Tendo sido criado no Wisconsin, passei muito tempo ao ar livre. Na primavera, eu respirava a fragrância inebriante dos lilases. No verão, eu adorava o brilho elétrico dos vaga-lumes piscando nas noites abafadas. No outono, os pântanos se enchiam com o vermelho brilhante do cranberry. Até o inverno tinha seus encantos, com os ramos natalinos dos pinheiros. A natureza sempre foi fonte de admiração e inspiração para mim. Ao longo da minha graduação em química, e nos anos seguintes, comecei a entender melhor o mundo em detalhes moleculares. Todas as coisas que acabei de mencionar, do aroma dos lilases, os pinheiros, até o vermelho brilhante do cranberry e o brilho dos vaga-lumes, têm pelo menos uma coisa em comum: elas são feitas de enzimas. Como disse, cresci em Wisconsin, então obviamente gosto de queijo e dos Green Bay Packers. Mas vou me deter um pouco no queijo. Pelo menos nos últimos 7 mil anos, os seres humanos têm extraído uma mistura de enzimas do estômago de vacas, ovelhas e cabras, adicionando-a ao leite. Isso faz o leite coagular, e é parte do processo de fabricação do queijo. A enzima-chave nessa mistura se chama quimosina. Vou mostrar como ela funciona. Tenho aqui dois tubos, e vou adicionar quimosina num deles. Só um minutinho. Meu filho Anthony, de oito anos, me ajudou a preparar esta apresentação para vocês, daí fomos pra cozinha fatiar abacaxis, extrair enzimas de batatas Asterix e fazer todo tipo de experimento. E, no final, achamos que o da quimosina ficou bem legal. Bem, a quimosina fica nadando no leite e se liga a uma proteína chamada caseína. Daí, ela corta a caseína... é como uma tesoura molecular. É esse corte que faz o leite coalhar. Aqui estamos nós na cozinha trabalhando nisso. Tudo bem. Vou sacudir os tubos. Vou colocar estes de lado, e deixá-los misturar um pouco. Ótimo. Se o DNA é o projeto da vida, as enzimas são as operárias que o executam. Uma enzima é uma proteína que é um catalisador que agiliza ou acelera uma reação química, assim como a quimosina aqui está acelerando a coagulação do leite. Mas não tem a ver só com o queijo. Embora as enzimas tenham papel importante em nossa alimentação, elas também estão envolvidas em tudo o mais, desde a saúde infantil até o combate a um dos maiores desafios ambientais de hoje. Os tijolos da construção das enzimas se chamam aminoácidos. Existem 20 aminoácidos comuns, e normalmente os designamos por letras, abreviações, então é realmente uma sopa de letrinhas de aminoácidos. Numa enzima, os aminoácidos se ligam como as pérolas num colar. E a identidade dos aminoácidos tem a ver com as letras desse colar e em que ordem elas aparecem, que palavras formam, conferindo propriedades únicas a uma enzima e a diferenciando de outras. Essa cadeia de aminoácidos, esse colar, faz parte de uma estrutura de ordem superior. E, se eu der um zoom no nível molecular e observarmos a quimosina, que é a enzima que atua aqui, veremos algo assim: um monte de fios, laços, hélices, voltas e curvas, que precisam dessa conformação exata pra funcionar corretamente. Hoje em dia, podemos produzir enzimas em micróbios, que podem ser uma bactéria ou uma levedura, por exemplo. Para tanto, pegamos um pedaço de DNA que codifique uma enzima em que estejamos interessados, inserimos no micróbio e deixamos que ele use seus próprios meios para produzir a enzima para nós. Então, hoje, para obter a quimosina, não precisamos de um bezerro; podemos obtê-la de um micróbio. O mais legal atualmente é poder selecionar sequências de DNA personalizadas para produzir as enzimas que queremos, coisas que não existem na natureza. Para mim, a parte divertida é tentar projetar enzimas para um novo uso, organizando os átomos exatamente para tal. O ato de tirar uma enzima da natureza e brincar com esses aminoácidos, mexer com essas letras, colocando algumas, tirando outras, reorganizando-as um pouco, talvez, é um pouco como encontrar um livro, editar alguns capítulos ou mudar o final. Em 2018, o Prêmio Nobel de Química foi para o desenvolvimento dessa abordagem, conhecida como "evolução dirigida". Atualmente, podemos aproveitar os poderes da evolução dirigida para projetar enzimas com fins personalizados, e um deles é projetar enzimas para serem usadas em novas áreas, como lavagem de roupa. Assim como as enzimas do corpo nos ajudam a digerir a comida que ingerimos, as enzimas no detergente da roupa podem nos ajudar a dissolver as manchas dela. Ocorre que 90% da energia gasta na lavagem vem do aquecimento da água. E por uma boa razão: a água mais aquecida facilita a limpeza das roupas. Mas e se pudéssemos lavar com água fria? Certamente economizaríamos algum dinheiro e, além disso, segundo cálculos feitos pela Procter and Gamble, se todas as famílias nos EUA lavassem as roupas com água fria, economizaríamos 32 toneladas métricas de emissões de CO2 por ano. Isso é muito; é o equivalente ao dióxido de carbono emitido por 6,3 milhões de carros. Então, como projetar uma enzima para realizar essas mudanças? As enzimas não evoluíram para lavar roupa suja, muito menos em água fria. Mas podemos ir para a natureza e encontrar um ponto de partida, uma enzima com alguma atividade inicial, uma matéria-prima com que possamos trabalhar. Temos aqui um exemplo dessa enzima, e podemos, como disse, brincar com esses aminoácidos, colocando algumas letras, tirando outras, reorganizando-as. E, ao fazer isso, podemos criar milhares de enzimas. E podemos pegá-las e testá-las em microplacas como esta. Esta placa contém 96 poços, e em cada poço há um pedaço de tecido com uma mancha. Podemos medir a eficácia de cada uma dessas enzimas para remover as manchas dos pedaços de tecido e, assim, ver como está funcionando. E podemos fazer isso usando robótica, como verão daqui a pouco na tela. Daí, fazemos isso, e ocorre que algumas das enzimas estão meio que no estágio inicial. Nada que mereça atenção. Algumas são piores, então nos livramos delas. E algumas são melhores. Aquelas melhoradas se tornam nossa versão 1.0. Essas são as enzimas com que queremos trabalhar, e dá pra repetir esse ciclo indefinidamente. E é essa repetição que nos permite criar uma nova enzima, algo que faça o que precisamos. E, após vários desses ciclos, acabamos chegando a algo novo. Hoje é possível ir ao supermercado e comprar um detergente de roupas que permita lavar em água fria, devido a enzimas como esta aqui. E quero mostrar pra vocês como esta funciona também. Então, tenho mais dois tubos, e, novamente, ambos contêm leite. Deixem-me mostrar: vou adicionar esta enzima num deles, e adicionar um pouco d'água no outro. Esse é o controle, então não deve acontecer nada neste tubo. Vocês podem achar curioso eu fazer isso com o leite. Mas a escolha se deve ao fato de que o leite é cheio de proteínas, e é muito fácil ver esta enzima funcionar numa solução assim, porque ela é mestre em cortar proteínas, é isso o que ela faz. Então deixem-me colocar isto aqui. E, como expliquei, ela é mestre em cortar proteínas, e podemos extrapolar o que ela faz com o leite para o que estaria fazendo com a roupa. Então, é uma maneira de visualizar o que pode acontecer. Bem, coloquei nos dois. E vou dar uma chacoalhada rápida também. Agora vamos deixar isso aqui com a amostra da quimosina, e no final voltamos pra ver. Bem, quais as perspectivas quando se fala de projetar enzimas? Certamente será mais rápido, pois há abordagens para desenvolver enzimas que permitem aos pesquisadores ter muito mais amostras do que acabei de mostrar. E, além de mexer, como falei, com enzimas naturais, alguns cientistas agora estão tentando projetar enzimas do zero, usando aprendizado de máquina, uma abordagem da inteligência artificial, para informar seus projetos de enzimas. E outros estão adicionando aminoácidos não naturais à mistura. Falei dos 20 aminoácidos comuns, eles estão adicionando aminoácidos não naturais para fazer enzimas com propriedades diferentes das encontradas na natureza. É uma área bem legal. Como as enzimas projetadas vão nos afetar nos anos vindouros? Bem, quero focar duas áreas: saúde humana e meio ambiente. Algumas indústrias farmacêuticas têm equipes para projetar enzimas para fazer drogas mais eficientes e com menos catalisadores tóxicos. Por exemplo, o Januvia, medicamento para o Diabetes do tipo 2, é parcialmente feito com enzimas. Certamente o número de medicamentos feitos com enzimas vai crescer no futuro. Noutra área, existem certos distúrbios em que uma única enzima no corpo não funciona adequadamente. Um exemplo disso é a chamada fenilcetonúria, ou PKU. Pessoas com PKU são incapazes de metabolizar ou digerir a fenilalanina, que é um dos 20 aminoácidos comuns. A ingestão de fenilalanina por pessoas com PKU traz como consequência deixá-las sujeitas a deficiências intelectuais permanentes, portanto é uma doença assustadora. Então, para quem tem filho... quem tem filho aqui? Muitos de vocês. Então já devem ter ouvido falar dela, pois todos os bebês nos EUA têm de ser testados para a doença. Lembro-me de quando furaram o calcanhar do Anthony, meu filho, para o teste. O grande desafio da doença é: o que comer? A fenilalanina está presente em diversos alimentos; é muito difícil de evitar. O Anthony tem uma alergia a nozes, e já acho difícil, mas a PKU está num outro nível. Mas, em breve, novas enzimas poderão permitir a pacientes com PKU comer o que quiserem. Recentemente, a FDA aprovou uma enzima projetada para tratar a PKU. Esta é uma ótima notícia não só para os pacientes, mas também para o campo da terapia da substituição enzimática em geral, porque existem outros alvos por aí em que essa seria uma boa abordagem. Bem, abordei um pouco a saúde, agora quero falar sobre o meio ambiente. Quando li sobre o Lixão do Pacífico, que é uma enorme ilha cheia de plástico localizada entre a Califórnia e o Havaí, e sobre microplásticos praticamente em todo lugar, achei isso perturbador. Os plásticos não vão desaparecer tão cedo. Mas as enzimas podem nos ajudar nessa área também. Recentemente descobriram-se bactérias produtoras de enzima plástico-degradável. Esforços para projetar versões aprimoradas dessas enzimas já estão em andamento. Ao mesmo tempo, há enzimas que foram descobertas e estão sendo otimizadas para fazer plásticos biodegradáveis não derivados de petróleo. As enzimas também podem ajudar na captura de gases do efeito estufa, como dióxido de carbono, metano e óxido nitroso. Bem, não há dúvida: esses são desafios enormes, e nenhum deles é fácil. Mas nossa capacidade de usar enzimas pode nos ajudar a resolvê-los no futuro, então esperamos ansiosamente por essas soluções. Mas vou voltar à demonstração; essa é a parte divertida. Começarei com as amostras com quimosina. Deixem-me colocar isto aqui. E aqui está o tubo em que coloquei água, então não deve acontecer nada com o leite. Este é o tubo que recebeu a quimosina. Dá pra ver como ficou translúcido aqui em cima. E há esse material coagulado: é queijo, que acabei de fazer nos últimos minutos. Então essa é a reação realizada pelas pessoas há milhares de anos. Acho que vou repetir isso no dia de levar os filhos pro trabalho, mas às vezes as crianças são difíceis de agradar, vamos ver. E o outro tubo que quero ver é este aqui. Esta é a enzima pra lavar roupa. E dá pra ver que é diferente do tubo com adição de água. É meio clareador, e é exatamente o que queremos na lavagem de roupas, pois queremos uma enzima que seja uma trituradora de proteínas, que as destrua, porque sempre temos manchas diferentes em nossas roupas, como achocolatado, graxa, por exemplo, e uma coisa assim vai ajudar a retirá-las. E isso também vai permitir lavar com água fria, reduzir a pegada de carbono e economizar algum dinheiro. Bem, percorremos um longo caminho nessa jornada de 7 mil anos de enzimas sendo usadas na fabricação de queijos, até atualmente, de podermos projetar enzimas. Estamos numa encruzilhada criativa e, com as enzimas, podemos editar o que a natureza escreveu ou escrever, com aminoácidos, nossa própria história. Então, da próxima vez que estiverem ao ar livre, numa noite abafada, e virem um vaga-lume, espero que pensem nas enzimas. Atualmente, elas estão fazendo coisas incríveis por nós. E, através do design, poderão fazer coisas mais incríveis ainda amanhã. Obrigado. (Aplausos)