-
O quinto verso:
-
"Seja da nossa família ou dos nossos amigos,
da nossa sociedade ou da nossa educação,
-
todas as sementes são, por natureza,
tanto individuais como coletivas."
-
Aqui temos mais um par de opostos:
-
Individual e coletivo.
-
E devemos ser capazes de transcender
essa ideia de coletivo e individual.
-
Na manifestação,
no mundo manifestado,
-
discernimos as coisas que são coletivas
e as coisas que são individuais.
-
O sol...
-
o sol no céu é considerado
algo coletivo.
-
Partilhamos igualmente o sol.
-
E o quintal da minha casa
é considerado algo individual.
-
Sou a única pessoa que pode desfrutar
do quintal da minha casa.
-
Então, um é individual
e o outro é coletivo.
-
Mas, se olharmos mais profundamente, veremos que...
-
o que chamamos de coletivo não é inteiramente coletivo.
-
O mesmo sol, sim.
Mas vivemos em países diferentes...
-
Vivemos em estados diferentes.
-
Temos diferentes tipos de clima.
-
Portanto, há o individual no coletivo.
E há o coletivo no individual.
-
A constituição, a lei,
é descrita como algo coletivo...
-
Todos podem usufruir da mesma constituição,
-
do mesmo conjunto de leis.
-
Mas há pessoas que sabem como tirar proveito,
-
e há aquelas que não sabem
como tirar proveito e proteger-se.
-
Assim, o coletivo e o individual...
-
interexistem.
-
Falemos de um autocarro...
-
um autocarro onde 50 pessoas se sentam.
-
O autocarro é algo coletivo...
-
...para essas 50 pessoas.
-
E eu tenho o meu próprio corpo,
-
que é individual.
-
E, ao continuar a olhar para outras pessoas,
posso ver os seus corpos, os seus olhos, os seus rostos,
-
as suas roupas, tudo.
-
Mesmo que uma pessoa use uns óculos
que lhe pertencem,
-
eu já consigo ver esses óculos.
-
Então, esses óculos, embora pertencendo a ele,
-
também os posso ver, posso percebê-los.
-
E essa pessoa não sou eu, mas, pelo facto de
poder vê-la,
-
partilho, também partilho...
-
Posso também partilhar a sua presença.
-
Assim, aquilo que essa pessoa pensa ser
algo individual...
-
...tem em si a natureza do coletivo.
-
E há coisas que eu não vejo,
-
como o sistema nervoso do motorista.
-
A constituição fisiológica do motorista,
os seus nervos ópticos...
-
...eu não os posso ver.
-
Os nervos ópticos do motorista parecem ser
algo estritamente individual.
-
Mas, sendo ele o meu motorista, a qualidade dos seus nervos ópticos
pode determinar a minha segurança.
-
Portanto, os nervos ópticos do motorista
têm algo a ver comigo.
-
Assim, não são estritamente individuais.
-
São também coletivos, até certo ponto.
-
Portanto, quando olhamos profundamente para qualquer coisa
à nossa volta ou dentro de nós,
-
podemos descobrir se algo
é mais coletivo...
-
ou mais individual.
-
Nada é absolutamente coletivo,
e nada é completamente individual.
-
Suponhamos que há uma vela.
-
E a vela, ao ser acesa,
começa a oferecer zonas de luz.
-
Aqui a luz é mais brilhante.
-
Aqui é menos brilhante.
-
E aqui é ainda menos.
-
E suponhamos que aqui...
-
temos outra vela.
E, quando acendemos a vela...
-
ela oferece esta luz...
desta forma.
-
Claro que esta luz é mais brilhante...
do que aqui,
-
e mais brilhante do que aqui,
e mais brilhante do que aqui.
-
Assim, a luz emitida por esta vela
-
ilumina esta vela.
-
Faz com que as pessoas vejam bem esta vela.
-
Mas também ilumina a outra vela.
-
E ajuda a outra vela
a ser vista com mais clareza.
-
A outra vela já tem a sua própria luz.
-
Mas agora, ao analisarmos
esta zona, por exemplo...
-
vemos que a luz aqui é uma luz coletiva,
-
vinda desta vela
e vinda desta vela.
-
E, se compararmos esta zona com esta zona,
já há uma diferença.
-
Portanto, o grau de coletividade e
individualidade é diferente
-
em cada espaço.
-
O facto é que o coletivo contém o individual;
o individual contém o coletivo,
-
e, se continuarmos a olhar,
não há coletividade absoluta;
-
não há individualidade absoluta.
-
A nossa ideia de coletividade e individualidade
são apenas ideias.
-
Consideremos o nosso cérebro dentro do nosso crânio.
-
É individual ou coletivo?
-
A forma como pensas,
-
a forma como julgas,
-
a forma como avalias,
-
a forma como gostas, a forma como odeias.
-
Olha profundamente para a natureza
do teu gostar, do teu odiar...
-
das tuas ideias, da tua apreciação,
da tua raiva.
-
Verás que tudo tem
a natureza do coletivo,
-
e tudo tem também
a natureza do individual.
-
Olha para o mercado de ações...
-
a subida e a descida do mercado de ações.
-
Quais são os elementos que determinam
a subida e a descida destas coisas?
-
O coletivo e o individual.
-
O coletivo é feito do individual,
e o individual é feito do coletivo.
-
O Buda disse:
"Isto é porque aquilo é."
-
Tão simples.
E, no entanto, tão profundo.
-
Talvez queiras fazer esta pergunta:
-
O meu alaya [consciência armazenadora]
é diferente do teu?
-
Existe um alaya para todos,
um alayavijñana coletivo para todos?
-
Ou há um alaya separado para cada pessoa?
-
É muito natural que faças essa pergunta.
-
Dissemos que existem pares de opostos.
-
Quando vires um par de opostos a manifestar-se,
-
tenta sempre olhar para a natureza da interexistência.
-
Isto/aquilo é outro par de opostos.
-
Eu e o não-eu,
-
tu e eu,
pai e filho.
-
Já tivemos a oportunidade de olhar para
a natureza da interexistência entre pai e filho.
-
Se o filho puder voltar a si mesmo,
tocar-se profundamente,
-
olhando profundamente para dentro de si,
-
ele verá que é uma continuação
do seu pai.
-
E mesmo que tenha sofrido tanto
por causa do seu pai...
-
mesmo que tenha odiado o seu pai...
-
mesmo que tenha declarado que não quer
ter nada a ver com o seu pai,
-
ele descobrirá que é a continuação do seu pai.
-
Ele não pode retirar o pai de dentro de si.
-
Como poderia?
Ele é a continuação do seu pai.
-
Ele é o seu pai.
-
Assim, o desejo de não querer
ter nada a ver com o pai
-
é apenas uma ilusão.
-
Porque tu és a continuação do teu pai.
-
Tu és o teu pai.
-
Há uma coisa em ti que precisa ser trabalhada:
-
esse tipo de raiva,
esse tipo de ódio,
-
que nasce da tua ignorância,
da tua ilusão.
-
Pai e filho são um par de opostos.
-
E, se olhares profundamente para
a natureza de pai e filho,
-
descobrirás a natureza da interexistência.
-
Eu e não-eu
-
é outro par de opostos.
-
Dissemos que o eu é feito de
elementos não-eu.
-
E essa afirmação pode ser muito útil
-
para que possamos ter a oportunidade
de olhar profundamente, tocar profundamente o eu,
-
descobriremos que o eu é feito
de nada além de elementos não-eu.
-
Outro conceito:
-
dentro e fora.
-
Talvez queiras perguntar:
onde está a nossa consciência armazenadora?
-
Está dentro do corpo
ou fora do corpo?
-
Vimos que cada célula do nosso corpo contém
todas as características, todos os elementos,
-
todas as experiências, todas as alegrias, todos os sofrimentos
de muitas gerações de antepassados.
-
Com apenas uma célula
do nosso corpo,
-
podemos criar uma réplica de nós mesmos.
-
E é possível dizer que...
-
alayavijñana, a nossa consciência armazenadora,
pode ser tocada dentro de cada célula do nosso corpo.
-
Todos os genes...
-
os genes em nós, podemos descrevê-los
como sementes, como bijas...
-
propriedades.
-
São propriedades
que podem ser reconhecidas,
-
podem ser tocadas.
-
Os talentos, a felicidade,
o sofrimento...
-
de todos os nossos antepassados podem ser reconhecidos
dentro de cada célula do nosso corpo.
-
Então, é possível dizermos que...
-
a consciência armazenadora pode ser encontrada
em cada célula do nosso corpo.
-
Mas também sabemos...
-
que o dentro é feito do fora.
-
Ao tocarmos o nosso corpo,
reconhecemos o elemento água,
-
o elemento calor,
o elemento ar,
-
o elemento terra dentro de nós.
-
E sabemos que esses quatro elementos...
-
estão fora do nosso corpo...
-
e que, se continuarmos a tocar profundamente,
perceberemos que o sol é o meu segundo coração.
-
O meu primeiro coração parece estar dentro do meu corpo.
-
E eu sei que, se o meu primeiro coração
parar de funcionar,
-
morrerei imediatamente.
-
Mas o sol é o meu segundo coração,
brilhando no céu.
-
Se o sol parar,
também morrerei imediatamente.
-
Por isso, "O Sol, Meu Coração"
é o título de um dos meus livros.
-
Tenho um coração fora do meu corpo.
-
Talvez o meu corpo seja maior do que isto.
-
O meu corpo é o próprio cosmos.
-
Na outra noite, eu disse:
um pedaço de pão que comemos...
-
...é o corpo do cosmos.
Cada um de nós é também o corpo do cosmos.
-
Não estamos limitados ao nosso corpo.
E quando morremos,
-
não morremos.
E sabemos que o nosso corpo não somos nós.
-
Somos mais do que este corpo.
-
Então, onde está alaya?
-
Podemos dizer que alaya está
em cada célula do nosso corpo,
-
e também podemos dizer que
alaya está fora do nosso corpo.
-
A ideia de fora e dentro é também
um par de opostos a ser transcendido.
-
Estamos sentados aqui na posição de lótus
ou meia posição de lótus.
-
Estamos confiantes de que esta direção...
-
é o acima
-
e esta é a direção do abaixo.
-
Mas outras pessoas que praticam meditação sentada
do outro lado do planeta
-
não concordariam.
-
Não diriam que isto é o seu acima.
-
Isto é o seu abaixo.
-
Portanto, a ideia de abaixo e acima
não pode ser aplicada ao cosmos.
-
Porque abaixo e acima é também
outro par de opostos.
-
Seria muito útil
se treinássemos o nosso olhar desta forma.
-
O acima contém o abaixo;
-
o abaixo contém o acima.
-
O dentro pode ser tocado no fora;
o fora pode ser tocado no dentro.
-
Estamos presos em ideias.
-
E é por isso que é difícil para nós
tocar a realidade última.