Bom dia. Eu chamo-me Pedro Medeiros e sou um agricultor urbano. Toda a gente, ao nascer, deveria ter direito a dois litros de água e a 1500 calorias de comidas saudáveis, por dia. Este é um direito que devia vir em todas as certidões de nascimento do ser humano. A população humana está a crescer rapidamente para os nove mil milhões. Em 2050, 70% da população vai viver nas cidades. Iremos necessitar do dobro dos alimentos. Portanto, faz todo o sentido cultivar no local onde vivemos. Apesar de as taxas de obesidade serem enormes nos países desenvolvidos, há 900 milhões de pessoas com fome. Só na Europa, há 30 milhões de pessoas subnutridas. Como agricultor, tenho de fazer esta pergunta aos meus colegas agricultores: Quanto dinheiro é que estão a ganhar com a agricultura? É que estão a usar os fertilizantes fósseis, feitos de petróleo e toda a gente sabe o que vai acontecer ao petróleo. Usam também pesticidas, herbicidas, fungicidas. Gastam 70% da água do mundo. Usam imensa energia para transportar e para refrigerar os alimentos. Sabiam que um alimento viaja, em média, 2000 km até chegar às nossas mesas? Como é que isto pode ser eficiente? E eficiente para quem? Só se for para as empresas de transportes, porque não é eficiente para o agricultor, não é eficiente para o consumidor e, muito menos, para o ambiente. A comida que chega a nós viaja de muito longe e a comida a viajar é como uma criança de dois anos. fica logo enjoada. A comida é colhida, é refrigerada, é embalada, é vendida, é revendida muitas vezes, e, quando chega às nossas mesas, já perdeu a maioria dos nutrientes, da textura e dos cheiros. A agricultura responsável deveria seguir quatro passos, ou quatro princípios essenciais. Não usar terras novas para cultivar. Aproveitar os terraços, os pátios das cidades, aproveitar o calor gerado pelos próprios edifícios aproveitar a energia solar. É nas cidades onde existe maior dióxido de carbono, exatamente o que as plantas necessitam. Usar a água de forma responsável, através de sistemas recirculados que aproveitem a água da chuva e que nos fazem poupar imenso dinheiro. Não usar pesticidas nem herbicidas, bastando apenas usar controlo biológico com insetos benéficos. Mas, acima de tudo, cultivar boa comida. Isso é essencial. Cultivar a comida pelos nutrientes, pelos sabores que têm. Nós, numa cidade, conseguimos cultivar de tudo gastando metade da energia e 90% menos de água. Imaginem cidades que alimentam os seus habitantes. Imaginem conhecer o vosso agricultor e conhecer a vossa comida. A agricultura urbana não é novidade. Sempre existiu. Principalmente em alturas de crises económicas e de guerras, sempre foi apoiada pelos governos. Vou referir os "zoo gardens" que fizeram parte do esforço da II Guerra Mundial. Nas cidades inglesas e americanas, durante a guerra, foram cultivados 270 mil toneladas de alimentos que deram para suprir 60% das necessidades alimentares dessa altura. Mas o melhor exemplo vem de Cuba. Em 1989, acabou o bloco soviético. Cuba, nos 30 anos anteriores, produzia de forma massiva. Era o país que gastava mais combustíveis fósseis e mais máquinas por hectare, no mundo. Depois, ficaram sem petróleo e não mais conseguiram cultivar. A ingestão de calorias caiu para metade e 11 milhões de cubanos começaram a passar fome. Então, o governo autorizou a ocupação de todos os espaços públicos e privados para cultivar. Hoje em dia, cultivar tornou-se uma paixão em Havana. Só na cidade, existem mais de 10 000 hortas urbanas. Cuba consegue alimentar a sua população gastando 5% da energia de qualquer país desenvolvido. Em 10 anos acabaram com a subnutrição e 22% do emprego gerado foi para a agricultura urbana. Há formas de cultivar muito interessantes, especialmente os hidrocultivos. As plantas têm comida sempre disponível e não necessitam de gastar grandes raízes, canalizando essa energia para crescer até quatro vezes mais depressa. Já existe a hidroponia. A maioria das saladas que temos nos supermercados já vêm todas da hidroponia. Mas o sistema mais eficiente e o que eu mais gosto é a chamada aquaponia. No fundo, funciona como um ecossistema da Natureza. Temos de retirar da água dos peixes, separar os resíduos, e aproveitar esses nutrientes que são conduzidos às plantas. As plantas, por sua vez, comem os nutrientes e a água regressa limpa para os peixes. Tudo isto num circuito recirculado de água muito eficiente. Um dos métodos mais usados são as chamadas "camas de cultivo". Então, como qualquer material inerte, podemos cultivar qualquer tipo de planta. Onde podemos usar a aquaponia? A aquaponia pode ser usada em todo o lado. Em nossas casas, alimentar a nossa família Podemos usar nas escolas, ensinar as crianças a cultivar. Uma criança que plante uma alface, come essa alface. Pode também ser usada em projetos sociais. Trabalhar a resiliência. Ensinar a enfrentar os problemas e saber lidar com eles. Mas, acima de tudo, é para ser usada nas cidades. Já existem projetos incríveis em que integram a agricultura nos edifícios mas, sendo realistas, que tipo de edifícios é que temos nas cidades? Quer seja por um período de cinco anos ou por um período de um ano, podemos aproveitar qualquer espaço para cultivar e para incentivar os outros a cultivar. Vou agora falar de um dos nossos sistemas de produção a que nós chamamos "no waste" ou "desperdício zero". Tudo começa nas borras de café. Cada português consome em média 2,9 kg de café por ano. Apenas 2% desse café é ingerido, o restante vai para o lixo. São 65 000 toneladas que vão para os aterros contribuindo para aumentar os gases com efeitos de estufa. Se juntarmos às borras de café 25% de cartão, obtemos cogumelos deliciosos. Os cogumelos Pleurotus são uma boa fonte de proteínas, têm baixo teor de gordura, reduzem o colesterol e têm propriedades antioxidantes. Depois de produzir três a quatro vezes, o substrato dos cogumelos vai para a vermicompostagem onde as nossas minhocas o transformam em húmus. O húmus de minhoca é um dos fertilizantes mais poderosos conhecidos pelo Homem. A seguir, damos as minhocas aos nossos peixes. O peixe é o animal mais eficiente que existe para criar para consumir. Por cada 1,2 kg de ração, conseguimos produzir 1 kg de peixe. Para produzir 1 kg de carne bovina, por exemplo, necessitamos de gastar 7 kg de ração e 15 000 litros de água. Uma das espécies que eu mais gosto chama-se a tilápia, pois é omnívora, e, portanto, podem ser alimentadas de tudo, de minhocas, de cogumelos, de algas. Além disso, não têm espinhas, são muito resistentes e também são muito saborosas. Pegamos nessa água dos peixes e cultivamos toda uma série de legumes: espinafres, saladas, agriões, tomates, tudo é possível. O que sobra dessas plantas e as raízes é dado às nossas galinhas. O que sobra dessas galinhas, nomeadamente o estrume das galinhas, é usado nuns tanques de água onde criamos lentilhas e algas que também servem para voltar a alimentar os peixes. Tudo isto num sistema recircular com a água da chuva. Ou seja, pegamos num edifício abandonado, ou sem utilidade no momento, mais água da chuva, mais borras de café, e conseguimos obter cogumelos deliciosos, minhocas e húmus para cultivar peixe fresco e delicioso galinhas e ovos e toda uma série de vegetais. Toda a gente pode cultivar em qualquer local mesmo com pouco espaço. Portanto, ninguém tem desculpa para não cultivar. Podemos utilizar as chamadas "window farms" que é um projeto muito interessante em que apenas com uma bomba de ar conseguimos alimentar todo um sistema que produz mais do que uma alface por semana. Temos os sistemas verticais feitos com materiais recicláveis Poupamos imensa água e temos grandes taxas de produção. Podemos cultivar cogumelos em qualquer local, numa garagem, debaixo dumas escadas em todo o lado é possível cultivar cogumelos Temos os sistemas aquapónicos que são escaláveis em tamanho, desde o mais pequeno ao sistema médio, ao sistema grande, tudo pode ser feito. Estas imagens que veem são feitas por nós com materiais que se arranjam facilmente. Temos os sistemas vermifertilizados. um dos meus favoritos, Digam lá se não é fantástico. São as minhocas que andam na terra e deixam ficar os nutrientes para as plantas. Temos apenas que alimentar o tubo do meio com resíduos orgânicos para elas irem lá comer e voltarem à terra. Além disso, usamos sempre a mesma água, o que é muito importante. Cultivar é uma forma de poder. O poder de controlar aquilo que comemos. O poder sobre a nossa saúde e sobre a nossa alimentação. Agarrem esse poder na vossa mão. Cultivem qualquer coisa. Obrigado. (Aplausos)