Vou começar com uma pequena história
Eu cresci neste bairro.
Quando tinha 15 anos, eu era
o que supunha ser um jovem atleta forte
e, em quatro meses, fui perdendo peso
até parecer uma vítima da fome
e com uma sede insaciável.
Tinha digerido o meu corpo.
Dei-me conta de tudo isso
durante uma caminhada,
a minha primeira caminhada,
na montanha Old Rag
na Virgína do Oeste.
Enfiava a cara nas poças de água
e bebia como um cão.
Naquela noite, fui levado
para a sala de urgências
e diagnosticaram-me diabetes tipo 1
em estado de cetoacidose.
Recuperei, graças aos milagres
da medicina moderna,
da insulina e de outras coisas,
recuperei o meu peso e ainda mais.
Depois de isso acontecer.
fiquei preocupado.
O que eu pensei foi:
"O que é que causou a diabetes?"
A diabetes é uma doença autoimune,
em que o corpo luta contra si mesmo.
Naquela época, as pessoas pensavam
que, provavelmente,
a exposição a um patogénico
tinha feito com que o meu sistema
imunológico lutasse contra o patogénico
e depois matasse as células
que produzem insulina.
Foi isso que eu pensei
durante muito tempo
e, de facto, é nisso que a medicina
e as pessoas se têm concentrado muito,
nos micróbios que fazem coisas ruins.
Agora preciso da minha assistente.
Pode ser que vocês a reconheçam.
Ontem fui — desculpem,
perdi algumas das palestras —
fui ao edifício da
Academia Nacional de Ciências.
Eles vendem brinquedos,
micróbios gigantes.
E olhem só!
Se apanharem este, vão apanhar
a doença que come a nossa carne.
Tenho que recuperar
o meu jeito para o basquetebol.
(Risos)
Lamentavelmente, ou nem tanto,
a maioria dos micróbios,
que eles vendem no edifício
da Academia Nacional, são patogénicos.
Toda a gente se concentra
nas coisas que nos matam,
e era nisso que eu estava a concentrar-me.
Acontece que nós estamos cobertos
por uma nuvem de micróbios,
e esses micróbios
habitualmente são-nos benéficos,
em vez de nos matarem.
E isso é uma coisa que
já sabemos há algum tempo.
As pessoas têm utilizado microscópios
para observar os micróbios que nos cobrem.
Eu sei que vocês não me estão a dar
atenção, mas...
(Risos)
Os micróbios que nos cobrem...
Se os observarmos ao microscópio,
podemos ver que temos dentro de nós
10 vezes mais células de micróbios
do que de células humanas.
Há mais massa nos micróbios
do que a massa do nosso cérebro.
Somos literalmente um ecossistema
abundante de microorganismos.
Infelizmente, se quisermos
conhecer melhor os microorganismos,
não basta observá-los ao microscópio.
Ouvimos falar há pouco
sobre a sequenciação do ADN.
Uma das melhores formas
de observar micróbios
e entendê-los é observar o seu ADN.
É o que eu tenho estado a fazer há 20 anos,
utilizando a sequenciação do ADN,
recolhendo amostras em vários lugares,
incluindo o corpo humano,
lendo a sequência do ADN,
e utilizando a sequenciação do ADN
para conhecer os micróbios
que se encontram num determinado lugar.
O que é incrível, quando
utilizamos esta tecnología,
— por exemplo, observando pessoas —
é que não estamos apenas cobertos
por um mar de micróbios.
Existem em nós milhares e milhares
de micróbios de diferentes tipos.
Temos milhões de genes de micróbios
no nosso microbioma humano,
que nos cobrem.
Essa diversidade microbiana
varia de pessoa para pessoa.
O que as pessoas têm pensado
nos últimos 10 ou 15 anos,
é que talvez esta nuvem microbiana
dentro e sobre nós,
e as variações entre nós,
possam ser responsáveis
por algumas das diferenças
de saúde e doença entre nós.
Isso faz-nos regressar à história
da diabetes que eu estava a contar.
Acontece que as pessoas agora pensam
que uma das causas para diabetes tipo 1
não é a luta contra um patogénico,
mas é tentar comunicar
incorretamente com os micróbios
que vivem dentro e sobre nós.
De algum modo,
talvez a comunidade microbiana
que está dentro e sobre mim
se desequilibrou,
e isso precipitou
uma resposta imunológica qualquer
que fez com que eu matasse as células
que produzem a insulina no meu corpo.
O que eu quero dizer
durante alguns minutos
é o que as pessoas têm aprendido
ao utilizarem
as técnicas de sequenciação do ADN,
em particular,
para estudarem a nuvem microbiana
que vive dentro e sobre nós.
Quero contar-vos uma história
sobre um projeto pessoal.
A minha primeira experiência pessoal
com o estudo dos micróbios no corpo humano
veio de uma palestra que eu fiz,
mesmo aqui ao pé, em Georgetown.
Fiz uma palestra, e um amigo
da família que, por acaso,
era o diretor da Escola de Medicina
de Georgetown, assistiu à palestra,
e depois veio falar comigo para me dizer
que eles estavam a fazer um estudo
sobre transplante de íleo em pessoas.
Queriam observar os micróbios
depois dos transplantes.
Então eu comecei
uma colaboração com essa pessoa,
com Michael Zasloff e Thomas Fishbein,
para observar os micróbios
que colonizaram esses íleos
depois de terem sido
transplantados para um recipiente.
Podia contar todos os pormenores
sobre o estudo microbiano que ali fizemos,
mas quero contar-vos esta história
por causa de uma coisa realmente chocante
que eles faziam no início desse projeto.
Agarram no íleo do doador,
que está repleto de micróbios do doador,
têm uma pessoa recetora
que pode ter um problema
com a comunidade microbiana,
digamos a doença de Crohn,
esterilizam o íleo do doador,
eliminam todos os micróbios,
e depois colocam-no na pessoa recetora.
Faziam isso porque era essa
a prática corrente em medicina,
apesar de ser óbvio
que não era uma boa ideia.
Felizmente, no decorrer deste projeto,
os cirurgiões de transplante
e as outras pessoas
decidiram esquecer a prática corrente.
"Temos que mudar!"
Mudaram mesmo e deixam parte
da comunidade microbiana no íleo.
Deixam os micróbios com o doador,
e teoricamente isso poderia
ajudar as pessoas
que recebem esse transplante do íleo.
Este é um estudo que fiz agora.
Nos últimos anos tem havido
uma grande expansão
na utilização da tecnologia do ADN
para estudar os micróbios
dentro e sobre as pessoas.
Há uma coisa chamada
o Projeto do Microbioma Humano
que está a decorrer nos
Estados Unidos da América,
o MetaHIT que decorre na Europa,
e muitos outros projetos.
Depois de as pessoas fazerem
uma série de estudos,
aprenderam coisas como,
quando um bebé nasce,
num parto natural,
é colonizado pelos micróbios da mãe.
Há fatores de risco associados
com uma cesariana.
Alguns desses fatores de risco podem
ser devidos a uma colonização deficiente
quando se extrai um bebé da mãe
em vez de ele sair
pelo canal de nascimento.
Outra série de estudos tem demonstrado
que a comunidade microbiana
que vive dentro e sobre nós
ajuda no desenvolvimento
do sistema imunológico,
ajuda a lutar contra bactérias patógenicas,
ajuda o nosso metabolismo,
e ajuda a determinar
a nossa taxa metabólica,
provavelmente determina o nosso cheiro,
e pode até formar o nosso comportamento
de diversas formas.
Estes estudos têm documentado ou sugerido
diversas funções importantes
para a comunidade microbiana,
essa nuvem de não-patogénicos
que vive dentro e sobre nós.
Uma área que eu penso
ser muito interessante,
que muito de vocês devem ter,
agora que atirámos micróbios na plateia,
é uma coisa a que eu poderia
chamar de ˝germofobia.˝
As pessoas gostam mesmo
de limpeza, não é?
Temos antibióticos
na bancada da cozinha.
As pessoas passam a vida
a lavar todas as partes do corpo.
Colocamos antibióticos na comida,
nas nossas comunidades.
Tomamos demasiados antibióticos.
Ora bem, matar as bactérias patogénicas
é bom se estivermos doentes
mas devemos perceber que,
quando enchemos o mundo
de químicos e de antibióticos,
também estamos a matar
a nuvem de micróbios
que vive dentro e sobre nós.
Está demonstrado que o uso excessivo
de antibióticos, em especial nas crianças,
está associado, mais uma vez,
a fatores de risco
para a obesidade, para doenças autoimunes,
para uma série de problemas
que provavelmente são devidos
a perturbações da comunidade microbiana.
A comunidade microbiana pode enganar-se,
quer queiramos, quer não,
ou podemos ser nós
a matá-la com antibióticos.
O que é que podemos fazer
para a restaurar?
Tenho a certeza que muitas pessoas aqui
têm ouvido falar de probióticos.
Os probióticos são uma coisa
que podemos experimentar
para repor a comunidade microbiana
que vive dentro e sobre nós.
Têm demonstrado ser eficazes
nalguns casos.
Há um projeto em marcha
na Universidade Davis, da Califórnia,
em que as pessoas estão a usar probióticos
para tentar tratar ou prevenir enterocolite
necrosante em bebés prematuros.
Os bebés prematuros podem ter problemas
com a sua comunidade microbiana.
E talvez os probióticos
possam ajudar a prevenir
o desenvolvimento desta
terrível enterocolite necrosante
nos bebés prematuros.
Mas os probióticos são
um tipo de solução muito simples.
A maioria das pílulas que tomamos
ou os iogurtes que comemos
contêm uma ou duas espécies,
talvez mesmo cinco espécies,
e a comunidade humana
tem milhares e milhares de espécies.
Então o que podemos fazer para restaurar
a nossa comunidade microbiana
quando temos milhares
e milhares de espécies em nós?
Uma coisa que os animais parecem fazer
é que eles comem cocó — coprofagia.
Há muitos veterinários,
veterinários da velha escola,
em particular,
que têm feito uma coisa
chamada ˝chá de cocó˝
não é fezes, é chá de cocó,
para tratar cólicas e outros males
em cavalos, vacas e animais desse tipo.
Faz-se um chá com
o cocó de um animal saudável
e dá-se a beber ao animal doente.
Embora, a menos que tenhamos uma vaca
com uma fístula,
com um grande buraco no flanco,
e possamos meter a mão na pança dela,
é difícil imaginar que colocar micróbios
diretamente na boca e através da
parte superior do tubo digestivo
seja o melhor sistema de tratamento.
Podem ter ouvido falar de pessoas
que estão a fazer transplantes fecais,
em que, em vez de administrar
micróbios probióticos de forma oral,
administram uma comunidade de probióticos,
uma comunidade de micróbios
de um doador saudável,
pelo outro lado.
Isto tem demonstrado ser muito eficaz
na luta contra certas
doenças infecciosas intransigentes
como as infeções Clostridium difficile,
que podem permanecer nas pessoas
durante anos e anos.
Os transplantes das fezes,
dos micróbios das fezes,
de um doador saudável
têm, de facto, demonstrado curar
diversas infeções sistémicas C
nalgumas pessoas.
O que estes transplantes,
estes transplantes fecais,
ou o chá de cocó, me sugerem,
e muitas outras pessoas
têm tido a mesma ideia,
é que a comunidade microbiana
dentro e sobre nós, é um órgão.
Devíamos vê-la como um órgão funcional,
que faz parte de nós.
Devíamos tratá-la com cuidado e respeito.
Não queremos interferir com ela,
como acontece nas cesarianas
ou com os antibióticos,
ou com a limpeza excessiva,
sem uma boa justificação.
O que as tecnologias
de sequenciação do ADN
estão a permitir
que as pessoas façam agora
é um estudo detalhado de 100 pacientes
que têm a doença de Crohn
e 100 pessoas que não têm
a doença de Crohn.
Ou 100 pessoas que tomaram antibióticos
quando eram pequenas,
e 100 pessoas que não tomaram antibióticos.
Podemos agora começar a comparar
a comunidade de micróbios
e os seus genes e ver se há diferenças.
Com o tempo, poderemos perceber
se não são diferenças
correlativas, mas causais.
Estudos em sistemas modelos
como ratos e outros animais
também estão a ajudar nisso,
mas as pessoas estão agora
a usar estas tecnologías porque elas
se tornaram muito baratas,
para estudar os micróbios
dentro e sobre uma série de pessoas.
Em resumo, o que
eu quero dizer é o seguinte:
Não vos contei uma parte da história
de ter adoecido com diabetes.
Acontece que o meu pai era médico,
estudava hormonas.
Disse-lhes muitas vezes
que estava cansado,
que tinha muita sede,
que não me sentia muito bem.
Ele não me deu muita atenção,
acho que ele pensou
que eu me queixava muito,
ou então estava a ser o médico típico:
˝Nada pode estar errado
com os meus filhos.˝
Até fomos à reunião da
Sociedade Internacional de Endocrinologia,
e reunimos a família no Quebec.
(Risos)
Tinha que me levantar de 5 em 5 minutos
para ir fazer chichi
(Risos)
e à mesa, bebía a água de toda a gente.
Acho que eles pensavam
que eu andava metido na droga.
(Risos)
Mas a razão por que estou a contar isto
é que a comunidade médica
— o meu pai por exemplo —
às vezes não vê o que está
em frente dos olhos.
A nuvem microbiana
está bem na nossa frente.
Não podemos vê-la
na maior parte do tempo. É invisível.
São micróbios. São mínimos.
Mas podemos vê-los através do seu ADN.
Podemos vê-los através dos efeitos
que eles causam nas pessoas.
Do que precisamos agora
é começar a pensar
nesta comunidade microbiana
no contexto de tudo na medicina humana.
Não significa que afeta
todas as nossas partes,
mas poderia.
Do que precisamos é de
um guía completo dos micróbios
que vivem dentro e sobre as pessoas,
de forma que possamos entender
o que eles fazem na nossa vida.
Nós somos eles. Eles são nós.
Obrigado.
(Aplausos)