Prever em excesso: Transtorno do Espectro Autista | Paul Fijal | TEDxEastVan

Nesta palestra comovente, Paul Fijal ilustra vivamente o que é conviver com o autismo. Ele explora o conceito do tratamento capacitado, uma abordagem personalizada que busca selar as lacunas de conhecimento entre indivíduos com transtornos de saúde mental e as formas de tratamento disponíveis atualmente.

Paul Fijal é um jovem empreendedor social e líder em Engenharia Biomédica na Awake Labs, que fornece soluções de tratamentos personalizados e mensurados a pessoas autistas. Ele também se dedica a elevar a reputação de Vancouver como eixo de empreendimentos sociais impactantes. Atualmente, Paul está envolvido com o Coast Capital Savings Innovation Hub, e também ajuda no desenvolvimento do novo MedTech Development Hub no Hospital Geral de Vancouver (VGH), junto a um grupo de jovens engenheiros e empreendedores. Originalmente um francófono de Calgary, Alberta, Paul graduou-se pela University of British Columbia, com diploma de bacharel em Engenharia Mecânica, optativa em Biomédica, em maio de 2015. Possui interesse por novos empreendimentos com foco em impacto social, bem como biomedicina e biotecnologia industrial.

Esta palestra foi dada em um evento TEDx, que usa o formato de conferência TED, mas é organizado de forma independente por uma comunidade local. Para saber mais visite http://ted.com/tedx

Sou engenheiro por formação
e empreendedor por opção.

Fui ensinado a ser analítico,
a pensar de forma crítica

e a procurar problemas para resolver.

De uns tempos para cá, porém,

comecei a apreciar profundamente
o fato de que algumas coisas

mais do que precisarem
de uma solução simples;

elas exigem ser entendidas.

Vou começar contando uma história

sobre Jamie e seu
filho de oito anos, Jacob.

Era dia 31 de dezembro de 2013,

e Jamie e Jacob se arrumavam

para ir a uma festa de Ano Novo
na casa da irmã de Jamie.

Eles já estavam saindo pela porta

quando Jamie percebeu que se esqueceu
de preparar a comida que sua irmã pediu.

Após um breve momento de desespero,
ela decidiu: "Sem problemas.

Nós passaremos pelo mercado,
compraremos algum prato

e talvez uma garrafa de champanhe
para compensar".

Eles entram no carro meio apressados
e se dirigem à loja.

Por sorte, havia vaga para estacionar
bem na entrada.

E Jamie, com Jacob ao seu lado,
entrou pelo saguão

e viu que havia umas mil pessoas a mais
por lá do que em qualquer outro dia.

Ela correu para o corredor 13,
"Comidas para Festas",

dobrou o corredor e, de repente,
ouviu um forte barulho de batida.

Jamie deu meia volta e viu que Jacob
havia derrubado uma prateleira.

Ele estava caído no chão,
chutando e gritando,

e batendo repetidamente na cabeça
com os punhos cerrados.

Foi só com a ajuda de dois homens adultos

que Jamie conseguiu arrastar Jacob
de volta para o carro,

onde ela o prendeu com o cinto
de segurança e o levou para casa,

e passou as três horas seguintes
tentando acalmá-lo.

Quando ele finalmente se acalmou,

Jamie desabou no sofá,
completamente exausta,

e não pôde fazer nada além de rezar
por um ano novo melhor.

Como uma em 68 crianças nascidas hoje,
Jacob tem Transtorno do Espectro Autista.

Algumas características do autismo
incluem: dificuldade de se comunicar,

de interagir socialmente
e de reconhecer emoções,

hipersensibilidade a cheiros
e barulhos diferentes,

e mudanças na rotina e no ambiente.

Assim como o nome sugere, o autismo
é um transtorno que tem vários níveis,

e atinge um número enorme de pessoas,

desde indivíduos altamente funcionais
e de inteligência elevada

a outros menos funcionais e com sérios
distúrbios de comportamento,

como as crianças e adolescentes da clínica

em que minha irmã mais velha
trabalhava há alguns anos.

Essas crianças exibiam
comportamentos tão severos

que suas famílias não tinham outra opção
a não ser deixá-las nessas clínicas

por 24 horas por dia,
7 dias por semana, o ano todo.

Naquela noite,

enquanto Jamie e Jacob se arrumavam,

ele notou que sua mãe
murmurou uma palavra,

algo que ele só a ouviu dizer uma vez,

há 13 dias, quando ela bateu
o dedão do pé na mesa da cozinha.

Eles entraram no carro e ele notou
que sua mãe usou a chave errada,

que arranhou a maçaneta
e o carro não ligou logo de primeira.

Eles foram em direção à casa da tia,

mas pararam no mercado,
algo que nunca faziam.

Eles estacionaram na entrada,
mas eles sempre param junto aos carrinhos

para que Jacob conte cada um deles
a caminho da loja.

No saguão, ele notou 21 pessoas a mais
do que numa terça-feira normal.

Ele ouviu um barulho familiar,
mas que não o agradou;

uma roda rangendo no carrinho que alguém
empurrava pelo corredor 13 e...

uma batida.

A verdade é que Jamie e Jacob enxergam
o mundo de maneiras diferentes.

Jamie enxerga a floresta inteira,

enquanto Jacob percebe cada uma das folhas

em cada um dos galhos
de cada uma das árvores dessa floresta.

O autismo, no entanto, não é algo

que classifica Jacob
como um problema a ser resolvido.

Ele é uma pessoa.

Ele tem suas qualidades, seus defeitos
e seus talentos próprios.

E, assim como todo mundo,

ele merece ser tratado
como uma pessoa a ser entendida.

Como podemos começar a entender?

Em cada cérebro humano,
há uma camada superior chamada córtex.

Ela é responsável
por pensamentos de alto nível,

como raciocinar, controlar impulsos,

ser capaz de entender o que alguém
está pensando ou sentindo.

Se pensarem em qualquer diálogo cotidiano,

como conversar com uma amiga,

e ela só responde
com grunhidos curtos e diretos,

isso pode significar que ela
não goste mais de você

ou que talvez tenha tido um dia difícil,

que o chefe dela a esteja pressionando
sobre alguma apresentação.

Então, em vez de julgá-la,
você decide escutá-la,

talvez oferecer uma xícara de chá.

É muito para se deduzir
a partir de alguns grunhidos.

O córtex também ajuda
a organizar todas as informações

com as quais somos
bombardeados o dia todo.

Enquanto estou aqui,
com essa luz brilhando no meu rosto,

nesta sala cheia de cheiros
e sons desconhecidos,

alguns de vocês se remexendo na cadeira,
e algumas pessoas tuitando na varanda,

(Risos)

meu córtex recebe toda essa informação
e consegue processá-la, ordená-la,

e categorizá-la automaticamente.

Isso é ótimo porque, caso contrário,

se eu tivesse que ordenar
tudo isso conscientemente,

eu não estaria falando com coerência,

na verdade, nem estaria aqui na frente.

O cérebro de um autista
funciona um pouco diferente.

Ele costuma ser mais focado em detalhes.

Essa abordagem de baixo para cima

não indica necessariamente
que o córtex não exista

ou que ele não funcione.

E sim que a configuração padrão
é olhar cada uma das folhas

em cada um dos galhos
de cada uma das árvores,

em vez de observar a floresta
como um todo.

Ser tão focado assim nos detalhes,
no entanto, pode gerar coisas incríveis,

como reproduzir uma sinfonia completa
após ouvi-la uma única vez;

publicar um artigo sobre matemática
aplicada antes dos 13 anos,

ou organizar milhares de barras
de código-fonte,

identificando erros sutis que ajudam
uma empresa a melhorar um produto.

Mas também pode ser insuportável.

Por esses dois sistemas operacionais
serem tão distintos,

fica mais fácil entender
como Jamie e Jacob

têm dificuldade de enxergar o mundo
pelos olhos um do outro.

Sem dúvidas, alguns de vocês aqui

conhecem ou trabalham
com alguém que tenha autismo

ou talvez um de seus filhos
ou um dos seus amigos

tenha sido diagnosticado no espectro.

Então vocês bem sabem como é difícil

para esses pais e familiares
entenderem suas crianças,

seja gastando de US$ 40 mil a US$ 60 mil
todo ano apenas com despesas não médicas,

gastos não associados a qualquer tipo
de serviço médico ou medicação.

Contextualizando,

são cerca de US$ 56 bilhões gastos
a cada ano somente na América do Norte.

E isso é só no quesito dinheiro,
mas vai muito além disso.

Pais e familiares fazem absolutamente
de tudo para que suas crianças

possam desenvolver suas qualidades,

trabalhar suas deficiências
e explorar seus talentos.

Quer seja preenchendo diversos fichários
com gráficos que acompanham

de terapias de manejo comportamental
à qualidade do sono e à dieta;

quer seja pressionando o conselho escolar
a promover a inclusão na sala de aula;

ou lutando contra leis que cortam
auxílios a certas faixas etárias;

ou ainda fazendo pesquisa
digna de doutorado tentando entender

a gama de opções
de tratamentos disponíveis.

E, mesmo assim,

situações como a que Jamie e Jacob
passaram no mercado ainda acontecem.

E clínicas como as que minha irmã
trabalhou ainda existem.

Porque, apesar de todos os esforços
e recursos dedicados ao autismo,

ainda há desafios enormes
a serem superados

para ajudar a entender melhor
o Transtorno do Espectro Autista

e as pessoas que convivem com ele.

Apesar das minhas boas intenções,
eu ainda penso como engenheiro,

talvez porque cinco anos de graduação
não são esquecidos tão facilmente,

mas quando minha irmã chegava em casa
e falava sobre as crianças

com as quais ela trabalhava,
eu comecei a pesquisar.

E descobri que há pesquisa inovadora
sendo feita ao redor do mundo

que investiga a relação entre autismo
e certos sinais vitais,

como batimento cardíaco,
temperatura corporal, transpiração,

e como eles se relacionam
com as mudanças psicológicas e emocionais

acontecendo dentro de alguém.

Esses sinais corporais aparecem
de forma automática,

mesmo antes de nos conscientizarmos deles.

Como podemos usar
esse conhecimento e essas ideias?

Como podemos inspirar famílias
como as de Jamie e Jacob?

Se imaginarem que este ano,
em algum momento,

enquanto Jamie e Jacob se preparam
para ir à festa novamente,

e Jamie esquece a comida,

dessa vez Jacob está usando
um instrumento simples,

com alguns sensores conectados
a um aplicativo no celular de Jamie.

Dessa vez, quando eles entrarem
no saguão cheio de gente,

Jamie será notificada de que Jacob
não está se sentindo bem.

E eles vão sair da loja,

fazer um exercício
de respiração para relaxar

e, juntos, concluir seus afazeres.

E, dessa vez, tanto Jamie quanto Jacob

poderão comemorar o Ano Novo
com as pessoas que amam.

Obrigado.

(Aplausos)