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Se eu tiver uma filha...

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    Se eu tiver uma filha,
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    em vez de Mãe, ela vai chamar-me Ponto B,
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    porque assim ela saberá que,
    aconteça o que acontecer,
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    vai sempre conseguir
    encontrar o caminho até mim.
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    E vou pintar-lhe sistemas solares
    nas palmas das mãos,
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    para ela aprender o universo inteiro
    antes de poder dizer:
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    "Oh, conheço isso
    como a palma da minha mão".
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    Ela vai aprender que esta vida
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    vai acertar-lhe com força na cara,
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    esperar que ela se levante
    só para te dar um soco no estômago.
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    Mas ficarmos sem fôlego
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    é a única forma de nos lembrarmos
    que temos pulmões
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    de quanto gostamos do sabor do ar.
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    Há mágoas que não podem ser curadas
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    com pensos rápidos ou com poesia.
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    Então, a primeira vez que ela perceber
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    que a Mulher Maravilha não aparece,
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    vou certificar-me de que ela saiba
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    que não vai ter que usar a capa sozinha.
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    Porque por mais que estiquemos os dedos,
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    as nossas mãos serão
    sempre demasiado pequenas
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    para agarrar toda a dor
    que queremos curar.
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    Acreditem, eu já tentei.
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    Vou dizer-lhe:
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    "Querida, não andes de nariz empinado."
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    "Eu conheço esse truque,
    já o usei milhões de vezes.
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    "Estás só a cheirar o fumo
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    "para poderes seguir-lhe o rasto
    até à casa em chamas
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    "para encontrares o rapaz
    que perdeu tudo no incêndio
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    "e ver se o podes salvar.
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    "Ou então encontrar o rapaz
    que ateou o fogo,
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    "para ver se o consegues mudar."
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    Mas eu sei que ela acabará por fazê-lo,
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    por isso, vou antes ter
    um carregamento extra
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    de chocolate e galochas por perto,
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    porque não há nenhum desgosto
    que o chocolate não cure.
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    OK, há alguns desgostos
    que o chocolate não cura.
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    Mas é para isso que servem as galochas.
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    Porque a chuva lava tudo, se a deixares.
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    Quero que ela veja o mundo
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    através da parte inferior
    de um barco com fundo de vidro,
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    que veja através de um microscópio
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    as galáxias que existem na mente humana,
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    porque foi assim
    que a minha mãe me ensinou.
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    Que vai haver dias assim.
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    ♫ Vai haver dias assim,
    dizia a minha mãe. ♫
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    Quando abrires as mãos para apanhar algo
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    e acabares apenas com bolhas e esfolões,
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    quando saíres da cabine telefónica
    e tentares voar
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    e as pessoas que queres salvar
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    são as que estão a pisar-te a capa,
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    quando as tuas botas
    se encherem com a chuva,
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    e a desilusão te chegar aos joelhos,
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    são precisamente esses os dias em que
    tens mais razão para dizer obrigada.
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    Porque não há nada mais belo
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    que a forma como o oceano
    se recusa a deixar de beijar a margem
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    sem se importar quantas vezes
    é empurrado para trás.
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    Vais ganhar e vais perder.
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    Vais ter que recomeçar,
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    uma e outra vez.
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    E não importa quantas minas
    surjam num minuto,
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    assegura-te que a tua mente aterra
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    na beleza deste engraçado lugar
    chamado vida.
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    E sim, numa escala de um a superconfiante,
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    eu sou bastante ingénua.
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    Mas quero que ela saiba
    que este mundo é feito de açúcar.
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    Pode esboroar-se tão facilmente,
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    mas não tenhas medo de pôr
    a língua de fora e de o provar.
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    Vou dizer-lhe: "Querida, lembra-te
    que a tua mãe se preocupa,
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    "e que o teu pai é um lutador
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    "e que tu és a menina de mãos pequenas
    e olhos grandes
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    "que nunca deixa de pedir mais".
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    "Lembra-te que as coisas boas
    vêm em grupos de três
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    "tal como as coisas más.
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    "Pede desculpa sempre
    que fizeres algo de errado.
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    "Mas nunca peças desculpa
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    "por os teus olhos se recusarem
    a deixar de brilhar.
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    "A tua voz é pequena,
    mas nunca pares de cantar.
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    "E quando finalmente te magoarem,
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    "quando, por baixo da porta,
    te meterem a guerra e o ódio
  • 3:14 - 3:18
    "e pelas esquinas te derem panfletos
    de cinismo e derrota,
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    "diz-lhes que deviam conhecer a tua mãe.
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    (Aplausos)
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    Obrigada. Obrigada.
  • 3:28 - 3:30
    (Aplausos)
  • 3:30 - 3:32
    Obrigada.
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    (Aplausos)
  • 3:36 - 3:37
    Obrigada.
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    (Aplausos)
  • 3:40 - 3:42
    Obrigada.
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    (Aplausos)
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    Ok. Quero então que percam uns segundos,
  • 3:48 - 3:50
    e pensem em três coisas
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    que sabem ser verdadeiras.
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    Podem ser sobre qualquer coisa
    que queiram:
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    tecnologia, entretenimento, design,
  • 3:56 - 3:59
    a vossa família, o que tomaram
    ao pequeno-almoço.
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    A única regra é não pensarem muito.
  • 4:01 - 4:04
    Ok, prontos? Podem começar.
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    Ok.
  • 4:11 - 4:14
    Aqui estão três coisas
    que sei serem verdadeiras.
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    Sei que o Jean-Luc Godard tinha razão
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    quando dizia que uma boa história
    tem um princípio, um meio e um fim,
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    embora não necessariamente por esta ordem.
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    Sei que estou incrivelmente nervosa
    e entusiasmada por estar aqui,
  • 4:26 - 4:29
    o que inibe grandemente a minha capacidade
    de me manter calma.
  • 4:29 - 4:30
    (Risos)
  • 4:30 - 4:34
    Sei que estive à espera a semana toda
    para contar esta piada.
  • 4:34 - 4:35
    (Risos)
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    Porque é que o espantalho
    foi convidado para o TED?
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    Porque se destacava no seu campo.
  • 4:42 - 4:44
    (Risos)
  • 4:45 - 4:47
    Desculpem.
  • 4:47 - 4:50
    Ok, então estas são três coisas
    que sei serem verdadeiras.
  • 4:50 - 4:54
    Mas há muitas coisas
    que tenho dificuldade em compreender.
  • 4:54 - 4:57
    Então eu escrevo poemas
    para perceber as coisas.
  • 4:57 - 5:00
    Por vezes, a única forma
    que sei para resolver uma coisa
  • 5:00 - 5:02
    é escrever um poema.
  • 5:02 - 5:04
    E, por vezes, chego ao fim do poema
  • 5:04 - 5:06
    olho para trás e digo:
    "Oh, então era isto."
  • 5:06 - 5:08
    Outras vezes, chego ao fim do poema
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    e não resolvi nada,
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    mas, pelo menos,
    consegui sacar um novo poema.
  • 5:12 - 5:15
    A poesia falada
    é a arte da poesia representada.
  • 5:15 - 5:17
    Eu digo às pessoas
    que implica criar poesia
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    que não se limita a ficar no papel,
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    que há nela qualquer coisa
    que exige ser ouvida
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    ou testemunhada em pessoa.
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    No primeiro ano de liceu,
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    eu era uma pilha de nervos.
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    Era subdesenvolvida e super-emotiva.
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    E apesar de não gostar
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    que olhassem para mim por muito tempo,
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    tinha um fascínio
    pela ideia da poesia falada.
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    Sentia que os meus dois amores secretos,
    a poesia e o teatro,
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    se tinham juntado, tinham tido um bebé,
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    um bebé que eu precisava conhecer.
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    Então decidi tentar.
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    O meu primeiro poema de poesia falada,
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    recheado com a sabedoria
    de uma menina de 14 anos,
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    era sobre a injustiça
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    de ser vista como pouco feminina.
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    O poema era muito indignado,
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    e essencialmente exagerado,
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    mas a única poesia falada
    que eu tinha visto até à altura
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    era essencialmente indignada.
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    Por isso achei que era isso
    que esperavam de mim.
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    A primeira vez que recitei,
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    a audiência de adolescentes
    dava gritos de incentivo,
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    e quando saí do palco estava a tremer.
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    Senti baterem-me no ombro.
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    Quando me voltei para ver quem era,
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    vi uma miúda gigante,
    de camisola com capuz.
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    Devia ter dois metros de altura,
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    parecia que me podia bater
    só com uma mão.
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    Mas apenas acenou com a cabeça e disse:
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    "Senti mesmo o que disseste. Obrigada".
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    Foi como se um raio me atingisse.
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    Fiquei viciada.
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    Descobri um bar
    no Lower East Side de Manhattan
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    que tinha noites semanais
    de poesia de microfone aberto,.
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    Os meus pais, admirados mas apoiantes,
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    levavam-me lá para beber cada bocadinho
    de poesia falada que pudesse.
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    Era a mais nova de longe,
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    mas o certo é que os poetas
    do Bowery Poetry Club
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    não pareciam incomodados pela presença
    da menina de 14 anos.
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    Na verdade, receberam-me bem.
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    E foi lá, a ouvir todos aqueles poetas
    partilhar as suas histórias
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    que aprendi que a poesia falada
    não tinha que ser indignada,
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    podia ser divertida ou dolorosa,
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    ou séria ou tonta.
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    O Bowery Poetry Club tornou-se
    a minha sala de aulas e a minha casa.
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    E os poetas que recitavam
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    encorajavam-me a partilhar
    também as minhas histórias.
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    Esquecendo o facto de eu ter 14 anos,
    disseram-me:
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    "Escreve sobre o que é ter 14 anos".
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    Então fi-lo e ficava maravilhada
    todas as semanas
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    quando estes poetas, adultos e brilhantes,
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    riam comigo, lamentavam com compaixão
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    aplaudiam e me diziam:
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    "Ei, eu também senti isso".
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    Posso dividir esta minha viagem
    de poesia falada
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    em três passos.
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    O primeiro passo foi quando disse:
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    "Eu consigo. Eu consigo fazer isto".
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    Isso graças à miúda de camisola e capuz.
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    O segundo passo foi quando disse:
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    "Eu vou. Eu vou continuar.
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    "Eu adoro a poesia falada.
    Vou continuar a vir semana após semana".
  • 7:53 - 7:55
    E o terceiro passo começou
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    quando percebi que não tinha
    que escrever poemas indignados,
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    se eu não era assim.
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    Estas coisas são específicas para mim.
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    Quanto mais me focava nelas,
  • 8:03 - 8:05
    mais estranha se tornava a minha poesia,
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    mas mais eu sentia que era minha.
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    Não é só o adágio "escreve o que sabes",
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    é juntar todo o conhecimento e experiência
  • 8:13 - 8:15
    que acumulámos até então
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    para nos ajudar a mergulhar
    nas coisas que não conhecemos.
  • 8:18 - 8:21
    Eu uso a poesia para me ajudar
    com o que não compreendo,
  • 8:21 - 8:23
    mas ataco cada novo poema
  • 8:23 - 8:26
    com uma mochila cheia
    de todos os lugares onde já estive.
  • 8:27 - 8:30
    Quando fui para a universidade,
    conheci outro poeta
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    que partilhava a minha crença
    na magia da poesia falada.
  • 8:32 - 8:35
    Na verdade, o Phil Kaye e eu
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    até partilhamos o mesmo apelido.
  • 8:38 - 8:41
    Quando estava no liceu,
    criei o Projeto V.O.I.C.E.
  • 8:41 - 8:44
    para encorajar os meus amigos
    a fazerem poesia falada comigo.
  • 8:44 - 8:46
    Mas o Phil e eu decidimos
    reinventar o projeto V.O.I.C.E.,
  • 8:46 - 8:48
    desta vez mudando a missão
  • 8:48 - 8:51
    para usar a poesia falada
    como forma de entreter,
  • 8:51 - 8:53
    de educar e de inspirar.
  • 8:53 - 8:56
    Continuámos como estudantes
    a tempo inteiro, mas também viajávamos,
  • 8:56 - 8:58
    atuando e ensinando
  • 8:58 - 9:01
    desde crianças de 9 anos
    a estudantes de Belas Artes
  • 9:01 - 9:03
    da Califórnia ao Indiana, à Índia,
  • 9:03 - 9:06
    ao liceu público perto
    do campus universitário.
  • 9:06 - 9:08
    E vimos, vezes sem conta,
  • 9:08 - 9:11
    a forma como a poesia falada
    arromba fechaduras.
  • 9:12 - 9:14
    Mas acontece que, por vezes,
  • 9:14 - 9:17
    a poesia pode ser bem assustadora.
  • 9:17 - 9:19
    Acontece que, por vezes,
  • 9:19 - 9:22
    temos que iludir os adolescentes
    para que escrevam poesia.
  • 9:22 - 9:25
    Então lembrei-me de usar listas.
    Toda a gente consegue escrever listas.
  • 9:25 - 9:27
    A primeira lista que peço
  • 9:27 - 9:29
    é "Dez Coisas Que Sei Serem Verdadeiras".
  • 9:30 - 9:32
    O que acontece, vocês iriam descobrir
  • 9:32 - 9:35
    se começássemos a partilhar
    as nossas listas em voz alta.
  • 9:35 - 9:36
    A certa altura, apercebemo-nos
  • 9:36 - 9:40
    que há outra pessoa
    com algo exatamente igual
  • 9:40 - 9:42
    ou muito parecido
  • 9:42 - 9:43
    com a nossa lista.
  • 9:43 - 9:48
    E há outra pessoa com uma coisa
    completamente oposta à nossa.
  • 9:48 - 9:51
    Terceiro, alguém tem uma coisa
    que nunca ouvimos antes.
  • 9:51 - 9:54
    E quarto, alguém tem uma coisa
    que pensávamos conhecer bem,
  • 9:54 - 9:57
    mas com uma nova perspetiva.
  • 9:57 - 10:00
    Eu digo às pessoas que é assim
    que começam as grandes histórias,
  • 10:00 - 10:02
    a partir destas quatro intersecções
  • 10:02 - 10:04
    daquilo por que somos apaixonados
  • 10:04 - 10:06
    e daquilo a que outros se dedicam.
  • 10:06 - 10:09
    A maior parte das pessoas
    responde bem a este exercício.
  • 10:09 - 10:12
    Mas uma das minhas alunas,
    uma caloira chamada Charlotte,
  • 10:12 - 10:14
    não estava convencida.
  • 10:14 - 10:18
    A Charlotte era muito boa a escrever listas,
    mas recusava-se a escrever poemas.
  • 10:18 - 10:21
    "Professora", dizia,
    "Eu não sou interessante.
  • 10:21 - 10:23
    "Não tenho nada
    de interessante para dizer".
  • 10:23 - 10:25
    Então mandei-a fazer lista atrás de lista
  • 10:25 - 10:27
    e um dia pedi-lhe a lista das
  • 10:27 - 10:29
    "Dez Coisas Que Eu Já Devia Ter Aprendido".
  • 10:29 - 10:32
    Em terceiro lugar,
    na lista da Charlotte, estava:
  • 10:32 - 10:34
    "Já devia ter aprendido
    a não me apaixonar por rapazes
  • 10:34 - 10:36
    "com o triplo da minha idade".
  • 10:36 - 10:38
    Perguntei-lhe o que queria dizer
    e ela disse:
  • 10:38 - 10:40
    "É uma história muito comprida".
  • 10:40 - 10:43
    E eu:, "Charlotte, isso parece-me
    muito interessante".
  • 10:43 - 10:45
    Foi então que ela escreveu
    o primeiro poema,
  • 10:45 - 10:48
    um poema de amor
    como eu nunca tinha ouvido.
  • 10:48 - 10:50
    O poema começava assim:
  • 10:50 - 10:53
    "O Anderson Cooper é um homem lindo".
  • 10:53 - 10:54
    (Risos)
  • 10:55 - 10:57
    "Viram-no no 60 Minutes,
  • 10:57 - 10:59
    "a nadar numa piscina
    com o Michael Phelps,
  • 10:59 - 11:00
    "só com calções de banho,
  • 11:00 - 11:03
    "a mergulhar, apostado a bater
    este campeão de natação?
  • 11:03 - 11:06
    "Depois da corrida, sacudiu
    o cabelo molhado e branco e disse:
  • 11:06 - 11:07
    "'És um deus'.
  • 11:07 - 11:09
    "Não, Anderson, tu é que és um deus".
  • 11:09 - 11:11
    (Risos)
  • 11:11 - 11:14
    (Aplausos)
  • 11:15 - 11:19
    Eu sei que a primeira coisa
    para se ser fixe
  • 11:19 - 11:21
    é parecer sempre imperturbável.
  • 11:21 - 11:24
    Nunca admitir que algo nos assusta
  • 11:24 - 11:26
    ou nos impressiona ou nos entusiasma.
  • 11:26 - 11:29
    Uma vez disseram-me que é
    como atravessar a vida assim.
  • 11:29 - 11:32
    Protegemo-nos de todas as inesperadas
    misérias ou mágoas
  • 11:32 - 11:34
    que nos possam surgir.
  • 11:34 - 11:37
    Mas eu tento atravessar a vida assim.
  • 11:37 - 11:40
    Sim, isso implica levar
    com todas essas misérias e mágoas,
  • 11:40 - 11:43
    mas também implica que,
    quando cai do céu
  • 11:43 - 11:44
    uma coisa bela e fantástica,
  • 11:44 - 11:46
    eu estou pronta para a apanhar.
  • 11:46 - 11:49
    Eu uso a poesia falada
    para ajudar os meus alunos
  • 11:49 - 11:51
    a redescobrir a maravilha,
  • 11:51 - 11:53
    a lutarem, em vez de serem
    fixes e imperturbáveis,
  • 11:53 - 11:56
    a tentarem ativamente estar envolvidos
    com tudo que os rodeia,
  • 11:56 - 11:59
    para poderem reinterpretar
    e criar qualquer coisa a partir disso.
  • 12:00 - 12:02
    Eu não acho que a poesia falada
  • 12:02 - 12:03
    seja a forma de arte ideal.
  • 12:03 - 12:07
    Estou sempre a tentar encontrar
    a melhor forma de contar cada história.
  • 12:07 - 12:10
    Escrevo musicais, faço curtas-metragens
    juntamente com os meus poemas.
  • 12:10 - 12:14
    Mas ensino poesia falada
    porque é acessível.
  • 12:14 - 12:16
    Nem toda a gente consegue ler música,
  • 12:16 - 12:18
    ou ter uma câmara,
  • 12:18 - 12:20
    mas toda a gente consegue comunicar
    de qualquer forma,
  • 12:20 - 12:22
    e toda a gente tem histórias
  • 12:22 - 12:24
    com as quais o resto de nós pode aprender.
  • 12:24 - 12:27
    Mais, a poesia falada permite
    fazer ligações imediatas.
  • 12:27 - 12:29
    Não é invulgar as pessoas sentirem-se sós
  • 12:29 - 12:31
    ou que ninguém os compreende,
  • 12:31 - 12:33
    mas a poesia falada ensina-nos
  • 12:33 - 12:35
    que, se tivermos a capacidade
    de nos expressarmos
  • 12:35 - 12:38
    e a coragem de apresentar
    essas histórias e opiniões,
  • 12:38 - 12:39
    seremos recompensados
  • 12:39 - 12:41
    com uma sala cheia dos nossos pares,
  • 12:41 - 12:43
    da nossa comunidade, que nos ouvirá.
  • 12:43 - 12:45
    E talvez até uma miúda gigante
  • 12:45 - 12:48
    se sentirá ligada
    ao que acabámos de dizer.
  • 12:48 - 12:50
    Isso é uma coisa fantástica de perceber,
  • 12:50 - 12:52
    especialmente quando se tem 14 anos.
  • 12:52 - 12:54
    Mais, agora com o YouTube,
  • 12:54 - 12:57
    essa ligação não está limitada
    à sala em que estamos.
  • 12:57 - 13:00
    Tenho muita sorte de ter
    um arquivo de atuações
  • 13:00 - 13:02
    que posso partilhar com os meus alunos.
  • 13:02 - 13:04
    Permite que haja mais oportunidades
  • 13:04 - 13:06
    para que possam encontrar
    um poeta ou um poema
  • 13:06 - 13:08
    ao qual se liguem.
  • 13:08 - 13:10
    Assim que sabemos como o fazer,
  • 13:10 - 13:13
    é tentador escrever sempre o mesmo poema,
  • 13:13 - 13:15
    ou contar sempre a mesma história,
  • 13:15 - 13:18
    depois de sabermos
    o que nos faz conquistar aplausos.
  • 13:18 - 13:20
    Não chega ensinar
    que nos podemos expressar,
  • 13:20 - 13:22
    mas também que podemos
    crescer e explorar,
  • 13:22 - 13:24
    correr riscos e desafiarmo-nos.
  • 13:24 - 13:27
    Esse é o terceiro passo.
  • 13:27 - 13:29
    Conseguir uma infusão daquilo que fazemos
  • 13:29 - 13:31
    com as coisas específicas que nos definem,
  • 13:31 - 13:34
    mesmo quando essas coisas
    estão sempre a mudar.
  • 13:34 - 13:36
    Porque o terceiro passo nunca acaba.
  • 13:36 - 13:39
    Mas não podem começar no terceiro passo,
  • 13:39 - 13:42
    sem passarem pelo primeiro:
    "Eu consigo".
  • 13:42 - 13:44
    Eu viajo muito enquanto ensino,
  • 13:44 - 13:47
    e nem sempre consigo ver os meus alunos
    atingir esse terceiro passo,
  • 13:47 - 13:49
    mas tive muita sorte com a Charlotte
  • 13:49 - 13:52
    cuja viagem vi desabrochar
    da forma que vi.
  • 13:52 - 13:53
    Vi-a compreender que,
  • 13:53 - 13:56
    ao colocar as coisas que sabe
    serem verdadeiras no trabalho que faz,
  • 13:56 - 13:59
    ela consegue criar poemas
    que só a Charlotte pode escrever,
  • 13:59 - 14:02
    sobre globos oculares e elevadores
    e Dora, A Exploradora.
  • 14:02 - 14:05
    Eu tento contar as histórias
    que só eu consigo,
  • 14:05 - 14:06
    como esta história.
  • 14:06 - 14:09
    Passo muito tempo a pensar na melhor forma
    de contar esta história,
  • 14:09 - 14:11
    e penso se a melhor forma
  • 14:11 - 14:13
    seria com um PowerPoint
    ou um pequeno filme,
  • 14:13 - 14:16
    e onde estava o princípio,
    ou o meio, ou o fim.
  • 14:16 - 14:18
    E pensei se conseguiria chegar
    ao fim desta palestra
  • 14:18 - 14:21
    e perceber tudo, ou não.
  • 14:21 - 14:24
    Sempre pensei que o meu princípio
    tinha sido no Bowery Poetry Club,
  • 14:24 - 14:26
    mas talvez tenha sido muito mais cedo.
  • 14:27 - 14:28
    Ao preparar-me para o TED,
  • 14:28 - 14:30
    descobri esta página de um diário.
  • 14:30 - 14:34
    Acho que 54 de dezembro devia ser 24.
  • 14:34 - 14:36
    É óbvio que quando era criança,
  • 14:36 - 14:38
    eu andava pela vida assim.
  • 14:38 - 14:40
    Acho que todos o fizemos.
  • 14:40 - 14:43
    Eu queria ajudar os outros
    a redescobrir essa maravilha,
  • 14:43 - 14:45
    a empenharem-se nela, a quererem aprender,
  • 14:45 - 14:47
    a quererem partilhar o que aprenderam,
  • 14:47 - 14:49
    o que descobriram ser verdade
  • 14:49 - 14:51
    e o que ainda estão a descobrir.
  • 14:51 - 14:54
    Gostava de terminar com este poema.
  • 14:55 - 14:57
    Quando bombardearam Hiroxima
  • 14:57 - 15:00
    a explosão formou uma pequena supernova,
  • 15:00 - 15:04
    de tal forma que todo o animal,
    ser humano ou planta
  • 15:04 - 15:07
    que recebeu contacto direto
    com os raios desse sol
  • 15:07 - 15:09
    se transformou instantaneamente em cinza.
  • 15:09 - 15:12
    E o que sobrou da cidade
    logo sofreu o mesmo destino.
  • 15:12 - 15:14
    O efeito duradouro
    dos danos da radiação nuclear
  • 15:14 - 15:17
    fizeram com que uma cidade inteira
    e a sua população
  • 15:17 - 15:19
    se transformasse em pó.
  • 15:19 - 15:23
    Quando nasci, a minha mãe diz que olhei
    em volta do quarto de hospital
  • 15:23 - 15:26
    com um olhar que dizia:
    "Isto? Eu já fiz isto antes".
  • 15:26 - 15:29
    Ela diz que eu tenho olhos velhos.
  • 15:29 - 15:31
    Quando o meu avô Genji morreu,
    eu só tinha cinco anos,
  • 15:31 - 15:33
    mas peguei na mão
    da minha mãe e disse-lhe:
  • 15:33 - 15:36
    "Não te preocupes, ele vai voltar
    na forma de um bebé".
  • 15:36 - 15:40
    No entanto, para alguém que
    aparentemente já fez isto antes,
  • 15:40 - 15:42
    ainda não percebi nada.
  • 15:42 - 15:45
    Os meus joelhos ainda tremem
    quando subo a um palco.
  • 15:45 - 15:47
    A minha autoconfiança pode ser medida
  • 15:47 - 15:50
    em colheres de chá
    misturadas com a minha poesia,
  • 15:50 - 15:53
    e ainda deixa um sabor estranho
    na minha boca.
  • 15:53 - 15:55
    Mas em Hiroxima,
    algumas pessoas foram varridas,
  • 15:55 - 15:59
    deixando só um relógio de pulso
    ou a página de um diário.
  • 15:59 - 16:02
    Não importa se tenho inibições
    para encher todos os meus bolsos,
  • 16:02 - 16:03
    continuo a tentar,
  • 16:03 - 16:05
    à espera que um dia escreva um poema
  • 16:05 - 16:08
    de que me orgulhe tanto
    que possa ser exibido num museu
  • 16:08 - 16:10
    como a única prova de que eu existi.
  • 16:10 - 16:12
    Os meus pais deram-me o nome de Sarah,
  • 16:12 - 16:13
    que é um nome bíblico.
  • 16:13 - 16:17
    Na história original, Deus disse a Sarah
    que ela podia fazer algo impossível
  • 16:17 - 16:19
    e ela riu-se,
  • 16:19 - 16:21
    porque essa Sarah
  • 16:21 - 16:23
    não sabia o que fazer com o impossível.
  • 16:23 - 16:26
    E eu? Bem, eu também não,
  • 16:26 - 16:28
    mas eu vejo o impossível todos os dias.
  • 16:28 - 16:31
    O impossível é tentarmos
    relacionar-nos neste mundo,
  • 16:31 - 16:34
    tentarmos agarrar os outros
    enquanto tudo explode à nossa volta,
  • 16:34 - 16:36
    sabendo que, enquanto falamos,
  • 16:36 - 16:39
    eles não estão à espera da sua vez
    de falar, eles ouvem-nos.
  • 16:39 - 16:41
    Sentem exatamente aquilo que sentimos
  • 16:41 - 16:42
    ao mesmo tempo que nós.
  • 16:42 - 16:45
    É o que desejo sempre
    que abro a minha boca,
  • 16:45 - 16:47
    essa ligação impossível.
  • 16:47 - 16:49
    Há um pedaço de parede em Hiroxima
  • 16:49 - 16:52
    que ficou enegrecido pela radiação.
  • 16:52 - 16:54
    Mas nos degraus, estava uma pessoa sentada
  • 16:54 - 16:57
    que impediu a radiação de atingir a pedra.
  • 16:57 - 16:58
    A única coisa que resta agora
  • 16:58 - 17:01
    é a permanente sombra de luz positiva
  • 17:01 - 17:02
    Depois da bomba atómica,
  • 17:02 - 17:05
    os especialistas disseram
    que demoraria 75 anos
  • 17:05 - 17:08
    para que no solo de Hiroxima,
    danificado pela radiação,
  • 17:08 - 17:09
    voltasse a crescer alguma coisa.
  • 17:09 - 17:13
    Mas nessa mesma primavera,
    já havia rebentos a brotar da terra.
  • 17:13 - 17:15
    Quando eu te conheço, nesse momento,
  • 17:15 - 17:16
    eu deixo de fazer parte do teu futuro.
  • 17:16 - 17:19
    Rapidamente passo
    a fazer parte do teu passado.
  • 17:19 - 17:21
    Mas nesse instante,
    eu partilho o teu presente.
  • 17:21 - 17:23
    E tu, tu partilhas o meu.
  • 17:23 - 17:25
    E esse é o maior presente de todos.
  • 17:25 - 17:27
    Se me dizes que eu consigo
    fazer o impossível,
  • 17:27 - 17:29
    provavelmente vou-me rir de ti.
  • 17:29 - 17:32
    Não sei se consigo mudar o mundo,
  • 17:32 - 17:34
    porque não o conheço muito bem
  • 17:34 - 17:36
    e também não sei muito sobre reencarnação,
  • 17:36 - 17:38
    mas se me fizeres rir e bem,
  • 17:38 - 17:40
    até posso esquecer-me
    do século em que estou.
  • 17:40 - 17:44
    Não é a primeira vez que estou aqui.
    Não é a última vez que estou aqui.
  • 17:44 - 17:46
    Estas não serão as últimas palavras
    que partilho.
  • 17:46 - 17:49
    Mas, por via das dúvidas,
    estou a dar o máximo
  • 17:49 - 17:51
    para acertar desta vez.
  • 17:51 - 17:53
    Obrigada.
  • 17:53 - 17:55
    (Aplausos)
  • 17:55 - 17:56
    Obrigada.
  • 17:56 - 17:58
    (Aplausos)
  • 17:58 - 18:00
    Obrigada.
  • 18:00 - 18:03
    (Aplausos)
Title:
Se eu tiver uma filha...
Speaker:
Sarah Kay
Description:

"Se eu tiver uma filha, em vez de Mãe, ela vai chamar-me Ponto B...", começou a poetisa da palavra falada, Sarah Kay, numa palestra que inspirou duas ovações de pé no TED2011. Conta a história da sua metamorfose: de uma adolescente de olhos arregalados a absorver versos no Bowery Poetry Club de Nova Iorque, a uma professora que liga os miúdos com o poder da autoexpressão através do Project V.O.I.C.E., e interpreta de forma arrebatadora os poemas "B" e "Hiroxima".

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
18:08
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for If I should have a daughter ...
Margarida Ferreira edited Portuguese subtitles for If I should have a daughter ...
Sérgio Lopes added a translation

Portuguese subtitles

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