Olá. Eu sou Mark e este é o Game Maker's Toolkit. Mirror's Edge era um jogo que pedia uma continuação. Uma que pudesse retocar o estilo plataforma em primeira pessoa, repensar a história, se livrar das armas, e incluir várias outras coisas. E, olha só, conseguimos! Mirror's Edge Catalyst é uma continuação - ou prequel, ou reboot, tanto faz - e os controles respondem melhor, as cutscenes não parecem terem sido feitas em Flash, as armas foram embora, e tem muito mais conteúdo. Mas, se as resenhas dizem alguma coisa, o jogo não funcionou tão bem. E eu acho que o culpado foi uma mudança delicada para a franquia: a introdução de um mundo aberto. Os níveis do Mirror's Edge original são, em sua maioria, corridas de obstáculos. Por uma rota em linha reta pelo mundo, você precisa acumular e manter velocidade, usando movimentos de parkour em uma série de trampolins, cercas e tirolesas. Sempre tem um caminho na sua frente, marcado em vermelho pela Visão de Corredor. Mas o desafio é notar esse caminho em velocidade máxima, ficar alerta para outras rotas mais rápidas, e realmente fazer os movimentos - os saltos, mergulhos, cambalhotas, corridas em paredes e giros rápidos - com precisão. E, de vez em quando, o jogo dá uma parada. Aí, Mirror's Edge vira um puzzle em plataforma, onde você deve encontrar um caminho para o topo de um prédio, em um labirinto de obstáculos. E, agora, Mirror's Edge Catalyst... Não, na verdade, tudo isso acontece em Catalyst também. Porque quase todas as missões da história, e algumas extras, se passam fora do ambiente do mundo aberto, em locais lineares e especificamente desenhados para serem percorridos uma vez e em uma só direção. Essas missões se passam em arranha-céus, edifícios comerciais, instalações subterrâneas, e centros gigantes que você não consegue alcançar normalmente. Isso significa que o mundo aberto serve para outras coisas. É como você vai de missão para missão, e um lugar para praticar parkour. É cheio de colecionáveis, se essa for a sua praia. Também tem várias missões paralelas. Então, será que essas tarefas extras tiram vantagem da Cidade de Glass em sandbox? Se nós quisermos entender como um mundo aberto pode levar a um gameplay que aproveita o grande espaço disponível para diversão, há vários jogos que podemos analisar. Aqueles que dão uma grande variedade de escolhas para o jogador lidar com uma missão, ou que passam um sentimento de domínio após várias explorações dos mesmos lugares. Mas considerando a velocidade de Mirror's Edge, a melhor opção seria um jogo como Burnout Paradise. Temos aqui uma franquia super veloz que transita muito bem de rotas lineares para mundo aberto. E eu acho que isso se dá porque todo evento aproveita a cidade sandbox que o jogo apresenta. Corridas e desafios marcados mandam você de um ponto do mapa para outro, e não há restrição nos caminhos que se pode pegar. Corridas furiosas e manobras disparadas permitem lançamento de carros e acumulação de pontos do jeito que você quiser, e não é preciso se preocupar em encontrar ruas sem saída, já que a cidade se desdobra em todas as direções. Como você fica correndo sempre pelas mesmas ruas, e o jogo todo se passa dentro da cidade, você aprende logo as melhores rotas e atalhos, e sabe onde acelerar com tudo e onde é melhor acalmar um pouco. E mais, toda corrida termina em uma das 8 linhas de chegada no mapa, então você logo se familiariza com os caminhos e atalhos que levam a esses pontos. Mirror's Edge Catalyst não funciona desse jeito. Missões extras como corridas, entregas discretas ou de objetos frágeis são sempre de um ponto arbitrário para outro, em rotas curtas e pre-determinadas. E ainda que sempre existam atalhos que te deixarão chegar mais rápido, eles geralmente ficam fora daquela rota principal. Parece até que o mundo aberto foi uma costura de vários pedaços, e se for fazer assim, é mais fácil colocar cada corrida em um menu e chamar de Mirror's Edge 1. Eles parecem tão lineares quanto as corridas do primeiro jogo, que usava pequenas seções dos níveis da campanha principal para as speed runs. Além de desafios em mundos abstratos bizarros. E mais: já que Mirror's Edge não precisava carregar um pedaço enorme de mundo aberto toda vez que você errava um pulo, não precisava de loading screens chatas durante as corridas. Mas enfim. Percebe-se que os atalhos das missões extras em Catalyst são descobertas do mesmo jeito que eram no Mirror's Edge original: jogando repetidamente o mesmo evento, ao invés de vir do seu domínio da Cidade de Glass. E aposto que esse domínio é bem limitado, por alguns motivos. Primeiro, as missões principais não se passam no mundo aberto, então você não passa muito tempo nele para aprender o layout. Outro é que a cidade tem poucos pontos marcantes para auxiliar na navegação. E, mais importante ainda, é que é quase impossível de jogar sem seguir obsessivamente esse rastrinho vermelho. Dê uma olhada nesse vídeo para entender porque seguir linhas pontilhadas afeta sua competência em se envolver com o mundo do jogo. É possível diminuir a Visão de Corredor, ou desligá-la por completo, mas o design confuso da cidade meio que a transforma numa necessidade. E, incomum para um mundo aberto, a Cidade de Glass sempre te coloca em corredores retos, onde você fica preso entre edifícios altos demais para se escalar, ou os prédios são baixos demais para aterrissar, ou há vãos enormes entre os terraços. Isso é bom para dar a sensação clássica de Mirror's Edge de passar por uma corrida de obstáculos, mas é péssimo para navegação. Ainda mais porque há poucos caminhos entre esses conjuntos de edifícios. Aí, o sinalzinho flutuante pode estar bem na sua frente, mas você só consegue alcançar se der essa volta enorme. Isso deve ser uma questão técnica, ligada a carregar pedaços diferentes do mundo aberto na memória. Jogadores podem lidar com algumas loading screens discretas, mas é difícil aguentar quando isso começa a atrapalhar o seu passeio pelo mundo. Isso tudo significa que Mirror's Edge Catalyst não consegue disponibilizar missões como as de Burnout Paradise. Ou Crazy Taxi. Nesse jogo, tem uma seta imprecisa apontando para o seu destino, e para chegar lá no tempo certo, você precisa saber dirigir bem e conhecimento do desenho da cidade. Em Mirror's Edge, poderia ter um tipo de missão divertido em que você resgataria e entregaria pacotes, indo de um lado do mundo para outro. Isso daria um novo tipo de gameplay que complementaria os níveis lineares da campanha - e testaria a sua habilidade de navegar pela cidade e de manter velocidade. Mas eu não acho que funcionaria na confusão que é a Cidade de Glass, porque você passa o tempo todo só seguindo o rastinho vermelho, ou caindo para a morte. Algo que o jogo faz bem é a opção para os jogadores fazerem suas próprias disputas, com qualquer rota pela Cidade de Glass. Isso não funcionaria mesmo num jogo linear, como o 1º Mirror's Edge, onde todos os melhores pedaços já eram corridas. Mas seria ruim dizer que Burnout Paradise fez melhor, simplesmente colocando tabelas de rankings em cada estrada, então você compete passivamente com outros jogadores, o que dá vontade de dirigir mais rápido, arriscar mais, e virar um motorista melhor? E os colecionáveis de Burnout se baseavam apenas em destruir cercas e painéis enquanto dirige, nada a ver com parar de correr para abrir uma caixa de fusíveis. E quem passa as missões não ficam parados que nem zumbis, e sim disparam por você, chamando pra correr? Mas, voltando a Catalyst. Tem mais um tipo de missão que realmente aproveita do mundo aberto. Aqueles em que você surra um monte de guardas, destrói uma torre, e foge de um helicóptero. Que nem nas manobras furiosas em Burnout, você pode correr em qualquer direção, indo pelo caminho que quiser, mantendo velocidade o bastante para ultrapassar o helicóptero. Não tem caminho predeterminado, nem direção específica, e qualquer entendimento que você tiver da Cidade de Glass te ajudará em evitar becos sem saída e quedas. Infelizmente, o melhor jeito de terminar essas missões é simplesmente seguir o rasto vermelho, que te leva logo para o abrigo mais próximo, onde a corrida acaba imediatamente. Tão perto! Essas coisas mostram que um jogo de Mirror's Edge poderia ter um mundo aberto. As mecânicas não são incompatíveis com exploração livre e, na verdade, um espaço aberto poderia trazer um novo tipo de missão para complementar as outras mais lineares e com puzzles. Porém, as várias escolhas tristes, como o layout estranho, a dependência na Visão de Corredor, as missões extras limitadas, e espaços próprios para as principais, tudo isso significa que esse mundo aberto não funcionou direito. Numa entrevista, o diretor de design Erik Odeldahl disse: "Eu tenho 100% de certeza de que outras equipes na DICE e em outros estúdios da EA aprenderão com o que fizemos e devem usar isso de algum jeito, ainda mais com esses mundos muito, muito grandes." E isso deveria me preocupar. Mas, vendo como a EA parece ter esquecido completamente tudo de bom que eles já tinham alcançado em um dos melhores jogos de mundo aberto já feitos, não acho que a memória deles é tão boa assim. Obrigado por assistir! Me conte o que você acha de Mirror's Edge nos comentários. Na verdade, eu gostei bastante do jogo, mesmo com o mundo aberto bagunçado. E deixa eu agradecer rapidinho por todas as mensagens carinhosas em Boss Keys, o meu spin off sobre o design das masmorras de Zelda. Eu não sabia como seria recebido, então estou feliz por terem gostado. O próximo será Link's Awakening, como pediram! E, finalmente, Game Maker's Toolkit só é possível devido a todos que doam para o Patreon, mas deixa eu dar um abraço especial aos maiores apoiadores.