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Biologia ou Cultura | Cláudia Morgado | TEDxPortoWomen

  • 0:12 - 0:13
    (Aplausos)
  • 0:13 - 0:17
    Todos nós estamos
    cada vez mais expostos.
  • 0:18 - 0:21
    Tudo aquilo que fazemos,
    tudo o que dizemos,
  • 0:21 - 0:23
    tudo aquilo que até pensamos
  • 0:23 - 0:27
    tem hoje em dia um potencial
    de alcance muito maior.
  • 0:28 - 0:30
    Agora imaginem o seguinte.
  • 0:30 - 0:34
    Imaginem que um qualquer
    "post" vosso numa rede social
  • 0:35 - 0:38
    é, um dia, notícia de abertura
    em todos os telejornais.
  • 0:40 - 0:42
    Isso aconteceu-me a mim.
  • 0:44 - 0:46
    Eu tenho dois filhos.
  • 0:47 - 0:49
    Um menino e uma menina
  • 0:49 - 0:51
    de sete e seis anos de idade.
  • 0:51 - 0:54
    Era agosto e estávamos todos de férias.
  • 0:54 - 0:55
    Enquanto eles brincavam,
  • 0:55 - 0:58
    uma banca com livros de atividades
    chamou-me a atenção.
  • 0:58 - 1:01
    Mais especificamente um certo
    conjunto em rosa e azul.
  • 1:01 - 1:03
    Não sei se sabem do que estou a falar.
  • 1:05 - 1:08
    Eu folheei a par cerca de 20 páginas
  • 1:09 - 1:12
    e o que vi para mim
    era demasiado óbvio para ignorar.
  • 1:12 - 1:16
    Na altura não vi autores,
    ilustradores, editores, não vi nada.
  • 1:16 - 1:18
    Vi apenas com os olhos de mãe,
  • 1:19 - 1:21
    a mãe de um Pedro e de uma Carolina.
  • 1:21 - 1:24
    Uma mãe que tenta e se esforça
    por educar em igualdade.
  • 1:26 - 1:28
    As fotos que tirei, meio à pressa,
  • 1:28 - 1:30
    e até com outras compras na mão,
  • 1:30 - 1:32
    eram apenas para alimentar uma conversa
  • 1:32 - 1:35
    que tinha pendente com o meu marido
    que ia um pouco mais à frente.
  • 1:35 - 1:39
    Há uns dias tínhamos estado a conversar
    sobre se estaríamos nós,
  • 1:39 - 1:42
    pais e sociedade a modelar de alguma forma
  • 1:42 - 1:45
    os gostos e as preferências das crianças.
  • 1:45 - 1:48
    Preferências essas que depois,
    mais tarde, no mercado de trabalho
  • 1:49 - 1:52
    demonstram ser desigualdades.
  • 1:56 - 1:58
    Eu sou farmacêutica
  • 1:59 - 2:00
    (Risos)
  • 2:00 - 2:03
    a trabalhar numa empresa de "software".
  • 2:03 - 2:07
    Eu saltei da área da saúde
    para a área da tecnologia.
  • 2:08 - 2:12
    Em farmácia, 80% dos cargos
    eram ocupados por mulheres.
  • 2:14 - 2:18
    Em tecnologia, a realidade
    é precisamente a oposta
  • 2:18 - 2:21
    sendo que os homens ocupam
    a maioria dos cargos.
  • 2:23 - 2:27
    Mas será que isto se deve única
    e exclusivamente à diferença
  • 2:27 - 2:28
    entre os géneros?
  • 2:29 - 2:31
    Homens e mulheres são diferentes,
    é verdade.
  • 2:32 - 2:34
    Somos fisicamente diferentes
  • 2:34 - 2:36
    e isso deve-se única
    e exclusivamente à biologia.
  • 2:37 - 2:41
    Mas podemos dizer o mesmo acerca
    dos comportamentos e das preferências?
  • 2:42 - 2:46
    A tal conversa com o meu marido tinha sido
    desencadeada por um vídeo da BBC.
  • 2:47 - 2:51
    Numa experiência filmada vestiram
    um bebé menino com um vestido
  • 2:51 - 2:55
    e uma bebé menina
    com umas calças e uma camisa.
  • 2:55 - 3:00
    Num espaço controlado onde havia todo
    o tipo de brinquedos espalhados pelo chão
  • 3:00 - 3:03
    pediram a adultos voluntários
    que entretivessem as crianças
  • 3:03 - 3:05
    durante um bocado.
  • 3:05 - 3:10
    A grande maioria dos adultos tentou
    entreter a "menina" com bebés,
  • 3:10 - 3:13
    com bonecas, com peluches,
  • 3:14 - 3:17
    ensinando-a a embalar, a vestir, a despir.
  • 3:18 - 3:22
    Já ao "rapaz"
    — a menina vestida de rapaz —
  • 3:22 - 3:25
    ofereceram Legos, carros, robôs.
  • 3:25 - 3:28
    Ensinaram-no a conduzir, a construir.
  • 3:29 - 3:33
    Mas é claro que é da nossa natureza de
    mulheres saber agarrar num bebé
  • 3:33 - 3:36
    e trocar uma fralda, certo?
  • 3:36 - 3:38
    Talvez não.
  • 3:39 - 3:42
    Uma polémica há relativamente pouco tempo
  • 3:42 - 3:46
    nascida na Google
    veio parar também às redes sociais.
  • 3:46 - 3:49
    Um funcionário que acabou despedido
  • 3:49 - 3:52
    contestava as políticas internas
    de diversidade e inclusão,
  • 3:52 - 3:55
    alegando precisamente isto:
  • 3:55 - 3:58
    que a diferença de número
    entre mulheres e homens
  • 3:58 - 4:02
    na área da tecnologia se devem,
    provavelmente, às diferenças naturais
  • 4:02 - 4:04
    entre homens e mulheres.
  • 4:05 - 4:09
    As mulheres são mais preocupadas
    com as pessoas, dizia ele.
  • 4:10 - 4:14
    É natural que procurem áreas de trabalho
    mais ligadas às áreas sociais,
  • 4:14 - 4:15
    à área da saúde.
  • 4:16 - 4:18
    Já os homens preocupam-se
    mais com as coisas
  • 4:18 - 4:22
    e isso explica o motivo pelo qual estão
    em maioria nas áreas da tecnologia
  • 4:22 - 4:24
    e nas engenharias.
  • 4:24 - 4:28
    Segundo ele, as mulheres são
    naturalmente cooperativas.
  • 4:29 - 4:33
    E isto explica o motivo pelo qual
    são os homens que ocupam
  • 4:33 - 4:35
    a maioria dos cargos de liderança
  • 4:35 - 4:38
    pois, segundo ele,
    eles são naturalmente competitivos
  • 4:38 - 4:41
    e têm uma maior apetência
    para correr riscos.
  • 4:42 - 4:45
    Mas será que podemos efetivamente
    fazer esta distinção?
  • 4:46 - 4:49
    É que foram precisamente estes dois traços
  • 4:50 - 4:54
    — como é que nós nos colocamos perante
    a competição e perante o risco —
  • 4:55 - 4:58
    que investigadores já em 2009
    tentaram perceber.
  • 4:59 - 5:01
    Para isso, identificaram duas tribos.
  • 5:02 - 5:04
    Uma da Tanzânia, outra na Índia.
  • 5:04 - 5:09
    Uma tribo de sociedade patriarcal
    e uma tribo de sociedade matriarcal.
  • 5:09 - 5:12
    Efetivamente, na sociedade patriarcal,
  • 5:12 - 5:16
    os homens demonstraram ter
    muito mais tendência a ser competitivos
  • 5:16 - 5:19
    e ter uma grande apetência para o risco
  • 5:19 - 5:23
    em valores até muito próximos
    das sociedades ocidentais atuais.
  • 5:24 - 5:30
    No entanto, na tribo matriarcal,
    foram elas, as mulheres
  • 5:30 - 5:32
    que demonstraram ser
    muito mais competitivas
  • 5:32 - 5:35
    e ter muito mais facilidade
    em encarar o risco.
  • 5:36 - 5:38
    Por este estudo somos levados a concluir
  • 5:38 - 5:42
    que, pelo menos estes traços,
    não são diferenças naturais entre géneros
  • 5:42 - 5:45
    mas são sim socialmente incutidos.
  • 5:47 - 5:52
    No entanto nós, sociedade, continuamos
    a responsabilizar única e exclusivamente
  • 5:52 - 5:54
    os pais pelas decisões na educação,
  • 5:54 - 5:57
    até porque são eles que têm
    de viver com as criancinhas
  • 5:57 - 5:59
    durante pelo menos 30 anos, certo?
  • 6:00 - 6:06
    Em janeiro deste ano saiu na Science
    um estudo que nos devia preocupar a todos.
  • 6:06 - 6:11
    Investigadores de três universidades
    foram tentar perceber qual o efeito
  • 6:11 - 6:16
    dos estereótipos de género nas crianças
    em idade de entrar na escola.
  • 6:16 - 6:18
    Dos cinco aos sete anos de idade.
  • 6:19 - 6:23
    Crianças tão novas
    como a minha Carolina, com seis anos,
  • 6:23 - 6:27
    identificavam estar já sob a influência
    dos estereótipos de género.
  • 6:27 - 6:31
    Identificavam, por exemplo,
    como traços maioritariamente masculinos
  • 6:31 - 6:34
    a inteligência e a genialidade.
  • 6:35 - 6:38
    Não fosse isto só por si
    suficientemente preocupante,
  • 6:38 - 6:40
    este mesmo estudo demonstrou
  • 6:40 - 6:43
    que isto influenciava já
    os seus comportamentos.
  • 6:43 - 6:47
    As meninas desta idade
    mostravam-se menos motivadas
  • 6:47 - 6:51
    para sequer iniciar atividades
    que por elas fossem percecionadas
  • 6:51 - 6:55
    como sendo para crianças
    mesmo muito inteligentes.
  • 6:56 - 7:00
    Neste mesmo estudo
    percebeu-se que as raparigas,
  • 7:00 - 7:05
    apesar de terem melhores notas,
    de terem bons resultados na escola,
  • 7:05 - 7:08
    atribuíam isso ao seu trabalho,
    ao seu estudo.
  • 7:09 - 7:15
    Já os rapazes assumiam isso como sendo
    o natural reflexo das suas competências.
  • 7:18 - 7:20
    Quando falamos de igualdade,
  • 7:20 - 7:24
    é muito mais fácil confundir
    com a defesa dos direitos das mulheres.
  • 7:25 - 7:28
    Mas a verdade é que também
    tem impacto nos homens.
  • 7:29 - 7:32
    Em caso de divórcio, por exemplo,
  • 7:32 - 7:34
    um homem, pai, sabe à partida que,
  • 7:34 - 7:37
    independentemente de tudo
    o que possa dizer, alegar
  • 7:37 - 7:39
    ou provar em tribunal,
  • 7:39 - 7:43
    a grande maioria das decisões
    vai pender em função da mãe.
  • 7:44 - 7:47
    Isto deve-se única
    e exclusivamente ao seu sexo.
  • 7:51 - 7:53
    Mas então, o que é que podemos fazer?
  • 7:54 - 7:57
    A verdade é que neste país,
    onde tanto se fala e pouco se faz
  • 7:57 - 8:00
    é difícil, às vezes, perceber
    o que está ao nosso alcance.
  • 8:01 - 8:05
    E quando alguma medida tenta vir à luz
  • 8:05 - 8:09
    logo flechas e arpões
    são apontadas na sua direção.
  • 8:10 - 8:15
    Recentemente a polémica estalou
    com as medidas de discriminação positiva,
  • 8:15 - 8:17
    quando a legislação foi aprovada
  • 8:17 - 8:20
    que veio impor quotas
    aos conselhos de administração
  • 8:20 - 8:22
    das empresas cotadas em bolsa.
  • 8:23 - 8:27
    As medidas de discriminação positiva
    parecem ter sempre esta aura de dúvida.
  • 8:27 - 8:31
    Não será discriminante para os homens
    verem-se ultrapassados por mulheres
  • 8:31 - 8:34
    única e exclusivamente pelo seu sexo?
  • 8:35 - 8:38
    A verdade é que, para além
    de termos uma opinião,
  • 8:38 - 8:40
    convém tentar perceber se há dados,
  • 8:40 - 8:43
    se há informação para,
    quanto mais não seja,
  • 8:43 - 8:46
    podermos fundamentar a opinião que temos.
  • 8:46 - 8:51
    Foi já em 1993 que, na Suécia,
    foi aprovada a legislação
  • 8:51 - 8:54
    que impôs a paridade
    nos partidos políticos.
  • 8:55 - 8:57
    Cinquenta cinquenta.
  • 8:57 - 9:00
    Este ano, quatro economistas
    tentaram perceber
  • 9:00 - 9:03
    qual foi o efeito dessa lei no país.
  • 9:04 - 9:06
    A principal conclusão que tiraram
  • 9:06 - 9:11
    foi que a qualidade das competências
    dos políticos nacionais aumentou.
  • 9:12 - 9:14
    As dúvidas que também existiam lá
  • 9:14 - 9:17
    de que mulheres iriam substituir
    homens competentes
  • 9:17 - 9:19
    não se verificaram.
  • 9:19 - 9:21
    O que acabou por acontecer
  • 9:21 - 9:26
    foi que mulheres competentes
    vieram ocupar o lugar de homens medíocres.
  • 9:27 - 9:29
    E atenção que isto
    não são palavras minhas.
  • 9:29 - 9:33
    Isto foi precisamente o que os autores
    do estudo decidiram chamar-lhe:
  • 9:33 - 9:35
    "A crise do homem medíocre."
  • 9:36 - 9:38
    Mas atentemos então num estudo
  • 9:38 - 9:41
    um pouco mais próximo da realidade
    que foi aprovada para Portugal.
  • 9:41 - 9:46
    Na Noruega, um estudo do mesmo género
    foi aplicado às empresas
  • 9:46 - 9:48
    e a principal conclusão que tiraram
  • 9:48 - 9:53
    foi que, na realidade, as empresas
    não tiveram uma dificuldade acrescida
  • 9:53 - 9:55
    em contratar mulheres competentes.
  • 9:56 - 9:59
    Elas já lá estavam,
    prontinhas a ser promovidas.
  • 10:00 - 10:02
    Só não o eram.
  • 10:03 - 10:05
    Mas voltando aos cadernos de atividades
  • 10:05 - 10:08
    e à "Silly Season",
    como tantas vezes foi apelidada.
  • 10:09 - 10:11
    Citando Luís Aguiar Correria
  • 10:11 - 10:14
    pai, economista e defensor da igualdade:
  • 10:14 - 10:18
    Qual é o problema em haver cadernos
    para meninas e para meninos?
  • 10:18 - 10:23
    É muito fácil argumentar que não é
    por uma menina ler determinado caderno
  • 10:23 - 10:26
    que é impedida de ir,
    por exemplo, para astronomia.
  • 10:27 - 10:30
    Impedida não é, mas é condicionada.
  • 10:31 - 10:34
    É condicionada a menina
    e é condicionado o menino.
  • 10:34 - 10:37
    E negar isto é negar a ciência.
  • 10:37 - 10:39
    Quando educamos uma criança,
  • 10:39 - 10:42
    o nosso objetivo deve ser
    ampliar-lhe os horizontes,
  • 10:42 - 10:44
    aumentar-lhes as escolhas.
  • 10:44 - 10:46
    Nunca condicioná-los.
  • 10:47 - 10:49
    Neste país em que tantos
    se demitem de educar,
  • 10:49 - 10:53
    em que achamos que compete
    exclusivamente aos pais esse dever,
  • 10:53 - 10:56
    vemo-nos muitas vezes escudar
    na liberdade das leis de mercado
  • 10:56 - 10:59
    para simplesmente
    nos desresponsabilizarmos
  • 10:59 - 11:03
    daquilo que deveria ser uma
    responsabilidade de todos,
  • 11:03 - 11:06
    aquilo que estamos a dar
    às nossas crianças.
  • 11:06 - 11:08
    A educação das gerações vindouras
  • 11:08 - 11:12
    devia ser uma preocupação
    em geral de toda a sociedade.
  • 11:12 - 11:15
    Se nós queremos
    uma sociedade mais equilibrada,
  • 11:15 - 11:17
    se nós queremos um amanhã melhor,
  • 11:17 - 11:19
    então temos de apostar hoje
  • 11:19 - 11:22
    na qualidade da educação
    das nossas crianças.
  • 11:22 - 11:26
    Portanto, se sabemos
    que os estereótipos de género
  • 11:26 - 11:28
    estão não só já presentes
    nas nossas crianças
  • 11:28 - 11:32
    mas estão a influenciá-los
    de forma negativa e a condicioná-los,
  • 11:32 - 11:37
    se sabemos que certos comportamentos
    não são diferenças naturais entre géneros
  • 11:37 - 11:42
    mas são sim socialmente incutidos,
    então deixemo-nos de desculpas
  • 11:42 - 11:45
    porque educar é uma responsabilidade
    de toda a sociedade.
  • 11:46 - 11:48
    (Aplausos)
Title:
Biologia ou Cultura | Cláudia Morgado | TEDxPortoWomen
Description:

Homens e mulheres são diferentes, mas será que podemos dissociar biologia e cultura? Qual a importância da educação na sociedade? A quem devemos atribuir essa responsabilidade? Cláudia Morgado fez todo o seu percurso académico e profissional na área da saúde, enquanto farmacêutica, no entanto a vida levou-a para a área da tecnologia e é hoje COO da Redlight Software, empresa especializada em "software" para a área da saúde.
Responsável, entre outras áreas, pela de recursos humanos, vê na diversidade um ponto fulcral na cultura interna com peso na identidade da empresa, das equipas e dos produtos e serviços que prestam. Entre outras causas que a movem e interesses em que investe o seu tempo pessoal, ressalta o especial gosto pela área do empreendedorismo social sustentável e a aplicação da inteligência artificial na saúde.

Esta palestra foi feita num evento TEDx usando o formato de palestras TED, mas organizado independentemente por uma comunidade local. Saiba mais em http://ted.com/tedx

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Video Language:
Portuguese
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
11:57

Portuguese subtitles

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