David Biello: Agora, é minha honra e privilégio apresentar o Dr. Georges Benjamin, o dirigente executivo da Associação de Saúde Pública Americana, com uma longa e distinta carreira, tanto como médico, como profissional de saúde pública. Por favor, dêem as boas-vindas ao Dr. Georges Benjamin. Georges Benjamin: Olá, David, como está? DB: Estou bem, e o Dr. Benjamin? GB: Estou aqui. DB: Está a aguentar-se. Boa. GB: Vou-me aguentando. DB: Sabemos que o tema do momento é a reabertura, diria eu. Acabámos de ouvir essa possibilidade, mas claro, muitos países já reabriram, de uma forma ou doutra, e acredito que, a partir de hoje, todos os 50 estados nos EUA já reabriram, de uma forma ou doutra. Como fazemos isso de maneira inteligente, de maneira segura? GB: Sim, precisamos mesmo de reabrir com precaução e segurança, e isso significa que não podemos esquecer as medidas de saúde pública que foram responsáveis por achatarmos a curva. Falo de coisas como tapar o nariz e a boca quando tossimos ou espirramos, usar máscara, lavar as mãos, distanciarmo-nos dos outros fisicamente, tanto quanto possível. Pensarmos em tudo o que fazemos, antes de irmos trabalhar, de manhã, quando estamos no trabalho. E sermos cuidadosos como muitos de nós têm sido nos últimos dois meses, ao longo dos próximos três meses, porque esta coisa ainda não acabou. DB: Certo. Há a possibilidade de novas vagas, como o Uri Alon mencionou. Parece que é uma incumbência para todos aceitarmos que a saúde pública é uma espécie de segundo trabalho. Certo? GB: Sabe, tenho vindo a defender que, agora que toda a gente sabe o que é a saúde pública, toda a gente devia ver a saúde pública como a sua segunda profissão, quer esteja a recolher o lixo ou a trabalhar na mercearia, ou se for um motorista, ou se, como eu, estiver a trabalhar na saúde pública, um médico ou um enfermeiro, todos temos de usar a capa da saúde pública em tudo o que fazemos diariamente. DB: O que é que acha? Agora todos somos profissionais de saúde. Qual acha que será o novo normal que podemos esperar, assim que os países reabrirem? Como é que vai ser, ou como é que espera que seja, como profissional de saúde pública? GB: Se pudesse usar uma varinha mágica, afirmaria com toda a certeza que as pessoas vão fazer muito mais pela saúde pública, tais como lavar as mãos e pensar no que fazem para manter a segurança quando saem em público. Sabe, não foi há muito tempo que comprávamos um carro e não púnhamos o cinto. Hoje fazêmo-lo, e nem pensamos nisso. A maioria de nós não fuma, porque sabemos que é mau para a saúde. A maioria de nós olha para os dois lados antes de atravessar a rua. A maioria de nós faz arranjos em casa para evitar perigos. Por isso, à medida que avançamos, espero que as pessoas prestem muito mais atenção às coisas que podem fazer com que apanhemos infecções. Por isso, limpar as coisas, desinfectar as coisas. Sobretudo, não ir trabalhar se estivermos doentes. Espero que os empregadores cubram os custos das baixas médicas, para que todos possam ficar em casa. Sim, é um custo adicional, mas agora já descobrimos que o custo de não o fazermos são milhares e milhares de milhões de dólares. As baixas médicas remuneradas até saem baratas se considerarmos isso. DB: Sim, acho que aqui nos EUA estamos com inveja de todos os países que talvez tenham um sistema de saúde mais abrangente que o nosso. Concordaria que as máscaras são uma espécie de símbolo da adopção desta mentalidade de "saúde pública como segunda profissão?" GB: Bem, é engraçado. Os nossos colegas da Ásia já usavam máscara, usavam máscaras como forma de cultura há muitos, muitos anos. E nós sempre gozámos um pouco com isso. Quando eu ia ao estrangeiro, achava sempre ridículo quando via pessoas a usar máscaras. E claro, quando isto começou, promovemos o uso de máscaras apenas para os infectados e claro, para os trabalhadores de saúde, que achámos que estavam num contexto de risco. Mas acho que usar máscaras vai passar a fazer parte da nossa cultura. Já vimos que provavelmente não fará parte da nossa cultura de praia, apesar de neste momento dever ser. Mas acho mesmo que vamos ver cada vez mais pessoas a usar máscara numa série de cenários. E acho que faz sentido. DB: Sim, usamos máscara para mostrar que nos preocupamos com os outros. E que temos este espírito de saúde pública. Por falar na Ásia, quem é que se portou bem? Olhando para todo o mundo, já anda nisto há algum tempo e tem comunicado com os seus colegas, quem é que se portou bem e o que é que podemos aprender com esses bons exemplos? GB: De muitas formas, a Coreia do Sul é o exemplo a seguir. E já agora, na verdade, a China acabou por se sair bastante bem. Mas o segredo de todos esses países que têm uma taxa de mortalidade inferior à nossa, é que fizeram muitos testes muito cedo, fizeram rastreio de contacto e isolamento e quarentena, o que, já agora, é a base da prática da saúde pública. Fizeram-no cedo, fizeram-no intensamente, e, a propósito, apesar de estarem a reabrir a sociedade, e como começaram a ter alguns surtos esporádicos, regressam a estas práticas básicas de saúde pública: testes, isolamento, rastreio de contacto e transparência para o público sempre que podem, porque é importante que o público compreenda quantos casos há, onde está a doença, para ganharmos a cooperação do público. DB: Portanto, testes, rastreio de contacto e isolamento. Não me parece astrofísica, para usar uma imagem gasta. Porque é que tem sido difícil a sua implementação nalguns países? O que é que nos está a impedir? Serão os registos médicos electrónicos, será máquinas sofisticadas, ou talvez seja apenas ultra-confiança, baseada nos sucessos da saúde pública dos últimos 100 anos? GB: Nós somos uma sociedade de comprimidos. Achamos que há um comprimido para tudo. Se não houver um comprimido, podemos fazer uma cirurgia e resolver o problema. A prevenção funciona. E nós investimos muito pouco na prevenção. Nós investimos muito pouco num sistema de saúde pública robusto e forte. Se atentarmos no facto de que hoje, nos EUA, podemos saber facilmente o que é que sai da prateleira de uma mercearia, a Amazon sabe tudo o que há para saber sobre nós, mas o nosso médico não tem as mesmas ferramentas. Às três da manhã, ainda é muito difícil obter um electrocardiograma, ou o nosso histórico médico, ou a lista das nossas alergias se não pudermos dizer ao nosso médico o que é que temos. Simplesmente não investimos em sistemas robustos. Uma das coisas mais interessantes desta pandemia é que criou um contexto em que estamos dependentes da telemedicina, que já existe há anos, mas não nos interessava muito. Mas agora, provavelmente, será o novo normal. DB: Mas também parece... Obviamente, esses países com sistemas de saúde robustos, como Taiwan, saíram-se bem, mas parece que até países que podíamos considerar que não têm um sistema de saúde robusto, como o Gana, em África, também se saíram bem. Qual é que tem sido o ingrediente secreto para estes países? GB: Anda passou pouco tempo desde que alguns estão expostos e esperemos que não venham a ter uma onda tardia, o que ainda é uma possibilidade, mas, no fim de contas, acho que, desde que tenham implementado práticas de saúde pública sólidas, todos os países que se saíram bem implementaram-nas. Mas nós somos um país enorme, um país complexo. E sim, falhámos nos testes logo de início. Mas não devemos repetir os nossos erros dos últimos três meses, porque ainda temos muitos meses pela frente. Agora sabemos o que fizemos de errado, e o meu incentivo é fazermos a coisa certa da próxima vez. DB: Isso parece sensato. GB: E a próxima vez é amanhã. DB: Certo. Já começou. Quer dizer, parece-me, se puder usar a metáfora, que alguns destes países já tinham os anticorpos no sistema deles porque tinham experiência talvez com o Ébola e o primeiro SARS. Será esta exposição prévia, importante para este tipo de crises de saúde pública? GB: Bom, este é um vírus muito diferente. E embora possa haver alguns indícios que a MERS e a SARS 1 nos possam ter dado alguma protecção inicial, e há estudos iniciais a debruçarem-se sobre isso, essa não é a solução. Aqui, o ingrediente secreto são as sólidas práticas de saúde pública. Esse é o ingrediente secreto. Não devemos procurar outras coisas, um misticismo qualquer, ou alguém para nos vir salvar com um comprimido especial. Tudo isto resume-se a práticas de saúde pública sólidas porque, já agora, esta foi bastante má, mas não é a última. Temos de nos preparar para a próxima mesmo muito má. Nós achamos que esta foi má, imaginemos o que aconteceria se o Ébola se transmitisse pelo ar, ou a MERS se transmitisse pelo ar. Escolham um filme da TV. Embora esta tenha sido má, desta vez, ainda escapámos a uma mesmo, mesmo má. DB: Sim, a MERS não é brincadeira nenhuma, e devíamos estar gratos por não se espalhar mais facilmente, como a SARS-Covid. Mas isto é... Todas estas doenças são zoonóticas, ou seja, apareceram de animais que há por aí. Obviamente, a humanidade parece estar a intrometer-se na natureza de forma cada vez mais urgente, quer através da alteração climática, quer pelas florestas, o que seja. Este é o novo normal, ou seja, devemos esperar pandemias de vez em quando? GB: Bem, elas aparecem periodicamente. Esta não é a primeira pandemia, certo? Já tivemos muitas. Há 100 anos, a gripe pneumónica de 1918, a SARS foi uma infecção significativa, embora não tenha chegado a este ponto, a SARS 1. E tivemos a gripe das aves, que foi um desafio, e a gripe suína. Tivemos o Zika. Por isso não, temos tido muitos surtos de novas doenças. Estas doenças emergentes ocorrem com frequência, e de muitas formas, temos tido a sorte de ter conseguido identificá-las cedo e de as conter. Mas, agora, estamos num contexto em que as pessoas podem criar uma destas coisas. Esta não, pelo que sabemos, não foi criada por humanos. Provavelmente, não veio duma fuga dum laboratório. Mas sabemos que, quando eu andava na escola, para criar um vírus era preciso ser-se muito sofisticado. Hoje, isso não é o caso. E temos de nos proteger tanto das infecções que ocorrem naturalmente como daquelas criadas por seres humanos. DB: Para além disso, temos outros multiplicadores de ameaças, como a alteração climática, que fazem com que pandemias destas sejam ainda piores. GB: Eu disse que a alteração climática era a maior ameaça à sobrevivência antes desta pandemia. Mas isto está ao mesmo nível. Mas deixe-me dizer que o grande problema que temos hoje é que temos esta pandemia, que ainda não contivemos, enquanto estamos a entrar na estação dos furacões, e temos a alteração climática, que potencia a ferocidade dos furacões que temos tido. Por isso, vamos ter um verão interessante. DB: E aqui está o Chris com uma pergunta da nossa audiência. Chris Anderson: Muitas perguntas! As pessoas têm muito interesse no que estás a dizer, Georges. Vamos lá, aqui vai a primeira de Jim Young: "Como lidamos com as pessoas que não acreditam que isto é grave?" GB: Só temos de continuar a comunicar a verdade a todos. Uma das coisas acerca desta doença em particular é que não poupa ninguém. Não reconhece partidos políticos, não reconhece geografia, e tivemos muita gente, especialmente em comunidades rurais, que não estavam a entender, porque ainda não tinha lá chegado e não acreditavam que era real. Agora, muitas dessas comunidades estão a ser desfeitas por esta doença. Por isso, temos simplesmente de... É assim, não é apropriado dizer: "Eu bem avisei." É apropriado dizer: "Vejam, agora que estão a ver como é, "bem-vindos a bordo e ajudem-nos a resolver estes problemas." Mas isto é algo que vai estar por aí durante algum tempo. E se se tornar endémico, ou seja, se continuar a ocorrer mesmo a um nível menor, toda a gente vai ter esta experiência. CA: Obrigado. Aqui está uma pergunta de Robert Perkowitz. "Parece que temos ignorado e dedicado poucos fundos à saúde pública, "e estávamos mal preparados para este vírus." Vejam se a pergunta vai aparecer ali, acho que vai, por magia. "Quais deviam ser as prioridades agora "para nos prepararmos para a próxima crise de saúde pública?" GB: Bem, agora temos de nos certificar que temos os fundos, os recursos, a formação e a contratação sobre a mesa. E já agora, a nossa próxima crise de saúde pública não é daqui a 10 anos, não é daqui a 20 anos, é a potencial co-ocorrência da gripe, que sabemos que vai acontecer no próximo outono, porque vem todos os anos, com a continuação da COVID, ou com um pico da COVID. E vamos ter um processo de doença que aparenta ser mais ou menos o mesmo, e vamos ter de diferenciar a COVID da gripe. Nós já temos uma vacina para a gripe, mas ainda não temos para a COVID. Esperamos ter uma daqui a mais ou menos um ano. Mas isso ainda está para ser visto. DB: Tomem a injecção para a gripe. CA: Sim. Na verdade, o David Collins perguntou exactamente isso. "Qual é a probabilidade de uma vacina antes da próxima vaga?" GB: A vacina que desenvolvemos mais rapidamente foi para o sarampo, e levou quatro anos. Agora, há muitas coisas diferentes, não é? Começámos com uma vacina para a SARS 1. Fizemos muitos testes em animais, e alguns testes iniciais em humanos. Como sabem, acabámos de receber a notícia de que, pelo menos, parece funcionar em macacos, no macaco-rhesus, e há alguns indícios de que, talvez possa ser eficaz e segura num número de pessoas muito reduzido. Quando digo um número muito reduzido, é uma meia dúzia de pessoas. Por isso agora tem de passar para os testes da fase 2 e fase 3. O David levantou as duas mãos, Sim, sim, é um número de pessoas muito pequeno. O que nos diz é que ou essas pessoas tiveram muita sorte, ou funciona mesmo. E só vamos saber quando a pusermos nos braços de milhares de pessoas. CA: Aqui vai uma pergunta importante dum membro do TED. "Como ensinamos às pessoas o que significa a saúde pública? "Especialmente em contextos "de quem não acredita ser responsável perante 'o público'?" GB: Eu recordo às pessoas, que, quando a saúde pública faz o seu melhor trabalho, nada acontece. E claro, quando nada acontece, não lhe reconhecemos mérito. Por isso, a razão para todos neste país não terem de se levantar e ir ferver a própria água é por causa da saúde pública. A razão por que, se tivermos um acidente de carro, por exemplo, um choque de automóveis, e temos cintos de segurança, temos "airbags", e não morremos nesse choque de automóveis é por causa da saúde pública. A razão por que o ar é seguro para respirar, a comida é boa para comer, é devido à saúde pública. A razão por que as crianças não vestem roupa que se incendeie é porque temos roupa ignífuga. E isso é obrigatório. A razão para não tropeçarmos ao descer escadas é porque vimos como é que se constroem escadas de forma a que as pessoas não tropecem ao subir e descer. Essa é uma intervenção de saúde pública. Logo, o que nos rodeia, os medicamentos, essas coisas, vacinas, tudo é saúde pública, e é por isso que temos saúde pública, e talvez alguém não acredite que é importante, mas não podíamos viver sem ela. CA: Talvez um dia possamos todos, nos EUA, ambicionar um sistema de saúde com incentivos que conduzam à saúde pública. Seria mesmo bom. David, tenho de continuar com algumas destas perguntas, se possível, porque não param de chover. Aqui está uma da Jacqueline Ashby. Uma pergunta importante para todos os pais. "Quais são as recomendações para o regresso das crianças à escola?" GB: Sim, tenho tido dúvidas a esse respeito, tenho três netos. Felizmente, os meus netos são mais competentes nas tecnologias que eu, e agora estão a ter aulas à distância. Acho que vai ser um problema pensar em mandar as crianças para a escola. Temos de saber quão infecciosas é que as crianças são e se ficam bem quando são infectadas. Agora mesmo, parece que. excepto para um número muito pequeno de crianças que têm uma doença rara, elas toleram bastante bem esta doença. Mas a questão central é: quantos germes é que estas crianças vão trazer para casa para a avó e para o avô. Isso será importante. E tentar dizer a uma criança de oito anos para não interagir com os amigos é um enorme problema. Aliás, tentar dizer a um jovem de 17 anos para não interagir com os amigos vai ser um enorme problema. Logo, temos de educar devidamente estas crianças, temos de entender como equilibrar os horários delas. A ideia do Uri para os trabalhadores pode ser um conceito interessante para as escolas, porque a ideia é tentar reduzir o número de crianças na sala de aula. E se tivermos turmas mais pequenas, temos um ensino melhor, de qualquer forma. Mas então, temos de ter professores suficientes. Poderíamos então limitar os números. CA: Certo, última pergunta agora de Steven Petranek. Máscaras. Conselhos sobre máscaras. Bolas, desliguei isto, vamos lá. Os conselhos sobre máscaras parecem ter mudado. "Será que os americanos que vivem e trabalham em cidades "devem usar máscaras "para ajudar a reduzir as partículas de poluição no ar "que respiram todos os dias?" GB: Pode ajudar alguma coisa, com certeza. Mas devo dizer o que preferia que deixássemos de fazer: queimar combustíveis fósseis. E todas aquelas coisas terríveis que fazemos e que destroem o nosso clima. Toda a gente está a falar sobre o facto de que tivemos uma redução extraordinária do CO2 porque não temos andado de carro. Tenho de dizer que esta é a melhor prova de que somos nós os responsáveis pela alteração climática. Todos os cépticos das mudanças climáticas que acham que elas não se devem aos seres humanos, acabámos de ter uma demonstração mundial do que as pessoas fazem para criar as alterações climáticas. Por isso, o que temos de fazer é parar e mudar para uma economia verde. CA: Muito obrigado. Vou intervir no fim com talvez mais uma ou duas. Muito obrigado. DB: Então, estamos a fazer campanha pelas máscaras. Mas também, uma das coisas que se tornou clara a partir de tudo isto é que a COVID-19 não nos torna iguais, como muitos tiveram esperança. Algumas comunidades estão a sofrer consequências muito piores significativamente piores, que outras. A que é que se deve isso? GB: Estamos a falar sobretudo das comunidades afro-americanas e latinas que parecem ter sido afectadas desproporcionalmente, quando infectadas. Isso deve-se principalmente à exposição, Essas populações têm trabalhos com maior contacto cara a cara. Ou seja, os motoristas, os empregados de mercearia, os trabalhadores permanente de instalações de cuidados de saúde, nos lares de acolhimento, em matadouros, na avicultura. É por isso que estão mais expostos à doença. Muita susceptibilidade. Muitas doenças crónicas. Sabemos que os afro-americanos, em particular, têm uma quantidade desproporcionada de diabetes, de problemas cardíacos, de problemas pulmonares, e devido a estes problemas crónicos, descobrimos bastante cedo que o vírus é mais prejudicial às populações que têm estas doenças. Esse é o grande problema aqui. É isso que está a causar essas diferenças e é um verdadeiro problema porque, de muitas formas, essas são muitas das pessoas que considerámos que eram trabalhadores essenciais e que têm de ir trabalhar. DB: Exactamente. Qual é, na sua opinião, a intervenção de saúde pública que pode proteger esses trabalhadores essenciais, se é que tem alguma ideia nessa área? GB: Com certeza que tenho. Começámos com uma estratégia de testes baseada em sintomas. E agora que temos testes suficientes, temos de garantir que as pessoas não são testadas só por razões clínicas, não são só as pessoas que têm sintomas. Temos de dar prioridade às pessoas que trabalham cara a cara, aos trabalhadores essenciais. Por isso, as pessoas que trabalham em lares, hospitais, etc. e também os motoristas, os seguranças, os empregados de mercearia. Eles têm de ser testados, e têm de ser testados periodicamente para os manter em segurança, a eles e às suas famílias e dar confiança a toda a gente de que não vão ficar infectados e de que não os vamos infectar. Quem trabalha em matadouros, por exemplo. Já vimos a verdadeira tragédia do que se passa nos matadouros, porque é um contexto em que os trabalhadores estão ombro a ombro. Há mais coisas que é preciso fazer para percebermos como manter a distância social na linha de montagem, isso é importante. Mas novamente, a ideia do Uri não é má e o país deve considerá-la, assim como muitas destas indústrias. DB: Sim, temos de nos certificar de que estes trabalhadores são tratados como essenciais, e não como trabalhadores de retaguarda. E claro, isto não se resume aos EUA. GB: Oh, certamente. Vemos estas disparidades não só nos EUA, mas noutros países também. E têm muito a ver com a raça e a classe e o tipo de trabalho que se tem, as ocupações que se têm. E francamente, devíamos ter pensado nisso quando vimos as primeiras informações que mostraram isso na China, ou seja, que pessoas com doenças crónicas estavam em maior risco e tinham piores resultados na saúde. Devíamos ter sido muito mais rápidos na acção, porque, olhem o que aconteceu com cada doença nova que chegou ao país. DB: Parece que tudo isto vai ao encontro — não é um paradoxo — a saúde pública é o trabalho de todos, e temos de a adotar. Na sua perspectiva, como será uma infraestrutura de saúde pública robusta? Com que se parecerá? GB ; Bem, sempre que nos chega uma nova ameaça da saúde, temos de conseguir identificá-la rapidamente, contê-la, e, se pudermos, mitigá-la, e eliminá-la se possível, e impor todas as medidas de protecção que já tivemos antes. Isso implica ter funcionários suficientes, um órgão de saúde pública governamental competente, tal como temos para a polícia, para os bombeiros, para os correios. Implica que sejam bem pagos, implica que têm de ter os recursos necessários. Ainda temos despistadores de contactos que usam canetas e blocos e enviam coisas para uma folha de cálculo do Excel. Não, nós precisamos do mesmo tipo de tecnologia robusta que os trabalhadores de qualquer rede de retalho "online" usam, quer seja a Amazon, etc. Ainda andamos a ver informações com dois anos de atraso para tomar decisões que dependem delas. Precisamos de poder tomar decisões imediatas. A propósito, falando de Taiwan — referido há pouco — lembro-me de estar em Taiwan a assistir às informações a chegarem, em tempo real, sobre doenças infecciosas, num sistema de históricos médicos electrónico que eles têm. Nós podemos fazer o mesmo, a tecnologia existe. DB: Quem diria. Uau! Informações de saúde em tempo real, que diferença que isso faria. Acha que a tecnologia nos pode ajudar aqui, quer seja uma colaboração entre a Google e a Apple, o que seja? GB: A tecnologia pode ajudar-nos, mas não nos vai substituir. Não estamos nem perto do momento em que possamos relaxar e deixar o nosso avatar electrónico trabalhar por nós. Mas a tecnologia pode superar-nos. Pode-nos dar uma consciência da situação. Pode-nos dar informações em tempo real. Permite-nos enviar informações do ponto A para o ponto B para análise dos dados. Permite-nos pensar duas vezes. enquanto fazemos um modelo, os outros podem logo verificar os números. Portanto, pode acelerar a investigação. Mas temos de investir nisso, e temos de continuar, porque a parte má da tecnologia é ficar rapidamente obsoleta. DB: E parece que o Chris está de volta com mais perguntas. CA: Sim, parece que estamos próximos do fim, mas as perguntas continuam a chegar. Aqui está uma do Neelay Bhatt. "Que papel terão os parques, caminhos e espaços amplos "nos objectivos gerais da saúde pública?" GB: Bem, os espaços verdes são absolutamente essenciais, e podermos sair para andar e fazer exercício, ter passeios, para termos comunidades para peões, ciclovias, e parques para utilização de todas as idades. É bom para a nossa saúde mental, é bom para a nossa saúde física. E digo sempre a toda a gente que é um lugar magnífico para irmos quando alguém nos mói o juízo. CA: É mesmo. Temos aqui uma pergunta anónima. Quando possível, não fiquem anónimos, porque aqui somos todos amigos, no fim de contas. Provavelmente, é alguém... Enfim. Vamos ver, mas é uma boa pergunta. "Muitos estão desconfiados do que os peritos têm vindo a dizer. "Há alguma técnica eficaz para ajudar alguém muito desconfiado "a ser menos desconfiado e mais confiante?" GB: Dizer a verdade. Se fizerem um erro, reconheçam-no e corrijam-no logo. Sejam consistentes. Não digam coisas estúpidas. Isso acontece demasiadas vezes. Aliás, umas das coisas interessantes, já falámos disso na discussão das máscaras. A sabedoria tradicional dizia que as únicas pessoas que deviam usar máscara eram as que estavam infectadas ou que estavam num hospital onde haveria um alto risco de apanharem a doença. E depois dissemos que não, que era melhor todos usarem máscaras. Isso porque finalmente entendemos — e tornou-se muito mais credível — que, segundo a ciência, havia contágio assintomático. Mas não o comunicámos como deve ser. Dissémos: "Oh, não, não, mudámos de ideias, "todos podem usar máscaras", depois de dizermos para não as usarem. Depois não dedicámos tempo suficiente a explicar às pessoas porquê. Logo, perdemos a confiança. Precisamos de fazer melhor. E depois, os nossos líderes, quando têm um microfone à frente, têm de ter cuidado com o que dizem. Já agora, eu já cometi erros, Disse coisas na televisão que estavam erradas, porque eu estava errado. E esforcei-me muito para corrigir esses erros o mais rápido possível. Todos nós fazemos isso, mas temos de ser suficientemente fortes e ter uma personalidade forte para dizermos quando estamos errados e depois corrigi-lo. Porque, no fim de contas, assim que perdemos a confiança, perdemos tudo. CA: Bem, se me permite, a forma como está a comunicar connosco agora, para mim é uma forma de comunicação que gera confiança. Não sei que ingrediente secreto é que temos aqui, mas é muito motivador ouvi-lo falar. Muito obrigado por isso. David, tens mais algumas sugestões? GB: Cometi muitos erros. DB: Sim, não, mas foi mesmo um enorme prazer tê-lo connosco, agradecemos-te por isso. Apenas uma última pergunta, se puder. Já faz isto há algum tempo, o que é que lhe dá esperança para continuar? GB: Vou dizer uma coisa. Aquilo que me dá esperança é ver as pessoas cuidar dos seus amigos e familiares. Por exemplo, festas de aniversário em "drive-in". Vi isso hoje nas notícias. Pessoas que telefonam aos seus amigos. Fui contactado por pessoas com quem não falava há anos, que me ligaram só para dizer: "Não falamos há imenso tempo. Está tudo bem?" Por isso, continuem a fazer isso. E a confiança que temos tido uns nos outros, e o amor que temos mostrado, tem sido incrível. Isso dá-me esperança. DB: No fim, a humanidade vence. GB: Sim. DB: Bem, muito obrigado, Dr. Benjamin, por se juntar a nós e partilhar os seus conhecimentos. GB: Grato por estar aqui. CA: Obrigado. GB: Fiquem bem. E as vossas famílias também. DB: Obrigado e igualmente.