Depressão, o segredo que partilhamos
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0:04 - 0:08Senti um funeral no cérebro
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0:08 - 0:11e carpideiras indo e vindo,
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0:11 - 0:13indo e vindo — em procissão —
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0:13 - 0:16até que senti como se os sentidos
estivessem a explodir. -
0:16 - 0:18E quando todos estavam sentados,
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0:18 - 0:20as exéquias, como um tambor
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0:20 - 0:22continuaram a tocar — a tocar —
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0:22 - 0:25até o meu espírito caísse em torpor.
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0:26 - 0:28Então ouvi-as levantarem uma caixa
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0:28 - 0:30e rangerem na minha alma
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0:30 - 0:33com as mesmas botas de chumbo, de novo.
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0:33 - 0:36Depois o espaço começou a tocar
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0:36 - 0:39como se os céus fossem um sino,
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0:39 - 0:41um ser, um simples ouvido.
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0:41 - 0:44E eu, e o silêncio, uma estranha raça
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0:44 - 0:46naufragada, solitária, sem sentido.
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0:46 - 0:50Então quebrou-se uma tábua na razão
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0:50 - 0:53e eu caí, caí, caí
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0:53 - 0:56e alcancei um mundo,
em cada mergulho. -
0:56 - 0:59E então deixei de ter conhecimento.
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1:01 - 1:03Conhecemos a depressão
através de metáforas. -
1:05 - 1:08Emily Dickinson conseguiu
transmiti-la em linguagem. -
1:08 - 1:10Goya numa imagem.
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1:10 - 1:12Metade da razão de ser da arte
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1:12 - 1:15é descrever estes estados icónicos.
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1:16 - 1:20Quanto a mim,
sempre julguei ser uma pessoa dura, -
1:20 - 1:22um dos que podia sobreviver
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1:22 - 1:25se fosse enviado
para um campo de concentração. -
1:25 - 1:28Em 1991, tive uma série de perdas.
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1:28 - 1:29A minha mãe morreu,
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1:29 - 1:32uma relação que eu mantinha terminou,
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1:32 - 1:34voltei para os Estados Unidos
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1:34 - 1:36depois de uns anos no estrangeiro
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1:36 - 1:38e passei incólume
por todas estas experiências. -
1:39 - 1:42Mas em 1994, três anos depois,
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1:42 - 1:46dei comigo desinteressado de quase tudo.
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1:47 - 1:50Não queria fazer nada das coisas
que anteriormente me interessavam, -
1:50 - 1:52e não sabia porquê.
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1:52 - 1:54O oposto de depressão
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1:54 - 1:57não é felicidade, mas vitalidade.
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1:57 - 2:02Foi a vitalidade que desapareceu
em mim naquele momento. -
2:02 - 2:05Tudo o que havia para fazer
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2:05 - 2:07parecia-me dar demasiado trabalho.
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2:07 - 2:08Chegava a casa,
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2:08 - 2:12via a luz vermelha a piscar
no gravador de chamadas -
2:12 - 2:14e, em vez de ficar satisfeito
por ouvir os meus amigos, -
2:14 - 2:15eu pensava:
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2:15 - 2:19"Tantas pessoas para que tenho de ligar".
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2:19 - 2:21Ou então decidia almoçar,
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2:21 - 2:22mas depois pensava
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2:22 - 2:25que tinha de tirar a comida
e pô-la num prato, -
2:25 - 2:30cortar, mastigar e engolir.
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2:30 - 2:33Sentia-me como se estivesse
a carregar a Cruz. -
2:34 - 2:36Uma das coisas que frequentemente escapa
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2:36 - 2:38na discussão sobre a depressão
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2:38 - 2:40é que sabemos que é ridícula.
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2:40 - 2:43Sabemos que é ridícula
enquanto a estamos a viver. -
2:43 - 2:45Sabemos que a maioria das pessoas
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2:45 - 2:47consegue ouvir as suas mensagens, almoçar
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2:47 - 2:49e organizar-se para tomar um duche
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2:49 - 2:51e sair a porta da rua.
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2:51 - 2:53Sabemos que isso não é um grande feito
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2:53 - 2:55e no entanto continuamos
sob este poder da inércia -
2:55 - 2:59e não conseguimos pensar
em nenhuma forma de o contornar. -
2:59 - 3:03Então comecei a sentir
que fazia cada vez menos, -
3:03 - 3:06pensava cada vez menos
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3:06 - 3:08e sentia cada vez menos.
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3:08 - 3:10Era uma espécie de nulidade.
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3:10 - 3:12E então chegou a ansiedade.
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3:13 - 3:14Se alguém me dissesse
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3:14 - 3:17que eu ia estar deprimido
no próximo mês, eu diria: -
3:17 - 3:20"Desde que saiba que termina
em novembro, eu aguento". -
3:20 - 3:21Mas se me dissessem:
-
3:21 - 3:24"Tens de passar por uma ansiedade
grave no próximo mês", -
3:24 - 3:27eu preferiria cortar os pulsos
do que passar por isso. -
3:27 - 3:28Era um sentimento permanente
-
3:28 - 3:30como o sentimento que temos
-
3:30 - 3:32quando caminhamos
e escorregamos ou tropeçamos -
3:32 - 3:34e o chão escapa dos nossos pés.
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3:34 - 3:37Mas em vez de durar meio segundo,
como é costume, -
3:37 - 3:39durou seis meses.
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3:39 - 3:42É a sensação de ter medo todo o tempo
-
3:42 - 3:45mas sem sequer saber o que se teme.
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3:45 - 3:48Foi nesse momento que comecei a pensar
-
3:48 - 3:52que era demasiado doloroso estar vivo
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3:52 - 3:54e que a única razão
para não me suicidar -
3:54 - 3:57era não magoar as outras pessoas.
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3:57 - 4:00Finalmente um dia, acordei
-
4:00 - 4:03e pensei que talvez tivesse tido um AVC,
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4:03 - 4:05porque estava na cama
completamente paralisado, -
4:05 - 4:08a olhar para o telefone, a pensar:
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4:08 - 4:10"Algo está mal e devia pedir ajuda".
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4:10 - 4:12Ma não conseguia mexer o braço,
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4:12 - 4:15pegar no telefone e marcar.
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4:15 - 4:19Por fim, depois de quatro horas inteiras,
deitado, a olhar para ele, -
4:19 - 4:20o telefone tocou.
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4:20 - 4:23Não sei como, consegui atender.
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4:23 - 4:25Era o meu pai e eu disse:
-
4:25 - 4:28"Estou com um problema grave.
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4:28 - 4:30Precisamos de fazer qualquer coisa."
-
4:30 - 4:34No dia seguinte, comecei
com a medicação e com a terapia. -
4:36 - 4:39Também comecei a dar conta
desta questão terrível: -
4:40 - 4:42Se eu não sou aquela pessoa dura
-
4:42 - 4:44que poderia sobreviver
a um campo de concentração, -
4:44 - 4:46então quem sou eu?
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4:46 - 4:48Se tenho de tomar medicação,
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4:48 - 4:52a medicação está a tornar-me mais "eu"
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4:52 - 4:54ou a transformar-me noutra pessoa?
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4:54 - 4:56Como é que me sinto,
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4:56 - 4:58se me está a transformar noutra pessoa?
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4:58 - 5:02Eu tive duas vantagens na minha luta.
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5:02 - 5:04A primeira é que eu sabia que,
falando objetivamente, -
5:04 - 5:06eu tinha uma vida boa,
-
5:06 - 5:08e se conseguisse ficar bem,
-
5:08 - 5:11havia algo no final do caminho
que valia a pena viver. -
5:11 - 5:14A outra vantagem é que tinha acesso
a um bom tratamento. -
5:14 - 5:18Apesar disso, melhorei e tive uma recaída,
-
5:18 - 5:20melhorei e tive uma recaída,
-
5:20 - 5:23melhorei e tive uma recaída.
-
5:24 - 5:25Por fim compreendi
-
5:25 - 5:29que teria de ter medicação
e terapia para sempre. -
5:30 - 5:31E pensei:
-
5:31 - 5:34"Isto é um problema químico
ou um problema psicológico? -
5:34 - 5:37"Necessita duma cura química
ou duma cura filosófica?" -
5:38 - 5:40Não consegui descobrir qual era o caso.
-
5:40 - 5:42Depois compreendi
-
5:42 - 5:45que não temos conhecimentos suficientes
em nenhuma destas áreas -
5:45 - 5:47para explicar as coisas completamente.
-
5:47 - 5:49A cura química e a cura psicológica
-
5:49 - 5:52ambas têm um papel a desempenhar,
-
5:52 - 5:55e também descobri
que a depressão era uma coisa -
5:55 - 5:58que estava tão enraizada dentro de nós
-
5:58 - 6:01que não havia forma de a separar
do nosso carácter e personalidade. -
6:02 - 6:04Quero dizer que os tratamentos
-
6:04 - 6:06que temos para a depressão são terríveis.
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6:06 - 6:08Não são muito eficazes.
-
6:08 - 6:10São extremamente caros.
-
6:10 - 6:12Têm inumeráveis efeitos secundários.
-
6:12 - 6:14São um desastre.
-
6:14 - 6:17Mas sinto-me muito grato de viver hoje
-
6:17 - 6:19e não há 50 anos,
-
6:19 - 6:21quando não havia quase nada a fazer.
-
6:22 - 6:24Espero que daqui a 50 anos,
-
6:24 - 6:26as pessoas ouçam falar
dos meus tratamentos -
6:26 - 6:29e fiquem horrorizadas
que alguém tenha aguentado -
6:29 - 6:30uma ciência tão primitiva.
-
6:31 - 6:35A depressão é a falha no amor.
-
6:36 - 6:39Se estivessem casados
com alguém e pensassem: -
6:39 - 6:42"Se a minha mulher morrer,
encontrarei outra", -
6:42 - 6:45não seria amor como o concebemos.
-
6:46 - 6:50Não existe amor sem o sentimento de perda.
-
6:50 - 6:55Esse espectro do desespero
pode ser o motor da intimidade. -
6:56 - 6:59Há três coisas que as pessoas
costumam confundir: -
6:59 - 7:02depressão, mágoa e tristeza.
-
7:03 - 7:06A mágoa é explicitamente reativa.
-
7:06 - 7:09Se perdemos alguém
e nos sentimos muito infelizes, -
7:09 - 7:11e depois, seis meses mais tarde,
-
7:11 - 7:14ainda estamos tristes,
mas começamos a reagir um pouco melhor, -
7:14 - 7:16provavelmente é mágoa.
-
7:16 - 7:19Provavelmente acaba
por passar sozinha, seja como for. -
7:20 - 7:24Se sofremos uma perda catastrófica
e nos sentimos mal, -
7:24 - 7:27e seis meses depois
não conseguimos reagir nada, -
7:27 - 7:29provavelmente é uma depressão
-
7:29 - 7:32despoletada pelas circunstâncias
catastróficas. -
7:32 - 7:35A trajetória diz-nos muito.
-
7:35 - 7:39As pessoas pensam que a depressão
é apenas sentir-se triste. -
7:39 - 7:41É muito, muito mais do que muita tristeza
-
7:41 - 7:43muito mais do que mágoa
-
7:43 - 7:45por uma causa mais leve.
-
7:46 - 7:48Quando me dispus a compreender a depressão
-
7:48 - 7:51e intervir junto de pessoas
que tiveram essa experiência, -
7:51 - 7:54achei que havia pessoas que,
aparentemente, à primeira vista, -
7:54 - 7:58estavam com uma depressão
relativamente suave -
7:58 - 8:01mas que, no entanto, estavam
totalmente incapacitadas. -
8:01 - 8:04E havia outras pessoas que,
segundo as suas descrições -
8:04 - 8:07tinham tido uma depressão terrível
-
8:07 - 8:10mas que, no entanto, tinham tido
uma boa vida nos intervalos -
8:10 - 8:13entre os episódios depressivos.
-
8:13 - 8:15E propus-me descobrir o que é que faz
-
8:15 - 8:18com que algumas pessoas sejam
mais resistentes que outras pessoas. -
8:18 - 8:22Quais são os mecanismos
que permitem às pessoas sobreviver? -
8:22 - 8:25Comecei a entrevistar pessoas,
umas atrás de outras, -
8:25 - 8:27que estavam a sofrer de depressão.
-
8:27 - 8:29Uma das primeiras pessoas que entrevistei
-
8:29 - 8:34descreveu a depressão
como uma forma mais lenta de morrer. -
8:34 - 8:37Foi bom para mim ouvir isso no início
-
8:37 - 8:39porque recordou-me
-
8:39 - 8:42que uma forma lenta de morrer
pode levar mesmo à morte. -
8:42 - 8:44Isto é uma questão grave,
-
8:44 - 8:47é a principal causa de
incapacidade em todo o mundo -
8:47 - 8:49e as pessoas morrem disso todos os dias.
-
8:49 - 8:52Uma das pessoas com quem conversei
-
8:52 - 8:54quando eu estava a tentar compreender isto
-
8:54 - 8:55foi uma grande amiga
-
8:55 - 8:57que eu conhecia há muitos anos.
-
8:57 - 8:59Tinha tido um episódio psicótico
-
8:59 - 9:02quando era caloira na faculdade.
-
9:02 - 9:04Depois caiu numa depressão horrível.
-
9:04 - 9:06Ela tinha doença bipolar,
-
9:06 - 9:09ou psicose maníaco-depressiva,
como era conhecida na altura. -
9:09 - 9:13Durante muitos anos,
teve ótimos resultados com lítio. -
9:12 - 9:16Depois retiraram-lhe o lítio
-
9:16 - 9:17para ver como se saía sem ele,
-
9:17 - 9:19e ela teve outra psicose.
-
9:20 - 9:23Mergulhou na pior depressão
que eu já vira. -
9:23 - 9:26Ficava sentada no apartamento dos pais,
-
9:26 - 9:30mais ou menos catatónica,
essencialmente sem se mover, -
9:30 - 9:32dia após dia, após dia.
-
9:32 - 9:35Entrevistei-a sobre essa experiência,
uns anos mais tarde. -
9:36 - 9:38Ela é poeta e psicoterapeuta,
chama-se Maggie Robbins. -
9:39 - 9:41Quando a entrevistei, ela disse-me:
-
9:42 - 9:45"Eu estava a cantar
'Para onde foram todas as flores?' -
9:45 - 9:48"repetia vezes sem conta
para ocupar o meu espírito. -
9:49 - 9:52"Cantava para apagar as coisas
que a minha cabeça dizia: -
9:53 - 9:57"'Tu não és nada. Tu não és ninguém.
-
9:57 - 9:58"Nem sequer mereces viver.'
-
10:00 - 10:03Foi quando comecei a pensar em matar-me."
-
10:04 - 10:07Numa depressão, não pensamos
que colocamos um véu cinzento -
10:07 - 10:11e estamos a ver o mundo através
da neblina de um mau humor. -
10:11 - 10:14Achamos que retiraram o véu,
-
10:14 - 10:16o véu da felicidade,
-
10:16 - 10:18e que agora é que estamos
a ver verdadeiramente. -
10:18 - 10:21É mais fácil ajudar esquizofrénicos
-
10:21 - 10:23que sentem que há algo estranho
dentro deles -
10:23 - 10:25que precisa ser exorcizado.
-
10:25 - 10:28Mas é difícil com deprimidos,
-
10:28 - 10:31porque acreditamos
que estamos a ver a verdade. -
10:31 - 10:33Mas a verdade mente.
-
10:34 - 10:36Fiquei obcecado com esta frase:
-
10:36 - 10:38"Mas a verdade mente."
-
10:39 - 10:41Descobri , à medida que falava
com pessoas deprimidas, -
10:41 - 10:44que elas têm muitas perceções delirantes.
-
10:44 - 10:46As pessoas dizem: "Ninguém me ama".
-
10:46 - 10:47E nós dizemos:
-
10:47 - 10:50"Eu amo-te, a tua mulher ama-te,
a tua mãe ama-te." -
10:50 - 10:52Podemos responder a essa
muito rapidamente, -
10:52 - 10:54pelo menos à maioria das pessoas.
-
10:54 - 10:56Mas as pessoas que estão deprimidas
também dirão: -
10:56 - 10:59"Façamos o que fizermos,
acabamos todos por morrer." -
10:59 - 11:03Ou dirão: "Não pode haver uma verdadeira
comunhão entre dois seres humanos. -
11:03 - 11:06"Cada um de nós está preso
no seu próprio corpo." -
11:06 - 11:08Ao que temos de responder:
-
11:08 - 11:09"Isso é verdade,
-
11:09 - 11:11"Mas acho que agora devemos concentrar-nos
-
11:11 - 11:13"no que temos para o pequeno-almoço."
-
11:13 - 11:15(Risos)
-
11:15 - 11:17Na maior parte das vezes,
-
11:17 - 11:19o que eles exprimem não é uma doença,
mas uma visão, -
11:19 - 11:23e chegamos a pensar que é extraordinário
-
11:23 - 11:26que a maioria de nós conheça
estas questões existenciais -
11:26 - 11:28e elas não nos perturbem muito.
-
11:28 - 11:30Houve um estudo
de que eu gostei especialmente -
11:30 - 11:33em que pessoas deprimidas
e pessoas não-deprimidas -
11:33 - 11:36foram convidadas a jogar
um jogo vídeo durante uma hora. -
11:36 - 11:38No final dessa hora, perguntaram-lhes
-
11:38 - 11:41quantos monstrinhos achavam
que tinham matado. -
11:41 - 11:43O grupo de depressivos,
geralmente, era preciso -
11:43 - 11:46com uma margem de erro
de cerca de 10%. -
11:46 - 11:48As pessoas não-deprimidas
avaliaram os monstrinhos -
11:48 - 11:50em cerca de 15 a 20 vezes mais...
-
11:50 - 11:52(Risos)
-
11:52 - 11:54... do que tinham matado na realidade.
-
11:57 - 11:59Quando eu decidi escrever
sobre a minha depressão -
11:59 - 12:01muita gente disse
que devia ser muito difícil -
12:01 - 12:04expor-me assim,
para que toda a gente soubesse. -
12:04 - 12:07Diziam: "As pessoas falam contigo
de forma diferente?" -
12:07 - 12:09E eu: "Sim, falam comigo
de forma diferente. -
12:09 - 12:10Falam comigo de forma diferente
-
12:10 - 12:13quando começam a contar-me
as suas experiências, -
12:13 - 12:15ou a experiência duma irmã,
-
12:15 - 12:17ou a experiência dum amigo.
-
12:17 - 12:19As coisas são diferentes,
porque agora eu sei -
12:19 - 12:22que a depressão é um segredo de família
-
12:22 - 12:23que toda a gente tem.
-
12:24 - 12:27Há uns anos, fui a uma conferência.
-
12:27 - 12:30Na sexta-feira
da conferência de três dias, -
12:30 - 12:33uma das participantes
chamou-me à parte, e disse: -
12:34 - 12:39"Eu sofro de depressão e sinto-me
um pouco envergonhada com isso. -
12:39 - 12:42"Mas tenho tomado este medicamento,
-
12:42 - 12:44"e só queria perguntar-lhe
o que é que acha?" -
12:44 - 12:47Fiz o melhor que pude
para dar-lhe conselhos. -
12:47 - 12:48Depois ela disse:
-
12:48 - 12:51"Sabe, o meu marido nunca entenderia isto.
-
12:51 - 12:54"Ele é o tipo de pessoa para quem
isto não faria qualquer sentido, -
12:54 - 12:57"Portanto, isto fica entre nós."
-
12:57 - 12:59E eu disse: "Sim, tudo bem."
-
12:59 - 13:01No domingo da mesma conferência,
-
13:01 - 13:04o marido dela chamou-me à parte e disse:
-
13:04 - 13:06"Se a minha mulher soubesse,
-
13:06 - 13:08"havia de achar que eu
não era homem, não era nada, -
13:08 - 13:10"mas eu tenho andado com uma depressão.
-
13:10 - 13:14Estou a tomar uns medicamentos
e gostava de saber o que acha." -
13:14 - 13:17Andavam a esconder a mesma medicação
-
13:17 - 13:20em dois lugares diferentes,
no mesmo quarto. -
13:20 - 13:21(Risos)
-
13:21 - 13:24Eu disse que achava
que a comunicação dentro do casamento -
13:24 - 13:27podia estar a provocar
alguns dos problemas deles. -
13:27 - 13:29(Risos)
-
13:31 - 13:34Mas também fiquei impressionado
pela natureza pesada -
13:34 - 13:36de um tal segredo mútuo.
-
13:36 - 13:38A depressão é tão cansativa.
-
13:38 - 13:41Absorve tanto do nosso tempo e energia.
-
13:41 - 13:45O silêncio sobre isso
só piora a depressão. -
13:45 - 13:47Então comecei a pensar
em todas as formas -
13:47 - 13:49que as pessoas usam para melhorar.
-
13:49 - 13:51Comecei como um médico conservador.
-
13:51 - 13:54Pensei que havia alguns tipos
de terapia que resultavam, -
13:54 - 13:56sabia-se quais eram.
-
13:56 - 13:58Havia medicação,
-
13:58 - 13:59Havia algumas psicoterapias,
-
13:59 - 14:01possivelmente havia tratamentos
electroconvulsivos, -
14:01 - 14:04e tudo o resto era absurdo.
-
14:04 - 14:06Mas então descobri uma coisa.
-
14:06 - 14:07Se temos cancro no cérebro,
-
14:07 - 14:10e dizemos que fazer o pino,
durante 20 minutos, -
14:10 - 14:12todas as manhãs, nos faz sentir melhor,
-
14:12 - 14:13podemos sentir-nos melhor,
-
14:13 - 14:15mas continuamos com cancro no cérebro.
-
14:15 - 14:17Provavelmente vamos morrer disso.
-
14:17 - 14:19Mas se temos uma depressão,
-
14:19 - 14:22e achamos que fazer o pino,
durante 20 minutos todos os dias, -
14:22 - 14:24nos faz sentir melhor, então funcionou.
-
14:24 - 14:27Porque a depressão é uma doença
de como nos sentimos. -
14:27 - 14:29Se nos sentimos melhor,
-
14:29 - 14:31é porque deixamos de estar deprimidos.
-
14:31 - 14:33Então tornei-me muito mais tolerante
-
14:33 - 14:36quanto ao vasto mundo
dos tratamentos alternativos. -
14:36 - 14:38Recebo centenas de cartas
-
14:38 - 14:42de pessoas que escrevem a contar-me
o que resultou com elas. -
14:42 - 14:45Ainda hoje me perguntaram
nos bastidores sobre meditação. -
14:45 - 14:47De todas as cartas que recebi
-
14:47 - 14:49a minha preferida é de uma mulher
-
14:49 - 14:51que disse que tinha tentado terapia,
-
14:51 - 14:53tinha tentado medicação,
tinha tentado quase tudo. -
14:53 - 14:57Tinha encontrado uma solução
e queria que eu contasse a toda gente. -
14:57 - 15:00Era fazer pequenos objetos de fios.
-
15:00 - 15:02(Risos)
-
15:03 - 15:05Ela mandou-me uns quantos.
-
15:05 - 15:06(Risos)
-
15:06 - 15:09Mas não estou a usá-los agora.
-
15:10 - 15:13Sugeri-lhe que também devia procurar
transtorno obsessivo-compulsivo -
15:13 - 15:15no Manual de Doenças Mentais.
-
15:15 - 15:16(Risos)
-
15:17 - 15:20No entanto, quando investiguei
os tratamentos alternativos, -
15:20 - 15:23também ganhei perspetiva
sobre outros tratamentos. -
15:23 - 15:26Passei por um exorcismo tribal no Senegal
-
15:26 - 15:28que envolvia muito sangue de carneiro
-
15:28 - 15:30e que eu não vou pormenorizar agora.
-
15:30 - 15:32Anos depois estive no Ruanda
-
15:32 - 15:34a trabalhar num projeto diferente,
-
15:34 - 15:37e descrevi a minha experiência
a uma pessoa que disse: -
15:37 - 15:40"Sabes, isso foi na África Ocidental.
Nós estamos na África Oriental. -
15:40 - 15:42"Os nossos rituais são diferentes.
-
15:42 - 15:45"Mas temos rituais que têm algo
em comum com o que descreves." -
15:45 - 15:47E eu: "Oh." E ele disse:
-
15:47 - 15:50"Sim, mas tivemos problemas com
os trabalhadores ocidentais de saúde mental, -
15:50 - 15:53"especialmente aqueles
que vieram depois do genocídio." -
15:53 - 15:55E eu disse:
"Que tipo de problema tiveram?" -
15:55 - 15:57E ele disse:
-
15:57 - 15:59"Eles faziam uma coisa bizarra.
-
15:59 - 16:01"Não levavam as pessoas para o sol
-
16:01 - 16:03"onde nos começamos a sentir melhor.
-
16:03 - 16:06"Não usavam tambores nem música
para fazer circular o sangue. -
16:06 - 16:08"Não envolviam a comunidade.
-
16:08 - 16:11"Não exteriorizavam a depressão
como um espírito invasivo. -
16:11 - 16:14"Em vez disso, levavam as pessoas
-
16:14 - 16:16"uma de cada vez para salas sujas
-
16:16 - 16:18"e elas tinham de falar durante uma hora
-
16:18 - 16:20"sobre as coisas más
que lhes tinham acontecido." -
16:20 - 16:22(Risos)
-
16:22 - 16:24(Aplausos)
-
16:25 - 16:28E disse: "Tivemos que lhes pedir
para saírem do país." -
16:28 - 16:30(Risos)
-
16:31 - 16:33Agora, no outro extremo
dos tratamentos alternativos, -
16:33 - 16:35vou falar sobre Frank Russakoff.
-
16:35 - 16:38Frank Russakoff tinha a pior depressão
-
16:38 - 16:41que eu talvez já tenha visto num homem.
-
16:41 - 16:43Ele estava constantemente deprimido,
-
16:43 - 16:45quando o conheci, numa altura
-
16:45 - 16:48em que fazia um tratamento
de choques elétricos todos os meses. -
16:48 - 16:51Ficava meio desorientado
durante uma semana. -
16:51 - 16:53Depois, sentia-se bem durante uma semana.
-
16:53 - 16:55Depois, começava a piorar
-
16:55 - 16:57e fazia outro tratamento de eletrochoques.
-
16:57 - 16:59Quando o conheci, disse-me:
-
16:59 - 17:01"É insuportável passar as semanas assim.
-
17:01 - 17:04"Não posso continuar neste caminho.
-
17:04 - 17:06"Acho que descobri como acabar
com isto se não melhorar. -
17:06 - 17:10"Ouvi falar de um protocolo
no Mass General -
17:10 - 17:12"para um procedimento chamado cingulotomia
-
17:12 - 17:14"que é uma cirurgia ao cérebro,
-
17:14 - 17:16"e acho que vou tentar."
-
17:17 - 17:19Lembro-me de ter ficado espantado
-
17:19 - 17:20por pensar que uma pessoa
-
17:20 - 17:22que claramente tinha tido
tantas experiências más -
17:22 - 17:24com tantos tratamentos diferentes
-
17:24 - 17:27ainda tinha algures dentro dela
otimismo suficiente -
17:27 - 17:30para tentar mais um.
-
17:30 - 17:32Ele fez a cingulotomia
-
17:32 - 17:34que correu incrivelmente bem.
-
17:34 - 17:36Ele agora é um amigo meu.
-
17:36 - 17:39Tem uma esposa adorável
e dois filhos lindos. -
17:39 - 17:43Escreveu-me uma carta no Natal
depois da cirurgia e dizia: -
17:43 - 17:45"O meu pai mandou-me
dois presentes este ano, -
17:45 - 17:49"O primeiro foi uma estante motorizada
para CDs da The Sharper Image -
17:49 - 17:51"de que eu não precisava.
-
17:51 - 17:54"Ofereceu-ma para comemorar
eu estar a viver independente -
17:54 - 17:56e ter um trabalho que eu adorava.
-
17:56 - 17:57O outro presente
-
17:57 - 18:00foi um retrato da minha avó
que se suicidou. -
18:01 - 18:04Quando o desembrulhei, comecei a chorar.
-
18:04 - 18:07A minha mãe aproximou-se e disse:
-
18:07 - 18:10'Estás a chorar por causa dum familiar
que nunca conheceste?' -
18:10 - 18:13E eu respondi:
'Ela tinha a mesma doença que eu'. -
18:13 - 18:16Estou a chorar agora enquanto te escrevo.
-
18:16 - 18:19Não é que esteja triste,
mas fico sentimental. -
18:19 - 18:22Talvez porque podia ter-me matado
-
18:22 - 18:25mas os meus pais impediram-me,
bem como os médicos -
18:25 - 18:27e eu fiz a cirurgia.
-
18:27 - 18:30Estou vivo e sinto-me grato.
-
18:30 - 18:33Nós vivemos na altura certa,
-
18:33 - 18:35apesar de nem sempre nos parecer isso."
-
18:36 - 18:38Fiquei surpreendido pelo facto
de que a depressão -
18:38 - 18:40é geralmente entendida
-
18:40 - 18:43como uma coisa moderna
da classe média, ocidental. -
18:43 - 18:47Fui investigar o que acontecia
numa série de outros contextos. -
18:47 - 18:49Uma das coisas que mais me interessava
-
18:49 - 18:51era a depressão entre os indigentes.
-
18:51 - 18:54Tentei indagar o que é que se fazia
-
18:54 - 18:56pelas pessoas pobres com depressão.
-
18:56 - 18:58Descobri que as pessoas pobres
-
18:58 - 19:00em norma não são tratadas de depressão.
-
19:00 - 19:03A depressão é o resultado
duma vulnerabilidade genética, -
19:03 - 19:06que presumivelmente está distribuída
por toda a população. -
19:06 - 19:08As circunstâncias que a provocam
-
19:08 - 19:10são provavelmente mais graves
-
19:10 - 19:12em pessoas que são pobres.
-
19:12 - 19:14Mas acontece que, se temos uma vida boa,
-
19:14 - 19:17mas sentimo-nos mal
o tempo todo, pensamos: -
19:17 - 19:19"Porque é que me sinto assim?
-
19:19 - 19:20"Devo ter uma depressão."
-
19:20 - 19:22E procuramos um tratamento.
-
19:22 - 19:24Mas se temos uma vida horrível,
-
19:24 - 19:26e nos sentimos mal o tempo todo,
-
19:26 - 19:29comparamos a forma como nos sentimos
com a nossa vida, -
19:29 - 19:31e não ocorre pensar:
-
19:31 - 19:33"Talvez haja um tratamento."
-
19:33 - 19:36Assim, temos neste país
uma epidemia de depressão -
19:36 - 19:38nas pessoas pobres
-
19:38 - 19:41que não está a ser detetada
nem a ser tratada, -
19:41 - 19:43nem a ser alvo de preocupações.
-
19:43 - 19:45É uma tragédia de grande escala.
-
19:45 - 19:49Encontrei uma académica que estava
a fazer um projeto de investigação -
19:49 - 19:50nos bairros de lata em volta de D.C.
-
19:50 - 19:53Entre as mulheres que apareciam
com outros problemas de saúde -
19:53 - 19:55ela escolhia as que tinham depressão
-
19:55 - 19:58e submetia-as a um protocolo
experimental de seis meses. -
19:58 - 20:01Apareceu-me uma delas, a Lolly,
-
20:01 - 20:03— era uma mulher que tinha sete filhos —
-
20:03 - 20:05e disse-me nesse dia:
-
20:08 - 20:11"Eu tinha trabalho, mas tive de o deixar
-
20:11 - 20:13"porque não conseguia sair de casa.
-
20:13 - 20:16"Não tinha nada para dizer
aos meus filhos. -
20:16 - 20:18"De manhã, mal podia esperar
que eles saíssem, -
20:18 - 20:21"para voltar para a cama
e tapar a cabeça com os cobertores. -
20:21 - 20:23"Às três horas, quando eles voltam a casa,
-
20:23 - 20:25"chegam tão depressa.
-
20:25 - 20:27"Tenho tomado um monte de Tylenol,
-
20:27 - 20:30"tudo o que me ajude a dormir mais.
-
20:30 - 20:33"O meu marido diz-me
que sou estúpida, que sou feia. -
20:33 - 20:36"Quem me dera poder parar
este sofrimento." -
20:37 - 20:40Ela fez para o protocolo experimental.
-
20:40 - 20:42Quando a entrevistei, seis meses depois,
-
20:42 - 20:46ela tinha aceite um trabalho
a tomar conta de crianças -
20:46 - 20:49para a Marinha dos EUA,
-
20:49 - 20:51tinha deixado o marido abusador
e disse-me: -
20:52 - 20:54"Os meus filhos agora
estão muito mais felizes." -
20:54 - 20:57"Na minha nova casa
há um quarto para os rapazes -
20:57 - 20:59"e um quarto para as raparigas,
-
20:59 - 21:02"mas à noite, vêm todos para a minha cama.
-
21:02 - 21:04"Fazemos os trabalhos de casa
todos juntos e tudo. -
21:04 - 21:08"Um deles que ser pregador,
outro quer ser bombeiro, -
21:08 - 21:10"e uma das meninas diz
que quer ser uma advogada. -
21:11 - 21:13"Eles já não choram como costumavam,
-
21:13 - 21:15"e já não brigam como costumavam.
-
21:15 - 21:19"Tudo o que preciso
agora são os meus filhos. -
21:19 - 21:22"As coisas continuam a mudar,
-
21:22 - 21:26"a forma como me visto,
como me sinto, como ajo. -
21:26 - 21:30"Posso sair sem sentir medo.
-
21:30 - 21:33"Acho que esses maus sentimentos
não vão voltar, -
21:33 - 21:36"Se não fosse a Dra. Miranda,
-
21:36 - 21:40"ainda estaria em casa
com os cobertores por cima da cabeça, -
21:40 - 21:42"se ainda estivesse viva.
-
21:42 - 21:46"Pedi ao Senhor para me enviar um anjo,
-
21:46 - 21:48"e Ele ouviu as minhas preces."
-
21:50 - 21:54Eu fiquei muito comovido
com estas experiências -
21:54 - 21:56e decidi que queria escrever acerca delas
-
21:56 - 21:58não só no livro em que estava a trabalhar,
-
21:58 - 21:59mas também num artigo.
-
21:59 - 22:02Consegui uma encomenda
da New York Times Magazine -
22:02 - 22:04para escrever sobre a depressão
dos indigentes. -
22:04 - 22:06Entreguei o meu artigo
e a editora chamou-me e disse: -
22:06 - 22:08"Não podemos publicar isto."
-
22:08 - 22:10E eu disse: "Porque não?"
-
22:10 - 22:12E ela disse: " É demasiado rebuscado.
-
22:12 - 22:16"Estas pessoas que estão
no fundo da escala social, -
22:16 - 22:18"seguem uns meses de tratamento
-
22:18 - 22:20"e ficam preparadas
para gerir a Morgan Stanley? -
22:20 - 22:22"É demasiado incrível.
-
22:22 - 22:24"Eu nunca ouvi falar duma coisa assim."
-
22:24 - 22:27E eu disse: "O facto de nunca
teres ouvido falar disto -
22:27 - 22:30"é um indicador
que se trata duma notícia." -
22:30 - 22:34(Risos)
-
22:33 - 22:36(Aplausos)
-
22:38 - 22:40"Vocês são uma revista de notícias."
-
22:40 - 22:43Depois de uma certa negociação,
eles concordaram. -
22:43 - 22:45Mas eu acho que o que eles disseram
-
22:45 - 22:47está relacionado, de forma estranha,
-
22:47 - 22:49com o desagrado que as pessoas ainda têm
-
22:49 - 22:51com a ideia de tratamento,
-
22:51 - 22:53a noção de que, se nós tratássemos
-
22:53 - 22:55um grande número de pessoas
de comunidades indigentes -
22:55 - 22:57isso seria uma exploração
-
22:57 - 22:59porque os estaríamos a mudar.
-
22:59 - 23:01Há um falso imperativo moral
-
23:01 - 23:03que parece estar à nossa volta
-
23:03 - 23:05e que diz que o tratamento da depressão
-
23:05 - 23:08a medicação e o resto, são um artifício
-
23:08 - 23:09e que não é natural.
-
23:10 - 23:12Eu acho que é um grande engano.
-
23:12 - 23:16Seria natural que os dentes
das pessoas caíssem, -
23:16 - 23:19mas não há ninguém a protestar
contra a pasta de dentes -
23:19 - 23:21pelo menos ninguém que eu conheça.
-
23:22 - 23:23As pessoas dizem:
-
23:23 - 23:26"A depressão não é uma coisa
que as pessoas devem experimentar? -
23:26 - 23:28"Não evoluímos para ter depressões?
-
23:28 - 23:30"Isso não faz parte
da nossa personalidade?" -
23:30 - 23:33Eu respondo que a disposição é adaptativa.
-
23:33 - 23:36Ter a capacidade
de estar triste e de ter medo -
23:36 - 23:38de estar alegre e de ter prazer
-
23:38 - 23:40e de todos os outros sentimentos
que temos, -
23:40 - 23:41é incrivelmente valioso.
-
23:42 - 23:45Uma grande depressão
é uma coisa que acontece -
23:45 - 23:47quando esse sistema se avaria.
-
23:47 - 23:49É uma deficiência de adaptação.
-
23:49 - 23:50As pessoas vêm ter comigo e dizem:
-
23:50 - 23:55" Acho que, se conseguir aguentar
mais um ano, consigo superar isto." -
23:55 - 23:56Respondo sempre:
-
23:56 - 23:59"Pode ser que superes,
mas nunca voltarás a ter 37 anos. -
24:01 - 24:04"A vida é curta, e preparas-te
para abdicar de um ano inteiro. -
24:04 - 24:06"Pensa nisso."
-
24:06 - 24:09Há uma estranha pobreza na língua inglesa
-
24:09 - 24:11e em muitos outros idiomas,
-
24:11 - 24:13em que usamos a mesma palavra
— depressão — -
24:13 - 24:15para descrever como um miúdo se sente,
-
24:15 - 24:17quando chove no dia do seu aniversário,
-
24:17 - 24:19e para descrever como alguém se sente
-
24:19 - 24:22um minuto antes de se suicidar.
-
24:22 - 24:23As pessoas dizem-me:
-
24:23 - 24:25"É um contínuo da tristeza normal?
-
24:25 - 24:28E eu digo: "De certa forma,
é um continuo da tristeza normal." -
24:28 - 24:30Há um certo grau de continuidade,
-
24:30 - 24:32mas na mesma medida que há continuidade
-
24:32 - 24:34entre ter uma vedação de ferro
em volta da casa -
24:34 - 24:36que fica com um ponto de ferrugem
-
24:36 - 24:38que temos de limar e retocar
-
24:38 - 24:41e o que acontece
se abandonamos a casa durante 100 anos -
24:41 - 24:44e a vedação enferrujar
até ser apenas um monte -
24:44 - 24:46de ferrugem laranja.
-
24:46 - 24:47É esse ponto laranja de ferrugem,
-
24:47 - 24:49esse problema da fuligem laranja,
-
24:49 - 24:52que nos propomos resolver.
-
24:52 - 24:54Então as pessoas dizem:
-
24:54 - 24:57"Tomamos esses comprimidos da felicidade
e sentimo-nos felizes?" -
24:57 - 24:59Não é bem assim.
-
24:59 - 25:01Mas não me sinto triste
por ter de almoçar, -
25:01 - 25:05não me sinto triste por causa
do meu atendedor de chamadas, -
25:05 - 25:07e não me sinto triste por tomar um duche.
-
25:07 - 25:10Na verdade, acho que
ainda me sinto mais triste -
25:10 - 25:13porque consigo sentir tristeza
sem sentir nulidade. -
25:13 - 25:17Sinto-me triste
com as desilusões profissionais, -
25:17 - 25:19com as relações destroçadas,,
-
25:19 - 25:21com o aquecimento global.
-
25:21 - 25:24São essas as coisas
que agora me entristecem. -
25:24 - 25:27E disse para mim mesmo:
Qual é a conclusão? -
25:27 - 25:30Como conseguiram superar
os que têm melhores vidas -
25:30 - 25:32apesar de terem tido maiores depressões?
-
25:32 - 25:34Qual é o mecanismo de resistência?
-
25:35 - 25:37Ao longo do tempo, cheguei à conclusão
-
25:37 - 25:40que as pessoas que negavam
a sua experiência e diziam: -
25:40 - 25:42"Eu tive uma depressão há muito tempo.
-
25:42 - 25:44"Nunca mais quero pensar nisso.
-
25:44 - 25:47"Não vou dar-lhe mais atenção
e vou continuar com aminha vida", -
25:47 - 25:51ironicamente, são as pessoas que estão
mais escravizadas pelo que tiveram. -
25:51 - 25:54Negar a depressão, fortalece-a.
-
25:54 - 25:57Enquanto nos escondemos dela, ela cresce.
-
25:57 - 26:00As pessoas que superam melhor
-
26:00 - 26:04são as que conseguem aceitar
o facto de terem essa doença. -
26:04 - 26:07As que conseguem aceitar a sua depressão
-
26:07 - 26:09são as que atingem a resistência.
-
26:09 - 26:11Frank Russakoff disse-me:
-
26:11 - 26:12"Se tivesse que fazer tudo novamente,
-
26:12 - 26:14"suponho que não o faria assim,
-
26:14 - 26:17"Mas, estranhamente,
estou grato pelo que passei. -
26:17 - 26:21"Sinto-me feliz por ter estado
no hospital 40 vezes. -
26:21 - 26:24"Ensinou-me muito sobre o amor.
-
26:24 - 26:27"A minha relação com os meus pais
e com os meus médicos -
26:27 - 26:31"tem sido preciosa para mim
e será sempre." -
26:31 - 26:33Maggie Robbins disse:
-
26:33 - 26:36"Costumava ser voluntária
numa clínica de SIDA. -
26:36 - 26:39"Eu só falava, falava, falava.
-
26:39 - 26:41"As pessoas com quem eu lidava
-
26:41 - 26:43"não eram muito recetivas e eu pensei:
-
26:43 - 26:47"'Isto não é muito simpático
nem útil da parte deles.' -
26:47 - 26:50"Então percebi que eles
não fariam muito mais -
26:50 - 26:53"do que aqueles primeiros minutos
de conversa fiada. -
26:53 - 26:55"Simplesmente ia haver uma ocasião
-
26:55 - 26:58"em que eu não tinha SIDA
e não estava a morrer, -
26:58 - 27:02"mas podia aceitar o facto
de que eles tinham SIDA e iam morrer. -
27:03 - 27:06"As nossas necessidades
são o nosso maior trunfo. -
27:06 - 27:11"Acontece que aprendi a dar
todas as coisas que preciso." -
27:12 - 27:17Valorizar a nossa depressão
não impede uma recaída, -
27:17 - 27:20mas pode alertar para uma recaída
-
27:20 - 27:23e até mesmo tornar a recaída em si
mais fácil tolerar. -
27:23 - 27:26A questão não é tanto
de encontrar grande significado -
27:26 - 27:30e de concluir que a nossa depressão
tem sido muito significativa. -
27:30 - 27:33É de procurar esse significado
e, quando ela voltar, pensar: -
27:33 - 27:37"Isto vai ser um inferno,
Mas vou aprender algo com isso." -
27:38 - 27:42Eu aprendi com a minha depressão
quão grande pode ser uma emoção, -
27:42 - 27:45Como pode ser mais real do que factos,
-
27:45 - 27:49e descobri que aquela experiência
-
27:49 - 27:54me permitiu experimentar emoções positivas
de uma forma mais intensa e mais focada. -
27:54 - 27:58O oposto da depressão não é felicidade,
-
27:58 - 27:59mas vitalidade.
-
27:59 - 28:02Hoje em dia, a minha vida é vital,
-
28:02 - 28:05mesmo nos dias em que estou triste.
-
28:05 - 28:08Senti aquele funeral no meu cérebro,
-
28:08 - 28:12e que estava junto do colosso
na borda do mundo. -
28:13 - 28:16Descobri dentro de mim uma coisa
-
28:16 - 28:19a que chamaria alma
-
28:19 - 28:22que nunca tinha formulado
até esse dia há 20 anos, -
28:22 - 28:26quando o inferno veio fazer-me
uma visita surpresa. -
28:27 - 28:31Acho que, apesar de odiar
ter estado deprimido -
28:31 - 28:33e de odiar vir a estar deprimido
novamente, -
28:33 - 28:36encontrei uma forma
de gostar da minha depressão. -
28:37 - 28:38Gosto dela porque me obrigou
-
28:38 - 28:41a encontrar e a agarrar-me à alegria.
-
28:41 - 28:43Gosto dela porque, em cada dia,
-
28:43 - 28:46decido, às vezes, corajosamente,
-
28:46 - 28:48outras vezes contra a razão do momento,
-
28:48 - 28:51decompor as razões para viver.
-
28:51 - 28:55Acho que isso é um arrebatamento
altamente privilegiado. -
28:55 - 28:57Obrigado.
-
28:57 - 29:00(Aplausos)
- Title:
- Depressão, o segredo que partilhamos
- Speaker:
- Andrew Solomon
- Description:
-
"O oposto de depressão não é felicidade, é vitalidade, e foi a vitalidade que desapareceu de mim naquele momento". Numa conversa tão eloquente como devastadora, o escritor Andrew Solomon leva-nos aos cantos mais sombrios do seu espírito durante os anos em que lutou contra a depressão. Essa luta levou-o a uma viagem reveladora pelo mundo para entrevistar outras pessoas com depressão — apenas para descobrir que, para sua surpresa, quanto mais falava, mais as pessoas queriam contar as suas histórias.
(Filmado em TEDxMet.) - Video Language:
- English
- Team:
- closed TED
- Project:
- TEDTalks
- Duration:
- 29:21
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Aristides Lourenco
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