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Como a comida modela as nossas cidades

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    Como é que se alimenta uma cidade?
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    É uma das grandes questões do nosso tempo.
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    No entanto, é uma pergunta
    que raras vezes se faz.
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    Temos por garantido que,
    se entrarmos numa loja ou restaurante,
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    ou mesmo no foyer deste teatro,
    dentro de cerca de uma hora,
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    vai haver comida à nossa espera,
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    vinda por artes mágicas de algum lado.
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    Mas quando se pensa
    numa cidade com o tamanho de Londres,
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    é necessário produzir-se comida suficiente,
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    transportá-la, vendê-la e comprá-la,
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    cozinhá-la, comê-la, deitar fora os restos,
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    e isso tem de acontecer todos os dias
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    em qualquer cidade do planeta.
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    É incrível como se consegue
    alimentar as cidades.
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    Vivemos em locais como este,
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    como se fosse a coisa mais natural do mundo,
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    esquecendo que, como somos animais
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    e precisamos de comer,
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    estamos, na verdade,
    tão dependentes do mundo natural
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    como os nossos antepassados estavam.
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    À medida que há mais gente
    a ir para as cidades,
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    mais bocados desse mundo natural
    estão a ser transformados
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    em paisagens extraordinárias
    como esta atrás de mim.
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    São campos de soja
    no Mato Grosso, no Brasil,
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    para nos alimentar.
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    Estas são paisagens extraordinárias.
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    Mas poucos de nós chegam a vê-las.
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    Cada vez mais, estas paisagens
    não nos alimentam só a nós.
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    À medida que há mais gente
    a mudar-se para as cidades,
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    há mais gente a comer carne,
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    de modo que um terço
    da produção mundial de grão
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    serve agora de alimento a animais,
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    em vez de nós, animais humanos.
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    E dado que é preciso três vezes mais grão
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    — aliás, dez vezes mais grão —
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    para alimentar um ser humano
    se este passar primeiro por um animal,
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    não é uma forma muito eficiente
    de nos alimentarmos.
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    E é também um problema galopante.
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    Estima-se que em 2050 o número de pessoas
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    a viver em cidades será o dobro.
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    E estima-se também que vai haver o dobro
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    do consumo de carne, leite e derivados.
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    Então, o urbanismo e a carne
    aumentam de mãos dadas.
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    E isso vai colocar-nos um enorme problema.
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    Seis mil milhões de carnívoros esfomeados
    para alimentar em 2050.
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    Esse é um grande problema.
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    Se continuarmos como estamos,
    é um problema
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    que muito provavelmente
    não seremos capazes de resolver.
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    Perdem-se todos os anos 19 milhões
    de hectares de floresta tropical
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    para criar nova terra arável
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    apesar de, ao mesmo tempo, estarmos
    a perder uma quantidade equivalente
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    de terra arável existente
    pela salinização e pela erosão.
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    Temos também muito apetite
    por combustíveis fósseis.
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    São precisas cerca de 10 calorias
    para produzir cada caloria
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    de comida que consumimos no Ocidente.
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    E apesar de haver comida
    que produzimos a custos óptimos,
  • 2:41 - 2:43
    não lhe damos o verdadeiro valor.
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    Metade da comida produzida nos EUA
    é, actualmente, deitada fora.
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    E o pior de tudo é que,
    no final deste longo processo,
  • 2:50 - 2:53
    não conseguimos alimentar
    o planeta decentemente.
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    Temos mil milhões de obesos,
    enquanto outros mil milhões passam fome.
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    Nada disto faz muito sentido.
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    Quando pensamos que, actualmente,
    80% do mercado global da comida
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    é controlado por apenas
    cinco multinacionais,
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    é um retrato horrendo.
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    À medida que nos mudamos para as cidades,
    o mundo adopta também uma dieta ocidental.
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    E, se olharmos para o futuro,
    é uma dieta insustentável.
  • 3:18 - 3:21
    Então, como é que chegámos aqui?
  • 3:21 - 3:23
    E mais importante, o que é que
    vamos fazer acerca disto?
  • 3:23 - 3:27
    Vou responder primeiro
    à questão um pouco mais fácil.
  • 3:27 - 3:31
    Encontramos o início deste processo
    há cerca de 10 000 anos,
  • 3:31 - 3:33
    no antigo Médio Oriente,
  • 3:33 - 3:35
    conhecido como o Crescente Fértil,
  • 3:35 - 3:38
    porque, como podem ver,
    tinha a forma de um crescente
  • 3:38 - 3:39
    e era fértil.
  • 3:39 - 3:42
    Foi aqui, há cerca de 10 000 anos,
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    que ocorreram
    duas invenções extraordinárias,
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    a agricultura e o urbanismo,
  • 3:47 - 3:50
    sensivelmente no mesmo lugar,
    e ao mesmo tempo.
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    Isto não é nenhum acaso.
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    Porque a agricultura
    e as cidades estão ligadas.
  • 3:55 - 3:56
    Precisam uma da outra.
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    Foi a descoberta dos cereais,
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    pelos nossos antepassados,
    pela primeira vez,
  • 4:01 - 4:04
    que revelou uma fonte de alimento
    suficientemente grande
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    e estável para sustentar
    uma colónia permanente.
  • 4:08 - 4:10
    Se observarmos como eram essas colónias,
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    podemos ver que eram compactas.
  • 4:12 - 4:14
    Eram rodeadas por terra agrícola produtiva
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    e dominadas por grandes
    complexos de templos
  • 4:17 - 4:19
    como este em Ur,
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    que eram, efectivamente,
  • 4:21 - 4:24
    centros de distribuição centralizada
    de alimentos espiritualizados,
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    porque eram os templos
    que organizavam as colheitas,
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    juntavam o grão, ofereciam-no aos deuses.
  • 4:30 - 4:33
    Depois ofereciam às pessoas
    o grão que os deuses não comiam.
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    Então, se quiserem,
  • 4:35 - 4:38
    podemos dizer que toda a vida
    física e espiritual destas cidades
  • 4:38 - 4:42
    era dominada pelo grão e pelas colheitas
    que as sustentavam.
  • 4:43 - 4:46
    Isto é verdade para qualquer cidade antiga.
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    Mas claro que nem todas e
    ram assim tão pequenas.
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    Como se sabe, Roma tinha cerca
    de um milhão de cidadãos
  • 4:51 - 4:53
    no primeiro século da nossa era.
  • 4:53 - 4:56
    Então, como é que
    uma cidade destas se alimentava?
  • 4:57 - 5:01
    A resposta é aquilo a que chamo
    "quilometragem antiga dos alimentos".
  • 5:01 - 5:03
    Basicamente, Roma tinha acesso ao mar,
  • 5:03 - 5:07
    o que tornava possível a importação
    de comida a partir de grandes distâncias.
  • 5:07 - 5:10
    Esta era a única forma de tornar
    isso possível no mundo antigo,
  • 5:10 - 5:13
    porque era muito difícil transportar
    alimentos pelas estradas,
  • 5:13 - 5:15
    que eram muito acidentadas.
  • 5:15 - 5:17
    E obviamente, a comida
    estragava-se muito rapidamente.
  • 5:17 - 5:21
    Roma travou guerra com nações
    como Cartago e o Egipto
  • 5:21 - 5:24
    apenas para deitar a mão
    às suas reservas de grão.
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    De facto, podemos dizer
    que a expansão do Império
  • 5:27 - 5:29
    foi uma espécie de longa e esgotada
  • 5:29 - 5:31
    ida às compras militarizada, na verdade.
  • 5:31 - 5:33
    (Risos)
  • 5:33 - 5:36
    Adoro este facto,
    tenho mesmo que falar nisto:
  • 5:36 - 5:39
    Roma, de facto chegou
    a importar ostras de Londres.
  • 5:39 - 5:40
    Acho que isso é extraordinário.
  • 5:40 - 5:45
    Então, Roma modelou o seu interior
    de acordo com o seu apetite.
  • 5:45 - 5:48
    Mas o mais interessante
    é que aquilo também
  • 5:48 - 5:50
    aconteceu no mundo pré-industrial.
  • 5:50 - 5:52
    Se olharmos para um mapa
    de Londres no século XVII,
  • 5:52 - 5:55
    podemos ver que o grão,
    chegava pelo Tamisa,
  • 5:55 - 5:57
    na parte de baixo deste mapa.
  • 5:57 - 6:00
    Os mercados de grão
    ficavam no sul da cidade.
  • 6:00 - 6:04
    E as estradas que deles
    partiam para Cheapside,
  • 6:04 - 6:05
    que era o principal mercado,
  • 6:05 - 6:07
    eram também mercados de grão.
  • 6:07 - 6:09
    Se olharmos para o nome duma dessas ruas,
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    Rua do Pão, podemos ver
    o que lá se passava há 300 anos.
  • 6:14 - 6:16
    E claro que o mesmo também
    era verdade para o peixe.
  • 6:16 - 6:20
    O peixe, claro, também chegava pelo rio.
    Era a mesma coisa.
  • 6:20 - 6:23
    O famoso Billingsgate
    era o mercado de peixe de Londres,
  • 6:23 - 6:26
    que se manteve em funcionamento
    no mesmo local até meados dos anos 80,
  • 6:26 - 6:28
    o que é algo extraordinário,
    quando se pensa nisso.
  • 6:28 - 6:30
    Toda a gente andava por ali
  • 6:30 - 6:32
    com telemóveis que pareciam tijolos,
  • 6:32 - 6:36
    e, ao fundo do porto
    uma azáfama com cheiro a peixe.
  • 6:36 - 6:39
    Esta é outra coisa acerca
    da comida nas cidades:
  • 6:39 - 6:41
    Depois de as suas raízes
    se estabelecerem na cidade,
  • 6:41 - 6:43
    muito raramente se deslocam.
  • 6:43 - 6:45
    A carne já é uma história diferente,
  • 6:45 - 6:48
    porque os animais podiam movimentar-se
    para dentro da cidade.
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    Muita da carne de Londres
    vinha de noroeste,
  • 6:51 - 6:53
    da Escócia e de Gales.
  • 6:53 - 6:57
    Chegava à cidade por noroeste,
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    motivo pelo qual Smithfield,
  • 6:59 - 7:02
    o muito afamado mercado de carne
    de Londres, se localizava aí.
  • 7:02 - 7:05
    As aves de capoeira vinham da Ânglia Oriental
    e por aí acima até ao nordeste.
  • 7:05 - 7:07
    Pareço a menina da meteorologia
    a fazer isto.
  • 7:07 - 7:08
    (Risos)
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    E então lá vinham as aves
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    com as suas patas protegidas
    por pequenos sapatos de algodão.
  • 7:13 - 7:15
    E eram vendidas quando chegavam
  • 7:15 - 7:17
    à ponta oriental de Cheapside.
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    E é por isso que lhes chamamos "poultry".
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    Se olharmos para o mapa de qualquer cidade
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    construída antes da era industrial,
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    podemos ver por onde
    é que a comida chegava.
  • 7:29 - 7:31
    Podemos ver como foi modelada
    fisicamente pela comida.
  • 7:31 - 7:34
    Os nomes das ruas
    também nos dão imensas pistas.
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    A Friday Street,numa vida anterior,
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    era onde se ia comprar
    o peixe à sexta-feira.
  • 7:38 - 7:41
    Mas também temos
    que imaginar isto cheio de comida.
  • 7:41 - 7:43
    Porque as ruas e os locais públicos
  • 7:43 - 7:46
    eram os únicos locais
    onde se comprava e vendia comida.
  • 7:46 - 7:49
    Se olharmos para uma imagem
    de Smithfield em 1830
  • 7:49 - 7:52
    vemos que devia ser muito difícil
    viver numa cidade como esta
  • 7:52 - 7:55
    e não ter consciência
    de onde vinha a comida.
  • 7:55 - 7:56
    O almoço de domingo, provavelmente
  • 7:56 - 7:59
    estava a mugir ou a balir junto da janela
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    cerca de três dias antes.
  • 8:01 - 8:03
    Esta era, obviamente, uma cidade orgânica,
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    parte de um ciclo orgânico.
  • 8:06 - 8:10
    Depois, nos 10 anos seguintes tudo mudou.
  • 8:10 - 8:12
    Esta é uma imagem da
    Grande Linha Férrea Ocidental em 1840.
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    Como podem ver, alguns dos primeiros
    passageiros do comboio
  • 8:15 - 8:17
    eram porcos e ovelhas.
  • 8:17 - 8:20
    De repente, estes animais já não entram
    pelo mercado adentro.
  • 8:20 - 8:22
    São abatidos longe da vista,
    longe do coração,
  • 8:22 - 8:24
    algures no meio rural.
  • 8:24 - 8:26
    E chegam à cidade de comboio.
  • 8:26 - 8:28
    Isto muda tudo.
  • 8:29 - 8:32
    Para começar,
    possibilita pela primeira vez,
  • 8:32 - 8:35
    que as cidades cresçam em tamanho e forma,
    em qualquer local.
  • 8:35 - 8:38
    As cidades costumavam
    estar limitadas pela geografia:
  • 8:38 - 8:42
    costumavam receber a sua comida
    através de difíceis meios físicos.
  • 8:42 - 8:45
    E de repente, encontram-se, efectivamente,
    emancipadas da geografia.
  • 8:45 - 8:48
    Como podem ver por estes mapas de Londres,
  • 8:48 - 8:50
    nos 90 anos depois
    do aparecimento dos comboios,
  • 8:50 - 8:54
    passa de uma pequena mancha
    muito fácil de alimentar
  • 8:54 - 8:56
    por animais que chegam
    pelo seu próprio pé,
  • 8:56 - 8:58
    a um grande borrão,
  • 8:58 - 9:01
    que seria muito difícil de alimentar
    por alguém a pé,
  • 9:01 - 9:03
    sejam animais ou pessoas.
  • 9:04 - 9:07
    Claro que isso foi apenas o início.
    Depois do comboio chegaram os carros.
  • 9:07 - 9:11
    E isso marca realmente
    o final deste processo.
  • 9:11 - 9:14
    É a emancipação final da cidade
  • 9:14 - 9:17
    de qualquer laço aparente com a natureza.
  • 9:17 - 9:19
    Isto é o tipo de cidade
    desprovida de cheiro,
  • 9:19 - 9:21
    desprovida de confusão,
    certamente desprovida de gente.
  • 9:21 - 9:24
    Porque ninguém sonharia
    caminhar num cenário destes.
  • 9:24 - 9:28
    O que se fazia para conseguir alimentos
    era meterem-se nos seus carros,
  • 9:28 - 9:30
    conduzir até um caixote
    algures nos arredores,
  • 9:30 - 9:32
    voltar com compras suficientes
    para uma semana,
  • 9:32 - 9:35
    e interrogar-se que raio fazer com aquilo.
  • 9:35 - 9:38
    E é este o momento em que a nossa relação,
  • 9:38 - 9:40
    tanto com a comida como com as cidades,
    muda completamente.
  • 9:40 - 9:43
    Agora temos a comida
    — que costumava ser o centro,
  • 9:43 - 9:46
    o núcleo social de uma cidade
    — na periferia.
  • 9:46 - 9:48
    A compra e venda de comida
    era um acontecimento social,
  • 9:48 - 9:50
    agora é anónimo.
  • 9:50 - 9:53
    Costumávamos cozinhar,
    agora apenas juntamos água,
  • 9:53 - 9:57
    ou um bocadinho de ovo
    se estamos a fazer um bolo.
  • 9:58 - 10:01
    Não cheiramos a comida
    para ver se está boa para comer.
  • 10:01 - 10:04
    Limitamo-nos a ler a etiqueta
    na parte de trás de uma embalagem.
  • 10:04 - 10:07
    E não valorizamos a comida.
    Não confiamos nela.
  • 10:07 - 10:10
    Em vez de confiar nela, temos receio dela.
  • 10:10 - 10:12
    Em vez de a valorizarmos,
    deitamo-la fora.
  • 10:13 - 10:17
    Uma das grandes ironias
    dos sistemas alimentares modernos
  • 10:17 - 10:21
    é que dificultaram exactamente
    o que tinham prometido facilitar.
  • 10:21 - 10:24
    Ao possibilitar a construção
    de cidades em qualquer lugar,
  • 10:24 - 10:28
    eles afastaram-nos
    da nossa relação mais importante,
  • 10:28 - 10:31
    que é a que temos com a natureza.
  • 10:31 - 10:34
    E também nos tornaram dependentes
    de sistemas que só eles podem providenciar,
  • 10:34 - 10:37
    que, como vimos, são insustentáveis.
  • 10:37 - 10:39
    Então o que é que havemos de fazer?
  • 10:39 - 10:41
    Não é nenhuma nova questão.
  • 10:42 - 10:45
    Há 500 anos, Thomas More interrogava-se.
  • 10:46 - 10:49
    Esta é a capa do seu livro "Utopia".
  • 10:49 - 10:51
    Era uma série de cidades-estado
    semi-independentes
  • 10:51 - 10:53
    — se isso soa remotamente familiar —
  • 10:53 - 10:54
    a um dia de caminhada umas das outras
  • 10:54 - 10:57
    onde praticamente todos eram
    loucos pela agricultura,
  • 10:57 - 10:58
    e cultivavam vegetais no quintal
  • 10:58 - 11:01
    e tinham refeições comunitárias juntos.
  • 11:01 - 11:02
    Acho que se pode argumentar
  • 11:02 - 11:06
    que a comida é um principio fundamental
    da ordem de Utopia,
  • 11:06 - 11:08
    apesar de More nunca o ter
    enquadrado dessa maneira.
  • 11:08 - 11:11
    Há uma outra versão muito famosa
    da visão de "Utopia",
  • 11:11 - 11:13
    a de Ebenezer Howard, "A cidade jardim".
  • 11:13 - 11:17
    A mesma ideia. Uma sucessão
    de cidades-estado semi-independentes.
  • 11:17 - 11:20
    Pequenas manchas de coisas metropolitanas
    com terra arável à volta,
  • 11:20 - 11:22
    ligadas por vias-férreas.
  • 11:22 - 11:24
    Mais uma vez, podemos dizer
  • 11:24 - 11:27
    que a comida era o princípio
    de ordem desta visão.
  • 11:27 - 11:29
    Chegou a ser construída,
    mas não tem nada a ver
  • 11:29 - 11:31
    com a visão que o Howard tinha.
  • 11:31 - 11:34
    E é esse o problema
    com estas ideias utópicas,
  • 11:34 - 11:37
    é que são utópicas.
  • 11:37 - 11:39
    A palavra "utopia" foi usada
    deliberadamente por Thomas More.
  • 11:39 - 11:43
    Era uma espécie de piada, porque
    os gregos atribuíam-lhe um duplo sentido.
  • 11:43 - 11:45
    Tanto significa um bom lugar,
    como lugar nenhum.
  • 11:45 - 11:49
    Porque é um ideal. É uma coisa imaginária.
    Não podemos tê-la.
  • 11:49 - 11:52
    E penso que, como ferramenta conceptual
  • 11:52 - 11:55
    para pensar acerca do problema profundo
    que é a habitação humana,
  • 11:55 - 11:56
    não tem muito uso.
  • 11:56 - 11:59
    Então arranjei uma alternativa,
  • 11:59 - 12:02
    que é "sitopia", do grego antigo,
  • 12:02 - 12:04
    "sitos" para alimento,
    e "topos" para lugar.
  • 12:04 - 12:07
    Acredito que já vivemos na Sitopia.
  • 12:07 - 12:09
    Vivemos num mundo modelado pela comida.
  • 12:09 - 12:13
    Se pensarmos bem, podemos usar a comida
    como uma ferramenta realmente ponderosa,
  • 12:13 - 12:17
    uma ferramenta conceptual, de design,
    para modelar o mundo de forma diferente.
  • 12:17 - 12:20
    Se fizéssemos isso,
    como seria o aspecto de Sitopia?
  • 12:21 - 12:23
    Bem, eu penso que se parece
    um pouco com isto.
  • 12:23 - 12:26
    Tenho que usar este slide.
    É só pela expressão da cara do cão.
  • 12:26 - 12:27
    (Risos)
  • 12:27 - 12:30
    De qualquer modo, isto é
    a comida no centro da vida,
  • 12:30 - 12:32
    no centro da vida familiar,
    sendo celebrada,
  • 12:32 - 12:35
    sendo apreciada, as pessoas
    a tirarem tempo para ela.
  • 12:35 - 12:38
    É aqui que a comida deve estar
    na nossa sociedade.
  • 12:38 - 12:42
    Mas não podemos ter cenários destes
    se não houver pessoas como estas.
  • 12:42 - 12:44
    Já agora, também podem ser homens aqui.
  • 12:44 - 12:46
    (Risos)
  • 12:46 - 12:48
    São as pessoas que pensam em comida,
  • 12:48 - 12:49
    que pensam à frente, que planeiam,
  • 12:49 - 12:52
    que podem olhar
    para um monte de vegetais crus
  • 12:52 - 12:53
    e reconhecê-los.
  • 12:53 - 12:56
    Precisamos destas pessoas.
    Fazemos parte de uma rede.
  • 12:56 - 13:00
    Porque sem este tipo de pessoas
    não podemos ter locais destes.
  • 13:00 - 13:03
    Escolhi este deliberadamente porque
    é um homem a comprar um vegetal.
  • 13:03 - 13:07
    Mas as redes, mercados onde a comida
    é cultivada localmente.
  • 13:07 - 13:10
    É comum. É fresco.
    Faz parte da vida social da cidade.
  • 13:11 - 13:13
    Porque sem isso não podemos
    ter este tipo de local,
  • 13:13 - 13:16
    comida que é cultivada localmente
    e também faz parte da paisagem,
  • 13:16 - 13:19
    e não é apenas
    um bem essencial de balanço nulo,
  • 13:19 - 13:21
    algures num buraco infernal nunca visto.
  • 13:21 - 13:23
    Vacas à vista.
  • 13:23 - 13:25
    Montes fumegantes de húmus.
  • 13:25 - 13:27
    Isto, basicamente, une tudo.
  • 13:27 - 13:30
    E este é um projecto de uma comunidade
  • 13:30 - 13:32
    que visitei recentemente em Toronto.
  • 13:32 - 13:34
    É uma estufa, onde se ensina aos miúdos
  • 13:34 - 13:36
    tudo sobre a comida
    e cultivo da comida.
  • 13:36 - 13:39
    Aqui está uma planta
    chamada Kevin, ou
  • 13:39 - 13:42
    talvez seja uma planta pertencente
    a um miúdo chamado Kevin, não sei.
  • 13:42 - 13:44
    Mas de qualquer modo, estes tipos de projectos
  • 13:44 - 13:48
    que tentam restabelecer os laços com a natureza
    são extremamente importantes.
  • 13:49 - 13:51
    Então Sitopia, para mim,
    é a forma de ver.
  • 13:51 - 13:54
    É reconhecer, basicamente, que Sitopia
  • 13:54 - 13:56
    já existe em pequenas bolsas
    por todo o lado.
  • 13:56 - 13:58
    O truque é juntá-las
  • 13:58 - 14:01
    para usar a comida
    como uma maneira de ver.
  • 14:01 - 14:04
    Se fizermos isso,
    vamos deixar de ver as cidades
  • 14:04 - 14:07
    como grandes manchas metropolitanas
    não produtivas, como esta.
  • 14:07 - 14:09
    Vamos vê-las mais como esta,
  • 14:09 - 14:12
    como parte das fundações orgânicas produtivas
  • 14:12 - 14:15
    das quais são inevitavelmente parte,
  • 14:15 - 14:16
    unidas simbioticamente.
  • 14:16 - 14:19
    Mas claro que esta também
    não é uma grande imagem.
  • 14:19 - 14:21
    Porque já não precisamos
    mais de produzir comida assim.
  • 14:21 - 14:24
    Precisamos de pensar mais em permacultura.
  • 14:24 - 14:26
    E é por isso que penso que esta imagem
  • 14:26 - 14:28
    resume o tipo de pensamento
    que precisamos de ter.
  • 14:28 - 14:30
    É a reconceptualização
  • 14:30 - 14:32
    da forma como a comida
    modela a nossa vida.
  • 14:32 - 14:35
    A melhor imagem que conheço
    disto tem 650 anos.
  • 14:35 - 14:39
    É a "Alegoria da Boa Governação"
    de Ambrogio Lorenzetti.
  • 14:39 - 14:42
    É sobre a relação entre a cidade e o campo.
  • 14:42 - 14:44
    E penso que a mensagem disto é muito clara.
  • 14:44 - 14:48
    Se a cidade cuidar do campo,
    o campo vai cuidar da cidade.
  • 14:48 - 14:51
    Queria que pensássemos agora
  • 14:51 - 14:53
    no que é que
    Ambrogio Lorenzetti pintaria
  • 14:53 - 14:55
    se pintasse este quadro hoje.
  • 14:55 - 14:58
    Qual seria o aspecto de uma alegoria
    da boa governação nos dias de hoje?
  • 14:58 - 15:01
    Porque eu penso que é uma questão urgente.
  • 15:01 - 15:03
    É uma coisa que temos que perguntar,
  • 15:03 - 15:05
    e temos que começar a responder.
  • 15:05 - 15:07
    Sabemos que somos aquilo que comemos.
  • 15:07 - 15:10
    Precisamos de perceber que o mundo
    também é o que comemos.
  • 15:10 - 15:12
    Se pegarmos nessa ideia,
    podemos usar a comida
  • 15:12 - 15:15
    como uma ferramenta verdadeiramente
    poderosa para modelarmos melhor o mundo.
  • 15:15 - 15:17
    Muito obrigada.
  • 15:17 - 15:20
    (Aplausos)
Title:
Como a comida modela as nossas cidades
Speaker:
Carolyn Steel
Description:

Todos os dias, numa cidade do tamanho de Londres, são servidos 30 milhões de refeições. Mas de onde vem toda esta comida? A arquitecta Carolyn Steel fala sobre o milagre diário que é alimentar uma cidade e mostra como as antigas rotas da comida modelaram o mundo moderno.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
15:25
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for How food shapes our cities
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for How food shapes our cities
Ana Brochado added a translation

Portuguese subtitles

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