Jes Fan: Logo que os vemos
eles ficarão gravados no nosso espírito
Especialmente se pensarmos neles
como uma das primeiras
poucas representações
de um chinês como sujeito.
[Biblioteca Médica
da Universidade de Yale]
Há um missionário médico
chamado Peter Parker
que viajou até Cantão para realizar
a remoção cirúrgica de tumores
no início do século XIX.
Lam Qua era um pintor
muito famoso na época.
Era famoso por pintar retratos.
Mas suponho que Lam Qua
também era conhecido
pela forma rigorosa
com que pintava os seus modelos.
É conhecido por ter dito:
"O que os olhos não veem,
não se pode fazer".
Há qualquer coisa de chinesice aqui.
Pensem nisto: como é que
chinesice passou a ser uma palavra?
Quais são as tecnologias envolvidas
na criação desta ideia de "o outro"?
Porque é que o ombro
tem de estar destapado?
A forma como a trança está colocada.
É muito sedutor e eu pensei
se este tipo de sedução
tem de aparecer de forma
a que consigamos ver o modelo
como uma pessoa igual a nós.
[Jess Fan: Beleza Infecciosa]
Acho que isso fez com que eu
me esforçasse por perceber
a ideia de beleza e sedução.
Penso que o meu trabalho
tem muito a ver com sedução.
Atualmente, a beleza é muito chata.
Só há podemos mostrar
uma emoção nas redes sociais,
é o coraçãozinho, não é?
(Risos)
Só há um formato de coração.
Quando uma coisa é bela,
é só um simples coração.
Mas depois, quando pensamos
na beleza no passado,
é a beleza e o sublime.
Tem de chegar com esta suspensão
— este receio.
Também significa, no passado,
descrever uma coisa que era tão bela
que quase nos faz querer vomitar.
Eu cresci em Hong Kong.
É muito opressivo ser gay ali.
Não podermos ver-nos
refletidos na sociedade
nem sequer...
podermos ver gays adultos e felizes
ou gays adultos em geral.
É como não conseguir ver
um futuro para nós mesmos.
Tive anos muito difíceis enquanto crescia
a tentar descobrir quem podia ser.
Julie Wolf: Pelo que entendi da peça
é que é feita de vidro
com um certo formato.
Depois, junta-se a melanina à peça
e depois enche-se com silicone,
está certo?
JF: Está.
JW: O que queremos fazer é melanina.
Vamos fazer a forma física final.
Chama-se L-DOPA.
Neste caso L-DOPA
é uma molécula muito instável.
Se a expusermos à luz
ou à temperatura ambiente,
começa a fazer uma coisa
chamada autopolimerização.
Vai começar a fazer um polímero
que é uma subunidade repetida
que se vai ligar com a melanina.
O que vamos fazer é criar as condições
tão instáveis quanto possível
para a L-DOPA
para podermos contornar
o processo biológico
e chegar diretamente à melanina.
Não está muito escura
mas podemos ver que tem flocos lá dentro.
JF: É estranho estão quentes.
JW: Estão.
JF: Seria ótimo se fosse...
qualquer coisa que pudéssemos
identificar ou acionar
e esperar que sejam..
Porque as placas que me deste com E.coli
são parecidas com mofo.
Esperemos que estas cresçam alegremente
e fiquem mais viscosas.
Muito do que estou a tentar fazer
com o que consideramos
materiais sexualizados
ou materiais racializados,
é realmente muito absurdos
É como um programa de culinária.
Tenho sémen, sangue,
melanina e chichi.
(Risos)
Numa altura em que eu pensava
muito em como a raça,
especialmente nos EUA,
é olhada como infecciosa.
Pensem na China e no coronavírus.
Pensem na SARS, estando em Hong Kong.
Pensem na era de Jim Crow
e a não partilha de água.
Essa ideia de estar infetado.
Hoje em dia, na Ásia, a beleza é suave,
não tem arestas, não causa repulsa.
Há qualquer coisa sobre...
fazer isto é subverter esse equilíbrio,
mostra o trabalho que dá
conseguir essa suavidade.
Assim, ela parece-se
com estes círculos infecciosos.
Mas depois, os materiais
que estão nessas formas bulbosas
são sémen em decadência.
Acho isto muito divertido.
Tem muito a ver com formas
que se encaixam umas nas outras
e de certa forma evoca
uma sensação dessa estranheza
mas, simultaneamente tão erótica
que não conseguimos parar.
Mas para ser atraído para isso,
esse erotismo seduz-nos.
É beleza no brilho
e a possibilidade de ver
o nosso reflexo nele.
Ao mesmo tempo,
estamos a olhar para uma coisa
que nos causa repulsa
que é considerada infecciosa ou suja.
O meu terapeuta diz que eu estou
tão familiarizado com a opressão
que o perigo, o risco e a opressão
fazem com que me sinta em casa.
Por isso, escravizo-me no estúdio.
Ou melhor, privo-me do prazer
porque aqui não sou oprimido
enqanto "gay".
Por isso, agora oprimo-me a mim mesmo.
Porque não posso voltar atrás,
se fracassar.
Tradução de Margarida Ferreira.