Steve Ramirez: No meu primeiro ano de faculdade, eu estava no meu quarto, comendo sorvete no pote, assistindo alguns programas de TV ruins e talvez, talvez ouvindo Taylor Swift. Eu tinha acabado de terminar um namoro. (Risos) Assim, por muito tempo, tudo o que eu fazia era reviver a memória dessa pessoa toda hora, desejando que eu pudesse me livrar desse sentimento, angustiante e visceral de melancolia. Agora, como se vê, eu sou um neurocientista, então eu sabia que a memória dessa pessoa e as terríveis conotações emocionais que coloriam aquela memória, são em grande parte mediadas por sistemas cerebrais separados. E então eu pensei: "E se pudéssemos entrar no cérebro e editar esse sentimento nauseante e ao mesmo tempo manter a memória dessa pessoa intacta?" Então percebi: "Talvez isso seja um pouco demais, por enquanto." E se pudéssemos começar entrando no cérebro e simplesmente encontrar uma única memória, a princípio? Será que poderíamos trazer essa memória de volta à vida, talvez até mesmo brincar com o conteúdo dela? Com isso dito, há uma pessoa em todo o mundo agora que realmente espero que não esteja assistindo a esta palestra. (Risos) E há um porém. Há um porém, Essas ideias provavelmente lembram "O Vingador do Futuro", "Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças", ou "A Origem", mas as estrelas de cinema com quem trabalhamos são as celebridades do laboratório. Xu Liu: Ratinhos de laboratório. (Risos) Como neurocientistas, trabalhamos no laboratório com ratos tentando entender como funciona a memória. E hoje, esperamos convencê-lo de que, agora, nós conseguimos ativar uma memória no cérebro na velocidade da luz. Para isso, há apenas dois passos simples a seguir. Primeiro, encontramos e rotulamos uma memória no cérebro, e depois a ativamos com uma chave. Simples assim. (Risos) SR: Estão convencidos? Acontece que encontrar uma memória no cérebro não é tão fácil. XL: De fato. É muito mais difícil do que, digamos, encontrar uma agulha num palheiro, porque, pelo menos, sabemos que a agulha ainda é algo que você pode fisicamente tocar. Mas a memória não. E, também, há muito mais células no cérebro do que fios de palha num palheiro típico. Então, sim, essa tarefa parece ser difícil. Mas, felizmente, temos a ajuda do próprio cérebro. Acontece que tudo o que precisamos fazer é, basicamente, permitir que o cérebro forme uma memória, e o cérebro nos diz quais células estão envolvidas nessa memória em particular. SR: Então, o que estava acontecendo no meu cérebro enquanto eu recordava a memória de uma ex? Se fôssemos ignorar completamente a ética humana por um segundo e fatiar meu cérebro agora, vocês veriam que há um número surpreendente de regiões do cérebro que estavam ativas ao recordar aquela memória. Agora, uma região do cérebro que estaria vigorosamente ativa em particular é chamada de hipocampo, que, há décadas, é associada ao processamento dos tipos de memórias que nos são próximas e queridas, o que também o torna um alvo ideal para entrarmos e tentarmos encontrar e talvez reativar uma memória. XL: Quando aumentamos o zoom no hipocampo, claro que veremos um monte de células, mas somos capazes de encontrar as células que estão envolvidas em uma memória específica, porque, sempre que uma célula está ativa, como quando ao formar uma memória, ela também vai deixar uma marca que, mais tarde, nos permite saber que essas células estiveram recentemente ativas. SR: Então, da mesma forma que, à noite, as luzes dos prédios nos indicam que alguém está trabalhando, em um determinado momento, em um sentido muito real, existem sensores biológicos dentro de uma célula que ficam "acesos" somente quando essa célula esteve ativa recentemente. São meio que janelas biológicas que se acendem, indicando que essa célula esteve recentemente ativa. XL: Então, cortamos uma parte desse sensor, e a conectamos a uma chave para controlar as células, e colocamos essa chave em um vírus sintético e o injetamos no cérebro dos ratos. Assim, sempre que uma memória estiver sendo formada, qualquer célula ativada por essa memória também terá essa chave instalada. SR: Então, é assim que fica o hipocampo, depois da formação de uma memória de medo, por exemplo. O mar azul que vocês veem aqui são células cerebrais densamente concentradas, mas as células cerebrais verdes, as células cerebrais verdes são as que estão se atendo a uma memória de medo específica. Então, vocês estão olhando para a cristalização da formação fugaz do medo. Na verdade, agora vocês estão vendo o corte transversal de uma memória. XL: Bom, a chave sobre a qual estamos falamos, idealmente, a chave tem que agir muito rápido. Não deve demorar minutos ou horas para funcionar. Deve agir na velocidade do cérebro, em milissegundos. SR: O que você acha, Xu ? Será que poderíamos usar, digamos, drogas farmacológicas para ativar ou desativar células cerebrais? XL: Não, drogas são uma bagunça. Elas se espalham pelo organismo. E também demoram muito para entrar em ação nas células. Portanto, isso não nos permitirá controlar uma memória em tempo real. Então, Steve, que tal darmos uma descarga elétrica no cérebro? SR: Bem, a eletricidade é bem rápida, mas provavelmente não conseguiríamos mirar somente nas células específicas que guardam uma memória, e provavelmente fritaríamos o cérebro. XL: Ah, é verdade. Então, parece que, hum.. De fato, precisamos encontrar um jeito melhor de impactar o cérebro, na velocidade da luz. SR: Bem, acontece que a luz viaja na velocidade da luz. Então, talvez pudéssemos ativar ou desativar memórias, usando apenas luz. XL: A luz é bem rápida SR: E porque as células cerebrais normalmente não respondem a pulsos de luz, as que respondem a pulsos de luz são aquelas que contêm uma chave sensível à luz. Para isso, primeiro precisamos enganar as células cerebrais para que respondam a feixes de laser. XL: Sim, é isso mesmo. Estamos tentando disparar lasers no cérebro. (Risos) SR: E a técnica que nos permite fazer isso é a optogenética. A optogenética nos deu essa chave de luz que podemos usar para ligar ou desligar as células cerebrais, e o nome dessa chave é canal-rodopsina, vista aqui como pontos verdes, grudados à célula cerebral. Podemos pensar na canal-rodopsina como um tipo de chave sensível à luz, que pode ser instalada artificialmente em células cerebrais, de modo que, agora, podemos usar essa chave para ativar ou desativar a célula cerebral, simplesmente alternando a chave, e, neste caso, nós a ligamos com pulsos de luz. XL: Prendemos essa chave de canal-rodopsina sensível à luz ao sensor de que falamos e o injetamos no cérebro. Assim, sempre que uma memória estiver sendo formada, qualquer célula ativa para essa memória em especial também terá essa chave sensível à luz instalada nela, o que nos permite controlá-las ao alternarmos um laser como este que vocês estão vendo. SR: Então, vamos testar tudo isso agora. O que podemos fazer é pegar nossos ratos e, então, colocá-los em uma caixa, exatamente como essa aqui, e lhes damos um choque de leve nas patas, para que formem uma memória de medo da caixa. Eles aprendem que algo ruim aconteceu ali. Agora, com o nosso sistema, as células que estão ativas no hipocampo durante a formação dessa memória, agora só essas células contêm canal-rodopsina. XL: Quando se é tão pequeno quanto um rato, parece que o mundo inteiro está tentando pegá-lo. Por isso, a melhor resposta de defesa é tentar passar despercebido. Sempre que um rato está com medo, ele mostra um comportamento muito típico, ficando em um canto da caixa, tentando não mover parte alguma de seu corpo, e esta postura é chamada de congelamento. Então, se um rato lembra que algo ruim aconteceu nessa caixa, e quando o colocarmos de volta na mesma caixa, basicamente ele vai mostrar o congelamento, pois quer passar despercebido a qualquer ameaça em potencial nessa caixa. SR: Então, podemos imaginar o congelamento como se você estivesse na rua, cuidando da sua vida, e aí, do nada, você quase dá de cara com uma ex-namorada ou ex-namorado, e aqueles terríveis dois segundos em que você começa a pensar: "O que eu faço? Será que cumprimento? Aperto a mão? Dou meia volta e corro? Sento aqui e finjo que não existo?" Esses tipos de pensamentos fugazes que o incapacitam fisicamente, que o deixam temporariamente com aquele olhar atordoado. XL: No entanto, se colocarmos o rato em uma caixa completamente nova e diferente, como a próxima, ele não vai ter medo dessa caixa, porque não há razão para ter medo desse ambiente novo. Mas e se colocarmos o rato nessa nova caixa e, ao mesmo tempo, ativarmos a memória do medo, usando lasers, como fizemos antes? Será que vamos trazer de volta a memória do medo da primeira caixa para esse ambiente completamente novo? SR: Certo, e aqui está a experiência de um milhão de dólares. Bom, revivendo a memória daquele dia, lembro que o Red Sox tinha acabado de ganhar, era um dia verde de primavera, perfeito para subir e descer o rio e, depois, talvez ir para o North End e beliscar uns petiscos, quem sabe. Agora Xu e eu, por outro lado, estávamos em uma sala escura, completamente sem janelas, sem fazer qualquer movimento ocular que se assemelhasse a um piscar de olhos, porque nossos olhos estavam fixos na tela do computador. Estávamos olhando este rato aqui, tentando ativar uma memória pela primeira vez, utilizando a nossa técnica. XL: E foi isto que vimos. Quando colocamos o rato dentro desta caixa pela primeira vez, ele a explorou, farejou, andou dentro dela, cuidando de sua própria vida, porque, na verdade, por natureza, ratos são animais muito curiosos. Eles querem saber: "O que está acontecendo nesta nova caixa? Ela é interessante". Mas no momento em que ligamos o laser, como vemos agora, de repente, o rato entrou em congelamento. Ele ficou aqui e tentou não mover parte alguma de seu corpo. Claramente, é o congelamento. Então, de fato, parece que conseguimos trazer de volta a memória do medo da primeira caixa para este ambiente completamente novo. Enquanto observávamos, Steve e eu estávamos tão chocados quanto o próprio rato. (Risos) Assim, após o experimento, nós dois apenas saímos da sala, sem dizer nada. Depois de um período de tempo longo e desconfortável, Steve quebrou o silêncio. SR: "Será que funcionou?" XL: "Sim!", eu disse. "De fato, funcionou!" Estamos muito animados com isso. Então, publicamos nossas descobertas na revista Nature. Desde a publicação do nosso trabalho, temos recebido inúmeros comentários de toda parte da Internet. Talvez possamos dar uma olhada em alguns deles. ["MEU DEUS, FINALMENTE... há muito mais por vir, realidade virtual, manipulação neural, emulação visual de sonhos... codificação neural, 'escrever e reescrever memórias', doenças mentais. Ahhh, o futuro é incrível"] SR: Então, a primeira coisa que notamos é que as pessoas têm opiniões muito fortes sobre esse tipo de trabalho. Bem, eu concordo completamente com o otimismo desta primeira citação, porque, numa escala de zero à voz de Morgan Freeman, por acaso é um dos elogios mais evocativos que eu ouvi surgindo sobre nós. (Risos) Mas, como vocês vão ver, essa não é a única opinião. ["Isso me assusta muito... E se eles puderem fazer isso facilmente em humanos em alguns anos?! OH MEU DEUS, ESTAMOS CONDENADOS"] XL: De fato, se dermos uma olhada no segundo, acho que todos podemos concordar que não é, assim, tão positivo. Mas isso também nos lembra de que, embora ainda estejamos trabalhando com ratos, é provavelmente uma boa ideia começar a pensar e discutir sobre as possíveis implicações éticas do controle de memória. SR: Agora, no espírito da terceira citação, queremos falar sobre um projeto recente em que temos trabalhado no laboratório, e que chamamos de projeto "A Origem". ["Eles deveriam fazer um filme sobre isso. Onde eles implantam ideias nas mentes das pessoas, para que possam controlá-las para seu ganho pessoal. Vamos chamá-lo: "A Origem"] Então, concluímos que, agora que podemos reativar uma memória, e se fizermos isso, mas depois começarmos a mexer com essa memória? Será que conseguiríamos transformá-la em uma falsa memória? XL: Então, toda memória é sofisticada e dinâmica, mas, apenas para simplificar, vamos imaginar a memória como um clipe de filme. Até agora, o que dissemos é basicamente que podemos controlar o botão de "tocar" do clipe, o que nos permite rodar este clipe a qualquer hora, em qualquer lugar. Mas será que há realmente alguma possibilidade de entrarmos no cérebro e editarmos esse clipe, tornando-o diferente do original? Sim, podemos. Aparentemente, tudo o que precisamos fazer é, basicamente, reativar a memória, usando lasers, assim como fizemos antes. Mas, ao mesmo tempo, se apresentarmos informação nova e permitirmos que esta informação nova se incorpore nessa memória antiga, isto irá alterar a memória. É mais ou menos como fazer uma fita de remix. SR: Então, como fazemos isso? Em vez de procurar uma memória de medo no cérebro, podemos começar pegando nossos animais, e, digamos que os coloquemos em uma caixa azul, como esta aqui, e encontremos as células cerebrais que representam essa caixa azul e as induzamos a responder a impulsos de luz, exatamente como havíamos dito antes. Bom, no dia seguinte, nós pegamos nossos animais e os colocamos em uma caixa vermelha, na qual jamais estiveram. Podemos disparar luz no cérebro para reativar a memória da caixa azul. Então, o que aconteceria se, enquanto o animal estivesse recordando a memória da caixa azul, déssemos leves choques em suas patas? Aqui estamos tentando criar artificialmente uma associação entre a memória da caixa azul e os choques na pata. Só estamos tentando conectar os dois. Assim, para sabermos se funcionou, podemos pegar nossos animais mais uma vez e colocá-los de volta na caixa azul. De novo, nós só reativamos a memória da caixa azul, enquanto o animal levou alguns choques leves nas patas, e agora o animal de repente congela. É como se estivesse se lembrando de ter levado choques neste ambiente, embora isso nunca tenha acontecido. Portanto, ele criou uma falsa memória, pois está enganado por sentir medo de um ambiente onde, tecnicamente falando, nada de ruim realmente aconteceu com ele. XL: Então, até agora estamos falando apenas dessa chave de luz de "ligar". Na verdade, nós também temos uma chave de luz de "desligar", e é muito fácil imaginar que, ao instalar essa chave de luz de "desligar", também podemos desligar uma memória, a qualquer hora, em qualquer lugar. Então, tudo o que falamos hoje está baseado nesse princípio neurocientífico filosoficamente carregado, de que a mente, com as suas propriedades aparentemente misteriosas, é mesmo feita de material físico, com o qual podemos mexer. SR: E para mim, pessoalmente, vejo um mundo onde podemos reativar qualquer tipo de memória que quisermos. Também vejo um mundo onde podemos apagar memórias indesejadas. Agora, ainda vejo um mundo onde editar memórias faz parte da realidade, porque vivemos em uma época onde é possível arrancar perguntas da árvore da ficção científica e cultivá-las na realidade experimental. XL: Hoje em dia, as pessoas no laboratório e pessoas de outros grupos em todo o mundo estão usando métodos semelhantes para ativar ou editar memórias, sejam elas velhas ou novas, positivas ou negativas, todos os tipos de memórias, para que possamos entender como funciona a memória. SR: Por exemplo, um grupo no nosso laboratório conseguiu encontrar as células cerebrais que compõem a memória do medo e converteu-as em uma memória agradável, simples assim. É exatamente isso que quero dizer sobre editar esse tipo de processo. Agora, um cara no laboratório foi capaz até de reativar memórias de ratinhas em ratinhos, o que, segundo boatos, é uma experiência agradável. XL: De fato, estamos vivendo um momento muito emocionante, onde a ciência não possui limites de velocidade arbitrários, mas é limitada apenas por nossa própria imaginação. SR: E, finalmente, o que vamos fazer com tudo isso? Como podemos levar essa tecnologia para a frente? Essas são questões que não devem ficar apenas dentro do laboratório. E um dos objetivos da palestra de hoje foi atualizar todos com o tipo de coisa que é possível na neurociência moderna. Porém, tão importante quanto isso, é envolver ativamente todos nessa troca de ideias. E vamos pensar juntos, como uma equipe, sobre o que tudo isso significa e onde podemos e devemos ir a partir daqui, porque Xu e eu achamos que todos nós temos algumas decisões realmente grandes pela frente. Obrigado. XL: Obrigado. (Aplausos )