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Cultura pop faz a diferença | Gustavo Mini | TEDxLaçador

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    Bom, eu não vim falar nem sobre música,
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    nem sobre publicidade.
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    Eu vim falar aqui sobre pais e filhos.
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    Eu sou filho há 40 anos
    e sou pai só há três,
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    mas eu já descobri uma coisa.
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    Eu descobri que todo filho
    é, de certa maneira,
  • 0:26 - 0:29
    um estrangeiro para os seus pais.
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    Quando um bebê nasce, na verdade,
    até aprece que ele veio de outro planeta.
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    Ele se alimenta de um jeito diferente,
  • 0:37 - 0:39
    ele fala de um jeito diferente,
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    ele se movimenta de um jeito diferente,
  • 0:42 - 0:44
    ele se veste de um jeito diferente,
  • 0:44 - 0:46
    ele é todo diferente dos pais.
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    Depois ele cresce e durante a infância
  • 0:49 - 0:52
    os pais até conseguem moldar os filhos
  • 0:52 - 0:55
    mais ou menos à sua imagem
    e semelhança, como se diz.
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    Mas em seguida vem a adolescência,
    vem a vida adulta,
  • 0:59 - 1:02
    e daí coisas acontecem,
    os filhos fazem as suas escolhas
  • 1:03 - 1:06
    e os filhos se tornam mesmo
    de alguma maneira estrangeiros
  • 1:06 - 1:08
    em relação aos pais, em algum nível.
  • 1:09 - 1:13
    Todos os filhos são estrangeiros
    para os seus pais,
  • 1:13 - 1:16
    mas alguns são mais estrangeiros
    do que os outros.
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    Quando meu filho nasceu, três anos atrás,
  • 1:18 - 1:22
    a gente logo notou que ele era diferente.
  • 1:22 - 1:25
    Diferente das outras crianças,
    durante a noite ele não acordava,
  • 1:25 - 1:28
    ele não acordava chorando para mamar.
  • 1:28 - 1:31
    Ele só dormia, o que às vezes
    era uma coisa boa, inclusive,
  • 1:31 - 1:33
    ele dormia o tempo inteiro.
  • 1:33 - 1:36
    Eles só dormia. Ele era mais molinho.
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    Ele demorou para começar a engatinhar,
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    começar a se movimentar, rolar,
  • 1:41 - 1:45
    e começar a comer, depois de mamar.
  • 1:45 - 1:50
    Depois de sete meses de especialistas
    e de exames e consultas,
  • 1:50 - 1:53
    a gente teve o diagnóstico,
    ele tem uma síndrome rara,
  • 1:53 - 1:57
    não muito conhecida ainda,
    chamada síndrome de Prader Willi.
  • 1:58 - 2:01
    A síndrome de Prader Willi
    foi descrita pelo jornal El País
  • 2:01 - 2:05
    como a enfermidade dos mil sintomas.
  • 2:05 - 2:10
    Quem tem Prader Willi, nos primeiros anos
  • 2:10 - 2:14
    tem essa dificuldade
    de mamar, de se movimentar
  • 2:14 - 2:18
    dificuldade de começar
    a engatinhar, caminhar e falar.
  • 2:18 - 2:22
    Depois entre os quatro e os oito anos
    aparece o sintoma mais dramático,
  • 2:22 - 2:24
    que é uma fome insaciável
  • 2:24 - 2:28
    causada por uma desregulação
    no hipotálamo.
  • 2:29 - 2:33
    A pessoa que tem Prader Willi,
    por causa dessa condição
  • 2:33 - 2:35
    que é causada por uma alteração
    genética aleatória,
  • 2:35 - 2:39
    ela precisa da ajuda
    de pessoas ao redor dela
  • 2:39 - 2:42
    para ela não comer sem parar.
  • 2:42 - 2:47
    Ela não recebe no cérebro
    a informação de saciedade.
  • 2:47 - 2:50
    E isso associado
    a um metabolismo mais lento
  • 2:50 - 2:55
    faz com que ela tenha
    uma fácil propensão à obesidade,
  • 2:55 - 2:57
    em alguns casos à obesidade mórbida,
  • 2:57 - 3:00
    com todas as consequências que isso traz.
  • 3:01 - 3:04
    Mais ainda, quem tem Prader Willi
    tem, em algum nível,
  • 3:04 - 3:09
    distúrbio de comportamento,
    dificuldade de aprendizagem
  • 3:09 - 3:12
    e em alguns casos autismo.
  • 3:13 - 3:17
    Tudo isso a gente descobriu
    no dia do diagnóstico
  • 3:17 - 3:21
    e como quaisquer pais fariam,
    a primeira coisa que a gente fez
  • 3:21 - 3:22
    foi ir para a Internet
  • 3:22 - 3:25
    e ler tudo o que a gente podia
    sobre a síndrome.
  • 3:25 - 3:31
    Nesse dia eu percebi o quanto
    o João Gabriel seria estrangeiro para mim
  • 3:31 - 3:33
    para o resto da vida,
  • 3:33 - 3:36
    independente das escolhas dele
    ou do que acontecesse com ele.
  • 3:37 - 3:39
    O escritor americano Andrew Solomon
  • 3:39 - 3:43
    chama isso de identidades verticais
    e identidades horizontais,
  • 3:43 - 3:46
    ele coloca isso no livro "Longe da Árvore"
  • 3:46 - 3:50
    e também num TED Talk que,
    inclusive, a gente viu aqui hoje.
  • 3:50 - 3:53
    Para relembrar, as identidades verticais
  • 3:53 - 3:55
    são aquelas passadas de pais para filhos
  • 3:55 - 3:58
    a partir de genética
    ou mesmo culturalmente.
  • 3:58 - 4:02
    As identidades horizontais são aquelas
    que os filhos constróem
  • 4:02 - 4:06
    em relação a grupos culturais
    com os quais eles têm afinidade.
  • 4:06 - 4:12
    Segundo Solomon, filhos esquizofrênicos,
    com Síndrome de Down,
  • 4:12 - 4:17
    cegos, surdos, anões
    que tenham pais normais,
  • 4:17 - 4:19
    eles têm a sua identidade horizontal
  • 4:19 - 4:23
    definida primordialmente
    pelas suas condições de saúde.
  • 4:26 - 4:30
    É como se pais e filhos já fossem
    de planetas diferentes
  • 4:30 - 4:32
    já de largada, independente
    do que fosse acontecer depois,
  • 4:32 - 4:34
    das escolhas posteriores.
  • 4:35 - 4:37
    Isso não impede que a gente tente,
  • 4:37 - 4:41
    que nós, pais que temos essas diferenças
    já de largada com seus filhos,
  • 4:41 - 4:46
    que a gente tente construir pontes,
    conexões com eles.
  • 4:46 - 4:49
    Cada pessoa, cada família
    tem um jeito de fazer isso
  • 4:49 - 4:54
    e no meu caso eu descobri
    muitas fontes interessantes de conexão
  • 4:54 - 4:56
    nos quadrinhos, nos livros,
  • 4:56 - 5:00
    nos seriados, nos filmes,
    nas músicas, nos games
  • 5:00 - 5:02
    que eu curto.
  • 5:02 - 5:04
    Por exemplo, vou dar um exemplo.
  • 5:04 - 5:05
    Os X-Men.
  • 5:06 - 5:08
    Não sei quem conhece os X-Men,
  • 5:08 - 5:11
    mas eles são um grupo
    de mutantes dos quadrinhos;
  • 5:12 - 5:14
    os mutantes nos quadrinhos
    são seres humanos
  • 5:14 - 5:17
    que têm alterações genéticas
    que dão poderes para eles.
  • 5:17 - 5:20
    Nas histórias dos X-Men,
    os mutantes são considerados
  • 5:20 - 5:22
    o próximo passo da escala evolucionária
  • 5:22 - 5:25
    e por isso eles também
    são considerados uma ameaça
  • 5:25 - 5:26
    pelos seres humanos normais.
  • 5:26 - 5:28
    É muito comum, nas histórias dos X-Men,
  • 5:28 - 5:31
    que as crianças
    sejam perseguidas por isso.
  • 5:31 - 5:34
    E um dos poucos lugares
    onde elas encontram refúgio
  • 5:34 - 5:39
    é a escola para crianças especiais
    do Professor Charles Xavier,
  • 5:39 - 5:41
    que é o líder dos X-Men,
  • 5:41 - 5:43
    o mentor dos X-Men,
  • 5:43 - 5:45
    e por sinal, um cadeirante.
  • 5:45 - 5:48
    Um dia, eu estava na casa de um amigo meu,
  • 5:48 - 5:51
    que também é fã de quadrinhos,
    que também é fã de X-Men,
  • 5:51 - 5:54
    e estava comentando com ele,
    contando as histórias
  • 5:54 - 5:57
    que a gente tava passando
    com o João Gabriel, as dificuldades,
  • 5:57 - 6:00
    e falei pra ele: "Mas não é só problema,
  • 6:00 - 6:02
    a gente também tem coisas boas".
  • 6:02 - 6:06
    Por exemplo, o João Gabriel
    tem uma alteração genética,
  • 6:06 - 6:09
    se ele tem uma alteração genética,
    ele é um mutante,
  • 6:09 - 6:11
    se ele é um mutante,
    ele está automaticamente
  • 6:11 - 6:14
    qualificado para entrar
    na escola do professor Charles Xavier.
  • 6:14 - 6:15
    (Risos)
  • 6:15 - 6:18
    O que para um fã de quadrinhos,
  • 6:18 - 6:20
    é como se o filho
    pudesse entrar em Harvard.
  • 6:20 - 6:22
    (Risos)
  • 6:22 - 6:26
    (Aplausos)
  • 6:28 - 6:30
    Então tem muitos amigos meus
  • 6:30 - 6:33
    que têm filhos que um dia
    vão poder entrar em Harvard,
  • 6:33 - 6:34
    mas nenhum deles tem um filho
  • 6:34 - 6:37
    que poderia entrar na escola
    do Professor Charles Xavier
  • 6:37 - 6:39
    e se tornar um X-Men.
  • 6:40 - 6:44
    Um outro exemplo,
    outra coisa que me fez bem
  • 6:44 - 6:47
    foi ler o livro "Jovens
    de um Novo Tempo, Despertai",
  • 6:47 - 6:49
    do prêmio Nobel de literatura
    Kenzaburo Oe,
  • 6:49 - 6:51
    que tem um filho,
  • 6:51 - 6:54
    ele tem um filho com uma deficiência
    cerebral de nascença.
  • 6:54 - 6:57
    Nesse livro, ele conta a história
    de um escritor, que é o alter ego do Oe,
  • 6:57 - 7:00
    um escritor que tem um filho
    também com uma deficiência
  • 7:00 - 7:04
    e que se propõe, no início do livro,
    a escrever uma enciclopédia
  • 7:04 - 7:06
    sobre todas as coisas do mundo
  • 7:06 - 7:09
    de um jeito que as crianças
    com deficiência entendam.
  • 7:10 - 7:13
    Que é um projeto super nobre,
    super inspirador,
  • 7:13 - 7:16
    mas se passam 300 páginas do livro,
  • 7:16 - 7:18
    e nada do personagem principal
  • 7:18 - 7:20
    escrever a tal da enciclopédia,
  • 7:20 - 7:24
    porque ele se perde
    nas angústias existenciais dele,
  • 7:24 - 7:26
    ele se perde nos problemas domésticos,
  • 7:26 - 7:29
    ele se perde com os problemas
    profissionais que ele tem
  • 7:29 - 7:31
    e não escreve o tal do livro.
  • 7:31 - 7:33
    Embora eu não escreva como um Nobel,
  • 7:33 - 7:35
    eu fiquei super feliz de perceber
  • 7:35 - 7:37
    que eu me angustio, que eu me perco
  • 7:37 - 7:40
    e que eu me disperso de um jeito
    muito parecido com o de um Nobel.
  • 7:40 - 7:45
    É uma honra estar no mesmo barco
    que o Kenzaburo Oe
  • 7:46 - 7:49
    e isso só aconteceu
    graças ao meu filho também.
  • 7:51 - 7:53
    Um terceiro exemplo:
  • 7:53 - 7:57
    a Amy Farrah Fowler, a namorada
    do Sheldon no "The Big Bang Theory",
  • 7:57 - 8:00
    além de atriz,
    que faz a Amy Farrah Fowler,
  • 8:00 - 8:04
    além de atriz ela é
    doutora em neurociência
  • 8:04 - 8:05
    e a tese de doutorado dela
  • 8:05 - 8:10
    é sobre regulação do hipotálamo em relação
    a comportamentos problemáticos
  • 8:10 - 8:12
    na síndrome de Prader Willi.
  • 8:13 - 8:17
    Que eu me lembre, nunca
    a síndrome do João Gabriel
  • 8:17 - 8:20
    apareceu em algum episódio desse;
  • 8:20 - 8:23
    que, eu acho, é o seriado de comédia
    mais assistido do mundo,
  • 8:23 - 8:25
    se não é, é um deles;
  • 8:25 - 8:28
    mas só de saber que tem
    algum tipo de intersecção
  • 8:28 - 8:33
    entre o universo do João Gabriel
    e o meu universo e o nosso;
  • 8:33 - 8:36
    porque a minha mulher, minha enteada,
    a gente lá em casa gosta desse seriado;
  • 8:36 - 8:39
    só de ver que existe essa conexão,
  • 8:39 - 8:42
    isso já deixa a gente um pouco mais feliz.
  • 8:42 - 8:46
    Na verdade, nada disso
    resolve de maneira prática
  • 8:46 - 8:50
    as dificuldades que a gente enfrenta
    com a síndrome de Prader Willi,
  • 8:50 - 8:57
    mas saber que existe essa conexão,
    que existe essa intersecção
  • 8:57 - 8:59
    entre o universo do João Gabriel
  • 8:59 - 9:03
    e todas as coisas
    de que eu gosto, que eu curto
  • 9:03 - 9:06
    e que, em alguns casos,
    me constituíram culturalmente,
  • 9:06 - 9:09
    isso ajuda a reduzir uma certa distância
  • 9:09 - 9:13
    que se colocou entre mim e ele
    no dia do diagnóstico,
  • 9:13 - 9:19
    que é uma coisa de que não se fala muito,
    mas que efetivamente acontece.
  • 9:20 - 9:27
    Da mesma maneira,
    eu acho que um filme como "Milk",
  • 9:27 - 9:30
    aquele filme que conta a história
    do ativista gay Harvey Milk,
  • 9:30 - 9:34
    certamente ajudaria pais heterossexuais
  • 9:34 - 9:36
    que têm algum tipo de dificuldade
  • 9:36 - 9:39
    com um filho ou com uma filha homossexual.
  • 9:39 - 9:43
    Eu acho também que um livro
    e um filme como "A Culpa É das Estrelas"
  • 9:43 - 9:45
    oferece uma oportunidade única de diálogo
  • 9:45 - 9:48
    entre pais saudáveis
    e um filho ou uma filha
  • 9:48 - 9:52
    que tem uma doença terminal
    ou uma doença degenerativa.
  • 9:52 - 9:54
    Eu acho que pais
    que têm um filho ou uma filha
  • 9:54 - 9:57
    com paralisia cerebral talvez
    se sintam mais especiais
  • 9:57 - 10:00
    de saber que um dos grandes
    cantores do nosso tempo,
  • 10:00 - 10:05
    o Neil Young, desafiou os fãs dele
    e a gravadora dele,
  • 10:05 - 10:09
    numa certa época, porque ele compôs
    umas músicas super diferentes
  • 10:09 - 10:10
    do que ele vinha fazendo
  • 10:10 - 10:13
    totalmente inspiradas
    no tratamento do filho dele
  • 10:13 - 10:15
    que tem paralisia cerebral.
  • 10:15 - 10:18
    Talvez pais que enxergam
  • 10:18 - 10:20
    e que têm um filho ou uma filha cega
  • 10:20 - 10:22
    se sintam orgulhosos de saber
  • 10:22 - 10:25
    que o seriado mais assistido
    do mundo hoje, no Netflix,
  • 10:25 - 10:29
    é protagonizado
    por um herói cego, o Demolidor.
  • 10:30 - 10:34
    Enfim, tudo isso
    que a gente chama de cultura pop
  • 10:34 - 10:40
    é uma fonte muito poderosa
    de códigos de comunicação
  • 10:40 - 10:43
    e de reconhecimento social do mundo hoje.
  • 10:43 - 10:45
    Perguntem para qualquer fã de Harry Potter
  • 10:45 - 10:49
    ou de Jogos Vorazes, ou de alguma série
    de games ou de seriado
  • 10:49 - 10:52
    ou de anime ou de bandas.
  • 10:52 - 10:56
    Às vezes a cultura pop
    é o único elo de ligação
  • 10:56 - 10:59
    entre duas pessoas
    completamente diferentes.
  • 11:00 - 11:03
    Por isso o recado que eu quero deixar,
  • 11:03 - 11:04
    o último recado que eu deixo
  • 11:04 - 11:06
    especialmente para os pais
  • 11:06 - 11:09
    que têm alguma dificuldade
    com a diferença dos seus filhos
  • 11:09 - 11:11
    é que a força esteja com vocês.
  • 11:11 - 11:13
    Muito obrigado
  • 11:13 - 11:14
    (Aplausos)
Title:
Cultura pop faz a diferença | Gustavo Mini | TEDxLaçador
Description:

Como a cultura pop ajudou Gustavo em relação ao filho que tem a Sindrome de Prader Willi

Pai, publicitário, músico e blogueiro. Como publicitário tem experiência como Diretor de Planejamento, Diretor de Inovação e Redator. Como músico é, desde 1993, guitarrista e vocalista dos Walverdes. Como blogueiro é um dos criadores do portal O Esquema, onde mantém o blog Conector. Além disso já teve programas de rádio na Oi FM e Ipanema FM.

This talk was given at a TEDx event using the TED conference format but independently organized by a local community. Learn more at http://ted.com/tedx

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Video Language:
Portuguese, Brazilian
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
11:16

Portuguese, Brazilian subtitles

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