Agradeço a oportunidade que me deram de falar sobre a maior história internacional da nossa vida profissional que é também o problema internacional mais importante que o mundo vai enfrentar tanto quanto podemos ver. A história, claro, é a ascensão da China. Nunca tantas pessoas se ergueram tanto e tão depressa, em tantas dimensões diferentes. O problema é o impacto da ascensão da China, a confusão que isso irá causar nos EUA e na ordem internacional de que os EUA têm sido o principal arquiteto e guardião. Os últimos 100 anos são aquilo a que os historiadores chamam o "século americano". Os norte-americanos habituaram-se ao seu lugar no topo de toda a ordem hierárquica. Então, a ideia de outro país que pode ser tão grande e tão forte como os EUA — ou maior — atinge muitos norte-americanos como um ataque ao que eles são. Para melhor perceber o que vemos hoje nessa rivalidade, é útil situar isso no âmbito maior da História. Os últimos 500 anos viram 16 casos em que um poder crescente ameaçou substituir um poder dominante. Doze deles acabaram em guerra. Em novembro, faremos uma pausa para comemorar o 100.º aniversário do último dia de uma guerra que se tornou tão abrangente que exigiu que os historiadores criassem uma categoria totalmente nova: a guerra mundial. Na 11.ª hora do 11.º dia do 11.º mês em 1918, calaram-se as espingardas da I Guerra Mundial mas 20 milhões de pessoas jaziam mortas. Sei que esta é uma audiência sofisticada, por isso, conhecem a ascensão da China. Portanto, vou-me concentrar no impacto da ascensão da China sobre os EUA, sobre a ordem internacional e sobre as perspetivas de guerra e de paz. Mas, como ensinei em Harvard durante muitos anos, aprendi que, de tempos em tempos, é útil fazer uma breve pausa, só para garantir que estamos todos na mesma onda. Faço isto numa coisa a que chamo um intervalo. Dou aos alunos um teste surpresa, sem classificação, claro. Portanto, vamos experimentar: Intervalo, teste surpresa. Pergunta: Há 40 anos, em 1978, a China inicia a sua marcha para o mercado. Nessa altura, qual a percentagem dos mil milhões de cidadãos chineses que estavam a lutar para sobreviver com menos de dois dólares por dia? Imaginem, 25% ? Cinquenta por cento? Setenta e cinco por cento? Noventa por cento? O que é que acham? Noventa por cento. Nove em cada dez, com menos de dois dólares por dia. Agora, em 2018, 40 anos depois, quais são os números? O que é que acham? Vejam. Menos do que 1%, atualmente. O presidente da China prometeu que, dentro de três anos, as últimas dezenas de milhões ultrapassarão o limiar da pobreza. É um milagre que ocorre durante a nossa vida. É difícil acreditar. Mas os factos nus e crus ainda são mais difíceis de ignorar. Uma nação que nem sequer aparecia em nenhuma mesa da liga internacional há 25 anos, evoluiu até rivalizar com os EUA e, nalgumas áreas, até os ultrapassou. É este o problema que modelará o nosso mundo: uma China aparentemente imparável, que acelera na direção de uns EUA, dominante e aparentemente imóvel, numa corrida para o que poderá ser a maior colisão da História. Para ajudar a compreender melhor este problema, vou apresentar-vos um grande pensador, vou apresentar-vos uma grande ideia e vou fazer a pergunta mais consequente. O grande pensador é Tucídides. Sei que este nome é impronunciável e algumas pessoas terão dificuldade em pronunciá-lo. Vamos lá tentar: dois, três, todos juntos: Tucídides. Mais uma vez: Tucídides. Quem era Tucídides? Foi o pai e o fundador da História. Escreveu o primeiro livro de História. Intitula-se "A História das Guerras do Peloponeso", sobre as guerras na Grécia, há 2500 anos. Pelo menos hoje, poderão enviar um "tweet" aos vossos amigos: "Conheci um grande pensador. "E até consigo pronunciar o nome dele: Tucídides". Quanto a essas guerras que destruíram a Grécia clássica, Tucídides escreveu: "Foi a ascensão de Atenas e o medo que instilou em Esparta "que tornaram inevitável a guerra". Portanto, a ascensão de uma e a reação da outra criaram um "cocktail" tóxico de orgulho, de arrogância, de paranoia, que arrastaram ambos para a guerra. O que me deu a grande ideia: a Ratoeira de Tucídides. A "Ratoeira de Tucídides" é um termo que eu inventei há uns anos para ressuscitar a visão de Tucídides. A Ratoeira de Tucídides é a dinâmica perigosa que ocorre quando uma potência em ascensão ameaça substituir uma potência dominante, como Atenas — ou a Alemanha, há 100 anos, ou a China de hoje — e o seu impacto em Esparta — ou na Grã-Bretanha, há 100 anos ou os EUA atualmente. Como disse Henry Kissinger, quando metemos na cabeça este conceito da Ratoeira de Tucídides, ele fornece uma lente que nos ajuda a ver as notícias e o ruído do dia para compreender o que se passa hoje. A pergunta mais consequente sobre o nosso mundo de hoje é: Vamos seguir as pisadas da História? Ou: "Através de uma mistura de imaginação e senso comum, "e de coragem, "poderemos encontrar uma forma de gerir esta rivalidade "sem uma guerra que ninguém quer "e que todos sabem que seria uma catástrofe?" Deem-me cinco minutos para desembrulhar isto e, logo à tarde, quando aparecer a próxima notícia sobre a China a fazer isto ou os EUA a reagir assim, poderão ter uma melhor compreensão do que se está a passar e até de explicá-lo aos vossos amigos. Como vimos com a inversão da pirâmide da pobreza, a China evolui extraordinariamente. Foi meteórico. O antigo presidente checo, Vaclav Havel, disse-o melhor: "Tudo isto aconteceu tão depressa "que ainda não tivemos tempo para ficarmos estupefactos". (Risos) Para me lembrar de quão estupefacto eu devia estar, eu, de vez em quando, olho pela janela do meu gabinete em Cambridge, para esta ponte, que atravessa o Rio Charles, entre a Escola Kennedy e a Escola de Gestão de Harvard. Em 2012, o estado de Massachusetts disse que iam renovar esta ponte e que isso levaria dois anos. Em 2014, disseram que não estava terminada. Em 2015, disseram que ia demorar mais um ano. Em 2016, disseram que ainda não estava acabada, e não disseram quando é que iria terminar. Por fim, no ano passado, estava acabada — três vezes mais cara que o orçamentado. Agora comparem isto com uma ponte parecida que atravessei, no mês passado, em Pequim. Chama-se Ponte Sanuyan. Em 2015, os chineses decidiram que queriam renovar essa ponte. Atualmente tem o dobro das vias de tráfego. Quanto tempo levaram a completar o projeto? Em 2015, o que é que acham? Imaginem. Ok, um, dois, três. Vejam. (Risos) A resposta é 43 horas. Audiência: Uau! Graham Allison: Claro que isto não podia acontecer em Nova Iorque. (Risos) Por detrás da velocidade na execução está um líder motivado e um governo que funciona. O líder mais ambicioso e mais competente na cena internacional de hoje é o presidente chinês Xi Jinping. Não esconde aquilo que pretende. Como disse, quando chegou a presidente, há seis anos, o seu objetivo era tornar a China grande outra vez, (Risos uma bandeira que ergueu muito antes de Donald Trump ter criado a sua versão. Para isso, Xi jinping anunciou alvos específicos para datas específicas: 2025 — 2035 — 2049. Em 2025, a China pretende ser a potência dominante no mercado mundial de 10 tecnologias dominantes, incluindo os carros autónomos, os robôs, a inteligência artificial, o cálculo quântico. Em 2035, a China pretende ser o líder inovador em todas as tecnologias avançadas. E em 2049, que é o 100.º aniversário da fundação da República Popular, a China pretende ser a indiscutível número um, incluindo, segundo Xi Jinping, um exército a que ele chama — e cito — "Lutar e vencer". Estes são os ambiciosos objetivos mas, como podem ver, a China está bem lançada nesta via, para esses objetivos. Não podemos esquecer como o nosso mundo está a mudar rapidamente. Há 30 anos, a World Wide Web ainda não tinha sido inventada. Quem sentirá mais diretamente o impacto desta ascensão da China? Obviamente, o atual número um. À medida que a China vai ficando maior, mais forte e mais rica, tecnologicamente mais avançada, será inevitável o choque contra as posições e prerrogativas norte-americanas. Para os norte-americanos de sangue na guelra, e, em especial, para os norte-americanos casmurros, como eu — eu sou da Carolina do Norte — há qualquer coisa de errado nesta imagem. Os EUA significam o número um, é isso que somos. Mas, repito, os factos nus e crus são difíceis de ignorar. Há quatro anos, o senador John McCain pediu-me para depor sobre isto na Comissão dos Serviços Armados do Senado. Fiz-lhes um gráfico, que mostrava: Comparem os EUA e a China com dois miúdos em posições opostas num sobe-e-desce num parque infantil, cada um representado pela dimensão da sua economia. Já no fim de 2004, a China tinha metade da nossa dimensão. Em 2014, o seu PIB era igual ao nosso. Na atual trajetória, em 2024, será 50% maior. As consequências desta mudança tectónica serão sentidas por toda a parte. Por exemplo, no atual conflito comercial, a China já é o parceiro comercial número um de todos os principais países asiáticos. O que nos remete para o nosso historiador grego. O dossier da "Ratoeira de Tucídides" de Harvard, analisou os últimos 500 anos de História e encontrou 16 casos em que uma potência em ascensão ameaçou substituir uma potência dominante. Doze deles acabaram em guerra. E a tragédia é que, só em poucos desses casos os dois protagonistas queriam uma guerra. Poucas dessas guerras foram iniciadas pela potência em ascensão ou pela potência dominante. Então como é que isto funciona? O que acontece é que uma provocação de terceiros força qualquer deles a reagir, e isso põe em movimento uma espiral, que arrasta as duas para uma coisa que nenhuma delas queria. Isto parece uma loucura, mas é assim. É a vida. Lembrem-se da I Guerra Mundial. Neste caso, a provocação foi o assassínio de uma figura de segundo plano, o arquiduque Franz Ferdinand, que levou o imperador austro-húngaro a lançar um ultimato à Sérvia, arrastando diversos aliados. Ao fim de dois meses, toda a Europa estava em guerra. Imaginem se Tucídides estivesse a observar hoje o planeta Terra. O que é que ele diria? Encontraria um dirigente mais adequado para a potência dominante do que Donald J. Trump? (Risos) Ou um líder mais apto que Xi Jinping para a potência em ascensão? Certamente coçaria a cabeça e diria que não podia imaginar um provocador mais extravagante do que Kim Jong-un da Coreia do Norte. Cada um deles parece apostado em desempenhar o papel que lhes atribuíram e seguir o guião. Por fim, concluímos de novo com a pergunta mais consequente, a pergunta que terá as consequências mais graves para o resto da nossa vida: Os norte-americanos e os chineses irão permitir que as forças da História nos arrastem para uma guerra que pode ser catastrófica para os dois lados? Ou poderemos conjugar a imaginação e a coragem para encontrar uma forma de sobrevivermos em conjunto, e partilhar a liderança no século XXI ou, como Xi Jinping disse, criar uma nova forma de relações entre grandes potências? É esta a questão que tenho perseguido apaixonadamente nos últimos dois anos. Tive a oportunidade de falar e, claro, de ouvir, líderes de todos os governos relevantes — Pequim. Washington, Seul, Tóquio — e líderes ponderados do espetro das artes e dos negócios. Oxalá tivesse mais notícias a dar. Felizmente, os líderes têm cada vez mais consciência desta dinâmica de Tucídides e dos perigos que ela comporta. Infelizmente, ninguém tem um plano viável para fugir à História, como habitualmente. Portanto, para mim é claro que precisamos de algumas ideias que saiam do vulgar dos gráficos convencionais — de outra página ou de outro espaço — que é o que me traz hoje aqui ao TED e que me leva a um pedido. Esta audiência inclui muitas das cabeças mais criativas do planeta que se levantam de manhã e pensam não só como gerir o mundo que temos, mas como criar um mundo ideal. Por isso, tenho esperança que, se refletirem nisto, alguns de vocês possam ter ideias ousadas, ideias peregrinas, que, quando as encontrarmos, farão a diferença nesta situação. Recordo-vos que, se o fizerem, não será a primeira vez. Lembro-vos o que aconteceu logo a seguir à II Guerra Mundial. Um notável número de norte-americanos de europeus e outros, não só do governo, mas do mundo da cultura e dos negócios, empenharam-se num impulso coletivo de imaginação. O que imaginaram e o que criaram foi uma nova ordem internacional, a ordem que nos permitiu a viver a nossa vida, toda a nossa vida, sem grande conflito pelo poder e com mais prosperidade do que já se vira no planeta. Uma história notável. Curiosamente, cada pilar deste projeto que produziu esses resultados, quando foi proposto pela primeira vez, foi rejeitado pelos políticos dos assuntos estrangeiros, como ingénuo e pouco realista. O meu preferido é o Plano Marshall. Depois da II Guerra Mundial, os norte-americanos sentiam-se exaustos. Desmobilizaram 10 milhões de tropas, concentraram-se num urgente programa interno. Mas, quando as pessoas começaram a perceber como a Europa estava destruída, e como era agressivo o comunismo soviético, os norte-americanos decidiram taxar anualmente o equivalente a 1,5% do PIB, durante quatro anos, e enviar esse dinheiro para a Europa para ajuda à reconstrução desses países, incluindo a Alemanha e a Itália, cujas tropas tinham matado norte-americanos. Espantoso! Isto também criou as Nações Unidas. Espantoso! A Declaração Universal dos Direitos Humanos. O Banco Mundial. A NATO. Todos estes elementos de uma ordem para a paz e a prosperidade. Numa palavra, precisamos de fazer isso outra vez. Penso que agora precisamos de imaginação, de criatividade, informados pela História para, como nos lembrou o filósofo Santayana, no fim, só os que se recusam a estudar a História, estão condenados a repeti-la. Obrigado. (Aplausos)