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Diferentes formas de conhecimento

  • 0:01 - 0:02
    Eu sou um "savant"
  • 0:02 - 0:05
    ou, mais precisamente,
  • 0:05 - 0:08
    um "savant" autista
    de alta funcionalidade.
  • 0:08 - 0:08
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    É uma deficiência rara.
  • 0:10 - 0:14
    E ainda mais rara quando acompanhada
  • 0:14 - 0:16
    — como acontece no meu caso —
  • 0:16 - 0:20
    de auto-consciência
    e domínio da linguagem.
  • 0:20 - 0:20
  • 0:21 - 0:23
    Muito frequentemente,
    quando encontro alguém
  • 0:23 - 0:26
    que vem a tomar conhecimento
    das minhas características,
  • 0:26 - 0:29
    instala-se uma certa espécie de constrangimento.
  • 0:29 - 0:31
    Consigo vê-lo nos olhos
    das outras pessoas.
  • 0:31 - 0:34
    Querem perguntar-me qualquer coisa.
  • 0:34 - 0:37
    E, no final, muito frequentemente,
  • 0:37 - 0:39
    o impulso é mais forte do que as pessoas
  • 0:39 - 0:41
    e acabam por deixar escapar:
  • 0:41 - 0:43
    "Se eu lhe disser
    a minha data de nascimento,
  • 0:43 - 0:46
    "pode dizer-me
    em que dia da semana nasci?"
  • 0:46 - 0:48
    (Risos)
  • 0:49 - 0:51
    Ou mencionam raízes cúbicas
  • 0:51 - 0:55
    ou pedem-me que recite um número enorme
    ou um texto longo.
  • 0:55 - 0:58
    Espero que me perdoem
  • 0:58 - 1:00
    se não vos apresentar hoje
  • 1:00 - 1:04
    uma espécie de "one-man savant show".
  • 1:04 - 1:08
    Em vez disso, vou falar
  • 1:08 - 1:11
    duma coisa muito mais interessante
  • 1:11 - 1:11
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    do que datas de nascimento
    ou raízes cúbicas
  • 1:14 - 1:16
    — um pouco mais profunda
  • 1:16 - 1:19
    e muito mais próxima da minha mente
    do que o trabalho.
  • 1:19 - 1:23
    Quero falar-vos rapidamente
    sobre perceção.
  • 1:23 - 1:24
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    Quando escrevia as peças e os contos
  • 1:27 - 1:29
    que haviam de torná-lo famoso,
  • 1:29 - 1:33
    Anton Chekhov tinha um bloco de notas
  • 1:33 - 1:36
    em que assentava as suas observações.
  • 1:36 - 1:37
  • 1:37 - 1:39
    sobre o mundo que o rodeava
  • 1:39 - 1:40
    — pequenos detalhes
  • 1:40 - 1:44
    que pareciam passar despercebidos
    às outras pessoas.
  • 1:44 - 1:47
    Sempre que leio Chekhov
  • 1:47 - 1:50
    e a sua visão única sobre a vida humana,
  • 1:50 - 1:54
    recordo-me da razão pela qual
    também eu me tornei escritor.
  • 1:54 - 1:55
  • 1:55 - 1:56
    Nos meus livros,
  • 1:56 - 1:59
    eu exploro a natureza da perceção
  • 1:59 - 2:01
    e como diferentes formas de perceber
  • 2:01 - 2:05
    geram diferentes formas
    de saber e de compreender.
  • 2:05 - 2:06
  • 2:08 - 2:10
    Eis três questões
    retiradas do meu trabalho
  • 2:10 - 2:12
    .
  • 2:13 - 2:15
    Em vez de tentar resolvê-las,
  • 2:15 - 2:17
    vou pedir-vos para considerarem, por um momento,
  • 2:17 - 2:19
    as intuições
  • 2:19 - 2:21
    e os instintos
  • 2:21 - 2:23
    que vão passar pelas vossas cabeças e corações
  • 2:23 - 2:26
    quando olharem para elas.
  • 2:26 - 2:29
    Por exemplo, o cálculo.
  • 2:29 - 2:31
    Conseguem sentir onde, na linha do número,
  • 2:31 - 2:34
    é provável que se encontre a solução?
  • 2:34 - 2:37
    Ou olhar para a palavra estrangeira e os sons.
  • 2:37 - 2:39
    Conseguem aperceber-se da quantidade de significados
  • 2:39 - 2:42
    que ela vos aponta?
  • 2:42 - 2:45
    E quanto à linha de poesia,
  • 2:45 - 2:47
    por que razão usa o poeta a palavra lebre
  • 2:47 - 2:50
    em lugar de coelho (rabbit)?
  • 2:51 - 2:53
    Estou a pedir-vos para fazerem isto
  • 2:53 - 2:57
    porque acredito que as nossas percepções pessoais,
  • 2:57 - 2:59
    estão no cerne
  • 2:59 - 3:01
    de como adquirimos o conhecimento.
  • 3:01 - 3:03
    Julgamentos estéticos,
  • 3:03 - 3:06
    mais do que raciocínios abstractos,
  • 3:06 - 3:08
    guiam e enformam o processo
  • 3:08 - 3:11
    pelo qual todos nós aprendemos
  • 3:11 - 3:13
    o que sabemos.
  • 3:13 - 3:16
    Eu sou um exemplo extremo disso.
  • 3:16 - 3:19
    Os meus mundos de palavras e números
  • 3:19 - 3:21
    misturam-se com cor, emoção
  • 3:21 - 3:23
    e personalidade.
  • 3:23 - 3:25
    Como Juan disse,
  • 3:25 - 3:28
    trata-se da condição a que os cientistas chamam sinestesia,
  • 3:28 - 3:30
    um cruzamento pouco usual
  • 3:30 - 3:33
    entre os sentidos.
  • 3:36 - 3:38
    Aqui estão os números de 1 a 12
  • 3:38 - 3:40
    como eu os vejo --
  • 3:40 - 3:44
    cada número com a sua própria forma e carácter.
  • 3:44 - 3:46
    O Um é clarão de luz branca.
  • 3:46 - 3:51
    O Seis é um buraquinho negro e muito triste.
  • 3:51 - 3:54
    Aqui, os desenhos estão a preto e branco,
  • 3:54 - 3:56
    mas na minha mente têm cores.
  • 3:56 - 3:58
    O Três é verde.
  • 3:58 - 4:00
    O Quatro é azul.
  • 4:00 - 4:03
    O Cinco é amarelo.
  • 4:05 - 4:07
    E também pinto.
  • 4:07 - 4:10
    E aqui está uma das minhas pinturas.
  • 4:10 - 4:14
    É a multiplicação de dois números primos.
  • 4:14 - 4:16
    Formas tridimensionais
  • 4:16 - 4:19
    e o espaço que deixam entre si
  • 4:19 - 4:21
    cria uma nova forma,
  • 4:21 - 4:24
    a resposta à soma.
  • 4:24 - 4:26
    E quanto a números maiores?
  • 4:26 - 4:30
    Bom, conseguem-se números muito maiores do que Pi,
  • 4:30 - 4:32
    a constante matemática.
  • 4:32 - 4:34
    É um número infinito --
  • 4:34 - 4:36
    literalmente continua para sempre.
  • 4:36 - 4:38
    Neste quadro que pintei,
  • 4:38 - 4:42
    dos 20 primeiros decimais de Pi,
  • 4:42 - 4:44
    eu pego nas cores
  • 4:44 - 4:47
    e nas emoções e texturas
  • 4:47 - 4:49
    e conjugo-as todas
  • 4:49 - 4:54
    numa espécie de paisagem numérica rolante.
  • 4:54 - 4:57
    Mas não são apenas os números que vejo em cores.
  • 4:57 - 4:59
    Para mim, as palavras também
  • 4:59 - 5:01
    têm cores e emoções
  • 5:01 - 5:03
    e texturas.
  • 5:03 - 5:05
    E esta é uma frase de abertura
  • 5:05 - 5:07
    da novela "Lolita."
  • 5:07 - 5:11
    E Nabokov, ele próprio, era sinestésico.
  • 5:11 - 5:13
    E aqui vocês podem ver
  • 5:13 - 5:16
    como a minha percepção do som L
  • 5:16 - 5:18
    ajuda a que a aliteração
  • 5:18 - 5:21
    surja naturalmente.
  • 5:21 - 5:23
    Outro exemplo:
  • 5:23 - 5:25
    um pouco mais matemático.
  • 5:25 - 5:27
    E pergunto-me se alguns de vocês notarão
  • 5:27 - 5:29
    a construção da frase
  • 5:29 - 5:32
    de "O Grande Gatsby".
  • 5:33 - 5:36
    Há um cortejo de sílabas --
  • 5:36 - 5:38
    trigo, uma;
  • 5:38 - 5:40
    pradarias, duas;
  • 5:40 - 5:43
    Cidades suecas perdidas, três --
  • 5:43 - 5:45
    um, dois, três.
  • 5:45 - 5:49
    E este efeito é muito agradável para a mente,
  • 5:49 - 5:51
    e ajuda a frase
  • 5:51 - 5:54
    a soar bem.
  • 5:54 - 5:56
    Vamos regressar às questões
  • 5:56 - 5:59
    que vos coloquei há pouco.
  • 5:59 - 6:02
    64 a multiplicar por 75.
  • 6:02 - 6:05
    Se alguns de vocês jogarem xadrez,
  • 6:05 - 6:07
    saberão que 64
  • 6:07 - 6:10
    é um número quadrado,
  • 6:10 - 6:12
    e é por isso que os tabuleiros de xadrez,
  • 6:12 - 6:14
    oito por oito,
  • 6:14 - 6:17
    têm 64 quadrados.
  • 6:17 - 6:19
    Isso dá-nos uma forma
  • 6:19 - 6:22
    que podemos visualizar, que podemos perceber.
  • 6:22 - 6:25
    Que tal 75?
  • 6:25 - 6:27
    Bem, se 100,
  • 6:27 - 6:30
    se pensarmos em 100 como sendo um quadrado,
  • 6:30 - 6:33
    75 teria este aspecto.
  • 6:33 - 6:35
    Portanto, o que precisamos de fazer agora
  • 6:35 - 6:37
    é unir estas duas imagens
  • 6:37 - 6:39
    na nossa mente --
  • 6:39 - 6:42
    algo assim.
  • 6:42 - 6:46
    64 torna-se em 6.400.
  • 6:46 - 6:50
    E no canto direito,
  • 6:50 - 6:52
    vocês não têm que calcular nada.
  • 6:52 - 6:54
    Quatro, quatro para cima e para baixo --
  • 6:54 - 6:57
    é 16.
  • 6:57 - 6:59
    Portanto, o que a soma está realmente a pedir-vos
  • 6:59 - 7:01
    é 16,
  • 7:01 - 7:04
    16, 16.
  • 7:04 - 7:06
    É muito mais fácil
  • 7:06 - 7:09
    do que a matemática que a escola vos ensinou, tenho a certeza.
  • 7:09 - 7:11
    É 16, 16, 16, 48,
  • 7:11 - 7:13
    4.800 --
  • 7:13 - 7:15
    4.000,
  • 7:15 - 7:18
    a resposta à soma.
  • 7:18 - 7:20
    É fácil quando se sabe como fazer.
  • 7:20 - 7:23
    (Risos)
  • 7:23 - 7:26
    A segunda questão era uma palavra islandesa.
  • 7:26 - 7:29
    Presumo que não haja muitas pessoas aqui
  • 7:29 - 7:31
    que falem islandês.
  • 7:31 - 7:34
    Por isso, deixem-me reduzir as escolhas a duas.
  • 7:36 - 7:38
    Hnugginn:
  • 7:38 - 7:40
    e uma palavra feliz,
  • 7:40 - 7:42
    ou uma palavra triste?
  • 7:42 - 7:44
    O que é que vocês dizem?
  • 7:45 - 7:47
    Certo.
  • 7:47 - 7:49
    Algumas pessoas disseram que é feliz.
  • 7:49 - 7:51
    Grande parte, a maioria das pessoas,
  • 7:51 - 7:53
    dizem que é triste.
  • 7:53 - 7:57
    E realmente ela significa "triste".
  • 7:57 - 8:00
    (Risos)
  • 8:00 - 8:03
    Por que razão, estatisticamente,
  • 8:03 - 8:05
    a maioria das pessoas
  • 8:05 - 8:07
    diz que a palavra é triste, neste caso,
  • 8:07 - 8:10
    pesada, noutros casos?
  • 8:10 - 8:13
    De acordo com a minha teoria, a linguagem evolui de maneira
  • 8:13 - 8:15
    a que os sons combinem,
  • 8:15 - 8:18
    correspondam ao subjectivo,
  • 8:18 - 8:20
    à experiência intuitiva
  • 8:20 - 8:22
    pessoal
  • 8:22 - 8:24
    do ouvinte.
  • 8:25 - 8:28
    Vamos ver a terceira questão.
  • 8:29 - 8:32
    É um verso de um poema de John Keats.
  • 8:32 - 8:35
    As palavras, como os números,
  • 8:35 - 8:38
    expressam relações fundamentais
  • 8:38 - 8:40
    entre objectos
  • 8:40 - 8:42
    e acontecimentos e forças
  • 8:42 - 8:44
    que constituem o nosso mundo.
  • 8:44 - 8:47
    É lógico que nós, existindo neste mundo,
  • 8:47 - 8:49
    devíamos, ao longo das nossas vidas,
  • 8:49 - 8:52
    absorver intuitivamente essas relações.
  • 8:52 - 8:55
    E os poetas, como outros artistas,
  • 8:55 - 8:58
    jogam com essa compreensão intuitiva.
  • 8:58 - 9:01
    No caso de lebre (hare),
  • 9:01 - 9:03
    trata-se de um som ambíguo, em inglês.
  • 9:03 - 9:06
    Pode também significar as fibras que crescem numa cabeça.
  • 9:06 - 9:08
    E se pensarmos nisso --
  • 9:08 - 9:10
    deixem-me compor a imagem --
  • 9:10 - 9:13
    as fibras representam vulnerabilidade.
  • 9:14 - 9:17
    Submetem-se ao menor movimento
  • 9:17 - 9:20
    ou gesto ou emoção.
  • 9:20 - 9:24
    Portanto, o que temos é uma atmosfera
  • 9:24 - 9:26
    de vulnerabilidade e tensão.
  • 9:26 - 9:28
    A lebre, em si mesma, o animal --
  • 9:28 - 9:31
    não um gato, não um cão, uma lebre --
  • 9:31 - 9:33
    porquê uma lebre?
  • 9:33 - 9:35
    Porque, pensem na imagem,
  • 9:35 - 9:37
    não na palavra, na imagem.
  • 9:37 - 9:39
    As longuíssimas orelhas,
  • 9:39 - 9:41
    os pés desmesurados,
  • 9:41 - 9:44
    ajudam-nos a visualizar, a sentir intuitivamente,
  • 9:44 - 9:47
    o que significa coxear
  • 9:47 - 9:50
    e tremer.
  • 9:50 - 9:52
    Assim, nestes poucos minutos,
  • 9:52 - 9:54
    eu espero ter conseguido partilhar
  • 9:54 - 9:57
    um bocadinho da minha visão das coisas,
  • 9:57 - 10:00
    e mostrar-vos
  • 10:00 - 10:03
    que as palavras podem ter cores e emoções,
  • 10:03 - 10:06
    números, formas e personalidades.
  • 10:06 - 10:08
    O mundo é mais rico
  • 10:08 - 10:10
    maior
  • 10:10 - 10:13
    do que demasiadas vezes parece ser.
  • 10:13 - 10:16
    Espero ter-vos suscitado o desejo
  • 10:16 - 10:19
    de aprender a ver o mundo com novos olhos.
  • 10:19 - 10:21
    Obrigado.
  • 10:21 - 10:32
    (Aplausos)
Title:
Diferentes formas de conhecimento
Speaker:
Daniel Tammet
Description:

Daniel Tammet tem sinestesia linguística, numérica e visual — o que significa que a sua perceção das palavras, números e cores está entrelaçada numa nova forma de apreender e compreender o mundo. Autor de "Nascido num Dia Azul", Tammet partilha a sua arte e a sua paixão por línguas neste vislumbre da sua mente maravilhosa.

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English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
10:33
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for Different ways of knowing
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Ilona Bastos added a translation

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