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Por que a curiosidade é chave para a ciência e a medicina

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    Ciência.
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    A palavra em si para muitos de vocês
    evoca lembranças infelizes de tédio
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    na aula de biologia ou física
    do ensino médio.
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    Mas deixem-me assegurar a vocês
    de que o que fizeram lá
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    tinha muito pouco a ver com a ciência.
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    Aquilo era, na verdade,
    o "quê" da ciência.
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    Era a história sobre
    o que outros haviam descoberto.
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    O que mais me interessa como cientista
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    é o "como" da ciência,
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    pois ciência é conhecimento em processo.
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    Fazemos uma observação,
    supomos uma explicação para ela,
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    e depois fazemos uma previsão
    a qual poderemos testar
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    com uma experiência ou outra observação.
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    Alguns exemplos.
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    Primeiramente, as pessoas notaram
    que a Terra estava abaixo, o céu acima,
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    e tanto o Sol quanto a Lua
    pareciam girar em torno deles.
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    A suposta explicação
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    era a de que a Terra devia ser
    o centro do Universo.
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    A previsão: tudo deve girar
    em torno da Terra.
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    Isso foi testado pela primeira vez
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    quando Galileu teve às mãos
    um dos primeiros telescópios,
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    e, enquanto observava o céu noturno,
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    ele encontrou um planeta, Júpiter,
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    com quatro luas que o circundavam.
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    Ele então usou essas luas
    para seguir o caminho de Júpiter
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    e descobriu que o planeta
    não girava ao redor da Terra,
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    mas ao redor do Sol.
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    Assim, o teste de previsão fracassou.
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    E isso levou à rejeição da teoria
    de que a Terra era o centro do Universo.
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    Outro exemplo: Isaac Newton
    percebeu que as coisas caem na Terra.
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    A suposta explicação era a gravidade
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    a previsão era a de que tudo
    deve cair na Terra.
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    Mas é claro que nem tudo cai na Terra.
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    Então, nós rejeitamos a gravidade?
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    Não!
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    Revisamos a teoria e dissemos:
    a gravidade atrai as coisas para a Terra
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    a menos que haja uma força
    oposta na outra direção.
  • 1:58 - 2:00
    Isso nos conduziu a um novo aprendizado.
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    Começamos a prestar mais atenção
    no pássaro e em suas asas,
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    e pensem em todas as descobertas
    que voaram dessa linha de raciocínio.
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    Assim, os fracassos dos testes,
    as exceções, e os valores atípicos
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    nos ensinam o que não sabemos
    e nos conduzem a algo novo.
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    É assim que a ciência avança e aprende.
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    Às vezes, na mídia,
    e ainda mais raramente,
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    mas, às vezes, até os cientistas dirão
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    que uma coisa ou outra foi
    cientificamente comprovada.
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    Mas eu espero que entendam
    que a ciência nunca prova nada
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    definitivamente para sempre.
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    Espera-se que a ciência permaneça
    curiosa o suficiente para buscar
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    e humilde o suficiente para reconhecer
    quando tivermos encontrado
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    o próximo valor atípico,
  • 2:50 - 2:52
    a próxima exceção,
  • 2:52 - 2:54
    que, como as luas de Júpiter,
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    nos ensinem o que realmente não sabemos.
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    Vamos mudar um pouco de direção.
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    O caduceu, ou símbolo da medicina,
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    tem significados diferentes
    para pessoas diferentes,
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    mas boa parte do nosso
    discurso público sobre medicina
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    a transforma num problema de engenharia.
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    Temos os corredores do Congresso,
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    e as salas de reuniões
    das companhias de seguros
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    que tentam descobrir como pagar por isso.
  • 3:16 - 3:17
    Os eticistas e epidemiologistas
  • 3:17 - 3:20
    tentam descobrir como distribuir
    melhor a medicina,
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    os hospitais e médicos
    são absolutamente obcecados
  • 3:23 - 3:25
    com seus protocolos e checklists,
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    tentando descobrir como administrar
    o medicamento de forma segura.
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    Todas são coisas boas.
  • 3:31 - 3:34
    No entanto, eles também assumem,
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    em algum nível,
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    que o livro da medicina está concluído.
  • 3:39 - 3:42
    Começamos a medir a qualidade
    dos nossos serviços à saúde
  • 3:42 - 3:44
    pela rapidez com que podemos acessá-los.
  • 3:44 - 3:46
    Não me surpreende que neste clima,
  • 3:46 - 3:49
    muitas das nossas instituições
    de prestação de serviços à saúde
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    comecem a se parecer
    com uma oficina mecânica.
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    (Risos)
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    O único problema é que quando
    me formei na faculdade de medicina,
  • 3:58 - 4:00
    não recebi uma daquelas bugigangas
  • 4:00 - 4:03
    que seu mecânico tem
    para conectar ao carro
  • 4:03 - 4:05
    e descobrir o que está errado com ele,
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    porque o livro de medicina
  • 4:07 - 4:09
    não está concluído.
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    Medicina é ciência.
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    A medicina é o conhecimento em processo.
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    Fazemos uma observação,
  • 4:17 - 4:19
    supomos uma explicação dela,
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    e então fazemos uma previsão
    que podemos testar.
  • 4:22 - 4:27
    A base de teste da maioria das previsões
    em medicina é populações.
  • 4:27 - 4:30
    E podem se lembrar daqueles
    dias tediosos na aula de biologia
  • 4:30 - 4:34
    que as populações tendem a se distribuir
    em torno de uma média,
  • 4:34 - 4:36
    como uma curva gaussiana ou normal.
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    Portanto, em medicina,
  • 4:37 - 4:40
    depois de fazermos uma previsão
    de uma suposta explicação,
  • 4:40 - 4:43
    nós a testamos numa população.
  • 4:43 - 4:45
    Isso significa
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    que o que sabemos em medicina,
    nosso conhecimento e experiência,
  • 4:49 - 4:51
    vêm de populações,
  • 4:51 - 4:55
    mas estende-se apenas
    até o próximo valor atípico,
  • 4:55 - 4:57
    a próxima exceção,
  • 4:57 - 5:01
    que, como as luas de Júpiter,
    nos ensinarão o que realmente não sabemos.
  • 5:02 - 5:05
    Sou um cirurgião que cuida
    de pacientes com sarcoma.
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    Sarcoma é uma forma muito rara de câncer.
  • 5:09 - 5:11
    É o câncer do tecido e dos ossos.
  • 5:11 - 5:16
    E eu diria que cada um
    dos meus pacientes é um valor atípico,
  • 5:16 - 5:17
    é uma exceção.
  • 5:18 - 5:22
    Não há nenhuma cirurgia que eu tenha
    executado num paciente com sarcoma,
  • 5:22 - 5:25
    que já tenha sido guiada por um
    ensaio clínico randomizado controlado,
  • 5:26 - 5:30
    considerado o melhor tipo de evidência
    baseada em população na medicina.
  • 5:30 - 5:33
    Falam sobre "pensar fora da caixa",
  • 5:33 - 5:35
    mas nem sequer temos
    uma "caixa para o sarcoma".
  • 5:35 - 5:39
    O que temos ao mergulharmos na incerteza,
  • 5:39 - 5:43
    desconhecimentos, exceções e valores
    atípicos que nos cercam no sarcoma
  • 5:43 - 5:48
    é o fácil acesso ao que acredito ser
    os dois valores mais importantes
  • 5:48 - 5:49
    para qualquer ciência:
  • 5:49 - 5:51
    humildade e curiosidade.
  • 5:52 - 5:54
    Pois se sou humilde e curioso,
  • 5:54 - 5:57
    quando um paciente me pergunta algo
  • 5:57 - 5:58
    e não sei a resposta,
  • 5:59 - 6:00
    vou perguntar a um colega
  • 6:00 - 6:03
    que pode ter um caso similar
    com outro paciente com sarcoma.
  • 6:03 - 6:06
    Podemos até estabelecer
    colaborações internacionais.
  • 6:06 - 6:09
    Esses pacientes começarão a conversar
    entre eles em salas de bate-papo
  • 6:09 - 6:11
    e grupos de apoio.
  • 6:11 - 6:14
    É através desse tipo de comunicação
    humilde e curiosa
  • 6:14 - 6:19
    que começamos a tentar
    e a aprender coisas novas.
  • 6:19 - 6:23
    Como exemplo, este é um paciente meu
    que teve câncer próximo ao joelho.
  • 6:23 - 6:28
    Por causa da comunicação humilde e curiosa
    em colaborações internacionais,
  • 6:28 - 6:33
    soubemos que podemos reorientar
    o tornozelo para servir como joelho
  • 6:33 - 6:35
    quando tivermos que remover
    o joelho com câncer.
  • 6:35 - 6:38
    Ele pode usar uma prótese,
    correr, pular e jogar.
  • 6:38 - 6:44
    Esta oportunidade ficou à disposição dele
    devido a colaborações internacionais.
  • 6:44 - 6:46
    Ele desejava isso,
  • 6:46 - 6:50
    pois havia contatado outros pacientes
    que a haviam experimentado.
  • 6:50 - 6:54
    E assim, exceções
    e valores atípicos em medicina
  • 6:54 - 6:58
    nos ensinam o que não sabemos,
    mas também nos levam a um novo raciocínio.
  • 6:59 - 7:01
    Agora, muito importante:
  • 7:01 - 7:05
    o novo raciocínio ao qual valores atípicos
    e exceções nos conduzem em medicina
  • 7:05 - 7:08
    não se aplica apenas
    a valores atípicos e exceções.
  • 7:09 - 7:12
    Não significa que, com pacientes
    com sarcoma, aprendemos apenas
  • 7:12 - 7:14
    a tratar pacientes com sarcoma.
  • 7:15 - 7:18
    Às vezes, valores atípicos e exceções
  • 7:19 - 7:22
    nos ensinam coisas que importam
    muito para a população em geral.
  • 7:23 - 7:25
    Como uma árvore fora de uma floresta:
  • 7:25 - 7:29
    os valores atípicos e as exceções
    chamam a nossa atenção
  • 7:29 - 7:33
    e nos conduzem a um sentido muito maior
    do que o significado de uma árvore.
  • 7:33 - 7:36
    É comum falarmos em perder
    as florestas para as árvores,
  • 7:36 - 7:40
    mas também se perde uma árvore
    dentro de uma floresta.
  • 7:41 - 7:43
    Mas a árvore que se destaca por si só
  • 7:43 - 7:46
    torna essas relações
    que definem uma árvore,
  • 7:46 - 7:50
    as relações entre o tronco,
    as raízes e os galhos,
  • 7:50 - 7:51
    muito mais aparentes.
  • 7:51 - 7:53
    Mesmo que essa árvore seja torta
  • 7:53 - 7:58
    ou tenha relacionamentos muito incomuns
    entre o tronco, as raízes e os galhos,
  • 7:58 - 8:03
    ela, todavia, chama a nossa atenção
    e nos permite fazer observações
  • 8:03 - 8:05
    que podemos então testar
    na população geral.
  • 8:06 - 8:08
    Eu disse que os sarcomas são raros.
  • 8:08 - 8:11
    Eles constituem cerca de 1%
    de todos os cânceres.
  • 8:11 - 8:15
    É provável que saibam que o câncer
    é considerado uma doença genética,
  • 8:16 - 8:19
    o que significa que ele
    é causado por oncogenes,
  • 8:19 - 8:21
    que são ativados no câncer,
  • 8:21 - 8:24
    e genes supressores de tumores,
    que são desligados para causar o câncer.
  • 8:24 - 8:27
    Podem achar que aprendemos sobre oncogenes
  • 8:27 - 8:29
    e genes supressores de tumores
    de cânceres comuns,
  • 8:29 - 8:32
    como o câncer de mama,
    de próstata ou de pulmão,
  • 8:32 - 8:34
    mas estariam errados.
  • 8:34 - 8:38
    Aprendemos sobre oncogenes e genes
    supressores de tumores pela primeira vez
  • 8:38 - 8:42
    naquele mínimo de 1%
    dos cânceres chamados sarcoma.
  • 8:43 - 8:47
    Em 1966, Peyton Rous recebeu
    o Prêmio Nobel por perceber que galinhas
  • 8:47 - 8:51
    tinham uma forma transmissível de sarcoma.
  • 8:51 - 8:54
    Trinta anos depois, Harold Varmus
    e Mike Bishop descobriram
  • 8:54 - 8:57
    qual era o elemento transmissível.
  • 8:57 - 8:58
    Era um vírus
  • 8:58 - 9:00
    portando um gene:
  • 9:00 - 9:01
    o oncogene src.
  • 9:02 - 9:06
    Eu não diria que o src é
    o oncogene mais importante.
  • 9:06 - 9:10
    Nem diria que é o oncogene mais
    frequentemente ativado em todo câncer.
  • 9:10 - 9:13
    Mas foi o primeiro oncogene.
  • 9:14 - 9:16
    A exceção, o valor atípico
  • 9:16 - 9:19
    chamou nossa atenção e nos levou a algo
  • 9:20 - 9:24
    que nos ensinou coisas muito importantes
    sobre o restante da biologia.
  • 9:25 - 9:29
    TP53 é o mais importante
    gene supressor de tumor.
  • 9:29 - 9:32
    É o gene supressor de tumor
    mais frequentemente desligado
  • 9:32 - 9:34
    em quase todos os tipos de câncer.
  • 9:34 - 9:37
    Mas não aprendemos
    isso com cânceres comuns.
  • 9:37 - 9:40
    Aprendemos quando os médicos Li e Fraumeni
    estavam observando famílias,
  • 9:41 - 9:46
    e perceberam que elas
    tinham muitos sarcomas.
  • 9:46 - 9:48
    Eu disse que o sarcoma é raro.
  • 9:48 - 9:51
    Lembrem-se de que um
    em um milhão de diagnósticos,
  • 9:51 - 9:53
    se ele se repetir numa família,
  • 9:53 - 9:56
    será comum demais nessa família.
  • 9:57 - 9:59
    O fato de serem raros
  • 9:59 - 10:01
    chama a nossa atenção
  • 10:02 - 10:04
    e nos leva a novos tipos de raciocínio.
  • 10:05 - 10:09
    Muitos de vocês podem dizer, e com razão:
  • 10:09 - 10:10
    "Sim, Kevin, isso é ótimo,
  • 10:10 - 10:13
    mas você não está falando
    sobre as asas de um pássaro,
  • 10:13 - 10:16
    nem sobre luas flutuando
    ao redor do planeta Júpiter.
  • 10:17 - 10:18
    Esta é uma pessoa.
  • 10:18 - 10:21
    Este valor atípico, esta exceção,
    pode levar ao avanço da ciência,
  • 10:21 - 10:23
    mas é uma pessoa".
  • 10:24 - 10:28
    E tudo o que posso dizer
    é que sei disso muito bem.
  • 10:30 - 10:33
    Converso com esses pacientes
    portadores de doenças raras e fatais.
  • 10:34 - 10:38
    Escrevo sobre essas conversas,
    que são terrivelmente graves.
  • 10:38 - 10:42
    Conversas repletas de frases horríveis
    como: "Tenho más notícias",
  • 10:42 - 10:44
    ou "Não há nada mais que possamos fazer."
  • 10:44 - 10:47
    Às vezes, essas conversas
    despertam uma única palavra:
  • 10:48 - 10:49
    "Terminal".
  • 10:53 - 10:56
    O silêncio também pode
    ser bastante desconfortável.
  • 10:57 - 11:02
    Os espaços em branco na medicina
    podem ser tão importantes
  • 11:02 - 11:04
    quanto as palavras usadas
    nessas conversas.
  • 11:05 - 11:07
    Quais são as incógnitas?
  • 11:07 - 11:09
    Que experiências estão sendo feitas?
  • 11:10 - 11:11
    Façam esse pequeno exercício comigo.
  • 11:11 - 11:15
    Lá em cima na tela, veem esta frase:
    "no where", lugar nenhum.
  • 11:15 - 11:17
    Observem onde está o espaço em branco.
  • 11:17 - 11:20
    Se deslocarmos aquele espaço em branco
  • 11:21 - 11:22
    "lugar nenhum"
  • 11:22 - 11:25
    torna-se "now here", agora aqui,
  • 11:25 - 11:29
    o significado oposto exato, apenas
    deslocando o espaço em branco.
  • 11:32 - 11:33
    Eu nunca vou me esquecer da noite
  • 11:33 - 11:36
    em que entrei no quarto
    de um de meus pacientes.
  • 11:36 - 11:40
    Eu havia operado aquele dia todo,
    mas ainda assim queria vê-lo.
  • 11:40 - 11:44
    Era um garoto que eu havia diagnosticado
    com câncer ósseo alguns dias antes.
  • 11:44 - 11:48
    Ele e a mãe haviam falado com os médicos
    da quimioterapia antes, naquele dia,
  • 11:48 - 11:51
    e ele tinha sido internado
    para iniciar a quimioterapia.
  • 11:51 - 11:53
    Era quase meia-noite
    quando cheguei ao quarto dele.
  • 11:53 - 11:56
    Ele estava dormindo,
    mas encontrei a mãe dele
  • 11:56 - 11:59
    lendo com uma lanterna
    ao lado da cama dele.
  • 11:59 - 12:02
    Ela saiu no corredor para conversar
    comigo por alguns minutos.
  • 12:02 - 12:06
    Ela estava lendo o protocolo
    que os médicos da quimioterapia
  • 12:06 - 12:08
    haviam dado a ela naquele dia.
  • 12:08 - 12:10
    Ela o havia memorizado.
  • 12:11 - 12:16
    Ela disse: "Dr. Jones, você me disse
    que nem sempre vencemos
  • 12:17 - 12:18
    este tipo de câncer,
  • 12:20 - 12:23
    mas tenho estudado este protocolo,
    e acho que posso fazer isso.
  • 12:24 - 12:28
    Acho que posso seguir
    estes tratamentos difíceis.
  • 12:28 - 12:30
    Vou pedir demissão,
    morar com os meus pais;
  • 12:30 - 12:33
    vou manter meu garoto a salvo".
  • 12:35 - 12:37
    Eu não disse a ela.
  • 12:38 - 12:41
    Não parei para corrigir o raciocínio dela.
  • 12:42 - 12:44
    Ela estava confiando num protocolo
  • 12:44 - 12:47
    que, mesmo que fosse seguido,
  • 12:47 - 12:50
    não necessariamente salvaria o filho dela.
  • 12:52 - 12:53
    Eu não disse a ela.
  • 12:54 - 12:56
    Não preenchi o espaço em branco.
  • 12:57 - 12:59
    Mas um ano e meio depois,
  • 12:59 - 13:02
    o filho dela morreu de câncer.
  • 13:03 - 13:05
    Eu deveria ter dito a ela?
  • 13:05 - 13:09
    Muitos de vocês podem dizer:
    "E daí? Eu não tenho sarcoma.
  • 13:09 - 13:11
    Ninguém na minha família tem sarcoma.
  • 13:11 - 13:13
    E está tudo bem,
  • 13:13 - 13:15
    mas, provavelmente,
    não importa na minha vida".
  • 13:15 - 13:16
    E vocês devem estar certos.
  • 13:16 - 13:19
    O sarcoma pode não importar
    muito na sua vida.
  • 13:21 - 13:23
    Mas a posição dos espaços
    em branco na medicina
  • 13:23 - 13:25
    importa na sua vida.
  • 13:27 - 13:29
    Não contei um segredinho a vocês.
  • 13:29 - 13:33
    Eu disse que na medicina
    testamos as previsões em populações,
  • 13:33 - 13:34
    mas eu não disse,
  • 13:35 - 13:37
    e muitas vezes a medicina nunca diz,
  • 13:37 - 13:40
    que cada vez que um indivíduo
  • 13:40 - 13:42
    recorre à medicina,
  • 13:42 - 13:46
    mesmo que ele esteja firmemente
    inserido na população geral,
  • 13:47 - 13:50
    nem o indivíduo nem o médico sabe
  • 13:50 - 13:52
    onde aquele indivíduo
    se encontra nessa população.
  • 13:53 - 13:58
    Portanto, cada encontro
    com a medicina é um experimento.
  • 13:58 - 14:02
    Você será um sujeito num experimento.
  • 14:03 - 14:07
    E o resultado será
    melhor ou pior para você.
  • 14:08 - 14:10
    Contanto que a medicina funcione bem,
  • 14:10 - 14:13
    estaremos bem com serviço rápido,
  • 14:13 - 14:17
    e com conversas desafiadoras e confiantes.
  • 14:18 - 14:22
    Mas quando as coisas não funcionam bem,
    às vezes queremos algo diferente.
  • 14:23 - 14:26
    Um colega meu removeu um tumor
    de um dos membros de uma paciente.
  • 14:27 - 14:29
    Ele estava preocupado com esse tumor.
  • 14:29 - 14:32
    Em nossas reuniões médicas,
    ele falou sobre sua preocupação,
  • 14:32 - 14:36
    dizendo que era um tipo de tumor
    com alto risco de voltar no mesmo membro.
  • 14:37 - 14:39
    Mas suas conversas com a paciente
  • 14:39 - 14:42
    eram exatamente o que um paciente
    pode querer: repletas de confiança.
  • 14:42 - 14:45
    Ele disse: "Eu retirei tudo
    e você está liberada".
  • 14:45 - 14:47
    Ela e o marido ficaram felizes.
  • 14:47 - 14:51
    Eles saíram, comemoraram: jantar chique,
    abriram uma garrafa de champanhe.
  • 14:52 - 14:54
    O único problema foi
    que algumas semanas depois,
  • 14:54 - 14:57
    ela começou a notar
    outro nódulo na mesma área.
  • 14:57 - 15:02
    Ele não havia retirado tudo,
    e ela não estava liberada.
  • 15:02 - 15:04
    Mas o que aconteceu nesta conjuntura
    me fascina muito.
  • 15:05 - 15:07
    Meu colega veio até mim e disse:
  • 15:07 - 15:10
    "Kevin, se importaria de cuidar
    desta paciente pra mim?"
  • 15:10 - 15:13
    Eu perguntei: "Por quê? Você sabe
    o que fazer tanto quanto eu.
  • 15:13 - 15:15
    Você não fez nada de errado".
  • 15:15 - 15:20
    Ele disse: "Por favor, apenas
    cuide dessa paciente pra mim".
  • 15:21 - 15:25
    Ele se sentia envergonhado,
    não pelo que tinha feito,
  • 15:25 - 15:27
    mas pela conversa que eles tinham tido,
  • 15:28 - 15:30
    pelo excesso de confiança.
  • 15:31 - 15:33
    Então fiz uma cirurgia muito mais invasiva
  • 15:33 - 15:36
    e depois tive uma conversa
    muito diferente com a paciente.
  • 15:36 - 15:39
    Eu disse: "É bem provável
    que eu tenha retirado tudo
  • 15:39 - 15:41
    e é provável que você esteja liberada,
  • 15:41 - 15:44
    mas este é o experimento
    que estamos fazendo.
  • 15:45 - 15:47
    Isto é o que você vai observar.
  • 15:47 - 15:49
    Isto é o que eu vou observar.
  • 15:49 - 15:53
    E vamos trabalhar juntos
    para saber se esta cirurgia vai funcionar
  • 15:53 - 15:55
    para que se livre do seu câncer".
  • 15:55 - 15:57
    Posso garantir que ela e o marido
  • 15:57 - 16:00
    não abriram outra garrafa de champanhe
    depois de terem falado comigo.
  • 16:02 - 16:04
    Mas agora ela era uma cientista,
  • 16:04 - 16:08
    não apenas um sujeito no experimento dela.
  • 16:10 - 16:12
    Por isso, encorajo vocês
  • 16:12 - 16:15
    a buscar humildade e curiosidade
  • 16:15 - 16:16
    em seus médicos.
  • 16:17 - 16:20
    Quase 20 bilhões de vezes ao ano,
  • 16:20 - 16:24
    uma pessoa entra num consultório médico,
  • 16:24 - 16:26
    e essa pessoa se torna um paciente.
  • 16:27 - 16:31
    Vocês, ou alguém que vocês amam, serão
    esse paciente algum dia muito em breve.
  • 16:32 - 16:34
    Como vão falar com seus médicos?
  • 16:35 - 16:36
    O que vão dizer a eles?
  • 16:37 - 16:39
    O que eles dirão a vocês?
  • 16:41 - 16:45
    Eles não podem dizer o que não sabem,
  • 16:46 - 16:49
    mas podem dizer quando não sabem,
  • 16:50 - 16:53
    se vocês simplesmente perguntarem.
  • 16:53 - 16:55
    Então, por favor, juntem-se à conversa.
  • 16:56 - 16:58
    Obrigado.
  • 16:58 - 16:59
    (Aplausos)
Title:
Por que a curiosidade é chave para a ciência e a medicina
Speaker:
Kevin Jones
Description:

A ciência é um processo de aprendizagem que envolve experimentação, falha e revisão - e a ciência da medicina não é exceção. O pesquisador de câncer Kevin B. Jones enfrenta as incógnitas profundas sobre cirurgia e cuidados médicos com uma resposta simples: honestidade. Numa conversa profunda sobre a natureza do conhecimento, Jones mostra como a ciência está no seu melhor quando os cientistas humildemente admitem o que ainda não entendem.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
17:13

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