O homem invisível

Poderá uma pessoa desaparecer à vista de todos? É essa a pergunta que a notável obra de Liu Bolin parece fazer. O artista de Pequim é por vezes apelidado de "O Homem Invisível" porque em quase toda a sua arte, Bolin está na frente e no centro, mas totalmente invisível. Pretende chamar a atenção para questões sociais e políticas, dissolvendo-se no fundo.

Liu Bolin: (em chinês)

Intérprete: Tornando-me invisível,
tento explorar e questionar

a relação contraditória que,
frequentemente, existe

entre a nossa civilização
e a sua evolução.

LB (em chinês):
Esta é a minha primeira obra,

criada em novembro de 2005.

Este é o Campo Internacional de Arte
de Pequim, onde trabalhei

antes de o governo o ter desmantelado.

Usei este trabalho para exprimir
o meu descontentamento.

Também quis usar este trabalho
para as pessoas prestarem atenção

às condições de vida dos artistas
e à sua liberdade criativa.

Entretanto, desde o início, esta série
tem tido um espírito de protesto,

de reflexão e de ausência de compromisso.

Quando aplico maquilhagem,
utilizo um método de franco-atirador

para melhor me proteger

e detetar o inimigo, como ele faz.

(Risos)

Depois de terminar esta série
de protestos,

comecei a questionar
porque é que é este o meu destino,

e percebi que não sou só eu.

Todos os chineses estão
tão confusos como eu.

Como veem, estes trabalhos

são sobre o planeamento familiar,

as eleições de acordo com a lei

e a propaganda da instituição
do Congresso Popular.

Este trabalho chama-se Xia Gang.

Xia Gang é um eufemismo para " despedido".

Refere-se às pessoas que perderam
o emprego durante a transição da China

de uma economia planeada
para uma economia de mercado.

De 1998 a 2000,

mais de 21 milhões de pessoas
perderam o emprego na China.

As seis pessoas nesta foto

são trabalhadores Xia Gang.

Tornei-os invisíveis na oficina deserta
onde viveram e trabalharam toda a vida.

Na parede por detrás deles,
está o slogan da Revolução Cultural:

"A força central que faz avançar
a nossa causa

"é o Partido Comunista Chinês".

Durante meio mês, procurei estas pessoas
para participarem no meu trabalho.

Só vemos seis homens nesta foto,
mas eles escondem

todas as pessoas que foram despedidas
e que se tornaram invisíveis.

Esta obra chama-se "O Estúdio".

Esta primavera,

tive a oportunidade,
durante a minha exposição em Paris,

de fazer um trabalho
nos estúdios de France 3.

Agarrei em fotos da imprensa do dia.

Uma é sobre a guerra no Médio Oriente

e outra é sobre uma manifestação
pública em França.

Descobri que todas as culturas
têm contradições irreconciliáveis.

(Em chinês)

Intérprete: Este é um esforço conjunto
entre mim e o artista francês JR.

(Aplausos)

LB: (em chinês)

Intérprete: Tentei desaparecer
aos olhos de JR

mas o problema é que JR
só usa modelos com grandes olhos.

Tentei aumentar os meus olhos
com os dedos.

Mas, infelizmente, não funcionou,
os meus olhos mantiveram-se pequenos.

LB (Em chinês): Este é sobre a memória
do 11 de setembro.

É um avião no Rio Hudson.

Um "graffiti" de Kenny Scharf.

(Risos)

Aqui é Veneza, na Itália.

Como as temperaturas mundiais
aumentam, o nível do mar aumenta

e diz-se que Veneza vai desaparecer
nas próximas décadas.

Intérprete:
Esta é a antiga cidade de Pompeia.

LB (Em chinês):
Esta é a Galeria Borghese, em Roma.

Quando trabalho numa nova obra,

presto mais atenção à expressão de ideias.

Por exemplo, porque é que
me torno invisível?

E se me tornasse invisível aqui,
o que é que as pessoas pensariam?

(Em chinês)

Intérprete: Esta chama-se
" 'Noodles' Instantâneas".

(Risos)

LB (Em chinês): Em agosto de 2012,

encontraram-se fósforos prejudiciais

nas embalagens de "noodles" instantâneas

em todas as marcas conhecidas
nos supermercados da China.

Estes fósforos podem causar o cancro.

Para criar esta obra,

comprei muitas embalagens
de "noodles" instantâneas

e coloquei-as no meu estúdio,
de modo a parecer um supermercado.

A minha função é ficar ali,
tentando não me mexer,

colocar a câmara, coordenar-me
com o meu assistente

e desenhar as cores e as formas
por detrás do meu corpo,

uma em frente do meu corpo.

Se o fundo for simples, normalmente
tenho de me manter ali

durante três a quatro horas.

O fundo desta obra é mais complexo,

portanto, preciso de quatro dias
para preparação.

Este é o fato que usei
quando fiz a foto do supermercado.

Intérprete: Este é o fato que usei
quando fiz a foto do supermercado

Não há aqui nenhum Photoshop.

(Risos)

LB (Em chinês): Estas obras estão
na memória cultural da China.

Esta refere-se
à segurança alimentar na China.

Os alimentos pouco seguros
prejudicam a saúde das pessoas,

e um dilúvio de revistas confundem
o espírito das pessoas.

(Risos)

As próximas obras mostram
como me tornei invisível

nas revistas de diversas línguas,

em vários países e em diversas alturas.

Penso que, na arte, a atitude do artista
é o elemento mais importante.

Para uma obra de arte
tocar qualquer pessoa,

tem que ser o resultado não só da técnica,

mas também do pensamento do artista
e da sua luta na vida.

As lutas repetidas na vida
criam a obra de arte,

seja qual for a sua forma.

(Música)

É tudo o que tenho a dizer.

Obrigado

(Aplausos)