Estamos no Museu
de Arte Moderna
olhando uma pintura de Pablo Picasso
que data de 1909,
do verão de 1909, "Fábrica
na Horta do Ebro".
É uma das primeiras pinturas cubistas
de maior importância de Picasso.
E já aparenta ser bem cubista.
Já parecer ser um afastamento radical
de Cézanne,
mas foi feita dois anos depois
de "As Senhoritas de Avignon".
- Então já passou pela transição.
- Sim.
Esta é uma das pinturas que está
à altura do nome do movimento.
Cubismo. Porque parece
que há vários cubinhos.
Na cronologia da História da Arte,
depois de "As Senhoritas",
Braque começou a explorar os temas
de Cézanne de um modo mais sério.
- Picasso responde...
- Segue Braque.
Sim por meio de Cézanne.
E ele foi ao sul da Espanha,
a um ambiente bem árido,
para entender como trabalhar
com a terracota.
Aqui vemos o topo de uma colina,
há um pouco de água à direita
na parte de baixo da pintura.
Dá até pra ver uma reflexão
na superfície da água.
O que as pessoas acham
interessante nesta tela
é a sua determinação em atrair
e repelir diferentes perspectivas.
Por isso às vezes vemos a parte
de cima de objetos
às vezes os vemos de lado,
por baixo, por cima,
como se estivéssemos nos movendo
e mudando nosso olhar.
Exato, assim os objetos se tornam
plásticos, maleáveis,
se formam pelo nosso movimento
no espaço e no tempo.
Mas também estão todos interconectados.
Este aspecto que Picasso
e Cézanne usaram,
de entrelaçar diferentes planos com cor,
assim um objeto marrom se move
para outro também marrom
de formato diferente, o topo de uma casa
se move para o lado da casa.
Assim perdemos a separação das diferentes
formas num espaço,
Que se torna um todo sintético.
Há um outro aspecto que ajuda nisso.
Se analisarmos a sombra e o reflexo,
eles também quase se tornam objetos
no espaço,
e não só fenômenos óticos.
Como assim?
Se olharmos, por exemplo, para as entradas
de prédios no centro da tela,
podemos ver sombras e reflexos
que incidem sobre elas
e que de certo modo são tão sólidas
quanto os objetos que pretendem criar
estes fenômenos óticos.
Há quase um nivelamento
do objeto com o visual.
- E superfície?
-Mais que superfície.
- Objeto e de certo modo um...
- Fenômeno visual.
Algo que é apenas visto e impalpável
se torna tão importante na tela
quanto um prédio.
Quem sabe é o próprio modo
que vemos em "As Senhoritas"
que o espaço em si, entre as figuras
- parece sólido.
- Exatamente.
Achei engraçado quando você disse
que isso é uma vila.
Eu imaginei a luz do sol numa paisagem
e não tenho esta mesma percepção
com esta tela.
Não, não há. Tem razão.
É engraçado que a luz é
o que cria formas aqui.
Temos sombras e áreas com luz.
Não há uma direção de fato.
Parece mais uma experiência subjetiva
de um lado enquanto nos movemos,
e o modo em que a luz
e a sombra se incidem
do o que ocorre na natureza de fato.
Sim, outro aspecto que me impressiona
é o jeito que...
por exemplo você falou sobre as entradas,
a do centro da tela, parece mesmo
uma entrada de um lugar.
Mas à esquerda,
há algo mais que parece ser uma entrada.
Que também incide uma sombra, mas é
claramente uma pincelada de tinta.
Isso. E de certa forma, parece uma forma
positiva em frente do prédio
-Isso. E ainda sim, é uma pincelada.
-Exato.
Há um constante deslocamento
do modo em que a forma é construída.
A tela não trata só da representação
e da observação da forma,
mas sim um deslocamento do processo
de representação da forma.
É uma tela bem consciente,
de um jeito bem moderno.
Com certeza.
[Legendado por Sophia Bento]