É quase impossível de imaginar o jogo
Ape Out sem um macaco.
No entanto, foi exatamente assim que
o projeto começou.
De acordo com o designer Gabe Cuzzillo,
esse deveria ser um jogo de espionagem com
loopings temporais onde você usaria
mecânicas de agarrar e empurrar para
arrastar-se pelas paredes. Mas se fossem
haver guardas no jogo, então naturalmente
você deveria ser capaz de usar essas mecâ-
nicas neles, trazendo uma jogabilidade
onde você mantem guardas reféns e os
joga contra paredes.
Esta acabou sendo a parte mais interessan-
te do jogo: então Gabe decidiu mudar de
direção completamente e construir o jogo
ao redor deste conceito central.
Ele removeu tudo que não precisava estar
lá, como a espionagem e os loopings.
E fez o que pôde para enfatizar esta ideia
- mais notavelmente, trocando o
cara careca por um violento
gorila de 135 kg.
Este é um exemplo de uma metodologia de
criação de jogos chamada "Follow the Fun".
É a simples ideia em que criadores deve-
riam ignorar seus planos e ideias
preconcebidas - e então olhar ao jogo em
si para achar onde o desenvolvimento
deveria focar-se. Vejam a pérola de
táticas microscópicas, Into the Breach.
Este jogo começou como um jogo bem padrão
no estilo Advance Wars, onde inimigos
escolhem ataques aleatoriamente e escondem
suas intenções até chegarem suas vezes.
Mas um inimigo no jogo lhe mostraria
exatamente o que faria na próxima vez,
destacando a casa que eles atacariam.
Os desenvolvedores na Subset perceberam
que esta era a parte mais agradável, então
decidiram focar o resto do jogo quase
exclusivamente nestes ataques previstos.
E isto acabou ajudando a ditar o resto das
decisões de criação que o estúdio deveria
fazer.
Pois, se você sabe o que os inimigos vão
fazer, você não poderia só mover suas
próprias unidades para fora da
zona de ataque?
Ok, talvez o jogo seja sobre proteger
construções estáticas.
E agora é sobre empurrar os inimigos por
aí para fazê-los errar seus ataques.
Mas, você poderia usar isto para enganar
seus inimigos a matarem uns aos outros.
Provavelmente você pode ver por que os
desenvolvedores que usam este método dizem
que seus jogos, até certa parte, criaram a
si mesmos.
Aqui está Sam Coster da desenvolvedora de
Crashlands, Butterscotch Shenanigans.
SAM COSTER: "Nós gostamos de pensar neste
processo como o jogo descobrindo a si mes-
mo ao longo do tempo. Pois como criadores
e não designers, é nosso trabalho jogar o
jogo, escutá-lo, senti-lo, e meio que sen-
tir o que ele parece querer se tornar e só
seguir as trilhas da diversão."
Agora, a ideia de um jogo criando a si
mesmo é bem empolgante para aqueles
buscando fazer o próximo hit.
Mas, não é como se ideias de jogos
incríveis brotam do nada.
Então, de onde elas vem?
Bem, vamos ver às origens do jogo de ritmo
no estilo rogue, Crypt of the Necrodancer.
O designer Ryan Clark queria ver se ele
conseguia colocar a tomada de decisões
rápidas de Spelunky em um jogo dungeon-
-crawler mais tradicional.
Então ele fez um protótipo rápido de um
rogue onde você tem um segundo para
fazer seu próximo turno.
Quando ele jogou, Ryan percebeu que ele
quase tinha uma qualidade rítmica - e se
tornou óbvio que o jogo devia se basear em
músicas.
Ou talvez devêssemos dar uma olhada no
icônico movimento aéreo de Rocket League.
Quando Psyonix trabalhava no antecessor do
jogo, Supersonic Acrobatic Rocket-Powered
Battle-Cars - eles aprenderam muito
sobre marketing desde
então. Hã, eles tinham feito um jogo sobre
carros batalhando, mas queriam adicionar
uma mecânica de jatos. Então eles sim-
plesmente aplicaram uma força de física na
traseira dos carros. Nos testes, descobri-
ram que jogadores poderiam usar essa força
para voar em arenas.
Esse não era o plano, mas os desenvolvedo-
res perceberam que isso adicionava enorme
profundidade e uma dimensão extra inteira
no jogo - então eles a mantiveram.
O estúdio diz que "desenvolvemos esta
mecânica quase que por acidente".
Na verdade, existe um histórico inteiro de
jogos onde bugs, erros e acidentes no de-
senvolvimento que viraram aspectos
do jogo.
Por exemplo, Hideki Kamiya achou um bug em
Onimusha: Warlords que lhe permitia fazer
malabarismo com inimigos atacando-os.
Foi consertado em Onimusha, mas Kamiya o
aprimorou, e o tornou na mecânica
principal de Devil May Cry.
O ponto é, esse processo envolve pegar uma
ideia inicial qualquer - vaga, confusa,
ou repetida - e fazer um protótipo
funcional.
E é aqui - durante a codificação e dos
testes - que novas ideias brotam.
E então cabe ao designer ser aberto e
atencioso ao que o jogo está dizendo.
Para perceber o que é interessante, e ser
capaz de explorar esses aspectos... mesmo
que eles não se alinhem totalmente com o
que você tinha em mente.
Foi assim que Gunpoint foi de ser sobre um
robô no espaço que derruba geladeiras nas
pessoas, para um jogo de enigmas sobre um
espião que muda fios elétricos de prédios.
Essa ideia de mudar fios era apenas uma
possível ideia para um mini-game de
hackear inspirado em Deus Ex.
Mas assim que o designer Tom Francis come-
çou o protótipo, o jogo que eventualmente
se tornaria Gunpoint começou a emergir.
Aqui diz Tom:
TOM FRANCIS: "Imediatamente ficou óbvio
que isto deveria virar um jogo de quebra-
-cabeça. Essa era uma mecâ-
nica. E então Gunpoint meio que me disse
o que queria ser. Apenas um jogo de
quebra-cabeça.
E eu só fui na onda, eu apenas loucamente
expandi a mecânica de hackear.
Construí o jogo inteiro ao redor dela."
Então esse processo geralmente causa as
mudanças mais significantes pelo começo do
desenvolvimento do jogo - que é o ponto
que Sam Coster descreve o jogo como uma
bola branca quente de magma maleável.
Mas ainda pode ser usado ao longo do
desenvolvimento, e o jogo começa a tomar
forma e virar pedra.
Como, para geração de conteúdo: Jonathan
Blow disse que os enigmas em Braid eram
simplesmente uma apresentação de conse-
quências do seu motor de viagem temporal.
Blow diz "Eu tinha um papel de tutor, lim-
pando as respostas e apresentando-as de um
jeito elas poderiam ser apreciadas pelos
jogadores do jogo."
Mais sobre isso neste vídeo.
Ou, ele pode ser usado para ouvir as
opiniões dos jogadores.
Quando Chris Hecker fez SpyParty, jogado-
res acharam todo tipo de aproveitamento e
jeitos impensados de jogar.
Ao invés de consertar esses "bugs", Chris
entrou de cabeça e os fez partes oficiais
do jogo - fazendo a experiência ser mais
sobre jogos-mentais
e truques psicológicos. E pode simplesmen-
te ser usado para guiar o desenvolvimento
geral de um jogo. Aqui está o designer de
Subnautica, Charlie Cleveland:
CHARLIE CLEVELAND: "Você pensa que sabe
onde está indo.
Você vê algo no horizonte.
E há muitos caminhos e você não sabe como
chegar lá.
Mas se você escutar ao jogo ele vai lhe
falar onde quer ir."
Foi assim que o estúdio dele fez um jogo
de terror, mesmo sem essa ser a intenção
no começo do projeto.
Agora obviamente, esse tipo de processo de
criação pode dificultar a previsão de
quanto tempo um jogo levará para fazer.
Esta é uma razão do por que essa metodolo-
gia é mais popular no mundo dos indies
- ao invés do fortemente arregimentado
mundo das produções de sucesso.
Tipo, quando Tom Francis fez seu segundo
jogo, Heat Signature, ele esperava que a
ideia vaga de "você entra em naves" fosse
magicamente levar à coisas boas - como
aconteceu com Gunpoint.
Mas... não funcionava.
Pelo menos, não por muito tempo.
Na verdade, Tom percebeu que ele devia fa-
zer coisa pra caramba até descobrir o que
fazia o jogo interessante, o que levou à
um desenvolvimento prolongado onde fez um
sistema de geração de naves, inteligência
artificial, combate, um mapa galático
inteiro com economia e etc.
Tom levou anos para perceber que o combate
dentro das naves era a parte mais interes-
sante. É por isso que vale lembrar que a
frase real é na verdade um pouco mais
longa que apenas "Follow the Fun".
Eu tracei a cunhagem da frase até esse
cara, Marc LeBlanc.
Ele é um designer que trabalhou em Thief e
System Shock, e um educador que ajudou a
criar ideias como a estrutura MDA.
Quando ele cunhou esta frase, ele na ver-
dade começou com um ditado bem conhecido
no mundo do design e empreendedorismo:
"fail fast" (falhe rápido).
Esse é o processo de fazer algo o mais rá-
pido possível, para ver o que funciona e o
que não funciona.
Não importa se você falha, porque você não
perdeu muito tempo - mas esse tão cha-
mado "fracasso" lhe dirá muito sobre qual
direção a próxima tentativa deverá tomar.
Então, talvez hajam algumas técnicas con-
cretas para acelerar o processo criativo?
Bem, um é algo que todos os espectadores
do GMTK tem familiaridade: Game Jams.
Aquelas maratonas frenéticas de criação de
jogos onde você tenta fazer um jogo em,
talvez, num fim de semana só.
Arvi Teikari, que criou o aclamadamente
premiado Baba is You em uma Game Jam, fala
sobre o poder desses eventos:
ARVI TEKARI: "A ideia é que você pode pe-
gar um protótipo
que tem na cabeça e tentar fazer algo
baseado nele.
Se não funcionar, tudo bem.
Você pode jogar fora depois da game jam,
você não é comprometido à ideia por mais
tempo que a game jam".
Outra técnica é usar ferramentas para pro-
totipagem rápida, como Game Maker e Godot.
Ou talvez protótipos em papel, LEGO, ou o
jogo de PS4 de criação de jogos, Dreams.
Se você já fez a maioria do jogo e só quer
gerar conteúdo, você pode desenvolver fer-
ramentas de criação de fases customizadas
para acelerar o processo criativo e adqui-
rir mais pessoas pra ajudar.
Para Mario Galaxy 2, a Nintendo fez ferra-
mentas de criação simples para encorajar
todos no time a pensar em mecânicas
únicas.
E para rapidamente focar em design e
mecânicas, você pode usar arte, música e
enredo placeholder. Quando Klei fez o pro-
tótipo de game jam do Don't Starve, o
herói do jogo era representado...
por Link, de Zelda.
E finalmente, pode ajudar ter algo no
jogo que
absolutamente não deve mudar.
Sunni Pavolic da thatgamecompany diz que o
estúdio usou uma metodologia bem iterativa
quando criando Journey, mas sempre com a
ideia de explorar o tema do amor.
Isso deu a todos no time uma única ideia a
seguir, e ajudou a estreitar o alcance de
ideias possíveis que eles poderiam
descobrir e desenvolver.
Então se tem algo que eu gostaria que você
levasse desse vídeo é: parar de esperar
pela ideia perfeita de jogo aparecer.
É fácil olhar pra algo como Ape Out, Crypt
of Necrodancer, ou Crashlands e
assumir que estes jogos foram feitos numa
explosão de inspiração - que fez transição
perfeita no jogo final.
E se você não consegue ter uma ideia tão
boa quanto essas - pra quê tentar?
Mas como eu lhe-mostrei neste vídeo, nada
poderia estar mais longe da verdade.
Em realidade, a coisa que liga todos estes
desenvolvedores é que eles tiveram
iniciativa e fizeram algo.
E foi só então (quando os desenvolvedores
testavam novas ideias, jogavam seus protó-
tipos, e até criavam bugs) que os jogos
que conhecemos hoje começaram a se formar.
Eles são ótimos designers não por que eles
tiveram ideias incríveis - mas porque eles
sabiam como escutar ao jogo, sabiam que
avenidas seguir, sabiam como fail fast e
fracassavam às vezes, e sabiam como aderir
essas ideias despareadas em algo coerente.
Então se você assiste Game Maker's Tool
Kit e acha que gostaria de fazer um jogo
- não espere pela ideia perfeita.
Faça algo.
E então você pode ouvir ao jogo, seguir a
diversão - e você pode descobrir que o
jogo, de forma pequena, cria a si mesmo.