Pierre Huyghe em: Arte no Século XXI Quando começo um projeto, sempre preciso criar um mundo. E aí eu quero entrar nesse mundo E meu passeio por esse mundo são as obras. O que me toma bastante tempo é criar o mundo. "Celebration Park no Tate" é uma coleção de exibições. Um local que proporciona experiências únicas. ["EU NÃO SOU DONO DA BRANCA DE NEVE."] O que será que as pessoas pensam quando entram no Tate e veem "Eu não sou dono da Branca de Neve"? Todos que viram Branca de Neve são donos da Branca de Neve, é claro. Você deve se divertir com essa cultura para poder ser parte dela. Eu acho que alguem que vê "Eu não sou dono da Branca de Neve", deve entender que pode começar a se divertir com isso. É sobre a circulação de histórias. É sobre como podemos contar histórias uns aos outros, e o quão flúido é o processo, ou o quão rígido ele é. É por isso que tem portas girando nessa sala o limite. Você diria que está dentro ou fora da sala? Se o limite está se movendo, se as portas estão se movendo, não existe mais limite, não existe mais dentro e fora. Com certeza é sobre limites. Sobre cultura e limites. Esses letreiros e essas portas, estão, de certa forma, conectados. [BRISA DO MAR] [ÁGUA SOB O GELO] Em algum lugar, é para existir uma ilha. Eu ouvi dizer, é um rumor, eu li, eu falei com pessoas, e elas disseram que tem uma criatura branca nessa ilha. Agora, eu estou usando um barco para atravessar a Passagem de Drake, para descobrir se isso é verdade ou não. Para encontrar esse território e essa criatura. [NEVASCA] ♪ [MÚSICA] ♪ Eu estive filmando essa jornada, e também estou filmando algo equivalente, uma adaptação dessa jornada em forma de opera no Central Park. ♪ [MÚSICA] ♪ Eu pedi ao compositor para pegar o formato da ilha, e transformar o formato em uma partitura, para uma orquestra sinfônica. ♪ [MÚSICA] ♪ Então ele está tocando a montanha, ele está tocando a ilha. O espaço é transformado em tempo. ♪ [MÚSICA] ♪ Nós temos "Uma viagem pela Lua"; "Uma viagem pela neve", na Antártica; temos "A conquista do mundo", então é importante dar uma espaçada. Fazer as pessoas saberem que você sabe e que elas sabem. Para que outra peça possa começar. A outra peça é que agora nós não sabemos se eu fui lá, não sabemos se eu vi essa ilha, se eu vi essa criatura branca. Talvez eu tenha visto, talvez sejam efeitos especiais, não dá para saber. O importante para mim é criar buracos no mapa, botar pontos desconhecidos no mapa. Ao fazer isso, você cria um aspecto místico, cria uma zona de não conhecimento, borra a certeza. [ZUMBIDO] Eu estou tentando focar menos na narrativa. Quero trazer o foco para as emoções que a paisagem evoca. Quero que as pessoas experienciem uma emoção, não uma simples narração. ♪ [MÚSICA] ♪ Fui convidado para fazer algo no prédio de Le Corbusier, o único prédio que ele fez na América do Norte. Esse prédio faz parte do Campus de Harvard, é um centro de arte e também o departamento de artes. Tive alguns problemas com a encomenda, não sabia o que fazer, até que encontrei um livro sobre como Le Corbusier também teve problemas quando trabalhou nesse prédio. Decidi fazer uma peça, um tipo de sátira, uma parábola irônica das duas situações. ♪ [MÚSICA] ♪ É não-verbal, a música é de Xénakis e Varèse. colaboradores passados de Le Corbusier. ♪ [MÚSICA] ♪ Há a curadora, que me convidou para fazer esse projeto. E, é claro, Le Corbusier, e as pessoas que fizeram a encomenda a Le Corbusier, então é uma simetria perfeita. Há essa figura preta, que parece um louva-a-deus, ou Darth Vader, que é o reitor dos reitores, a instituição. [PÁSSARO PIANDO] [ASAS BATENDO] Há esse passarinho vermelho, que vem de uma anedota que Le Corbusier escreveu. Ele sonhava que pássaros trouxessem sementes até o prédio, e que as sementes crescessem. [VINHAS SE ESPREITANDO] O teatro foi construído em colaboração com um arquiteto. A ideia era construir algo entre as raízes e um tumor. Algo que pareça que vai crescer como um tumor, da base do prédio. E, dentro desse tumor, acontecerá a peça. ♪ [MÚSICA] ♪ Há um sentimento de irreverência que eu quero captar, de certa forma. Sempre achei o humor uma forma de se opor às estruturas hierárquicas ♪ [MÚSICA] ♪ Se tratando da beleza transcedental da peça, até mesmo a poesia da peça, ou o senso crítico da peça, eu acho o humor uma ferramenta essencial para evitar julgamento e críticas; para estar acima disso. E eu acho que é uma linguagem que é muito visual, me encanta a rapidez do humor. Não me interesso em filmar a realidade como ela se apresenta. Mas também não me interesso em construir uma ficção. O que me interessa, é definir uma realidade, produzir uma realidade, e, somente depois disso, documentar essa realdiade. Eu fiz, por exemplo, uma celebração ao norte de Nova Iorque, Streamside é uma pequena cidade em construção. Estou tantando decidir o que há de comum em todas essas pessoas, e chego a algo simples: todos eles se conectam com a natureza, que é esse lugar que eu encontrei. E sobre essa base simples, eu crio um script programado, e faço a filmagem. Aqui temos uma recriação do início de Bambi. A ideia de uma natureza pura e ideal, e o que acontece é que o veado sai da natureza e chega a uma cidade. O veado vai de um lugar onde há certa complexidade, a natureza, a esse tipo de cubo branco. E aí o filme começa novamente, e agora você vê um menininha em casa, até que ela se muda da casa antiga dela e vai para uma casa nova. Então é o mesmo tipo de movimento, uma vez pelo animal, uma vez pelo humano. Essa é a base dessa tradição. Essa celebração, esse costume. O que você vê na segunda parte do filme é a celebração, eles celebram isso. ♪ [FLAUTA] ♪ [CRIANÇAS CONVERSANDO] Eu organizei toda a celebração a parada, o show, a comida, o prefeito e o discurso da garota, e as crianças brincando, organizei tudo. [HOMEM: Testando...] De certa forma, é um script, uma receita. [MULHER: Boa tarde, pessoal...] É uma partitura. A partitura pode ser tocada novamente, próximo ano, no mesmo horário, dia 11 de outubro, é so pegar esse pedaço de papel e dar as ordens, esperando que todos atuem como o ensaiado. Para mim, a coisa mais importante é poder repetir a performance. Como acontece anualmente, você acaba voltando e voltando. Isso é o que me faz querer criar uma linha temporal, o momento, que vai acabar acontecendo de novo. ♪ [VIOLÃO] ♪ Estou criando um tipo de mitologia. ♪ [MÚSICA] ♪ Então, as pessoas encenam essa mitologia na forma de uma festa, que nós chamamos de celebração, uma vez no ano. Temos uma partitura, e então você tem a interpretação Minhas obras desde 1994 tem sido baseadas nesse protocolo temporal, trabalho temporal. Elas sempre foram sobre a exibição em sí, a exibição sendo o ponto de partida. Geralmente, artistas veem exibições como o ponto final, a resolução de algo. Ele está trabalhando no estúdio, e então há o processo, e ao fim do processo ele apresenta o trabalho no que chamamos de exibição. Não tenho interesse nisso, para mim, a exibição não é o final do processo, mas sim o ponto inicial para chegar a outro lugar.