Quando vocês olham
para estas imagens, o que veem?
Crianças felizes, sorrindo, brincando.
Agora, recordem as memórias
mais felizes de sua infância.
Sair com os amigos
da escola ou da vizinhança,
festas do pijama,
festas de aniversário,
acampamentos,
viagens esportivas.
As crianças com quem partilharam isso
podem ainda ser suas melhores amigas.
Agora, imaginem uma infância
completamente diferente.
Em que vocês estejam à margem dos jogos,
e quando perguntam a outras crianças
se podem participar, elas dizem: "Não".
Uma infância em que vocês
destroem laços sociais
acidentalmente dizendo e fazendo coisas
que entristecem e ofendem os outros.
Recentemente, trabalhei com um garoto
que me disse que era melhor eu
me apressar, me casar e ter filhos,
porque, caso contrário,
meus óvulos secariam,
eu envelheceria, ficaria gorda e enrugada,
e ninguém iria querer se casar comigo.
Não fiquei ofendida.
Ele estava somente preocupado comigo.
(Risos)
Não quis me chatear com o que disse.
E se ele entendesse que havia me ofendido,
não saberia como corrigir isso.
Erros sociais como esse
fazem parte do dia a dia de uma
a cada 68 crianças em todo o mundo.
São crianças que estão
no espectro do autismo.
Nos últimos 15 anos,
minha missão tem sido criar
um programa de terapia baseado em jogos
que as ensine habilidades para se sentirem
mais felizes, calmas e corajosas,
para fazer amizades e mantê-las.
Criar um programa que essas crianças amem,
que seja eficaz,
explore o fascínio e o interesse
delas por tecnologia,
permitindo um autoaprendizado,
com um feedback personalizado,
que seja escalável.
O acesso a tratamentos eficazes
de profissionais qualificados
é um enorme desafio mundial enfrentado
por famílias de crianças autistas.
A terapia com tecnologia demonstrou
ser a solução perfeita para esse problema.
Mal sabia eu que essa ideia formaria
a base de minha futura carreira.
Como aspirante a estudante
de psicologia de 21 anos,
aqui na Universidade de Queensland,
eu queria fazer um doutorado
que mudasse o rumo
no mundo da terapia infantil.
Naquela época, eu trabalhava
meio período como professora de flauta
para pagar o essencial
de uma universitária,
como entrada em boates,
bebidas e macarrões instantâneos.
Como professora de flauta,
tive o grande privilégio
de ensinar um menino de nove anos
que era absolutamente genial.
Vou chamá-lo Sam.
Sam praticava, incansavelmente,
suas escalas e partituras,
repetidas vezes, até alcançar
o ponto da perfeição técnica.
Nunca havia ensinado um estudante
tão dedicado e comprometido.
Mas, quando ele tocava
a flauta, soava robótico.
Não havia uma presença emocional
ao ouvinte ou ao próprio Sam.
Quando levantei essa questão,
ele enrugou o rosto e me disse:
"Mas eu não entendo,
as notas são apenas pontos
e traços na página.
Onde está dizendo algo sobre emoções?"
Ele comentou, de fato,
um ponto interessante:
a emoção que é comunicada na música
não está claramente marcada na página.
É uma experiência sentida.
Quando compartilhei
essa história com a mãe de Sam,
ela me contou que ele tinha
uma condição do espectro do autismo.
Sam era realmente bastante inteligente,
mas sofria muito com as relações sociais.
As outras crianças o achavam estranho,
porque enquanto ele gostava de matemática,
elas gostavam de esportes e Pokemon.
Ele falava em um tom de voz monótono
e seu contato visual era pouco usual.
As outras crianças o excluíam
dos jogos e atividades.
Ele não era convidado
a festas de aniversário
e era a última criança a ser
escolhida nas atividades em grupo.
A mãe de Sam não sabia o que fazer.
Ela tentava, incansavelmente,
dar-lhe o auxílio necessário,
mas descobriu que muitos
profissionais não entendiam
os desafios do isolamento social
e emocional que ele enfrentava.
Alguns até banalizavam suas dificuldades,
porque ele ia bem academicamente.
Reconhecendo as ameaças
que as dificuldades sociais de Sam
representavam para seu potencial futuro,
eu procurei, aflita, na literatura
um programa eficaz
de habilidades sociais para ele.
Porém, nenhum programa desse tipo
parecia estar disponível.
Aqueles que foram avaliados
apresentaram, em geral,
ganhos mínimos no tratamento,
pareciam muito chatos às crianças
e não estavam disponíveis ao público.
Dediquei minha vida a criar o programa
que Sam e muitas outras crianças
como ele precisavam desesperadamente.
Um programa divertido que não se baseasse
na leitura e escrita das crianças
em apostilas cansativas,
em branco e preto, cheias de texto.
Um mundo onde as crianças cocriariam,
que lhes dariam a direção necessária:
"Secret Agent Society".
(Locutor) Por favor, entre na sede
da Secret Agent Society,
onde começará seu treinamento.
Renae Beaumont: Desde o início,
minha visão era a de um jogo de computador
como base deste programa.
As crianças adoram jogos.
Parecia-me lógico explorar este interesse,
criar um jogo de computador que os ensine
habilidades de sobrevivência social.
Não poderia ser tão difícil, certo?
Errado.
Eu não tinha ideia
no que estava me metendo.
Tinha 21 anos e era uma "ninguém"
no mundo acadêmico
sem nenhuma habilidade
em programação de computadores.
Na época, não sabia nem criar
uma apresentação de PowerPoint
sem obter ajuda do departamento de TI
daqui da Universidade de Queensland.
Eu tinha mais chances de vencer na loteria
do que garantir um financiamento
que fosse significativo e suficiente
para financiar o desenvolvimento
do jogo de computador.
Então, sondei o departamento de engenharia
da computação de uma universidade próxima
e perguntei:
"Haveria alguma chance de, quem sabe,
os alunos criarem um jogo de computador
para cumprir os requisitos do curso?"
Meu pedido foi atendido
com uma resposta animadora.
Mas, tragicamente, após um ano
de trabalho cuidadoso,
entregaram-me um jogo de computador
cheio de problemas, com falhas,
e somente 60% finalizado.
Nem eu nem os alunos com quem trabalhei
percebemos que a minha visão
para esse jogo de computador
estava além da capacidade deles.
Neste ponto,
fui confrontada com a possibilidade
de abandonar o projeto completamente.
Mas então, parei um momento para pensar
por que estava fazendo meu doutorado.
Não era para obter um diploma
ou um título de doutora.
Era para criar algo que fizesse
diferença na vida das crianças.
Na vida de uma menina de 11 anos
que costumava sentar e almoçar sozinha,
ao invés de fofocar sobre meninos
e música com suas amigas.
Na vida de um menino de dez anos
que costumava sair da classe, chorando,
quando não podia fazer o trabalho escolar
em vez de respirar, pedir ajuda
e tentar o seu melhor.
De coração, acreditei
que o investimento inicial significativo
de tempo, energia e dinheiro
levaria a melhoras exponenciais
na vida dessas crianças.
Então, assumi trabalhos extras casuais,
economizei bastante
e paguei uma equipe de recém-formados
em TI para programar o jogo de computador.
Enquanto os programadores
trabalhavam no jogo
com uma equipe de consultores infantis,
desenvolvi materiais extras
do programa para ajudar as crianças
a colocar em prática as habilidades
aprendidas com o jogo de computador
na vida cotidiana.
Isso incluiu um jogo
de tabuleiro terapêutico,
um jogo de reconhecimento
do tom de voz pelo walkie-talkie
e um jogo de lógica.
Substituí as lições de casa tediosas,
que eram uma característica comum
da terapia infantil naquela época,
para missões de agentes secretos
que envolvem gravar evidências
para mostrar como eles usam
as habilidades sociais na vida cotidiana
em um diário computadorizado.
Também incluí recursos
e sessões de treinamento
a pais e funcionários de escola
para ensiná-los a ajudar as crianças
a expressarem essas habilidades
sociais na vida cotidiana.
Quando esses recursos foram desenvolvidos
e o jogo estava completo,
o teste estava pronto para começar.
Fiquei muitas noites
sem dormir, preocupada:
"E se pais e filhos odiarem o programa?
E se não funcionar?
Ninguém tinha conseguido criar
um programa de terapia eficaz.
O que me fez pensar que eu poderia?"
Mas, mesmo com essa trilha sonora penosa
e sombria que se repetia em minha cabeça,
continuei em frente.
E foi a melhor coisa que fiz,
pois o programa Secret Agent Society
fez uma diferença real na vida de crianças
e da família delas no mundo todo.
Aquela menina acostumada
a sentar e almoçar sozinha?
Foi convidada à primeira festa do pijama
e de aniversário durante o programa.
O menino acostumado a chorar e desistir
quando não sabia fazer a lição de casa?
Ele aprendeu a manter a calma,
concentrar-se e concluir a lição.
Três meses após o término do programa,
obteve seu primeiro prêmio acadêmico.
Com efeito, 76% das crianças que tiveram
dificuldades sociais significativas
no início do programa
melhoraram as habilidades sociais,
igual à outras crianças na idade deles,
até o final ou dentro
de cinco meses após o término.
Esse foi o mais significativo
progresso nas habilidades sociais
jamais divulgado por um programa
para crianças no espectro do autismo.
Pela primeira vez na vida,
essas crianças fizeram amigos de verdade
que gostavam de ficar com elas.
A visão de seus pais para o futuro delas
estava, finalmente, tornando-se real.
Com a ajuda do braço comercial
daqui da Universidade de Queensland,
fiz parceria com uma empresa
para publicar e distribuir
os materiais do programa,
e o resultado foi mais extraordinário
que qualquer coisa que poderia imaginar.
Criei um programa eficaz
de terapia baseada em jogos
que, desde então, tocou a vida
de mais de 10 mil crianças e famílias
em 9 países
e está sendo cada vez mais adotado
em escolas e clínicas em todo o mundo.
Neste momento, trabalho com colegas
da Weill Cornell Medicine, em Nova York,
para levar a pesquisa
a um nível totalmente novo.
A maioria dos testes feitos até o momento
foi em crianças no espectro do autismo.
Agora estamos analisando
a eficácia do programa
para crianças que têm outros
desafios socioemocionais,
como transtornos de ansiedade,
transtorno do déficit
de atenção e hiperatividade.
A versão completa do programa
também está sendo testada
nas escolas australianas,
graças ao Australian Cooperative
Research Centre for Living with Autism.
Neste teste, analisamos os benefícios
sociais, emocionais e acadêmicos
do programa para todos os alunos,
incluindo seu impacto ao bullying.
E isso é só o começo.
Aprimorando o jogo de computador
com a tecnologia de realidade virtual
e criando um aplicativo que alerte
e recompense as crianças
ao usarem seus dispositivos de relaxamento
e códigos sociais quando precisarem,
minha meta é liderar uma revolução
de terapia tecnológica,
para criar o Pokemon GO
das habilidades de sobrevivência social.
Qual é o meu conselho a vocês?
Pensem naquilo que mais gostaria
de ver diferente no mundo
e em maneiras criativas
para resolver este problema.
Podem não saber a resposta
certa agora ou como chegar lá,
mas vocês são inteligentes:
podem aprender as habilidades necessárias
ou, se preferirem,
cercarem-se de outras pessoas
que já têm essas habilidades.
Agora mesmo,
vocês podem ter um trabalho penoso
que paga um salário mínimo
e estarem a anos de concluírem seu curso,
mas tão logo se movam
em direção a suas metas,
não importa o quanto demore,
vocês serão bem-sucedidos.
Graças ao Sam,
eu criei algo que faz o futuro
das crianças um pouco mais iluminado.
Ao saírem de sua zona de conforto,
abraçando novas experiências,
e persistindo quando
falharem; o que farão;
poderão baixar seus sonhos da nuvem
e fazer a diferença.
Obrigada.
(Aplausos)