Deem autonomia a uma rapariga, transformem uma comunidade
-
0:01 - 0:04Para dar autonomia às raparigas,
temos de as educar. -
0:04 - 0:06Esse era o meu sonho.
-
0:06 - 0:07Então, criei uma escola,
-
0:07 - 0:10e nesse processo,
aprendi algo bastante maior. -
0:10 - 0:14Quando damos autonomia a uma rapariga,
transformamos uma comunidade. -
0:14 - 0:16A escola é apenas um início.
-
0:17 - 0:19Cresci no Quénia rural,
-
0:19 - 0:21numa pequena aldeia chamada Enoosaen.
-
0:21 - 0:23Fui a primeira de oito filhos,
-
0:23 - 0:28e passei a minha infância a ajudar
a minha mãe a cozinhar, limpar, cultivar -
0:28 - 0:30e a tomar conta dos meus irmãos.
-
0:30 - 0:32Como outras raparigas Maasai,
-
0:32 - 0:36eu estava comprometida
desde muito jovem para casar. -
0:36 - 0:38Mas, quando atingi a puberdade,
-
0:38 - 0:42sofri a mutilação genital feminina,
-
0:42 - 0:44conhecida como MGF.
-
0:44 - 0:49Esta foto mostra alguma das ferramentas
usadas para executar a MGF em raparigas. -
0:51 - 0:54A MGF marcava
o fim da minha infância -
0:54 - 0:58e, por extensão, a minha educação.
-
0:58 - 1:03Mas eu negociei como o meu pai,
de forma a manter-me na escola, -
1:03 - 1:05mesmo após a minha MGF.
-
1:06 - 1:09Anos mais tarde, entrei na universidade.
-
1:11 - 1:14Para ter o apoio da minha comunidade,
-
1:14 - 1:19prometi voltar um dia de forma
a retribuir o apoio recebido. -
1:19 - 1:22Mas, anos mais tarde,
quando voltei à minha aldeia, -
1:22 - 1:24quase nada tinha mudado.
-
1:24 - 1:27As raparigas ainda sofriam a MGF,
-
1:27 - 1:29ainda abandonavam a escola,
-
1:29 - 1:33ainda casavam com homens
mais velhos que os pais -
1:33 - 1:37e ainda davam à luz em adolescentes.
-
1:37 - 1:41Eu não queria ver mais nenhuma rapariga
a passar por isso. -
1:41 - 1:46Foi quando vi o que podia fazer
para ajudar a minha comunidade. -
1:48 - 1:51Criei uma escola para raparigas
-
1:51 - 1:55para que elas pudessem livrar-se da MGF
e de casamentos precoces. -
1:55 - 1:57Na minha primeira inscrição...
-
1:57 - 2:01(Aplausos e vivas)
-
2:03 - 2:05Na minha primeira inscrição,
-
2:05 - 2:08esperava ter 10 raparigas.
-
2:08 - 2:10Apareceram 100.
-
2:10 - 2:12(Vivas e aplausos)
-
2:12 - 2:15Comecei a ver quão grande era este sonho,
-
2:15 - 2:19apercebi-me que a minha escola
poderia ser a fundação, -
2:20 - 2:22mas não seria o suficiente.
-
2:22 - 2:25Então, no primeiro ano
inscrevi estas 30 raparigas. -
2:26 - 2:28Algumas tinham sido abusadas,
outras eram órfãs, -
2:28 - 2:31e algumas vinham de famílias
que eram muito tradicionais, -
2:31 - 2:34que nunca tinham enviado
uma rapariga para a escola. -
2:34 - 2:35Então, a escola começou.
-
2:36 - 2:38Apesar de as raparigas
parecerem estar animadas, -
2:38 - 2:41tinham dificuldade
em se manterem acordadas. -
2:42 - 2:43O que se passava?
-
2:43 - 2:46Tinham uma professora, tinham livros,
-
2:46 - 2:48uma nova sala a caminho,
-
2:48 - 2:53estavam determinadas a estarem ali,
mas não tinham energia. -
2:54 - 2:56Apercebi-me de que tinham fome,
-
2:56 - 3:00e depressa arranjei
um cozinheiro e comida. -
3:00 - 3:04Pouco depois, verifiquei
que uma sala não era suficiente. -
3:04 - 3:06Precisava de um colégio interno.
-
3:07 - 3:11Para além de estarem cansadas
e com fome, por causa das tarefas -
3:11 - 3:14e das caminhadas de ida e volta
para a escola, -
3:14 - 3:16também não estavam seguras.
-
3:16 - 3:18É uma triste realidade,
-
3:18 - 3:22mas frequentemente eram
agredidas, violadas ou raptadas -
3:22 - 3:23a caminho da escola.
-
3:24 - 3:27Assim, antes de aprenderem
matemática ou história, -
3:27 - 3:29elas tinham de se sentir seguras,
-
3:29 - 3:32tinham de estar repousadas
e bem nutridas. -
3:33 - 3:35Vou falar de algumas das minhas raparigas.
-
3:35 - 3:37Esta é Faith.
-
3:37 - 3:41Faith vem de uma família
muito tradicional na comunidade. -
3:41 - 3:46A irmã mais velha já tinha passado
pela MGF e tinha casado, -
3:46 - 3:48mas a Faith estava determinada.
-
3:48 - 3:49Ela adorava aprender,
-
3:50 - 3:53e quis ir para a minha escola
logo que soube que ela existia. -
3:53 - 3:56Então, pediu ao pai, à mãe
-
3:56 - 3:58a alguém que a levasse à escola.
-
3:58 - 4:00Todos se recusaram.
-
4:01 - 4:03A Faith fez algo de muito corajoso.
-
4:03 - 4:06Roubou um ovo de casa da mãe,
-
4:06 - 4:08foi ao mercado,
-
4:08 - 4:10vendeu o ovo e comprou um lápis.
-
4:10 - 4:12Depois, caminhou oito quilómetros,
-
4:12 - 4:15com o lápis na mão,
e foi-se inscrever. -
4:16 - 4:17Ela chegou...
-
4:17 - 4:19(Aplausos)
-
4:19 - 4:22Ela chegou cansada e com fome,
-
4:22 - 4:24mas determinada.
-
4:24 - 4:27Ouvi a história dela
e fizemos a inscrição na escola. -
4:28 - 4:31Mas entrar na escola
era apenas o início. -
4:32 - 4:34A Faith precisava de comida,
de medicamentos, -
4:34 - 4:36precisava de aconselhamento.
-
4:36 - 4:38Providenciámos tudo isso.
-
4:38 - 4:42Conheceu adultos que acreditavam nela.
-
4:43 - 4:45Apoiada por esta comunidade,
-
4:45 - 4:47Faith estava pronta a aprender.
-
4:47 - 4:49Esta é a Faith.
-
4:49 - 4:51Seis meses de escola,
-
4:51 - 4:56agora é uma feliz aluna do sexto ano,
que sonha em ser uma piloto no futuro, -
4:56 - 4:59e agora tem o apoio da família.
-
4:59 - 5:00O melhor de tudo
-
5:00 - 5:04é que as irmãs mais novas
vão seguir os seus passos. -
5:04 - 5:07(Aplausos)
-
5:11 - 5:16Calcula-se que o casamento infantil
terá um custo de biliões de dólares -
5:16 - 5:18nos próximos 15 anos.
-
5:19 - 5:21Podemos falar de números,
-
5:21 - 5:22mas na vida real,
-
5:23 - 5:25o que o casamento infantil
custa à minha aldeia -
5:26 - 5:29é a médica, a professora, a empresária
-
5:29 - 5:33e a parceira que os nossos homens
irão precisar no futuro, -
5:33 - 5:38formas reais de as mulheres
nos poderem tirar da pobreza. -
5:41 - 5:43Voltei a perceber, mais uma vez,
-
5:43 - 5:46que, tal como quando precisei
de ajuda para ir para a universidade, -
5:46 - 5:49embora eu pudesse sonhar
ou ter um sonho, -
5:49 - 5:53não o conseguiria realizar sozinha.
-
5:54 - 5:58Então voltei aos anciãos que me
tinham ajudado 10 anos antes. -
5:59 - 6:03Necessitava do seu apoio novamente
se queria ser bem sucedida. -
6:04 - 6:08Formei um conselho comunitário,
com líderes religiosos, pais -
6:08 - 6:11e alguns professores de outras escolas.
-
6:12 - 6:15Precisava de aliados no governo
e na comunidade -
6:15 - 6:18para levar avante o meu objetivo.
-
6:18 - 6:21Precisava especialmente
do apoio do chefe -
6:21 - 6:24para me ajudar a impor
uma política não-MGF na minha escola. -
6:25 - 6:27De início, houve resistência,
-
6:28 - 6:29mas fui persistente.
-
6:29 - 6:30(Risos)
-
6:30 - 6:33Agora, é o nosso maior aliado.
-
6:33 - 6:37(Aplausos)
-
6:38 - 6:41Também precisava dos pais.
-
6:42 - 6:44O que me leva a Linet.
-
6:44 - 6:49O pai de Linet, Momposhi,
não acreditava em educar raparigas. -
6:49 - 6:52Ele próprio nunca tinha andado na escola.
-
6:52 - 6:56Mas a mãe de Linet acreditava nela
e levou-a à escola para a inscrever. -
6:56 - 6:58Fiquei a saber que ela estava connosco.
-
6:58 - 7:03Tinha de arranjar maneira de Momposhi
também acreditar em Linet. -
7:04 - 7:08Então, usei o pretexto
de revelar as notas de Linet -
7:08 - 7:11para atrair Momposhi.
-
7:11 - 7:16Ele apareceu e reparou
que a filha era uma aluna promissora. -
7:17 - 7:22A cada visita, ele fortaleceu
a relação com a filha, -
7:22 - 7:25reparando, não apenas nas suas notas,
-
7:25 - 7:29mas também aceitando-a como
alguém com muito potencial. -
7:30 - 7:33Quando Linet foi aceite
num dos melhores liceus do país -
7:33 - 7:35após o 8.º ano.
-
7:35 - 7:38Momposhi ficou cheio de orgulho
-
7:38 - 7:39e foi por toda a aldeia
-
7:39 - 7:43a dizer quão orgulhoso estava
e quão inteligente era a filha. -
7:43 - 7:44(Risos)
-
7:44 - 7:45Conseguem imaginar?
-
7:45 - 7:48Ele próprio levou Linet à nova escola.
-
7:48 - 7:52Foi a primeira vez que ambos
estiveram em Nairobi. -
7:52 - 7:57Hoje Linet está a estudar
numa universidade na Austrália. -
7:57 - 8:00(Aplausos e vivas)
-
8:02 - 8:06Momposhi é agora o nosso
maior defensor na comunidade. -
8:06 - 8:09Eu também atraí as mães à discussão,
-
8:09 - 8:10incluindo a minha.
-
8:10 - 8:13Esta é a minha mãe
num dos programas de formação. -
8:13 - 8:17As mães estão envolvidas
na educação dos próprios filhos. -
8:17 - 8:20Também trouxe avós para esta amálgama.
-
8:20 - 8:21(Risos)
-
8:21 - 8:24Na minha comunidade,
as avós são as orgulhosas guardiãs -
8:24 - 8:26das nossas histórias e culturas,
-
8:26 - 8:31e eu queria que as raparigas conhecessem
e adotassem a rica cultura Maasai. -
8:31 - 8:34Agora, as avós partilham
essas histórias com as raparigas, -
8:34 - 8:38e é uma bela maneira
da interligar a nossa comunidade. -
8:40 - 8:43Eu também comecei
a trabalhar com os rapazes! -
8:43 - 8:45(Risos)
-
8:45 - 8:46O que aconteceria
-
8:46 - 8:50se os rapazes crescessem com a mesma
mentalidade dos pais? -
8:50 - 8:54Digo-vos, as coisas não vão mudar muito.
-
8:54 - 8:59Consegui o apoio de uma organização
chamada "I'm Worth Defending": -
8:59 - 9:01um grupo de líderes
jovens e progressistas, -
9:01 - 9:03chefiados por Alfred e George.
-
9:03 - 9:07Juntos criámos um programa
de formação para rapazes e raparigas -
9:07 - 9:09que não podiam frequentar a escola,
-
9:09 - 9:14partilhando informação vital
sobre igualdade entre sexos, -
9:14 - 9:16sobre saúde e direitos humanos.
-
9:16 - 9:20Hoje em dia chegámos a mais
de 10 000 rapazes e raparigas -
9:20 - 9:22e este número está a aumentar.
-
9:22 - 9:26(Aplausos)
-
9:29 - 9:32Parece que realmente
é preciso conquistar a aldeia -
9:32 - 9:34para fazer deste sonho uma realidade.
-
9:34 - 9:35(Risos)
-
9:35 - 9:37É isso que se verifica hoje em dia,
-
9:37 - 9:41em que cerca de 400 raparigas
não sofreram com a MGF -
9:41 - 9:43na minha aldeia,
-
9:43 - 9:48numa região onde cerca de 80%
de mulheres foram mutiladas. -
9:48 - 9:51Acreditem, estas raparigas,
-
9:51 - 9:54estão a partilhar as suas experiências
-
9:54 - 9:58com as irmãs, as primas e as amigas.
-
9:58 - 10:00Estão muito interessadas.
-
10:01 - 10:04Com o tempo, isto será o novo normal
-
10:04 - 10:07e está a ser adotado
pela mesma comunidade, -
10:07 - 10:09a minha comunidade.
-
10:11 - 10:15O que significa transformar
comunidades no Quénia? -
10:15 - 10:18O presidente Obama visitou
o Quénia em 2015, -
10:18 - 10:22e reuniu-se com representantes
de organizações -
10:22 - 10:25que tentam melhorar comunidades.
-
10:26 - 10:27Adivinhem?
-
10:27 - 10:29Ele conheceu a Linet!
-
10:29 - 10:30(Risos)
-
10:30 - 10:34(Aplausos)
-
10:38 - 10:40Juntos falaram sobre um Quénia
-
10:40 - 10:44onde todas as raparigas
tenham as mesmas oportunidades, -
10:44 - 10:46onde Linet seja uma líder
-
10:46 - 10:49e onde comunidades
como a Enoosaen prosperem -
10:49 - 10:51porque os seus membros
-
10:51 - 10:54— todos os seus membros —
têm oportunidades. -
10:54 - 10:58Ajudar as comunidades a verem
que cada filha é um tesouro, -
10:58 - 11:00cada irmã é cheia de potencial,
-
11:00 - 11:05e ajudar cada rapariga a ver
esse valor dentro de si. -
11:05 - 11:09Não há limite para
o que esse futuro irá custar. -
11:10 - 11:14Nem todas as raparigas
na minha escola serão doutoradas, -
11:14 - 11:19mas cada uma delas irá atingir
todo o seu potencial -
11:20 - 11:23e será uma porta-voz
para os seus filhos -
11:23 - 11:26e para os seus netos
nos anos vindouros. -
11:27 - 11:30Hoje os meus sonhos são informados
pelo que aprendi com eles -
11:30 - 11:33e pelo que aprendi com vocês.
-
11:33 - 11:37A minha viagem levou-me a sair
de Enoosaen e a lá voltar. -
11:37 - 11:39E nesse processo,
-
11:39 - 11:41fui adotada pelo mundo.
-
11:41 - 11:43Vocês transformaram-se na minha aldeia.
-
11:43 - 11:46Por isso, faço-vos uma nova promessa,
a vocês, -
11:46 - 11:49aos meus anciãos, às minhas irmãs
e aos meus amigos. -
11:49 - 11:53Vou continuar a sonhar
e vou prosseguir -
11:53 - 11:58até que as raparigas como Linet
e Faith cumpram os seus sonhos -
11:58 - 11:59e eu veja o meu:
-
12:00 - 12:05que todas as comunidades
permitam a todas as mulheres -
12:05 - 12:06e a cada rapariga
-
12:06 - 12:09que os seus sonhos se cumpram.
-
12:09 - 12:10Obrigada.
-
12:10 - 12:12(Aplausos e vivas)
-
12:14 - 12:16Obrigada, obrigada.
-
12:16 - 12:18(Aplausos e vivas)
- Title:
- Deem autonomia a uma rapariga, transformem uma comunidade
- Speaker:
- Kakenya Ntaiya
- Description:
-
Kakenya Ntaiya transformou o seu sonho de estudar num movimento para autonomizar raparigas vulneráveis e acabar com uma tradição brutal no Quénia. Conheçam duas alunas do Centro para Excelência de Kakenya, uma escola onde as raparigas podem viver e estudar em segurança — e elevar a sua comunidade nesse processo. "Deem autonomia a uma rapariga, transformem uma comunidade" diz Ntaiya
- Video Language:
- English
- Team:
closed TED
- Project:
- TEDTalks
- Duration:
- 12:31
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