Em 2008, recebi um telefonema incomum de um cara chamado Joe Graedon. Ele disse que estava sendo metralhado com queixas de pacientes que recentemente haviam mudado para medicamentos genéricos. Joe era farmacologista formado e coapresentador de um programa de rádio na NPR. Pacientes disseram que genéricos estavam causando efeitos colaterais indesejados ou até recaídas. Joe acreditou nas reclamações deles. Mas quando relatou essas queixas à FDA, os funcionários de lá argumentaram: "Provavelmente era psicossomático. Os pacientes ficam chateados com pílulas que parecem diferentes das antigas". Joe não cai nessa. Queria alguém com poder de fogo investigativo para se aprofundar nisso, e como eu era jornalista investigativa, ele me ligou. E então fez uma pergunta que eu não consegui tirar da minha cabeça: "Katherine, o que há de errado com os medicamentos?" Passei os dez anos seguintes tentando achar a resposta. Nosso sistema de saúde depende dos genéricos. Minha família também. Mas uma década de entrevistas, reuniões com denunciantes, relatórios no local em quatro continentes e milhares de arquivos confidenciais da FDA, de empresas de medicamentos genéricos e dos tribunais, todos me apontaram na mesma direção: um grande número de fabricantes de medicamentos genéricos em certos países estrangeiros aprovam medicamentos abaixo do padrão como genéricos legítimos por lucro. Estão desrespeitando deliberadamente os regulamentos e normas da FDA. Basicamente, estão cometendo fraudes. No processo, estão arriscando a saúde de pacientes em todo o mundo, ou até colocando em risco a vida deles. Uma empresa líder na Índia já fechou por causa dessa atividade ilícita. Eu queria saber: "Essa empresa foi um caso isolado ou a ponta do iceberg?" O que eu descobri é inquietante, e quem toma medicamentos genéricos tem o direito de se preocupar profundamente. Se você é cético em relação a isso, está certo. Eu via genéricos como uma das grandes inovações em saúde pública mundial, uma vitória gigante para pacientes no mundo todo. Hoje, 90% dos medicamentos são genéricos. Genéricos para o HIV/AIDS salvaram muitas vidas na África. Nos EUA, programas como "Medicare", "Medicaid" e "Affordable Care Act" dependiam deles. Em um mercado de medicamentos muito caro, os genéricos eram o azarão heroico. Mas minha maior suposição era baseada na garantia da FDA de que medicamentos genéricos adequadamente regulamentados não são apenas seguros e eficazes, mas bioequivalentes, intercambiáveis com a marca e entre si. Bem, isso é verdade, se as empresas seguirem as regras. Mas dentro de fábricas remotas, descobri um conjunto diferente de regras não escritas. Comecei minha investigação focando a estrutura regulatória. Imediatamente, um fato me surpreendeu: a FDA não examina as inscrições do fabricante testando os medicamentos. Em vez disso, analisa os dados da empresa. Como o diretor de medicamentos genéricos da FDA me disse: "O sistema de aprovação requer o comportamento ético do candidato. Caso contrário, todo o castelo de cartas cairá". Sério? É o sistema de honra? (Risos) Após nove meses de investigação, publiquei meu primeiro artigo sobre genéricos. Escrevi sobre pacientes que haviam mudado para medicamentos genéricos e sofreram contratempos médicos. Citei médicos que questionaram se os genéricos realmente eram bioequivalentes à marca. Um mês depois, recebi um e-mail anônimo de alguém que se denominava "Refil de US$ 4". (Risos) É o que se pagaria para preencher uma receita genérica no Walmart. O meu denunciante trabalhava na indústria de medicamentos genéricos. Ele disse que se eu realmente quisesse descobrir o problema, era melhor procurar onde a maioria dos nossos medicamentos genéricos é fabricada: na Índia e na China. Meu denunciante estava certo: 80% das fábricas que produzem o ingrediente ativo de todos os nossos medicamentos, de marca ou genérico, estão no exterior, principalmente na China e na Índia. Qualquer empresa de medicamentos genéricos em qualquer lugar do mundo querendo aprovação para vender medicamentos em nosso mercado precisa seguir regras conhecidas como "Boas Práticas de Fabricação". Eu decidi aprender todos os detalhes de como fabricar um medicamento genérico legítimo. Num laboratório de Nova Jersey, observei enquanto os técnicos faziam testes em máquinas especializadas e frascos usados que imitam as condições do estômago para medir a dissolução de drogas. Mas um fato notável se destacou. O laboratório proibiu o uso do corretivo líquido "Wite-Out", o "branquinho", em suas instalações. Sob as regras da FDA, os dados servem como o pilar da qualidade. Eles devem ser coletados em cada etapa da fabricação, preservados e compartilhados com os reguladores. O Wite-Out era de alto risco. Permitia alteração. Ficou claro que, para o regime regulatório da FDA ter sucesso, qualquer empresa que solicita a aprovação deve ser ética, e seus dados devem estar intactos. Mas e se nenhum deles for verdadeiro? E se o requerente não fosse ético? E se os dados não estivessem intactos? Comecei a escutar sobre uma empresa na Índia chamada Ranbaxy, a maior empresa farmacêutica do país, uma de suas primeiras multinacionais de sucesso e um dos fornecedores de genéricos que mais cresce no mercado dos EUA. Um denunciante estava fornecendo documentos internos da Ranbaxy à FDA. Eu consegui cópias. Decifrar tabelas, gráficos e números da empresa revelou uma fraude chocante. Eles substituíam ingredientes não aprovados e de menor pureza. Produziam documentos como procedimentos operacionais padrão que deixavam durante a noite num tipo de sauna para fazê-los parecer velhos. Criavam estudos de estabilidade de 3, 6, 9 e 18 meses, todos gerados no mesmo dia. Gradualmente, pude descobrir a história por trás desse pesadelo regulatório. Em 2004, a Ranbaxy contratou um novo diretor de pesquisa e desenvolvimento. Ele suspeitou que algo estivesse errado. Pediu a um jovem engenheiro chamado Dinesh Thakur que estudasse os dados em todas as solicitações de medicamentos para descobrir se eram reais ou falsos. Thakur acabou preparando um PowerPoint inacreditável mostrando que a Ranbaxy havia falsificado dados de mais de 200 produtos em mais de 40 países. O novo diretor de pesquisa e desenvolvimento mostrou o PowerPoint a um subcomitê da diretoria. O subcomitê requisitou o relatório e eles destruíram o laptop no qual ele foi criado. Então forçaram Thakur a sair da empresa. Ele não conseguia dormir, pensando nos medicamentos perigosamente ruins da Ranbaxy. Então, arriscou a vida para alertar a FDA. Após uma investigação de oito anos, a Ranbaxy se declarou culpada por sete crimes por falsificação de dados. Uma consultora da FDA me ensinou que, assim como roupas baratas feitas em fábricas distantes, ou "moda rápida", como ela chamava, havia "medicamentos rápidos" também, feitos em fábricas farmacêuticas exploradoras no exterior com ingredientes de baixa qualidade e atalhos na fabricação. Na Cidade do México, sentei-me em um bar com um denunciante. Ele me deu documentos revelando como a fábrica de genéricos que reduz custos, onde ele trabalhava, conscientemente liberou lotes de remédios que continham partículas de vidro. Em Accra, capital do Gana, médicos explicaram como remédios indianos e chineses de baixo custo de todo tipo mal pareciam funcionar, mesmo quando dobravam e triplicavam as doses. Em Mumbai, conheci outro denunciante de uma empresa que eu pensava ser ética. Ele descreveu o eficaz sistema de manipulação de dados que a empresa usava para aprovar rapidamente medicamentos comprometidos. Com lágrimas rolando pelo rosto ele disse: "O que está acontecendo na indústria é absurdamente sujo". Nos EUA, uma fonte confidencial que trabalhava no governo me entregou um pen-drive contendo mais de 20 mil documentos internos da FDA. Os e-mails e memorandos revelaram como a missão de saúde pública da agência, que é a de proteger os consumidores, frequentemente colidia com sua missão política; mostrar ao Congresso um fluxo constante de aprovações de remédios de baixo custo. Eu também descobri o sistema de inspeção comprometido da FDA das instalações farmacêuticas no exterior. Nos EUA, pesquisadores da FDA chegam sem aviso prévio para fazer auditorias surpresa. No exterior, porém, a FDA dá às fábricas notificações com meses de antecedência, chegando a pedir a ajuda da empresa com o transporte terrestre e hotel. Minhas fontes também falaram sobre auditorias encenadas, em que equipes de fabricantes de dados inventam ou alteram documentos necessários para criar uma fachada de conformidade muito antes da chegada da FDA. Um intrépido investigador da FDA chamado Peter Baker descobriu como encontrar a verdade. Ele ignorava os dados impressos e analisava os computadores da empresa. Quando os arquivos eram excluídos, ele achava metadados revelando testes ocultos. As empresas estavam pré-filtrando medicamentos para alterar os testes oficiais para que atendessem às especificações da FDA. Como eu disse, esse problema é mais do que um punhado de maus atores. Durante 4 anos, Peter Baker inspecionou 86 instalações na Índia e na China. Achou evidências de fraude em 67 delas. Querem saber o que acontece com um lote de medicamentos que falham nos testes? Deveria ser jogado fora. Em vez disso, instalações de baixo custo os vendem em mercados mal regulamentados que não entendem o que estão recebendo, lugares como a África, o Sudeste da Ásia e a própria Índia. A indústria de genéricos no exterior chama isso de "produção em pista dupla": melhores medicamentos para alguns, defeituosos para outros. Nos países em desenvolvimento, este sistema corrupto inundou o mercado com tantos medicamentos ruins que pesquisadores de saúde pública os vinculam ao aumento de infecções resistentes a medicamentos. Mas o comportamento criminoso de empresas estrangeiras é apenas metade do problema. Embora alguns reguladores aparentemente não percebam que estão sendo enganados, nos EUA, nossos reguladores parecem dispostos a ignorar transgressões para continuar com medicamentos de baixo custo permitidos. Como resultado, pacientes americanos receberam medicamentos genéricos com impurezas tóxicas, ingredientes não aprovados, partículas perigosas ou que não são bioequivalentes. Como afirmou o investigador da FDA Peter Baker, se as pessoas realmente entendessem como funciona, ninguém usaria esses medicamentos. Existem maneiras de resolver esse problema global? Sim, existem. As soluções começam com o reconhecimento de que nosso atual sistema de honra para regulamentação de medicamentos é uma relíquia de uma época passada. A ciência, a medicina e a economia global evoluem. A regulamentação não deveria evoluir com elas? Somente uma abordagem pode garantir genéricos de qualidade: supervisão rigorosa, incluindo auditorias sem aviso prévio e testes sistemáticos de medicamentos. Uma supervisão rigorosa significa que reguladores não observam apenas os dados que podem ou não ser genuínos. Soluções eficazes também dependem de dar mais informações ao paciente. Sabemos onde são feitos nossos cereais matinais e nossos tênis de corrida. Por que é diferente com medicamentos genéricos? Os pacientes podem fazer mais. Podem dizer aos oficiais eleitos e organizações de consumidores para exigirem tanta qualidade quanto eles exigem acesso. As organizações de consumidores podem prestar um ótimo serviço a seus membros testando e classificando genéricos, como fazem com carros e máquinas de lavar. As grandes redes de farmácias devem isso ao público, testar os medicamentos que distribuem. Uma compra numa farmácia para medicamentos acessíveis não deve vir com um custo oculto. Agora é a hora de todos nós que nos preocupamos com a segurança do paciente agirmos sobre o que sabemos. Obrigada. (Aplausos)