A máquina de que vou falar
é a "maior máquina que nunca existiu".
Foi uma máquina que nunca foi construída
mas que será construída.
Foi uma máquina que foi concebida
muito antes de alguém
pensar em computadores.
Se sabem um pouco
da história dos computadores,
sabem que foi nos anos 30 e 40,
que se criaram computadores simples
que iniciaram a revolução
de computadores que temos hoje.
E vocês teriam razão,
só que estariam no século errado.
O primeiro computador foi concebido
nos anos de 1830 e 1840,
e não em 1930 e 1940.
Foi concebido e foram feitos
protótipos de algumas partes.
Essas partes que foram construídas
estão aqui, em South Kensington.
Essa máquina foi construída
por este sujeito, Charles Babbage.
Eu tenho uma grande afinidade
com o Charles Babbage
porque tem o cabelo
sempre assim despenteado
em todas as fotografias.
Era um homem muito rico
e, de certa forma,
fazia parte da aristocracia britânica.
Aos sábados à noite, em Marylebone,
se vocês fossem intelectuais
naquela época,
seriam convidados
para um sarau em casa dele.
Ele convidava toda a gente:
reis, o Duque de Wellington,
muita gente famosa.
Ter-vos-ia mostrado uma
das suas máquinas mecânicas.
Tenho saudades daquela época
em que podíamos ir a um sarau
e ver uma demonstração
de um computador mecânico.
(Risos)
Mas o próprio Babbage,
nasceu no fim do séc. XVIII,
e era um matemático famoso.
Tinha o mesmo cargo
que Newton, em Cambridge,
e que foi recentemente
do Stephen Hawking.
Não é tão conhecido como eles
porque tinha aquela ideia
de fazer aparelhos
mecânicos de cálculo
e acabou por nunca fazer nenhum.
E não o fez porque era
um "nerd" clássico
Cada vez que tinha uma
boa ideia, pensava:
"Brilhante, vou começar a construí-lo.
"Vou gastar uma fortuna nele.
Tenho uma ideia melhor.
"Vou trabalhar neste.
Vou fazer este aqui."
Ele fez isto até que Sir Robert Peel,
primeiro-ministro na altura,
o expulsou do nº 10 de Downing Street.
Nessa altura, uma expulsão
era como dizer:
"Um bom dia para si, Sir."
(Risos)
Ele concebeu
esta monstruosidade aqui,
a "máquina analítica".
Para terem uma ideia,
esta é uma visão de cima.
Cada um destes círculos é uma engrenagem,
é uma pilha de engrenagens,
e isto tem o tamanho
de uma locomotiva a vapor.
Portanto, durante esta palestra,
imaginem esta máquina gigante.
Ouvimos os sons magníficos
que esta máquina teria produzido.
Vou mostrar a arquitetura da máquina
— é por isso que é
arquitetura de computador —
e falar-vos desta máquina,
que é um computador.
Falemos da memória.
A memória é semelhante à memória
dos computadores de hoje,
exceto que era toda feita de metal,
pilhas de rodas dentadas.
30 rodas dentadas de altura.
Imaginem uma altura de 30 rodas dentadas,
centenas e centenas,
contendo números inscritos nelas.
É uma máquina decimal.
Tudo é feito no sistema decimal.
Ele pensou em usar o sistema binário.
mas a máquina teria que ser
ridiculamente alta,
Como está, já é enorme.
Portanto, tem memória.
A memória é este pedaço aqui.
Veem-na assim.
Esta monstruosidade aqui é o processador
— o chip se preferirem.
Claro, é enorme.
Esta máquina é totalmente mecânica.
Isto é uma fotografia de um protótipo
para uma parte do processador
que está no Museu da Ciência.
O processador executava as quatro
funções fundamentais da aritmética
— adição, multiplicação,
subtração, divisão --
o que já é uma façanha, em metal,
mas também conseguia fazer uma coisa
que um computador faz
e uma calculadora não faz:
esta máquina observava a memória
e podia tomar uma decisão.
Conseguia fazer o "se... então"
para programadores básicos.
Era isso que fazia dele um computador.
Não fazia só cálculos.
Podia fazer mais.
Se pararmos um instante,
a olhar para isto,
e pensarmos nos chips de hoje,
não podemos ver um chip de silicone
por dentro, porque é muito pequeno.
Mas se conseguíssemos,
veríamos uma coisa
muito semelhante a isto.
O processador tem
uma complexidade incrível,
e uma regularidade incrível na memória.
Se já viram uma imagem de
um microscópio eletrónico, viram isto.
Parece tudo igual.
Mas depois há esta parte aqui
que é muito complicada.
Todo este mecanismo de rodas dentadas
faz o que um computador faz,
mas é preciso programar isto.
Babbage usou a tecnologia da altura
e a tecnologia que voltaria a aparecer
nos anos 50, 60 e 70,
que é a dos cartões perfurados.
Isto é um de três leitores
de cartões perfurados,
e isto é um programa, no Museu de Ciência,
perto daqui, criado por Charles Babbage,
que lá existe — podem ir lá vê-lo —
à espera que a máquina seja construída.
Não há só um, há muitos.
Ele preparou programas
prevendo que isto aconteceria.
Usavam-se cartões perfurados
porque Jacquard, em França.
tinha criado o tear de Jacquard,
que tecia belos padrões
controlados por cartões perfurados.
Babbage estava apenas a reutilizar
a tecnologia da época.
Como em tudo o que fazia,
usava a tecnologia da época.
Nos anos 1830, 1840, 1850,
usava as engrenagens, o vapor,
dispositivos mecânicos.
Ironicamente, nascido no mesmo ano
de Charles Babbage,
surgiu Michael Faraday
que viria a revolucionar tudo
com o dínamo, transformadores,
e coisas dessas.
Mas Babbage queria usar
tecnologia comprovada,
como era o caso do vapor.
Ora, ele precisava de acessórios.
Temos um computador.
Temos cartões perfurados,
um processador e memória.
Era preciso adicionar acessórios.
Não podia ficar apenas com aquilo.
Primeiro, havia o som.
Havia um sino.
Se algo corresse mal
ou a máquina precisasse
da atenção de alguém,
havia um sino para tocar.
Há uma instrução num cartão perfurado
que diz: "Toca o sino".
Têm que imaginar este "Ting!"
Imaginem por instantes
todos aqueles ruídos:
"Clic, clac clic clic clic,"
a máquina a vapor... "Ding".
Também era precisa uma impressora.
Este é a imagem
de um mecanismo de impressão
para outra máquina dele,
'Máquina Diferencial n.º 2"
que ele nunca construiu,
mas foi construída, nos anos 80 e 90,
pelo Museu de Ciência.
A impressora é totalmente mecânica.
Imprime apenas números, porque ele
era obcecado por números,
mas imprime em papel
e até faz quebras de linha.
Portanto, ao chegar ao fim da linha,
dá a volta assim.
Também são precisos gráficos,
se quiserem fazer algo com gráficos.
Pensou: "Preciso
de uma impressora de gráficos.
"Tenho papel e caneta,
posso desenhar".
Portanto, também desenhou
uma impressora de gráficos.
Penso que, naquele momento,
tinha uma máquina bastante boa.
Surge então uma mulher, Ada Lovelace.
Imaginem aqueles saraus,
onde se juntam os grandes e os bons.
Esta senhora é filha de Lord Byron,
um homem maluco, malvado e perigoso.
A mãe, preocupada com a ideia
de a filha poder ter herdado
alguma da loucura e da maldade
de Lord Byron, pensou:
"Já sei. A matemática é a solução.
"Vamos ensinar-lhe matemática.
Isso vai acalmá-la."
(Risos)
"Porque nunca houve um matemático
que tivesse enlouquecido,
"portanto, há-de correr bem".
(Risos)
Portanto, ela recebeu
formação em matemática,
e vai a um dos saraus com a mãe.
Charles Babbage aparece com a sua máquina.
Também está lá o Duque de Wellington.
Ele mostra a máquina,
faz uma demonstração,
e ela compreende.
Foi a única pessoa, enquanto ele foi vivo,
que disse: "Eu percebo o que ela faz,
"percebo o futuro desta máquina."
Devemos-lhe muito, porque sabemos muito
sobre a máquina
que Babbage queria construir
por causa dela.
Há quem lhe chame a primeira programadora.
Isto pertence a um papel que ela traduziu.
É um programa escrito
de uma forma particular.
Historicamente, não é totalmente exato
que ela fosse a primeira programadora.
Mas ela fez algo mais espantoso.
Em vez de ser só programadora,
ela viu algo que Babbage não viu.
Babbage era totalmente
obcecado pela matemática.
Estava a construir uma máquina
para fazer matemática,
e Lovelace disse:
"Nesta máquina, podes fazer
mais do que matemática."
Todos aqui, nesta sala
têm um computador
porque têm um telemóvel.
Se pegarem no telemóvel,
tudo nesse telemóvel,
num computador ou em qualquer outro
aparelho informático, é matemática.
No fundo, tudo são números.
Quer seja vídeo, texto, música
ou voz, tudo são números.
Na essência, são tudo funções matemáticas.
Lovelace disse: "Lá porque estás a fazer
"funções matemáticas e símbolos,
"não quer dizer que isso
não possa representar
"outras coisas no mundo real,
como a música."
Isto foi um grande salto,
porque Babbage dizia:
"Podíamos calcular
estas funções magnificas
"e imprimir tabelas com números
e desenhar gráficos"
e Lovelace dizia:
"Isto até podia compor música,
"se lhe indicasses uma representação
numérica da música".
É a isto que eu chamo
o "Salto de Lovelace".
Quando se diz que ela é uma programadora,
ela até programou,
mas o importante foi
que disse que o futuro
podia ser muito mais do que isso.
Cem anos depois, aparece um tipo
— Alan Turing —
e em 1936, inventa de novo o computador.
Claro que a máquina de Babbage
era totalmente mecânica.
A máquina de Turing
era inteiramente teórica.
Ambos tinham uma perspetiva matemática,
mas Turing disse-nos
algo muito importante.
Criou as fundações matemáticas
para a ciência da informática e disse:
"Não interessa como se faz um computador."
Não interessa se o computador
é mecânico, como o de Babbage
ou eletrónico, como os de hoje,
ou, talvez no futuro, feito de células,
ou de novo mecânico,
quando entrarmos na nanotecnologia.
Poderemos voltar à máquina de Babbage
e torná-la minúscula.
Todas estas coisas são computadores.
Há uma essência da computação.
Esta é a tese de Church-Turing.
E assim, estabelece-se uma ligação
que diz que o que Babbage criou
é um computador.
De facto, era capaz de fazer tudo
o que fazemos hoje com computadores
só que muito mais devagar.
(Risos)
Para terem uma ideia dessa lentidão,
tinha cerca de 1K de memória.
Usava cartões perfurados
que tinham que ser inseridos,
e funcionava 10 000 vezes mais devagar
do que o primeiro ZX81.
Tinha memória RAM.
Podíamos adicionar muita memória,
se quiséssemos.
Portanto, até onde
é que isso nos leva hoje?
Hoje há planos.
Em Swindon, nos arquivos
do Museu da Ciência,
há centenas de planos
e milhares de páginas
com notas escritas por Babbage
acerca desta máquina analítica.
Um deles é um conjunto de planos
a que chamamos Plano 28,
e que é também o nome de uma fundação
de beneficência que iniciei
com Doron Swade, o curador de computação
do Museu da Ciência
e também a pessoa
que chefiou o projeto
para construir uma máquina diferencial.
Os nossos planos são para a construir.
Aqui em South Kensington,
vamos construir a máquina analítica.
O projeto consiste em várias partes.
Uma era digitalizar o arquivo
de Babbage, o que já foi feito.
A segunda é o estudo de todos esses planos
para determinar o que construir.
A terceira é uma simulação
computacional dessa máquina.
E a última parte é construí-la,
fisicamente, no Museu da Ciência.
Depois de construída, perceberão
como funciona um computador,
porque, em vez de olharem
para um pequeno chip,
podem olhar para algo monstruoso e dizer:
"Ah, estou a ver a memória a funcionar,
o processador a funcionar,
"ouço-o a funcionar,
até o cheiro a funcionar."
Mas, entretanto,
vamos fazer uma simulação.
O próprio Babbage escreveu, dizendo
que, quando a máquina analítica existisse,
certamente iria orientar
o futuro da ciência.
Nunca construiu a máquina
porque dedicou-se a novos planos.
Mas quando foi construída,
nos anos 40, tudo mudou.
Vou dar-vos uma pequena amostra
do seu aspeto em movimento
com um vídeo que mostra
apenas uma parte
do mecanismo do processador a funcionar.
Isto são apenas três conjuntos
de rodas dentadas.
Está a somar. Isto é o mecanismo
de somar em funcionamento.
Imaginem esta máquina gigante.
Portanto, deem-me cinco anos.
Antes de 2030, teremos isto pronto.
Muito obrigado.
(Aplausos)