O mestre zen Thich Nhat Hanh responde
(Sino) Podemos sentir medo e frustração
quando vemos todas as guerras do mundo.
Como podemos transformar esses sentimentos
em compaixão e pacificação ativa?
Querido Thay, querida sangha.
Eu estava na Igreja Riverside,
em Nova Iorque
em 2001 quando você veio para uma breve
conferência depois do 11 de setembro.
Foi no mesmo local onde Dr. King foi fazer
seu discurso contra a guerra do Vietnã
- uma postura, lembramos com gratidão,
que foi influenciada pelo tempo
que ele passou com você
Você falou da sua própria experiência da
tragédia da guerra, e você estava entre
as poucas vozes que eu posso
lembrar da época
que defendiam aproveitar o momento
para trabalhar pela paz.
Muitos de nós, atualmente,
podemos estar sentindo medo, raiva,
desespero
ao ver quantas guerras são travadas
em nosso nome.
Assim como você fez com o Dr. King,
você pode nos orientar sobre
como podemos tranformar esses sentimentos
em compaixão e pacificação interativa?
Como você sabe, eu estava nos
Estados Unidos
quando aconteceu o 11 de setembro.
Aquele dia eu estava indo do Deer Park
até o norte da Califórnia para organizar
retiros e conferências públicas.
E enquanto preparávamos o ônibus,
nós ouvimos sobre o ocorrido.
Eu deveria dar uma palestra em Berkeley
quatro dias depois.
E nós experimentamos
a energia coletiva de medo e raiva
nos Estados Unidos.
Medo e raiva.
Nós sabemos que a energia coletiva
da compaixão pode ser curadora,
mas a energia coletiva de medo e raiva
pode ser muito perigosa.
Ela pode começar uma guerra
a qualquer momento.
Então meu propósito
nessas palestras foi pedir
aos estadunidenses
para praticar a respiração consciente
com o objetivo de acalmar
seus sentimentos, suas emoções.
Essa é coisa mais importante a ser feita.
É por isso que na conferência
em Berkeley
- com presença de 4.000 pessoas -
nós vestimos nossos mantos da sangha,
a túnica de cor laranja,
e praticamos meditação na compaixão
e tentamos acalmar
- ajudar as pessoas a se acalmar.
Você podia ver o sofrimento no rosto
das pessoas... aquele dia.
E nós soubemos que depois daquela palestra
as pessoas sofreram menos,
só de olhar nos seus rostos
você sabia que elas sofriam menos
depois de uma guiada meditação
na compaixão
e se acalmaram.
Mas isso é apenas para poucos
milhares de pessoas.
A conferência na Igreja Riverside tinha
o mesmo propósito.
E nós aconselhamos nossos amigos
nos Estados Unidos
a não fazer nada ainda.
Não dizer nada ainda.
A primeira coisa a fazer é se acalmar.
E então começar a olhar para a situação
e fazer a pergunta:
por que eles fizeram tal coisa conosco?
Nós fizemos algo
que os deixou tão bravos conosco...
que os deixou tão desesperados
que eles pudessem cometer... tal ato?
Eu propus que
- conforme a tradição a que pertencemos
- Eu propus que
os Estados Unidos organizassem
sessões de escuta profunda.
Nós deveríamos convidar muitos
estadunidenses sábios
para ir e nos ajudar a escutar.
E nós convidamos pessoas
nos Estados Unidos
que sentiam que elas eram vítimas
da injustiça social e assim por diante
para comparecer e nos contar sobre
seus sofrimentos.
E nós propusemos que essas sessões
de escuta profunda nos Estados Unidos
fossem televisionadas
- então todo mundo poderia acompanhar.
Isso foi para escutarmos
nosso próprio sofrimento
- nosso próprio sofrimento.
E entender nosso próprio sofrimento
antes de querer escutar o sofrimento
das pessoas do outro lado.
Isso é muito leal a nossa prática.
Você escuta seus próprios
sofrimentos primeiro
antes de escutar o sofrimento
da outra parte.
E depois que você escutou profundamente
no seu próprio país,
você vira para as pessoas lá
e usa o discurso amoroso.
"Querido amigos de lá,
nós sofremos muito.
Nós não entendemos
porque vocês fizeram tal coisa conosco.
Nós fizemos algo com o objetivo
de tentar destruí-los como povo?
como uma religião? como um estilo de vida?
Nós podemos ter feito algo;
ou podemos ter dito algo
que lhes deu a impressão
de querer destruí-los
como povo, como religião,
como estilo de vida.
Mas na verdade,
nós não temos essa intenção.
Então diga-nos o que nós fizemos,
o que nós dissemos, que lhes deu
esse tipo de impressão.
Nós sabemos que vocês devem ter ficado
muito bravo conosco
para terem feito tal coisa.
Nós gostaríamos de escutar.
Por favor conte-nos... do seu coração.
Conte-nos sobre seu sofrimento...
e nossa falta de habilidade
- em fazê-los sofrer."
E isso foi o que eu propus
para os Estados Unidos
naquela época.
E esse é o processo de
restaurar comunicação e reconciliar.
E na última primavera
- a primavera deste ano,
eu fui para a Coreia e realizei retiros
- nós fizemos retiros
e conferências públicas.
E houve uma conferência pública
na Coreia do Sul
da qual participaram muitas pessoas
- talvez 20.000 pessoas,
e eles anunciaram
que eles iriam organizar
uma enorme cerimônia de prece
pela paz
entre o Sul e o Norte.
Coreia do Norte agora tem armas nucleares
e elas parecem ser beligerantes.
E o Sul está temeroso,
e eles têm medo que uma guerra
possa irromper pronto.
Então na conferência eu disse:
"Queridos amigos.
O perigo não são as armas nucleares.
O perigo é o medo.
Se você olha profundamente no Norte,
você vê uma enorme quantidade de medo.
Quando o presidente do Sul
visitou os Estados Unidos,
o Norte pode ter pensado
que deveria ser um esquema
para atacar o Norte,
então eles ficaram com muito medo.
E eles estão fazendo seu melhor
para mostrar que não estão com medo,
que eles estão prontos para lutar e matar.
Então, a atitude beligerante externa,
na aparência, mostra que há
um grande medo interno.
E se você olha aquele medo, você não...
- você não fica mais bravo com eles.
E você sabe que a melhor coisa
é tentar ajudar a remover aquele medo
das pessoas no norte.
Mas para isso,
você precisa remover o medo
em você primeiro.
Porque você também tem medo.
E é por isso que uma prece pela paz
não é o bastante.
Vir se juntar e rezar não é o suficiente.
Você tem que criar -
você tem que organizar retiros
para políticos, professores,
líderes de negócios,
e ajudá-los a olhar profundamente,
para acalmá-los - para eles se acalmarem,
e remover o medo deles de entendimento.
E quando você está livre do medo,
você pode ajudar o Norte a fazer o mesmo.
Então, não é com manobras políticas
que você pode resolver o problema.
É aquele tipo de prática
que pode remover a raiva e o ódio em nós
que pode nos fazer mais pacíficos
e compassivos.
E quando você é mais pacífico
e compassivo,
você pode ajudar as pessoas
do outro lado
a fazer o mesmo
- para ser um real pacificador.
Esse é o processo que nós aprendemos
na tradição budista.
E como a Coreia do Norte e a Coreia do Sul
tiveram o budismo
como suas tradições espirituais,
nós acreditamos que eles podem
fazer um bom uso de sua tradição
de modo a praticar
de forma a sair
dessa situação difícil.
E eu acho que as mesmas coisas
deveriam ser verdadeiras
- no Oriente Médio,
na Europa, nos Estados Unidos
e assim por diante.
Conecte
Inspire-se
Nutra-se
(Sino)