Este é Augustín. Um dia, há três anos, sua família veio a um jantar na minha casa, como costumamos fazer, porque somos muito amigos. Naquela época, Agus não devia ter mais que três ou quatro anos, e já tinha sido diagnosticado com TEA: Transtorno do Espectro Autista. Em um momento da noite, enquanto os pais jantavam, alguém percebeu que Agus estava sentadinho à mesa da sala, brincando com um "tablet". O tablet tinha sido lançado pouco antes, não se sabia muito sobre ele. No primeiro momento, ficamos surpresos, porque sempre que ele vai a minha casa, ainda hoje, costuma ficar dando voltas. É muito difícil que fique sentado com algo por tanto tempo. Então, perguntamos aos meus filhos se algum tinha explicado a ele como ligar o tablet, como abrir os aplicativos, e o que não é nada fácil: como jogar. Eles responderam que não, que ninguém tinha dito nada. Lembro-me de que aquela noite terminou com a mãe dele, Laura, dizendo: "Temos que comprar este tablet para Augustín!" Ele não interagia tão rápido com nenhum dos brinquedos que tinha. Aquela noite não foi como as outras. A verdade é que eu não tinha percebido. Mas comecei a perceber depois, à medida que o tempo passou. Ali comecei a nutrir uma ideia que tinha: a de utilizar a tecnologia para ajudar na vida das pessoas. Vinha trabalhando no desenvolvimento de programas há mais de 20 anos. E isso era algo que queria e tinha necessidade de fazer. Um tempo depois, tive a sorte de participar de uma palestra de pais de crianças com síndrome de Down. Entre outras coisas, o que comentavam era que muitos pais se surpreendiam com a facilidade que os filhos tinham para utilizar todo os tipos de dispositivos móveis, como os tablets e telefones celulares. Diziam que aquilo não acontecia com os computadores tradicionais, que têm o teclado, o mouse e o monitor. De alguma forma, o que faziam era confirmar o que eu tinha visto acontecer com Augustín uns meses antes. Então, a partir desse potencial que viram nas crianças, propuseram a um grupo de empresas de desenvolvimento, entre as quais estava a minha, que criassem aplicativos de tablets para crianças com deficiência. Lembro-me daquele dia, uma manhã, quando voltava para o escritório, e disse: "Sim, claro. É isso o que quero fazer. Adoro isso!" Naquele momento, de algum modo, encarei como um desafio que me apresentaram e comecei. Talvez "comecei" seja um modo de dizer, porque, por um lado, naquela época, conhecia muito pouco, quase nada, sobre o assunto de deficiência. Além disso, minha empresa não desenvolvia tablets ainda. A verdade é que não sabia como começar. Mas o que sabia, que tinha certeza, era que queria mudar a forma de ensinar às crianças, em especial às que tinham necessidades especiais, e fazê-lo com a tecnologia. E algo mais: não só para o nosso país, mas pensando em todos os países de língua espanhola. Porque eu já tinha procurado algo, mas não tinha encontrado nada totalmente desenvolvido com essa temática. Com o começo do projeto, mais pessoas foram se juntando, principalmente com muita experiência em tecnologia e em deficiência. Acontece que, em um certo momento, me vi coordenando um grupo de pessoas que vinha de escolas, de universidades, de ONGs e de empresas de desenvolvimento de programas, e destas eu entendia. E havia algo muito lindo. Lembro-me de que as empresas que começaram tinham quatro, dez pessoas. Mas também havia algumas que tinham mais de 3 mil empregados, multinacionais. E todos trabalhavam de forma voluntária, "pro bono". E é algo que acontece hoje, três anos e meio depois. Vejam, hoje já existem vários aplicativos desenvolvidos. Lembro-me de quando começamos, nas primeiras reuniões, dissemos: "Quais características, de fato, devem ter os aplicativos?" Que todas as crianças possam usá-los em particular, com ênfase aquelas que têm deficiência. Uma das primeiras que definimos foi que os aplicativos deveriam utilizar imagens, fotos ou desenhos bem realistas e que não fossem agressivos para as crianças. Sabem por quê? Porque, em geral, as crianças com deficiência são muito literais. Então, se vocês, em um aplicativo, desenharem um carrinho e no capô, dois olhinhos e uma boquinha, elas irão para a rua e procurarão o carro com os dois olhos e a boca no capô. E como não o encontrarão, para elas não será um carro, porque não é o mesmo que lhe ensinaram. Por isso, é muito importante a questão das imagens e das fotos. Lembro-me de outra coisa que aconteceu. No princípio, começamos a ver como as crianças interagiam com os tablets, como jogavam. E começamos a perceber que, quando, por exemplo, cometiam um erro, deixavam de usar o aplicativo, por 30 segundos, por 1 minuto. E tem a ver com o fato de que, em geral, elas têm pouca tolerância ao fracasso. A partir daí, decidimos que, quando elas errassem, faríamos de conta que nada tinha acontecido. E ao contrário, com certeza, vocês conhecem ou inclusive já tenham convivido, por exemplo, com alguma criança com síndrome de Down. Sabem que são muito afetuosas, que abraçam e beijam. Nós tratamos de reproduzir isso nos aplicativos. Então, quando elas acertam algo, por menor que seja, o que geralmente fazemos? Colocamos aplausos, musiquinhas, algum bonequinho que as felicita. Com isso, algo muito lindo aconteceu. Começamos a fazer isso e, com o tempo, percebemos que quando o acerto delas é comemorado, querem continuar jogando, aprendendo com os tablets. Há muitas crianças que nunca chegam a ler ou a escrever, dificilmente poderão usar os aplicativos. Mas as que conseguem, o primeiro tipo de letra que aprendem é a de forma, em especial a maiúscula. Muitas vezes, é o único tipo de letra que aprendem. Esse é o que usamos nos aplicativos. E mais uma coisa: bem grande. Em um desenho, não fica tão bem, mas é bem grande para os que têm alguma deficiência visual. Vejam. Este é um dos aplicativos que desenvolvemos no começo. O nome dele é Tuli. A ideia era trabalhar com as emoções, que é uma questão muito importante, sobretudo para crianças com autismo. Em um momento, tínhamos acabado de fazer uma primeira versão e a testamos com um garoto com síndrome de Down. A ideia era que selecionasse qual emoção o Tuli sentia. Nesse caso, estava na praça, e arrastaria até o outro lado. Ele pegou, selecionou a opção correta, "Tuli está feliz", a moveu e, como tinha problemas de coordenação motora fina, ele não conseguia chegar do outro lado e, então, soltava a escolha dele. E, quando ele a soltava, o que acontece com 99% dos aplicativos que se pode baixar no tablet, o objeto voltava ao lugar de origem. Então, ele nunca poderia chegar até a outra ponta do tablet. É óbvio que a partir dali, fizemos com que, quando alguém soltasse o objeto, ele chegasse ao lugar. E ele poderia arrastá-lo e movê-lo em todos os passos necessários. Mas vocês se dão conta desse exemplo? Ele sabia o que tinha que fazer. Não só sabia, mas dizia: "Tuli está feliz na praça". "Sim, tem razão, está feliz! Bem, movimente-o." Mas ele não conseguia. Nunca poderia levá-lo ao outro lado. Porque, quando, projetaram o aplicativo, não pensaram na deficiência dele. Como essas características, há muitas outras. Arrisco-me a dizer, que certamente passam despercebidas para a maioria de vocês. Porque isso acontecia comigo; há três anos, nem tinha ideia disso. Mas, não só para eles, para os pais, os terapeutas, os professores que estão preocupados, para as crianças é a diferença entre poder usá-los ou não. Entre poder aprender com tablets ou não. Como falava antes, hoje temos cerca de 15 aplicativos já desenvolvidos, os quais podem ser baixados gratuitamente nos tablets. Hoje já são usados em escolas, e em algumas terapias também. E agora estamos fazendo uma série de estudos um pouco mais rigorosos para demonstrar o que os professores nos dizem. E é que as crianças aprendem mais rápido com os tablets. Mas há algo ainda mais lindo: aprendem mais motivadas, e sempre estão mais motivadas quando utilizam os tablets. Muitos trabalham neste projeto, e lhes conto meu caso em particular, que dedico muito do meu tempo, que poderia dedicar ao meu descanso ou muitas vezes a minha empresa. Mas tem a ver com o fato de que percebi que, fazendo o que gosto, o que adoro, que é desenvolver programas, é o que sei fazer, dou uma contribuição, mesmo que pequena, para mudar a vida de algumas pessoas. Por exemplo, quando vemos alguém que tem afasia, que por sérios problemas cerebrais, tem dificuldade de comunicação. De fato, elas comunicam-se com rabiscos, com desenhos. Então, fizemos um aplicativo que transforma o tablet em algo parecido com um quadro mágico magnético, que usávamos quando éramos crianças. Isso permite trazer a conversa pré-gravada no tablet por meio de desenhos, e então sentar-se com aquela pessoa com a qual se quer comunicar. Algo que antes poderia levar uma hora para dizer o que queria, hoje leva menos de dez minutos. Bem, isso é mudar o seu dia a dia. Agora acabamos de lançar uma versão de um aplicativo para lidar com cédulas de dinheiro, Então, permite que não mais uma criança, mas um adolescente com síndrome de Down, possa ir ao supermercado para fazer compras e consultar no aplicativo com quais cédulas pode pagar, ou possivelmente, com quais receber o troco. Bem, isso permite ser mais independente, a ele e a seus pais. Porque os pais se preocupam constantemente que seu filho possa fazer coisas sozinho. O projeto tem mais um efeito que, para ser totalmente honesto, nunca tínhamos pensado, nunca imaginamos que pudesse acontecer, mas que hoje adoramos. E tem a ver com o grau de comprometimento que têm os jovens que programam e que projetam os aplicativos. Eles têm entre 20 e 30 anos, não mais. E nos dizem que depois de passar pelo projeto, de ver os aplicativos, de testar com as crianças, a partir daí, vão incorporar todas essas características aos aplicativos que desenvolverem em sua vida profissional. Isso é fantástico. Porque isso é o que deve ser normal com o tempo. É isso que tem que acontecer. Há algumas semanas, eu e minha família estávamos na casa de Augustín. Em um momento, minha filha maior, Cande, estava com o tablet dele. E me disse, surpresa, mas feliz: "Olha, papai, Agus tem o aplicativo do ursinho que você fez". O pai dele confirmou: "Foi você quem fez, Pablo? Porque foi a terapeuta de Agus quem o recomendou, para usarmos com ele". Naquele momento, senti que embora tudo para mim tivesse começado por ele, a história não terminava ali. Porque cada vez mais meninos e meninas utilizam os tablets e os aplicativos nas escolas para aprenderem de uma forma diferente. Vejam. (Vídeo) (Fim do vídeo) (Aplausos) Muito obrigado. (Aplausos)