Histórias de um educador selvagem | Juan López-Aranguren | TEDxMadrid
-
0:15 - 0:18No ensino, as perguntas
não são bem-vindas. -
0:18 - 0:21Os professores não nos ensinam
a questionar. -
0:21 - 0:24Dizem-nos como são as coisas
e como devemos responder. -
0:24 - 0:27Na minha vida, sempre houve espaço
para as perguntas. -
0:27 - 0:31Tanto as que eu faço a mim mesmo
como as que os outros me fazem. -
0:31 - 0:34Quando me convidaram para falar
sobre o ensino informal, -
0:34 - 0:39fiquei com uma pergunta na cabeça
que queria partilhar convosco. -
0:39 - 0:44Porque é que, sempre que detêm
a equipa A, a fecham numa garagem? -
0:44 - 0:48Estou certo de que vocês
também já pensaram nisso. -
0:48 - 0:52Para os mais jovens,
a Equipa A é uma série dos anos 80 -
0:52 - 0:55em que um grupo muito diverso
de ex-militares -
0:55 - 0:58ajudavam uma comunidade em perigo.
-
0:58 - 1:01Em todos os episódios eram capturados
-
1:01 - 1:03e metidos num celeiro,
num armazém ou numa garagem -
1:03 - 1:04e, em todos os episódios,
-
1:04 - 1:08utilizavam as ferramentas e os materiais
que encontravam na garagem para escapar. -
1:08 - 1:11Eu pensava: "Porque é que os metem
outra vez numa garagem? -
1:11 - 1:14"Não veem que ela está cheia
de coisas fantásticas?" -
1:14 - 1:15Mas os maus nunca viam.
-
1:15 - 1:19Para eles era um sítio onde deixavam
objetos inúteis, coisas abandonadas, -
1:19 - 1:22um sítio onde deixar lixo.
-
1:22 - 1:27Há pouco tempo, li que o lixo
é o produto dos limites da imaginação, -
1:27 - 1:30Essa é a diferença
entre os maus e a Equipa A, -
1:30 - 1:33em que os maus viam
uma pilha abstrata de objetos, -
1:33 - 1:36e a Equipa A via um paraíso
cheio de possibilidades. -
1:36 - 1:37Suponho que, por isso, anos depois,
-
1:37 - 1:41o estúdio, onde os meus colegas
e eu trabalhamos, tem este aspeto. -
1:41 - 1:44Se observarem bem, alguns deles
podiam ter entrado naquela série. -
1:44 - 1:45(Risos)
-
1:45 - 1:48O caso é que, ao terminar cada episódio,
-
1:48 - 1:50o líder da Equipa A
punha um charuto entre os dentes -
1:50 - 1:52e dizia, elegantemente:
-
1:52 - 1:54"Adoro quando um plano corre bem".
-
1:54 - 1:56E eu pensava: "Mas que plano?"
-
1:56 - 1:58Apanham-nos, caem numa emboscada,
-
1:58 - 2:01fecham-nos numa garagem
e escapam quase por milagre. -
2:01 - 2:03Mas quem tinha razão era Isaac Asimov,
-
2:03 - 2:07um outro tipo cheio
de perguntas, que dizia: -
2:07 - 2:11"Para triunfar,
um mero plano é insuficiente. -
2:11 - 2:14"É necessário improvisação".
-
2:14 - 2:17Se Isaac Asimov dizia isso,
devia ter razão. -
2:17 - 2:21Acontece que era isso mesmo
o que a Equipa A fazia: improvisar. -
2:21 - 2:25Eram capazes de reunir
as suas capacidades, as suas aptidões, -
2:25 - 2:31os seus valores, e combiná-los
para enfrentarem diversas situações. -
2:31 - 2:34Eram capazes de pôr em prática
as suas competências -
2:35 - 2:38Tenho sido educador selvagem
durante quase metade da minha vida. -
2:38 - 2:40Educador porque não entendo
outra forma de vida -
2:40 - 2:43que não seja através
do ensino partilhado. -
2:43 - 2:45Selvagem porque só sei
pensar com as mãos. -
2:45 - 2:48Ou seja, refletir,
quando me ponho a fazer. -
2:48 - 2:49Perante um limite, uma barreira,
-
2:49 - 2:52a primeira coisa que penso
é como transpô-la. -
2:52 - 2:54Como faziam os bárbaros
com o muro de Adriano. -
2:54 - 2:56Tudo isto aprendi em minha casa.
-
2:56 - 2:59Os meus pais são professores
e, durante a sobremesa, -
2:59 - 3:04só falavam sobre alunos,
professores, modelos educativos... -
3:04 - 3:06Hoje, como bom filho de professores,
-
3:06 - 3:08passei a ser um aluno modelo.
-
3:08 - 3:12Terminei o ensino secundário
com distinção. -
3:13 - 3:17Entrei para a universidade
e demorei 14 anos a terminar o curso... -
3:17 - 3:18(Risos)
-
3:18 - 3:19de arquitetura.
-
3:20 - 3:22Posso agradecer aos meus pais,
-
3:22 - 3:24hoje, aqui, diante de todos,
não me ter metido na tuna, -
3:24 - 3:27nem ter sido campeão
no jogo de "mus". -
3:27 - 3:31Tive a sorte de encontrar
outros colegas -
3:31 - 3:35que, como eu, decidiram
pôr de lado o plano estabelecido, -
3:35 - 3:38improvisar e procurar outras opções.
-
3:38 - 3:40Durante esses 14 anos,
juntamente com os meus colegas, -
3:41 - 3:43levei a efeito projetos
nos quatro continentes -
3:43 - 3:46e convidaram-me para fazer
palestras e cursos -
3:46 - 3:49em universidades de todo o mundo.
-
3:49 - 3:51Como pode ser que uma universidade
-
3:51 - 3:55contrate um tipo que só tem
o título de bacharel para dar aulas? -
3:55 - 3:58É uma falha do sistema?
-
3:58 - 4:02Ou é uma forma que o sistema tem
para corrigir certas carências? -
4:03 - 4:05Voltemos à Equipa A.
-
4:05 - 4:07Podemos ser um piloto excecional,
-
4:07 - 4:11um mecânico maravilhoso,
ou disparar melhor do que Lucky Luke, -
4:11 - 4:15mas, se não formos capazes
de trabalhar em equipa, -
4:16 - 4:18detetar os problemas
e encontrar soluções criativas, -
4:19 - 4:21nunca sairemos daquela garagem.
-
4:21 - 4:23A capacidade para improvisar,
-
4:23 - 4:25pertence ao âmbito
das competências. -
4:25 - 4:28Como se adquirem essas competências?
-
4:28 - 4:29Bom, em primeiro lugar,
-
4:29 - 4:33o ensino ocorre durante toda a vida.
-
4:33 - 4:36Não começa na escola nem termina
quando acabamos um mestrado. -
4:36 - 4:39Por outras palavras,
como é que aprendemos inglês? -
4:39 - 4:41Inscrevendo-nos na escola de línguas
-
4:41 - 4:44ou arranjando uma noiva irlandesa?
-
4:44 - 4:45(Risos)
-
4:45 - 4:48Como aprendemos mecânica?
-
4:48 - 4:50Num módulo de formação profissional
-
4:50 - 4:53ou modificando a carrinha com os colegas?
-
4:53 - 4:55No fundo, é uma pergunta armadilhada.
-
4:56 - 5:00Ambas as aprendizagens
são complementares e necessárias. -
5:00 - 5:02A aprendizagem informal
-
5:02 - 5:04não é uma versão "low cost"
da aprendizagem formal. -
5:04 - 5:07A aprendizagem informal é o motor vital
-
5:07 - 5:10que nos permite articular
o desejo e a curiosidade -
5:10 - 5:13que é o que alimenta
a nossa vontade de saber. -
5:13 - 5:18Somos concebidos geneticamente
para aprender durante toda a vida. -
5:18 - 5:21A não ser que apanhemos pelo caminho
um sistema educativo perverso. -
5:22 - 5:24Como, por exemplo,
um sistema que nos obriga -
5:24 - 5:28a decorar as respostas,
em vez de nos ajudar a perguntar. -
5:29 - 5:33Podemos recuperar a ilusão
depois de atravessar estas situações? -
5:33 - 5:39Estamos acostumados a sistemas
que reúnem uma série de regras e de leis -
5:39 - 5:42através das quais se decide
o que é válido e o que não é. -
5:42 - 5:45As pessoas que não são capazes
de se adaptarem a esse sistema -
5:45 - 5:47acabam por ser rejeitadas.
-
5:47 - 5:49Será que podemos criar um sistema
-
5:49 - 5:51que se adapte
às características das pessoas -
5:52 - 5:55e que lhes permita
desenvolver todo o seu potencial? -
5:56 - 5:57Como?
-
5:57 - 6:00Ao longo destes 14 anos
como educador, -
6:00 - 6:03dei-me conta de que
é mais fácil do que parece. -
6:03 - 6:07Em primeiro lugar, temos de criar
situações de exceção. -
6:07 - 6:09Pequenos gestos
que nos tirem da rotina -
6:09 - 6:11e que nos permitam
transformar um espaço anódino -
6:12 - 6:14num espaço mágico
onde possa acontecer o inesperado. -
6:15 - 6:17Por exemplo, encher de lixo
a escola de arquitetura -
6:17 - 6:21e promover um concurso
de construção criativa, durante um dia. -
6:21 - 6:25Ou encher a Praça 2 de Maio, em Madrid,
com bolas de plástico. -
6:26 - 6:29Também pode acontecer
enchermos o pátio do Conde Duque, -
6:29 - 6:32perto daqui, com roupa em segunda mão.
-
6:32 - 6:35O surpreendente foi que,
quando as pessoas começaram a vestir-se. -
6:35 - 6:37começaram a atar as roupas
umas às outras, -
6:37 - 6:40formando umas grandes cordas
com que saltavam à corda. -
6:40 - 6:42Durante umas horas,
o pátio do Conde Duque -
6:42 - 6:44transformou-se num pátio de recreio.
-
6:44 - 6:46Não é preciso ser uma coisa
tão sofisticada. -
6:47 - 6:50Às vezes, basta pendurar um baloiço
numa avenida em São Paulo -
6:50 - 6:53para poder sentir a ausência de peso.
-
6:54 - 6:56Atenção! Não confundamos
espaços selvagens -
6:56 - 6:58com espaços domesticados.
-
6:58 - 7:00Não confundamos o zoológico com a selva,
-
7:00 - 7:03os escritórios da Google com uma oficina
-
7:03 - 7:05ou a televisão com a Internet.
-
7:05 - 7:08Nós procuramos espaços mágicos,
que nos emocionem, -
7:08 - 7:10nos surpreendam, nos estimulem,
-
7:10 - 7:13mas também onde possamos atuar,
criar, exercer atividade. -
7:13 - 7:16Espaços onde possamos trabalhar
valores universais -
7:16 - 7:17duma forma natural.
-
7:17 - 7:20Por exemplo, podemos falar de género
-
7:20 - 7:23enquanto construímos nuvens
com bolsas e cartões em segunda mão -
7:23 - 7:25para a cidade do Cairo.
-
7:26 - 7:30Também podemos falar
sobre inclusão racial -
7:30 - 7:33enquanto construímos
um oceano de plástico -
7:33 - 7:38que assinale os problemas ecológicos
nas costas da África do Sul. -
7:39 - 7:40Não é preciso ir tão longe.
-
7:40 - 7:43Aqui, no sul de Madrid,
em San Cristóbal de los Ángeles, -
7:43 - 7:45um grupo de vizinhos,
adultos, crianças, -
7:46 - 7:48anciãos, jovens, adultos,
-
7:48 - 7:51juntam-se e reconhecem
as suas capacidades, -
7:51 - 7:55enquanto recuperam um espaço abandonado
e o transformam num centro cultural -
7:55 - 7:57e, além disso, educativo.
-
7:57 - 8:01Será que podemos traduzir,
transformar estes espaços selvagens -
8:01 - 8:03em espaços organizados?
-
8:04 - 8:08Um estudo em 30 escolas da Catalunha
-
8:08 - 8:11dizia que o pátio é dos poucos locais,
senão o único, -
8:11 - 8:15que é concebido exclusivamente
para recreio e diversão das crianças -
8:15 - 8:18e que, além disso, está
dentro de um centro educativo. -
8:18 - 8:22Mais ainda, as crianças passavam
30 minutos por dia nesse recreio, -
8:22 - 8:25perfazendo 525 horas por ano,
o que era mais -
8:25 - 8:28do que Educação Cívica
ou Língua Estrangeira. -
8:28 - 8:31Quer dizer, o tempo do recreio
transformou-se -
8:31 - 8:34num espaço importantíssimo
para a formação dos alunos -
8:34 - 8:37nos centos educativos organizados.
-
8:37 - 8:38Esse mesmo estudo perguntava
-
8:38 - 8:41como podia ser que,
nos últimos 90 anos, -
8:41 - 8:44esses pátios pouco tenham evoluído.
-
8:44 - 8:47Será que podemos transformar
espaços domésticos -
8:47 - 8:49em espaços mágicos?
-
8:50 - 8:51Podemos fazer isso em conjunto?
-
8:51 - 8:55Alunos, professores,
pais, mães, administração. -
8:56 - 8:58Como o faríamos?
De que precisamos? -
8:58 - 9:01Eu aqui seguiria um pouco
a esteira da Equipa A. -
9:01 - 9:04Temos à nossa volta
quase tudo o que precisamos. -
9:04 - 9:07Por exemplo, num campo de refugiados
na Palestina, em Suf, na Jordânia, -
9:07 - 9:10juntámo-nos para, durante três dias,
-
9:10 - 9:14reutilizar lonas e pneus
e construir uma zona de recreio -
9:14 - 9:16e um espaço de sombras.
-
9:16 - 9:18Em Adis Abeba, na Etiópia,
-
9:18 - 9:22tivemos uma semana
para transformar este espaço -
9:22 - 9:25numa zona de jogos
e numa aula ao ar livre. -
9:25 - 9:27No Níger, em Niamey,
-
9:27 - 9:29um grupo de voluntários
destes centros culturais -
9:29 - 9:33juntaram-se para aprender
a desenhar e a construir -
9:33 - 9:36o primeiro pátio de recreio
público do país, -
9:36 - 9:40sem nenhuma experiência prévia,
e transformando o espaço, -
9:40 - 9:44onde, anteriormente, queimavam
resíduos, numa zona de jogos. -
9:44 - 9:48A simples transformação morfológica
dos pátios não é suficiente. -
9:49 - 9:51O modelo pedagógico
tem de estar presente. -
9:51 - 9:53Não podemos perder
uma oportunidade única -
9:53 - 9:57para desenvolver e trabalhar competências
que normalmente ficam pela margem. -
9:57 - 10:01Por exemplo,
as inteligências múltiplas, -
10:01 - 10:04a responsabilidade partilhada,
as equipas colaboradoras. -
10:04 - 10:08É isso que temos estado a fazer
estes últimos anos em colégios em Madrid. -
10:08 - 10:11Transformar o pátio
a partir desses valores. -
10:11 - 10:14Fizemos isso de Las Tablas a Caño Roto.
-
10:14 - 10:18Reparem, todos estes exemplos
que estou a mostrar -
10:18 - 10:21têm uma coisa em comum:
são objetos abstratos. -
10:22 - 10:26Porque, no final do dia,
um cesto obriga-nos a jogar basquetebol -
10:27 - 10:29e uma baliza obriga-nos a jogar futebol.
-
10:29 - 10:34Mas um bidão de 25 000 litros...
obriga-nos a pensar. -
10:34 - 10:35(Risos)
-
10:35 - 10:36E muito!
-
10:36 - 10:39Obriga-nos a imaginar.
Obriga-nos a perguntar. -
10:39 - 10:42Se me perguntarem agora
onde é que eu fecharia a Equipa A -
10:42 - 10:46para os manter ali toda a vida,
não lhes daria uma garagem. -
10:46 - 10:49Dar-lhes-ia um laboratório,
-
10:49 - 10:51um escritório,
-
10:51 - 10:53uma sala de aulas,
-
10:53 - 10:56ou mesmo um anfiteatro em Harvard.
-
10:56 - 11:01Acontece que as conversas à sobremesa
me deixaram uma coisa na cabeça -
11:01 - 11:03que também nunca mais me largou.
-
11:03 - 11:07É que, enquanto educadores,
temos obrigação de sonhar -
11:08 - 11:11e de criar espaços onde cada um
-
11:11 - 11:15tenha a oportunidade de ser
a melhor versão de si mesmo. -
11:15 - 11:16Muito obrigado.
-
11:16 - 11:19(Aplausos)
- Title:
- Histórias de um educador selvagem | Juan López-Aranguren | TEDxMadrid
- Description:
-
Porque é que a equipa A conseguia sempre escapar de onde a encerravam? A improvisação e as situações de exceção como chaves para uma educação mais moderna e mais eficaz enchem esta palestra rica em exemplos internacionais em que os espaços do ensino informal oferecem inspiração para a organização e em que se propõe o pátio como elemento central de um novo projeto de experiência educativa.
Esta palestra foi feita num evento TEDx usando o formato de palestras TED, mas organizado independentemente por uma comunidade local. Saiba mais em http://ted.com/tedx
- Video Language:
- Spanish
- Team:
- closed TED
- Project:
- TEDxTalks
- Duration:
- 11:34
Margarida Ferreira approved Portuguese subtitles for Historias de un educador salvaje | Juan López-Aranguren | TEDxMadrid | ||
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for Historias de un educador salvaje | Juan López-Aranguren | TEDxMadrid | ||
Mafalda Ferreira accepted Portuguese subtitles for Historias de un educador salvaje | Juan López-Aranguren | TEDxMadrid | ||
Mafalda Ferreira edited Portuguese subtitles for Historias de un educador salvaje | Juan López-Aranguren | TEDxMadrid | ||
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for Historias de un educador salvaje | Juan López-Aranguren | TEDxMadrid | ||
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for Historias de un educador salvaje | Juan López-Aranguren | TEDxMadrid |