(Chilreio de pássaros) Olá. Como estão? Sou Guillermo de Anda. Sou arqueólogo e explorador da National Geographic. (Aplausos) Obrigado. (Aplausos) Muito obrigado. Que energia! Agradeço muito este acolhimento. Espero que achem interessante o que vos vou dizer. Sou mexicano. Hão de perguntar o que faz um mexicano na Nicarágua, num TEDx. Venho falar de certas semelhanças que provavelmente não temos agora muito nítidas, mas que existem e que me têm maravilhado. Eu trabalho na água. Sou arqueólogo subaquático e mergulho dentro de grutas no mundo obscuro mas maravilhoso que são as grutas inundadas de Iucatão e Quintana Roo, que se chamam cenotes. Este é o nome genérico que vem do maia "tz'onot". Como podem ver, são locais belíssimos por fora mas, por dentro, não têm igual. Na realidade, é estar noutro planeta, dentro do nosso planeta. É um local totalmente estranho, mas com uma beleza extraordinária. É um local imenso. Precisamos de equipamento como se estivéssemos noutro planeta, para sobreviver. Aquelas botijas que levamos transportam o gás vital para podermos sobreviver nesta zona. É incrível o que se conseguiu durante todos estes anos. Mais uma vez perguntarão: "Bom, o Iucatão... "Cancun está a 1402 km de Manágua". Estamos longe mas estamos muito perto. Estamos muito perto em muitas coisas. Estamos muito perto porque temos grandes reservas naturais, grandes mananciais de água e também uma grande cultura pré-colombiana. Nós exploramos este mundo obscuro de grutas, em que estamos a pressionar cada vez mais, ou seja, estamos a tratar de andar cada vez mais longe. Reparem neste pequeno artefacto que o mergulhador tem na fotografia. É um carretel que tem uma linha de nylon muito comprida. É a nossa garantia de regressar à vida porque estes locais são verdadeiros labirintos. Precisamos de um guia para poder voltar, não nos perdermos e morrer, porque não podemos respirar água, toda a gente sabe. Este carretel tem nós de três em três metros, ou seja, quando chegamos ao fim de todos os nós, chegamos ao ponto máximo de penetração. E quando voltamos, contamos estes nós. Há 30 anos, mais ou menos, que contamos estes nós e em resultado de contar estes nós, sabemos que foram 1390 km. Se fizermos uma comparação, é quase a distância entre Manágua e Cancun. Isto é impressionante porque tudo isto ocorre num pequeno setor do estado de Quintana Roo, entre a Playa del Carmen, um local muito popular de turismo, e Tulum. É uma área onde se concentrou uma grande quantidade de explorações e de descobertas. Graças a estas explorações, temos encontrado coisas maravilhosas. É o sonho de um arqueólogo. Há uns anos, encontrámos estes animais que eram ossos, os primeiros ossos registados nesta zona. Eram ossos muito antigos, provavelmente com 14 000 anos de antiguidade. São da Idade do Gelo. Isto está a dar-nos uma perspetiva nova sobre o povoamento da América, e a sua biogeografia em geral. Não ficaria admirado que nesta região, se iniciássemos explorações mais intensivas, encontrássemos coisas semelhantes. Na zona do Iucatão, encontrámos também uma grande quantidade de elefantes antigos, parentes dos mamutes, neste caso, gonfotérios, de que vemos uma mandíbula extraordinária e enorme, com todos os dentes bem preservados debaixo de água. Este nível de preservação nos cenotes é extraordinário. É incrível pensar que há 10, há 11 ou há 12 000 anos, este indivíduo jovem que vemos ali, perdeu-se provavelmente numa gruta que hoje está a mais de 1000 metros, um pouco mais de um quilómetro, e ali encontrou o seu lugar de eterno repouso, para que os mergulhadores, milhares de anos depois, o encontrassem e ele desse grandes respostas à ciência. Agora sabemos muito mais sobre o povoamento precoce da América graças à investigação que se faz no aquífero maia, em toda esta enorme zona de grutas inundadas. particularmente no estado de Quintana Roo. Esta foto é de uma descoberta que se deu a conhecer há pouco tempo. É o cenote de Hoyo Negro, onde se encontraram os restos de uma rapariga, com cerca de 15 anos, conjuntamente com ossos enormes, neste caso de outro gonfotério, outro parente dos mamutes, num estado maravilhoso de preservação. Vou dizer-vos o seguinte: extraiu-se um dente a esta mulher, fizeram-se análises e obteve-se o ADN. Com isto, supõe-se que esta mulher, em especial, era descendente da gente que atravessou o estreito de Bering, e que vinha da Ásia. Este tipo de respostas, este tipo de conservação é o que nos dá este contexto maravilhoso. Como se isto fosse pouco, aqui viveram os nossos antepassados maias, que tinham uma inclinação especial para as grutas e cenotes porque eram considerados, na sua visão do cosmos, como os locais de onde tinha emanado a vida, o primeiro grão de milho para o homem e de onde vinha a chuva, de onde vinham coisas boas mas também vinham os males. Quando vemos uma foto destas, umas fotos extraordinárias dos meus colegas da National Geographic — esta é de Paul Nicklen — podemos dar-nos conta de qual teria sido o sentimento dos nossos antepassados maias. Assim, começa a desenvolver-se uma nova disciplina científica que é a arqueologia de grutas e cenotes. Estamos a mergulhar num aquífero, com milhares de quilómetros de água, com milhões de litros de água, um recurso que tende a esgotar-se, um recurso que em breve será mais valioso do que o petróleo, e no qual está depositada uma grande quantidade de materiais arqueológicos num ótimo estado de preservação. Mas este aquífero incrível dá-nos respostas não apenas para o povoamento não apenas respostas sobre os rituais que os antigos maias praticavam, mas também, quando vemos uma foto como esta, e vemos uma entrada de luz tão especial... Este é um cenote que se chama Holtún e está no sítio arqueológico de Chichén Itzá. Esta foto também é de Paul Nicklen, fotógrafo da National Geographic. Tenho o enorme prazer de vos dizer que, nesta foto, estão os primeiros dois latinos que aparecem numa capa da National Geographic. Esta foi a capa de agosto de 2013. É o meu colega Dante Garcia e um empregado. (Aplausos) Obrigado. Muito obrigado. Isto, obviamente, é uma grande satisfação para nós, enquanto latinos, mas estas fotos também nos deram uma forma de entender melhor o contexto. Reparem que esta luz que estão a ver, que está por detrás da pessoa que está à corda, é a luz de uma entrada que foi aberta artificialmente pelos antigos maias, com a forma de um retângulo que era a forma do seu universo que tinha quatro cantos. Para nós são o norte, o sul, o este e o oeste, e para eles eram o amarelo, o vermelho, o branco e o preto. Havia um quinto caminho neste universo que era o centro, o "eixo do mundo", o eixo sagrado de onde emanava tudo. Deram-se ao luxo de abrir uma entrada numa certa direção para que o sol só entrasse duas vezes por ano de uma forma especial. Ou seja, era um observatório astronómico solar. Estas são todas as informações importantes que os cenotes nos estão a dar. Vemos esta foto impressionante desse dia, em especial, em que o sol entra de um modo totalmente vertical. Esta luz chega ao fundo a 50 metros de profundidade. É um momento mágico poder estar ali e confirmar que os maias tinham uma grande sabedoria, como todos os povos mesoamericanos. como todos os pré-colombianos que nos antecederam. Todo este movimento de exploração levou-nos também a locais incríveis. Há uma gruta no centro do estado do Iucatão — é a foto que estão a ver — onde há um caminho. Os maias chamavam-lhe o "sac be", o caminho branco. Eram enormes obras de engenharia. Este é o único que se encontrava dentro de uma gruta. Acontece que, no final deste caminho, está uma massa de água, um cenote. Para continuar, tivemos que mergulhar. Mergulhámos cerca de 100 metros dentro da gruta e do outro lado encontrámos a continuação do caminho na mesma direção. Começávamos a perguntar: "Como é possível que os antigos maias pudessem mergulhar?" "Como é possível que tenham conseguido chegar a este lugar?" Também começámos a ver uma série de marcas nos cenotes, de linhas de nível de água e isso começou a dar-nos uma explicação. Acontece que a água estava a subir e a baixar, estava a flutuar. Houve muitas alterações climáticas ao longo dos séculos, nos últimos milhares de anos. Houve aquecimentos da Terra. deixou de chover. Estas secas intensas que poderão ter acontecido desde a Idade do Gelo até à era dos maias, estão a manifestar-se sob a forma de material arqueológico. O caminho de que vos falo, um crânio depositado numa espécie de altar natural, ao qual se tem acesso apenas mergulhando. Perguntávamos: "Como é que os maias chegaram ali?" Neste mesmo cenote Holtún, de que vos falei, encontrámos uma enorme oferenda, que está a oito metros de profundidade. Este foi o elemento que nos deu a ideia, que nos deu a resposta de como seria possível que os maias entrassem a mergulhar. Não entravam a mergulhar. O nível da água era mais baixo durante esta seca enorme, que está documentada pelos paleoclimatólogos. Vemos que há uma oferenda perfeitamente arrumada com materiais em certos cantos do universo, que eram representativos de certas coisas. Mas tudo nos leva a uma coisa. Tudo nos leva a um culto da água. Ao culto da chuva. Ao desespero para que chovesse. Tinham água para beber, nunca se esgotava, mas como ter água para as culturas? Segundo parece, os maias passam grandes dificuldades quando o nível da água desce, quando deixa de chover durante 5, 6, 10 anos. Então, entram diretamente nas entranhas das divindades — neste caso, as entranhas do deus da chuva, Chaac — e pedem-lhe: "Chaac, por favor, faz chover". Fazem sacrifícios nesta plataforma. Isto provavelmente é o que está a suceder por causa de uma grande seca. Estes são os lados muito agradáveis de tudo isto. Mas também há problemas e é importante contá-los. A minha prática chama-se "Proteger o grande aquífero". Esta foto faz parte desta investigação, de outro lugar onde encontramos sinais de mudança no nível da água. É uma foto de um local belíssimo. Foi tirada em 2006. Em 2006, durante este projeto, fizemos uma apresentação numa vila, numa povoação chamada Homún, a capital do município. Os habitantes, em especial o senhor presidente do município, ficaram encantados com a fotografia. Disseram-nos: "Que local é esse? "É um lugar maravilhoso para explorar turisticamente". Obviamente, ficámos com um pouco de medo, mas propusemos alternativas para fazer um turismo consciente e sustentável. Mas eles foram muito rápidos e ultrapassaram-nos. Acontece que quiseram fazer este cenote mais bonito. Para fazê-lo mais bonito, destruíram a entrada. Vemos uma diferença enorme. Entra uma grande quantidade de luz. Alteraram o equilíbrio de toda a gruta. Perdeu-se material arqueológico. Perderam-se estalactites, essas formações maravilhosas. — É melhor tirá-la e pôr a foto bonita. Neste local, havia manifestações de pinturas rupestres nas paredes, manifestações de mãos, que são muito vulgares nas grutas, que desapareceram porque, quando entrou a luz, esta destruiu-as. Manifestações de mãos como estas que vimos nesta gruta. Mãos pintadas. Vemos estalactites cortadas intencionalmente de modo ritual. Os maias e os pré-colombianos cortavam as estalactites porque eram sinal de fertilidade. Por vezes, colocavam-nas em sepulturas ou punham-nas como oferendas aos deuses da chuva, para que chovesse. Mas esta foto que estão a ver por acaso não é de Iucatão. Quando preparei esta palestra fiquei surpreendido e investiguei um pouco a arqueologia da Nicarágua. Este é um local de aqui, na Nicarágua, a norte, perto da fronteira com as Honduras. O local surpreendeu-me pela semelhança com alguns dos nossos sítios e também por este costume de cortar as estalactites, talvez para alguma oferenda. No Iucatão, temos locais com muitas destas manifestações e quando o vi aqui... Segundo a investigação da Universidade Aberta, dizem que é a gruta mais a sul da Mesoamérica onde se veem estas manifestações. Tenho a certeza que vamos encontrar muito mais coisas, se nos dedicarmos, uma coisa que quero fazer, se me aceitarem neste país maravilhoso. (Aplausos) Obrigado. Muito obrigado. (Aplausos) Que amáveis. Obrigado. Esta foto que estamos a ver também é da Nicarágua. É desta mesma gruta. Chama-se "Cueva La Conga". Há mãos e há dois elementos que atraíram a minha atenção. Em cima, quase ao centro, há uma espécie de sol, olho ou inseto, que se repete na parte inferior, à esquerda. Há anos, quando mergulhei num cenote em Chichén Iztá — um cenote muito profundo, com 75 metros de profundidade — encontrámos uma vasilha que nos deixou intrigados porque é o único desenho que vimos deste tipo no Iucatão ou na península em geral, na cerâmica maia em geral. Encontro-me com o mesmo padrão nesta gruta. Isto foi maravilhoso porque vejo que há um ponto de união. De manhã, estávamos a tomar o pequeno-almoço e César, que apresentei há pouco, disse uma coisa — porque estávamos a falar da comida riquíssima e da parecença com algumas coisas que comemos no México — e disse-me: "Somos os mesmos". Tem toda a razão. Estamos a ver isso desde as nossas origens, desde há muito tempo. Somos os mesmos. Somos americanos. Temos os mesmos antepassados. Esta é outra foto da mesma gruta. Nas grutas, às vezes, encontramos estas manifestações fantásticas das formações das grutas. Chamo-lhes "guardiãs" das grutas. Vemos que há aqui uma guardiã dentro do quadro amarelo. É uma espécie de animal, a que os habitantes da zona gravaram os olhos e, de certo modo, modificaram a cara para torná-la mais animal, para que fosse uma espécie de eu chamo-lhes "guardiãs" porque parece estarem a proteger a gruta, são como divindades do inframundo. Surpreende-me porque, no Iucatão, temos esta outra "guardiã", que também foi gravada numa rocha e a que também pintaram olhos, e acrescentaram as orelhas. Estamos a ver um mesmo padrão cultural, uma mesma forma de adorar os sítios sagrados, uma união na forma de fazer oferendas aos deuses da chuva e à água. A água, este elemento vital e indispensável, que nos damos ao luxo de desperdiçar por toda a parte, que nos damos ao luxo de contaminar. Devemos ter um grande cuidado com ela. Esta é outra semelhança impressionante. Noutra gruta... —não registámos exatamente o nome da gruta na investigação — mas a figura que tem em cima à esquerda é nicaraguense. Em baixo à direita é uma gruta no Iucatão, perto de um local chamado Uxmal. Ambas são manifestações que alguns investigadores interpretaram — e eu concordo — como uma imagem de Tláloc. Tláloc é o deus da chuva mas do centro do México. É como uma representação de Tláloc. Estamos a falar de novo da água, da chuva. E estamos a ver de novo a manifestação em arte rupestre nas duas zonas, em zonas aparentemente distantes e que não tiveram nada a ver entre elas. Mas parece que, afinal, têm tudo a ver. Este local, este país maravilhoso. Nestas fotos muito antigas deste lago, vemos tubarões de água doce e um peixe-serra enorme, que é um animal em perigo de extinção em todo o mundo. Espero que ainda existam muitos. O mais importante de estes dois animais é que vivem, suponho, em água doce. Todos conhecemos o importantíssimo fenómeno de animais que conseguiram evoluir que, normalmente, vivem em água salgada e que estão a viver nestas massas de água incríveis da Nicarágua. É uma missão importante. Vejo muitos jovens e isso alegra-me. É uma missão muito importante a que os jovens e os menos jovens, todos nós nos dediquemos, todos nós nos empenhemos em proteger maravilhas naturais e culturais que partilhamos e que nos esqueçamos de fronteiras políticas e geográficas. É um todo. Somos os mesmos. E devemos protegê-lo. Estão a ver estas imagens maravilhosas que nos dão tanta paz. Uma mãe a dar banho ao filho com água do lago. Que melhor sinal de vida, de otimismo e de esperança podíamos ter? Eu ia começar a dizer-lhes que todos sabemos que há uma ideia revolucionária de fazer um canal que não é novidade, já tem muitos anos e é muito polémico. Já conversei com muitos de vocês e as opiniões dividem-se. Creio que qualquer que seja a medida que vier a ser tomada, seja o que for que aconteça, espero que seja de modo muito organizado. Sei que há aspetos muito benéficos. Estive a ler um relatório de um arqueólogo nicaraguense que dizia que, graças apenas aos trabalhos do traçado, se encontraram mais de 250 locais arqueológicos. Isto é maravilhoso. Isto é uma coisa muito importante que pode ser, não um dano colateral, mas um efeito colateral, e devem aproveitar-se estas coisas. Mas onde está a resposta? Quem pode proteger este país? Quem pode proteger as suas riquezas naturais? Quem pode proteger a sua cultura? Claro que são vocês. Temos estado a ver palestras maravilhosas que nos têm falado, precisamente do poder das pessoas. O poder está em todos nós. Simplesmente, temos que mudar a nossa mentalidade. Temos que conhecer o que temos, Creio que é esse o primeiro passo. Saber o que é que existe para poder protegê-lo, amá-lo. Não vamos protegê-lo se não o amarmos. É em nós que reside esta escolha que os maias enfrentaram, de vida ou morte, esta dicotomia que podemos ver claramente num cenote. A vida, a água, tudo e a morte. Espero que possamos ver-nos mais amiúde neste país. Eu estou ao vosso dispor. Estou encantado por estar aqui convosco. Muito obrigado. (Aplausos)