Quando o sol nasce
num manhã de outono, em 55 a.C.,
Camma coloca dois pombos no altar
no centro da aldeia.
Oferece uma oração a Matrona,
a deusa-mãe da Terra
e a Lugus, o chefe dos deuses.
Depois, torce o pescoço das aves
e abre-as para examinar as entranhas,
procurando mensagens divinas.
Camma é uma druida.
Ou seja, ela realiza rituais religiosos,
mas também serve de juíza,
curandeira e erudita,
ensinando as crianças e mediando conflitos
entre as tribos celtas.
Começou os seus estudos em criança,
decorando os inúmeros pormenores
necessários à realização
dos seus muitos papéis,
visto que o conhecimento dos druidas
é demasiado sagrado
para ser registado por escrito.
Tal como muitos druidas,
passou anos a estudar na Bretanha.
Agora, é uma druida residente
da tribo dos Venetos,
numa pequena aldeia rural
perto da costa ocidental da Gália,
no que é hoje a França.
Desde que regressou à Gália,
recebeu muitas propostas de casamento,
mas decidiu dedicar-se
ao seu trabalho, pelo menos, para já.
Esta manhã, os presságios
são perturbadores.
Falam-lhe de guerra e conflitos,
como acontece amiúde nos últimos meses.
Uma tribo vizinha, os Redones,
atacaram a sua aldeia e roubaram gado
em plena luz do dia,
duas vezes neste outono.
As crianças reuniram-se à volta dela,
para observarem o seu trabalho.
Camma toca a lira e canta para elas.
Tece histórias dos poderosos reis
que outrora governavam aquela terra,
valentes guerreiros que foram
chacinados nus em combate
mas que irão renascer,
assim como todos os celtas.
Quando as crianças partem
para ajudar nos campos,
Camma dirige-se à aldeia para visitar
uma idosa com uma infeção nos olhos.
A caminho da cabana da idosa,
passa por homens que salgam porcos
para guardarem para o inverno
e por mulheres
que tecem roupas de lã tinta.
Entrega um remédio para o olho afetado
— é feito de visco, uma planta
sagrada que cura,
mas mortal, se for mal usada.
A partir daí, Camma visita o chefe
para discutir os presságios.
Convence-o a ir falar
dos problemas com os vizinhos.
Acompanhados por vários guerreiros,
atravessam a floresta
e pedem uma reunião
fora dos muros da aldeia dos Redones.
Os representantes dos Redones
levam a sua druida
que Camma reconhece da reunião
anual no centro da Gália
onde são eleitos os lideres dos druidas.
Os chefes começam logo a discutir
e a ameaçarem-se uns aos outros.
Camma intervém entre os lados opostos
para os impedir de lutarem
— eles têm de respeitar a sua autoridade.
Por fim, os Redones concordam
pagar o gado à tribo de Camma.
Apesar desta resolução,
Camma ainda se sente inquieta
na longa jornada para casa.
À medida que se aproximam
dos muros da aldeia,
um raio brilhante risca o céu
— mais um presságio, mas de quê?
De volta a casa, Camma senta-se
com os anciãos para a sua ceia de papas,
um pouco de carne e uma taça de vinho.
Enquanto estiveram fora, durante o dia,
chegou um pergaminho intercetado.
Camma reconhece imediatamente a escrita.
Embora os druidas estejam proibidos
de registar os seus conhecimentos,
ela e muitos outros jovens druidas
sabem ler latim.
Pela mensagem, ela fica a saber
que os romanos estão
a aproximar-se das terras deles.
Alguns dos anciãos dizem que a tribo
deve fugir para as colinas vizinhas
e esconder-se.
mas Camma aconselha-os a confiarem
nos deuses e a manterem-se na sua terra.
Em privado, ela tem dúvidas.
Se os romanos os alcançarem,
o poder dela para ajudar será limitado.
Ao contrário das outras tribos celtas,
as legiões romanas não respeitam
o papel sagrado dos druidas
como pacificadores.
Antes de se ir deitar,
ela observa o curso dos planetas
e consulta as suas cartas,
tentando fazer sentido do meteoro
que tinha visto anteriormente.
Os sinais estão a convergir
numa ameaça maior
do que a dos seus vizinhos.