"Como as minhocas fazem
para respirar debaixo da terra?"
Foi o que me perguntou outro dia
um dos meus gêmeos de cinco anos
quando brincávamos em casa, no jardim
e, de repente, saiu uma minhoca
de um dos canteiros.
As crianças fazem perguntas
como essa o tempo todo
e, em geral, o que acontece?
Não damos importância.
Se, por acaso, sabemos a resposta,
o que costumamos fazer?
Respondemos, não é? E pronto.
Mas, em geral, convenhamos,
não sabemos a resposta
e aí, o que costumamos fazer?
Dizemos: "Bem, vamos pesquisar".
Ou: "Não sei". Ou mudamos de assunto.
Mas acho que nessas perguntas
curiosas das crianças
existe uma oportunidade enorme
que podemos aproveitar.
Há quase 20 anos me dedico à educação.
Trabalho com escolas,
professores, diretores,
buscando estimular acontecimentos em sala
de aula para formar crianças curiosas,
com pensamento crítico
e preparadas para a vida.
E há cinco anos, também sou mãe,
e nestes anos de conversas
com mães e pais, amigos e conhecidos,
todos me fazem sempre a mesma pergunta:
"Para que escola devo mandar meus filhos?"
Claro que a escolha da escola
é um assunto muito importante.
Podemos falar disso por um bom tempo.
Mas acho que essa preocupação
com a educação das crianças
tão centrada na escola, lá fora,
tem algo importante
que estamos nos esquecendo,
algo que, muitas vezes, passa despercebido
e não nos damos conta:
como educamos as crianças em casa?
E, com educação em casa
não estou falando de ensinar
a comportar-se bem à mesa,
dizer obrigada à avó
ou dividir com os irmãos, não.
Também não estou falando
de tirar as crianças da escola
e educá-las nós mesmos, claro que não.
Estou falando de outra coisa, muito maior,
muito mais profunda.
De como se constrói o vínculo
das crianças com o conhecimento,
de como se gera seu amor por aprender.
Porque isso é o que pode fazer
toda a diferença em suas vidas.
Porque vai lhes dar ferramentas
mas, sobretudo,
o desejo e o compromisso
de continuar aprendendo sempre.
E isso se constrói em casa,
desde que as crianças são muito pequenas,
desde os primeiros anos de vida,
até que estejam crescidos.
E se constrói no cotidiano,
nas interações com os pais
mas também com os irmãos,
com os tios, com os avós,
e, às vezes, até com amigos da família.
Mas, como fazer para despertar o amor
por aprender, em casa? O que fazemos?
Temos que deixar de trabalhar
e estar todos os dias com as crianças?
Ou montar atividades sofisticadas
depois de um longo dia de trabalho,
em que voltamos esgotados e, além disso,
temos milhares de coisas para resolver?
Na verdade, não se sabe
com certeza como se faz.
Mas tenho uma boa notícia:
existem algumas ideias bem comprovadas,
que vêm do campo da educação,
comprovadas por décadas
de pesquisa acadêmica,
que eu acho que podem dar
boas pistas para nos orientar.
E, o melhor de tudo, é que são
fáceis de aplicar em casa,
coisas que fazemos
o tempo todo com as crianças.
Venho pesquisando esses temas
e hoje quero contar o que descobri
pensando em três das interações-chave
que temos com as crianças.
Como respondemos as suas perguntas.
Como conversamos com elas.
E como elogiamos quando fazem algo bem.
Vamos à primeira das questões:
como respondemos
as perguntas das crianças?
Faz tempo que sabemos que para despertar
e, sobretudo, para sustentar
a vontade de aprender,
é preciso gerar o hábito
de aprendizagem profunda.
O que é a aprendizagem profunda?
É quando vamos aprendendo um assunto,
e descobrindo pouco a pouco,
buscando como ele se conecta
com outros assuntos,
como se conecta com nossa vida,
olhando dos muitos pontos
de vista possíveis.
E digo que isso ajuda a sustentar
a vontade de aprender
porque, à medida que nos tornamos
especialistas em algo,
à medida que conhecemos bem alguma coisa,
vamos ganhando confiança em nossa
própria capacidade como aprendizes.
E isso nos ajuda a continuar.
E aqui está o segredo:
as perguntas curiosas das crianças
são um ponto de partida único
para gerar essa aprendizagem profunda.
Vou contar como continuou
o episódio das minhocas.
Aproveitamos a pergunta
para fazer uma exploração
que durou bastante tempo.
Primeiro, o que fizemos?
Tiramos as minhocas da terra,
tocamos nelas um pouco, olhamos elas.
A princípio não queriam
pegar nelas, mas...
Ficaram um pouco impressionados.
E depois de um tempo o que não queriam,
obviamente, era devolvê-las.
Começamos a buscar informação
sobre as minhocas.
Como as minhocas fazem
para respirar debaixo da terra?
Como fazem para comer debaixo da terra?
Encontramos as coisas mais interessantes.
Por exemplo, as minhocas têm dez corações
e nós, somente um, um dado importante.
Ou, o cocô das minhocas
é ótimo para as plantas.
As pérolas da pesquisa foram uns vídeos
de várias minhocas saindo
de dentro de um mesmo casulo,
que vimos dezenas de vezes.
Aqui está o desenho que fizeram depois.
Aí está o casulo, as minhocas saindo.
A grandona que está ao lado é a mamãe.
A parte de ficção, não?
Porque as mamães minhocas não cuidam
de suas crias nenhum pouquinho,
mas me dá um não sei quê quebrar a ilusão,
então não disse nada a eles.
Depois, um dos meus filhos
resolveu perguntar:
"E qual é a velocidade de uma minhoca?
Quão rápido pode ir?"
E íamos pesquisar esse dado na internet.
Viram que na internet
encontramos de tudo, não?
Coloca "velocidade de uma minhoca"
e vem alguma coisa.
Então, dissemos: "E se nós medirmos?"
"Como se faz para medir
a velocidade de algo?"
E nos ocorreu fazer uma pista
de corrida para minhocas
e colocá-las para correr.
Na verdade, a corrida
não funcionou muito bem,
porque as minhocas não entenderam
e não iam para o mesmo lado.
E mais, a pista estava seca, então
as minhocas não deslizavam
não importa o que disséssemos
e, então, meus filhos iam colocando
umas gotas de água para cada minhoca
para que deslizassem melhor
e aproveitavam para dar um empurrãozinho
na sua para que chegasse antes.
Este é o desenho da nossa pista.
Então esses 11 minutos que diz aí
que a minhoca vencedora levou para chegar,
digamos que não são muito confiáveis.
Mas esses 11 minutos
com o cronômetro na mão,
incentivando as minhocas
para que chegassem, foram memoráveis,
Essas foram as coisas que nos ocorreu
fazer com as minhocas naquele momento.
Poderiam ter sido outras, claro.
Porque o importante não é tanto o que
fazemos com as crianças em particular,
mas sim ir dando corda
aos assuntos que nos intrigam
para ver aonde nos levam,
como uma aventura,
como um jogo compartilhado.
E qualquer assunto vale,
inclusive se não temos muita ideia.
Porque não se trata de ensinar,
senão de contagiar
com o amor por aprender.
E, para isso, nem sempre é preciso saber.
Eu, de minhocas, sabia algumas coisas,
não dos corações, mas sabia.
Mas outro dia meus filhos
vieram, por exemplo,
com um monte de perguntas
sobre as Guerras da Independência.
Um tema que estudei,
vocês também,
milhares de vezes como aluna
e que nunca entendi muito,
e mais, sempre achei chatíssimo.
E aprender com eles sobre isso foi melhor.
Porque me permitiu tirar o pó
de um assunto cheio de teia de aranhas,
muito esquecido,
e reconectar com minha
própria curiosidade.
Para mim esse é
um dos grandes combustíveis
que me fazem ter vontade de fazer
essas coisas com as crianças.
E o outro grande combustível
é ver elas aprenderem.
Acredito que existem poucas
coisas tão emocionantes
como ver um menino ou uma menina
ir construindo seu próprio pensamento,
sua própria visão de mundo.
E nisso de construir o pensamento
está a segunda chave: as conversas.
Faz tempo que sabemos também
que para construir o pensamento,
o grande veículo é a linguagem.
Por isso é tão importante,
quando conversamos com as crianças,
ajudá-las a colocarem
em palavras o que pensam
e porque pensam isso.
E isso é importante, não apenas para nós,
para irmos medindo
o que estão entendendo e o que não
e ajudá-las a partir daí.
Mas, especialmente, para elas,
porque para ganharem autonomia,
para aprenderem a aprender,
as crianças precisam ir tomando
consciência do que entendem
e do que ainda não entendem,
e de como se conecta o novo
que estão aprendendo
com o que já sabiam antes.
Isso serve para todas as conversas,
mas um bom momento
para fazer isso com as crianças
é, por exemplo, quando lemos para elas.
Em casa, quando lemos com as crianças,
vamos parando para conversar;
para conversar sobre a história,
sobre como os personagens
devem ter se sentido em cada parte,
para conversar se teríamos nos sentido
da mesma forma na mesma situação.
Pensamos outros finais possíveis.
Por exemplo, o que aconteceria
se a Cinderela tivesse saído
à meia-noite e meia do baile?
Ou pensamos se recomendariam
esse livro a outras crianças.
O que diriam para que tivessem
vontade de ler o livro?
Ou, por exemplo, vemos
quem escreveu esses livros.
Já tínhamos lido outro livro
desse autor ou autora?
Era parecido com esse
que estamos lendo agora?
Ou vemos para quem foram
dedicados os livros.
Outro dia, por exemplo, um livro dizia:
"A Toto, meu fiel
companheiro de aventuras".
Quem era Toto?
Seu cachorro, seu irmão, seu melhor amigo?
E também fazemos isso para que as crianças
se deem conta de que os livros,
e qualquer obra, como um filme,
uma peça de teatro,
um quadro, uma invenção,
não foram feitos por super-heróis,
mas por gente de carne e osso como elas.
Aprender pode ser bonito,
mas também pode ser muito frustrante,
requer muito esforço,
porque, cedo ou tarde,
vamos encontrar alguma situação
que nos custe, algo que não seja tão fácil
e vamos ter que continuar.
E para isso necessitamos estar motivados.
E aqui vem a terceira
e última chave: os elogios.
E essa eu adoro, porque acho
que é a mais fácil de implementar,
mas é a que todos nós
fazemos ao contrário.
O que fazem as mães, os pais,
ainda mais os avós, quando as crianças
fazem bem alguma coisa?
Elogiamos, não é?
Com as melhores intenções,
queremos que ganhem confiança,
que estejam seguros, motivados,
e dizemos a elas coisas do tipo:
"Muito bem, você é superinteligente!"
ou: "Você é um gênio!"
Mas o que a pesquisa mostra
é que nem todos os elogios ajudam.
E mais, que alguns até podem
ser contraproducentes.
Hoje sabemos que quando elogiamos
as crianças pelo seu talento,
por sua inteligência, as crianças
começam a escolher coisas mais fáceis,
coisas que não as desafiem tanto,
escolhem o que é seguro.
Por um lado, porque não querem
nos decepcionar,
mas também porque não querem
decepcionar a si mesmas,
a imagem que estão
construindo de si mesmas.
Por sorte, quando elogiamos
seu esforço, acontece o contrário.
Por exemplo, se dizemos:
"Muito bem! Se nota que trabalhou muito",
ou: "Você praticou muito!",
as crianças continuam escolhendo
coisas que as desafiem cada vez mais
porque as ajudamos a sentir
que estão no controle do processo.
Ninguém controla
o quão talentoso é em algo,
mas sim o quanto se esforça para realizar.
Em casa me tornei um pouco fanática
com esses elogios de esforço
e meus filhos já me descobriram.
Então, quando fazem algo bem,
costumam me olhar e dizer:
"Me esforcei muito, não é mamãe?"
(Risos)
Se pensarmos, despertar
o amor por aprender
não é tão diferente de ser caçadores
à procura dessas oportunidades
em que podemos aprender
junto com as crianças.
E não digo que seja tão fácil
e também não digo que podemos
fazer isso o tempo todo.
Mas acredito que se fizermos,
pelo menos, às vezes,
podemos fazer uma enorme diferença.
E eu descobri que isso gera
momentos de encontro familiar
agradáveis, maravilhosos,
que são de longe meus momentos
favoritos de todos esses anos,
e dos quais, espero, eles se lembrarão
quando forem grandes.
e pensem na sua infância.
Por isso, da próxima vez
que algum conhecido me perguntar:
"Para que escola
devo mandar meus filhos?",
acho que já tenho a resposta.
Vou dizer a eles que a pergunta
fundamental não é essa, é outra.
Vou dizer que a pergunta é:
"O que você responde aos seus filhos
quando eles perguntam
como uma minhoca faz
para respirar debaixo da terra?"
Obrigada!
(Aplausos)