Desde quando eu recebi o convite
pra participar deste TEDxLaçador,
mas, sobretudo quando descobri
que o tema era: "Tem saída?",
dali então eu não dormi mais.
Hoje acordei às 5h30min da manhã,
as olheiras não mentem.
Por que eu ficava me perguntando
como é que eu poderia responder
se tem saída ou não.
Como apontar os caminhos
de uma mudança, cheio de certezas,
sem ser petulante, arrogante, prepotente?
OK. A liberdade etária
me daria essa liberdade.
Eu tenho indecentes 22 anos.
OK. A cara não está ajudando muito.
Na verdade, é o Brasil
que não ajuda a gente,
faz com que a gente fique
um pouquinho acabado.
Brasil, Rio... Tem saída?
Logo eu comecei a pensar num cara
que participou da minha infância.
Ele não sabe, mas eu o vi...
na verdade, ele me viu crescer,
e eu o vi envelhecer.
Eu não sei seu nome, eu não sei
sua história, eu não sei sua idade.
Mas o que eu sei é que ele tem milhas
e milhas de quilômetros rodados
pelo lugar de onde eu falo.
Esse lugar, esse universo
particular e também coletivo,
que é a Favela da Rocinha.
Esse cara é o vendedor de sonhos.
Enquanto ele anda, ele solta,
com um balaio na cabeça,
a pergunta que ditou muitas vezes
todos os meus passos:
"Quem quer sonhar? Quem quer sonhar?"
Parecia uma espécie de Silvio Santos,
um apresentador de programa de auditório.
Sonhar...
Só que até pra isso, até pra sonhar,
é preciso estar de barriga cheia.
É difícil não querer dizer: "Eu!"
ao ouvir a pergunta.
Mas nem sempre é fácil responder.
Com as características
que eu apresento hoje,
as possibilidades de vida
são muito curtas e determinantes
no país que a cada 23 minutos
mata uma pessoa que poderia
estar aqui, no meu lugar,
e não está.
Por quê?
Porque essa pessoa foi morta.
A ela não foi possível pensar,
parar e responder à pergunta-refrão:
"Com recheio de doce de leite
ou chocolate?"
Corta.
Esse mesmo lugar de onde eu venho,
a Favela da Rocinha, no Rio de Janeiro,
numa atitude de reexistência,
afirmou, na base de murros, pontapés,
no meio dos tiros, das cápsulas,
dos fogos, das barreiras, dos Caveirões,
dos helicópteros com metralhadoras 360
apontadas pra minha cabeça,
que sim, a minha vida era possível.
E ela valia.
Na verdade, ela importa.
Foi ressignificando o ser
e contrariando todas as expectativas,
na base de funk 150 bpm
de Rennan da Penha,
como bem citou a Marcela Lisboa,
que eu chego aqui.
Talvez por entender... talvez, não.
Por acreditar piamente
que este lugar, a favela,
não é um bunker de bandidos.
É um bunker de potências.
E salve Eliana Sousa Silva!
Potência no agir, no pensar, no caminhar,
no enfrentamento das crises,
que não foram criadas por nós
e simplesmente impostas.
Pela urgência das ações.
A minha forma de luta? O papel e o lápis.
Quem lida com a violência
através dessas armas,
não está preparado para ser
confrontado com a artilharia pesada
que pode sair de uma página em branco
de quem mora e vive
no lugar que seria o da...
falta?
Tem certeza?
Falta não.
O lugar da possibilidade.
Mas vem cá? O que eu estava falando mesmo?
Lembrei. Sobre saídas.
Sim! Sobre as saídas.
Se elas existem, se são possíveis.
Sobre quem pode ou não coordenar
essa questão, essas respostas.
Sobre quem pode ser.
Sobre quem é.
Já pararam pra pensar naquelas saídas
que invisibilizamos todos os dias,
diariamente, em nossa vida
individual e também coletiva?
Porque quando eu falo em saídas,
eu falo de pessoas.
E o que devemos dar...
dar não, privilegiar, é a visibilidade.
Voz?
Voz todos nós temos.
Já pararam para pensar que neste minuto,
agora, enquanto estamos aqui,
algumas dessas pessoas
que estão à nossa volta
podem simplesmente
estar precisando de...
nós?
Afinal de contas, ela pode, neste momento,
querer responder uma pergunta
aparentemente simples.
Quem quer sonhar?
E aí? O que você vai fazer
para realizar esse sonho?
Tem saída?
Obrigado.