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Famílias descosidas | Julieta Grinblat | TEDxRíodelaPlataED

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    Há uns dias, recebi
    um "e-mail" do meu pai,
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    que não vejo há muito, muito tempo.
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    O meu coração acelerou.
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    Decidi há bastante tempo
    deixar de ver o meu pai
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    porque me dei conta de que, depois
    de mil segundas oportunidades,
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    não conseguia salvar nada da relação.
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    Era uma pessoa que não me fazia bem.
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    O "e-mail" convidava-me
    a encontrarmo-nos no aniversário dele.
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    E, subtilmente, deitava-me as culpas,
    por ser uma filha terrível.
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    Bem, não era assim tão subtilmente.
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    Apesar de eu saber
    que o facto de não o ver
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    não me transformava numa má pessoa,
    nem nada do género,
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    sentia muita, muita culpa.
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    Nisto, encontrei-me com um amigo
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    um pouco para descarregar todas
    estas emoções por que estava a passar.
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    E ele, depois de me ouvir,
    olhou para mim, muito calmo,
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    e disse-me algo como:
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    "Juli, nós não somos Jesus".
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    Isto ficou a ecoar-me na cabeça.
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    É evidente, não é?
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    Só alguém como Jesus
    pode perdoar a qualquer pessoa
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    o que quer que tenha feito.
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    Mas o que realmente
    me chamou a atenção nesta ideia
  • 1:39 - 1:42
    foi que não me disse,
    em momento algum, algo como:
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    "Mas Juli, se é teu pai,
    como é que podes não querer vê-lo?"
  • 1:48 - 1:52
    Como costumava ouvir
    da maioria das pessoas
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    com quem falava sobre o assunto.
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    Porque... chamamos pai a quem?
  • 2:00 - 2:03
    Quem é que merece realmente este título?
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    Ou, desculpem-me a expressão,
    mas basta usá-lo?
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    Fui-me dando conta
    de como se dá por garantido
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    que a família
    é unicamente a biológica.
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    Mesmo quando se conhecem
    outras formas de família
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    a biológica tem o privilégio.
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    Aparece sempre, queiramos ou não,
    como "a melhor".
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    A família natural, a família certa.
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    De onde vem esta ideia de que
    temos de gostar dos nossos pais
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    só porque são os nossos pais?
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    Quer dizer, porque não gostar deles
    pelo laço que temos com eles,
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    porque tomam conta de nós,
    porque nos fazem bem?
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    Custou-me bastante perceber
    que não existe algo como uma escola
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    que ensine aos pais como amar os filhos,
    para não os fazer sofrer.
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    Custou-me perceber que a família
    é uma construção,
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    porque ia contra um discurso
    que tinha ouvido durante a vida inteira.
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    Algo que me tinham apresentado
    como sendo natural.
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    Gosto de pensar na família
    como uma "T-shirt".
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    Uma peça de roupa bem costurada.
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    Tão bem feita
    que as costuras não se notam.
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    Mas, qual é o problema?
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    Se não nos sentimos confortáveis
    se não passamos bons momentos com ela,
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    ou se há alguém que está a fazer
    com que passemos um mau bocado,
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    dizem-nos que foi o que nos calhou.
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    Quando as coisas começam
    a não funcionar numa família,
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    especialmente quando, de repente,
    surge esta dor aguda,
  • 3:50 - 3:53
    as costuras começam a incomodar.
  • 3:53 - 3:55
    Passam a estar presentes.
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    Arranham, picam, às vezes magoam.
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    As costuras começaram a incomodar-me
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    no momento em que estar
    em minha casa se tornou terrível.
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    Algo que me fazia sofrer e chorar imenso.
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    Mas que tinha de fazer,
    custasse o que custasse.
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    Era o que me tinha calhado!
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    Não imaginam o que me custou
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    quando ouvi que o que estava
    a sofrer era violência.
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    Foi aí que me ocorreu virar do avesso
    esta "T-shirt" de que vos falo.
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    E vi as costuras.
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    As que todos temos, que se constroem
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    e vão sendo cosidas
    à medida que crescemos
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    e com os laços que criamos.
  • 4:39 - 4:44
    Às vezes é para o bem
    e, noutros casos, para o mal.
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    Quando temos uma família
    que, em certas situações, nos faz mal,
  • 4:48 - 4:50
    clara e efetivamente mal,
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    custa-nos muito a entender
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    que não estamos presos
    neste tecido para sempre
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    e que podemos tecer outros vínculos.
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    Comecei a descoser o que tanto
    me venderam como "o que te calhou".
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    E procurei outros laços familiares.
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    Permiti-me ir conhecendo famílias
    e outras formas de educação.
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    Outros bastidores.
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    Fui encontrando lugares que me deram
    esses laços que tanto procurava,
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    que construí e tornei meus:
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    o colégio, amigas e amigos da minha mãe,
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    famílias de amigos meus, enfim.
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    Não respondi ao "e-mail" do meu pai.
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    De facto, até hoje, não voltei a vê-lo.
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    Mas esta é a minha experiência.
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    O que cada um vive
    ao longo da sua vida
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    vai formando a sua forma de ver o mundo.
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    Não temos de ficar parados
    sem fazer nada,
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    se estamos a passar um mau bocado.
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    Isto também pode abrir-nos a porta
    para perguntarmos coisas novas.
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    E para descoser discursos.
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    Muito obrigada.
Title:
Famílias descosidas | Julieta Grinblat | TEDxRíodelaPlataED
Description:

Caso estejam a viver ou tenham presenciado situações de violência na vossa família, liguem para a linha 137 (Argentina) ou para o número de apoio do vosso país.

Julieta tem 19 anos, saiu da escola secundária no ano passado e estuda Psicologia na Universidade de Buenos Aires. Interessa-se por aquilo que as pessoas pensam e sentem, gosta de estar envolvida, de ouvir e de ajudar. Durante a sua experiência nos Clubes TED-Ed, refletiu sobre os vínculos familiares que a rodeiam.

Esta palestra foi feita num evento TEDx usando o formato de palestras TED, mas organizado independentemente por uma comunidade local. Saiba mais em http://ted.com/tedx

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Video Language:
Spanish
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
06:21

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