41 - 11:44
    Sonhou que ela
    e milhares de outras mulheres
  • 11:44 - 11:46
    acabavam com
    o derramamento de sangu
  • 11:46 - 11:49
    Na manhã seguinte, na igreja,
    perguntou aos outros como se sentiam.
  • 11:49 - 11:51
    Estavam todos cansados da luta.
  • 11:51 - 11:54
    "Precisamos de paz e precisamos
    que os nossos líderes saibam
  • 11:54 - 11:56
    "que não vamos descansar até haver paz."
  • 11:56 - 11:59
    Entre os amigos de Leymah havia
    uma polícia que era muçulmana.
  • 11:59 - 12:02
    Ela prometeu levantar a questão
    na sua comunidade.
  • 12:02 - 12:04
    No sermão da sexta-feira seguinte,
  • 12:04 - 12:06
    as mulheres que se sentavam
    na sala lateral da mesquita
  • 12:06 - 12:10
    começaram a partilhar as suas preocupações
    acerca do estado da situação.
  • 12:10 - 12:12
    "O que importa?" — disseram.
  • 12:12 - 12:14
    "Uma bala não distingue
    entre um muçulmano e um cristão."
  • 12:14 - 12:16
    Este pequeno grupo de mulheres,
  • 12:16 - 12:19
    estavam determinadas a acabar com a guerra
  • 12:19 - 12:21
    e escolheram usar as suas tradições
    com um objetivo:
  • 12:21 - 12:23
    As mulheres liberianas geralmente
  • 12:23 - 12:25
    usam muitas joias e roupas coloridas.
  • 12:25 - 12:29
    Mas não, para o protesto vestiram-se
    todas de branco, sem maquilhagem.
  • 12:29 - 12:31
    Como Leymah disse: "Vestimos de branco
  • 12:31 - 12:33
    "dizendo que saímos pela paz."
  • 12:33 - 12:34
    Puseram-se do lado da estrada
  • 12:34 - 12:37
    por onde a comitiva
    do presidente Charles Taylor
  • 12:37 - 12:38
    passava todos os dias.
  • 12:38 - 12:39
    Ficaram ali durante semanas,
  • 12:39 - 12:43
    primeiro só 10, depois 20, depois 50,
    depois centenas de mulheres,
  • 12:43 - 12:45
    vestidas de branco, cantando, dançando,
  • 12:45 - 12:48
    dizendo que tinham saído à rua pela paz.
  • 12:48 - 12:50
    Por fim, as forças da oposição na Libéria
  • 12:50 - 12:53
    foram forçados a manter
    negociações de paz no Gana.
  • 12:54 - 12:57
    As negociações de paz
    arrastaram-se por muito tempo.
  • 12:57 - 12:59
    Leymah e as suas irmãs estavam fartas.
  • 12:59 - 13:02
    Com os fundos restantes,
    levaram um pequeno grupo de mulheres
  • 13:02 - 13:04
    ao local onde decorriam
    as negociações de paz
  • 13:04 - 13:06
    e cercaram o edifício.
  • 13:06 - 13:08
    Num vídeo da CNN agora famoso,
  • 13:08 - 13:11
    podemos vê-las sentadas no chão,
    de braços unidos.
  • 13:11 - 13:14
    Conhecemos isto na Índia.
    Chama-se um [Hindi].
  • 13:14 - 13:16
    Depois as coisas ficaram tensas.
  • 13:16 - 13:19
    A polícia foi chamada ao local
    para afastar as mulheres.
  • 13:19 - 13:22
    Quando o oficial superior
    se aproxima com um bastão
  • 13:22 - 13:24
    Leymah ergue-se deliberadamente,
  • 13:24 - 13:26
    leva os braços à cabeça
  • 13:26 - 13:28
    e começa, muito lentamente,
  • 13:28 - 13:31
    a desatar o lenço que lhe tapa o cabelo.
  • 13:31 - 13:34
    Pode ver-se a cara do polícia,
  • 13:34 - 13:37
    parece incomodado. Afasta-se.
  • 13:37 - 13:40
    Logo depois a polícia desaparece.
  • 13:41 - 13:43
    Leymah disse-me mais tarde:
  • 13:43 - 13:46
    "É um tabu sabes? Na África Ocidental,
  • 13:46 - 13:49
    "se uma mulher mais velha
    se despir à frente de um homem
  • 13:49 - 13:51
    "porque ela quer,
  • 13:51 - 13:53
    "a família do homem é amaldiçoada."
  • 13:53 - 13:55
    (Risos)
  • 13:55 - 13:57
    (Aplausos)
  • 13:57 - 14:00
    Ela disse: "Não sei se o fez
    porque acreditava
  • 14:00 - 14:03
    "mas ele percebeu
    que não nos íamos embora.
  • 14:03 - 14:06
    Não nos íamos embora, enquanto
    o acordo de paz não fosse assinado."
  • 14:06 - 14:08
    E o acordo de paz foi assinado.
  • 14:08 - 14:09
    As mulheres da Libéria
  • 14:09 - 14:12
    mobilizaram-se em apoio
    a Ellen Johnson Sirleaf,
  • 14:12 - 14:14
    uma mulher que também
    quebrou alguns tabus
  • 14:14 - 14:17
    tornando-se na primeira mulher
    a ser eleita chefe de estado
  • 14:17 - 14:20
    em África durante muitos anos.
  • 14:20 - 14:23
    Quando fez o seu discurso presidencial
  • 14:23 - 14:25
    agradeceu a estas valentes
    mulheres da Libéria
  • 14:25 - 14:28
    que lhe permitiram vencer
    contra uma estrela do futebol
  • 14:28 - 14:30
    do futebol europeu, não o americano,
  • 14:30 - 14:32
    nem mais nem menos.
  • 14:33 - 14:36
    As mulheres como Sakena,
    como Leah, e como Leymah
  • 14:36 - 14:39
    tornaram-me mais humilde, mudaram-me
  • 14:39 - 14:42
    e fizeram-me entender
    que não devia precipitar-me
  • 14:42 - 14:46
    ao fazer presunções de qualquer tipo.
  • 14:46 - 14:48
    Também me salvaram
    da minha raiva justiceira
  • 14:48 - 14:52
    oferecendo-me o conhecimento
    desta "terceira" maneira.
  • 14:52 - 14:54
    Uma ativista filipina disse-me um dia:
  • 14:54 - 14:56
    "Como é que cozinhas um bolo de arroz?
  • 14:56 - 14:59
    "Com calor na base e calor no topo."
  • 14:59 - 15:01
    Os protestos, as marchas,
  • 15:01 - 15:03
    a posição intransigente
  • 15:03 - 15:07
    de que os direitos das mulheres
    são direitos humanos, ponto final,
  • 15:07 - 15:09
    tudo isso é o calor da base.
  • 15:09 - 15:11
    É o Malcom X, as sufragistas
  • 15:11 - 15:13
    e os desfiles de orgulho "gay".
  • 15:13 - 15:15
    Mas também precisamos de calor no topo.
  • 15:15 - 15:18
    E em quase todas as partes do mundo,
  • 15:18 - 15:21
    esse topo ainda é controlado pelos homens.
  • 15:21 - 15:23
    Então, para parafrasear Marx
  • 15:23 - 15:27
    "As mulheres fazem a mudança
    mas não em circunstâncias da sua escolha."
  • 15:27 - 15:29
    Elas têm de negociar.
  • 15:29 - 15:32
    Elas têm de subverter a tradição
    que em tempos as silenciou
  • 15:32 - 15:35
    para dar voz a novas aspirações.
  • 15:35 - 15:38
    E precisam de aliados
    nas suas comunidades.
  • 15:38 - 15:40
    Aliados como o imã,
  • 15:40 - 15:42
    aliados como o pai
    que agora escreve canções
  • 15:42 - 15:45
    para um grupo de lésbicas na Croácia,
  • 15:45 - 15:48
    aliados como o polícia
    que honrou o tabu e recuou,
  • 15:48 - 15:50
    aliados como o meu pai,
  • 15:50 - 15:52
    que não pôde ajudar a irmã
  • 15:52 - 15:55
    mas ajudou as três filhas
    a perseguir os seus sonhos.
  • 15:55 - 15:57
    Talvez isto se deva ao feminismo,
  • 15:57 - 16:00
    que, ao contrário
    da maioria de movimentos sociais,
  • 16:00 - 16:02
    não é uma luta
    contra um opressor diferente,
  • 16:02 - 16:04
    contra a classe dominante
  • 16:04 - 16:07
    contra os ocupantes ou os colonizadores.
  • 16:07 - 16:10
    É uma luta contra crenças e suposições
    profundamente entranhadas
  • 16:10 - 16:13
    que nós mulheres, demasiadas vezes,
  • 16:13 - 16:15
    também defendemos.
  • 16:15 - 16:18
    E talvez este seja
    o derradeiro presente do feminismo,
  • 16:18 - 16:21
    que o pessoal é, na realidade, político.
  • 16:21 - 16:24
    Então, como Eleanor Roosevelt
    disse uma vez sobre os direitos humanos,
  • 16:24 - 16:27
    também é verdade para
    a igualdade de género,
  • 16:27 - 16:29
    que começa em lugares pequenos,
    perto de casa.
  • 16:29 - 16:31
    Nas ruas, sim
  • 16:31 - 16:34
    mas também em negociações
    à mesa da cozinha
  • 16:34 - 16:36
    e na cama conjugal,
  • 16:36 - 16:38
    em relações entre amantes e com os pais
  • 16:38 - 16:40
    e com irmãs e amigos.
  • 16:42 - 16:44
    E depois...
  • 16:44 - 16:46
    depois percebemos que, ao integrarem
  • 16:46 - 16:50
    aspetos da tradição
    e da comunidade nas suas lutas,
  • 16:50 - 16:53
    mulheres como Sakena, Leah e Leymah,
  • 16:53 - 16:56
    mas também mulheres
    como Sonia Gandhi, aqui na Índia,
  • 16:56 - 16:58
    Michelle Bachelet no Chile
  • 16:58 - 17:01
    e Shirin Ebadi no Irão,
  • 17:01 - 17:03
    estão a fazer algo mais.
  • 17:03 - 17:05
    Estão a desafiar a própria noção
  • 17:05 - 17:08
    de modelos de desenvolvimento ocidentais.
  • 17:08 - 17:09
    Estão a dizer:
  • 17:09 - 17:12
    "Não temos que ser como vocês
    para criar mudança.
  • 17:13 - 17:16
    "Podemos usar um sari ou um 'hijab',
  • 17:16 - 17:18
    "calças ou uma túnica,
  • 17:18 - 17:21
    "e podemos ser líderes de partidos,
    presidentes
  • 17:21 - 17:23
    "e defensoras dos direitos humanos.
  • 17:23 - 17:26
    "Podemos usar a nossa tradição
    para navegar pela mudança.
  • 17:26 - 17:29
    "Podemos desmilitarizar sociedades
  • 17:29 - 17:32
    "e, em alternativa, injetar recursos
  • 17:32 - 17:35
    "em reservatórios de segurança genuína."
  • 17:35 - 17:38
    É nestas pequenas histórias,
  • 17:38 - 17:40
    nestas histórias individuais,
  • 17:40 - 17:42
    que eu vejo uma epopeia radical
    a ser escrita
  • 17:42 - 17:44
    por mulheres em todo o mundo.
  • 17:44 - 17:46
    É nestas linhas
  • 17:46 - 17:49
    que se está a tecer um tecido resiliente
  • 17:49 - 17:51
    que vai sustentar comunidades,
  • 17:51 - 17:53
    que eu encontro esperança.
  • 17:53 - 17:55
    E se o meu coração canta
  • 17:55 - 17:58
    é porque nestes pequenos fragmentos,
  • 17:58 - 18:03
    às vezes, vislumbramos
    um mundo totalmente novo.
  • 18:04 - 18:07
    E definitivamente, ele está a caminho.
  • 18:07 - 18:08
    Obrigada.
  • 18:08 - 18:12
    (Aplausos)
Title:
Mulheres radicais que mantêm a tradição
Speaker:
Kavita Ramdas
Description:

Qual é o aspeto de uma mulher com poder? Poderá usar uma burca, um "hijab", um sari? Kavita Ramdas fala sobre três mulheres notáveis que respeitam a sua herança cultural enquanto trabalham para reformar as suas tradições opressivas .

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English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
18:19

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