Não deveria ter sido assim.
Eles não deveriam ter morrido...
...assim.
Tudo começou com sobreviventes.
Na minha primeira visita ao Iowa Farm Sanctuary,
o primeiro e único santuário vegano do estado
para animais de criação que foram libertados ou
escaparam do seu destino na indústria alimentar.
Pouco tempo depois de eu chegar, a co-fundadora
do IFS, Shawn, recebeu uma ligação do marido.
Um caminhão carregando vacas para abate tinha
capotado em uma estrada a cerca de 45 minutos.
O único trailer do Santuário tinha um pneu furado,
então eles postaram um pedido desesperado de ajuda
no Facebook e partimos para o local do acidente
na esperança de salvar quaisquer sobreviventes.
Quando chegamos, eles já estavam limpando
há mais de cinco horas.
Mas ainda restavam três corpos.
Víamos as pernas de uma vaca
viradas para cima no topo da lixeira,
cheia até à borda de carcaças.
Percorrendo o caminho do caminhão pela floresta,
vendo partes do veículo presas em árvores
devido ao enorme impacto da descida,
corpos de vacas ejetadas sangrando no meio do mato
e o que restava do trailer
violentamente contorcido,
era difícil acreditar
que alguém tivesse sobrevivido.
As informações eram escassas e dispersas.
Ouvimos dizer que o motorista estava no hospital;
que tinha sido resgatado dos destroços no rio.
Pelo menos vinte vacas morreram com o impacto
ou foram mortas a tiro no local.
Algumas fugiram para a floresta,
e encontramos o corpo de uma que tentou,
mas acabou por sucumbir
aos seus ferimentos internos.
E havia oito sobreviventes que tinham sido
capturados, mas sua localização atual era incerta.
A Shawn fez ligação após ligação, reconstituindo o
seu caminho, finalmente recebendo uma dica de que
eles tinham sido levados para um local remoto
que pertencia a uma empresa de camionagem.
Mas quando chegamos vimos que estava
praticamente abandonado,
tirando um caminhão de gado parado e vazio.
Um contraste impressionante
com os destroços retorcidos de que
eu tinha estado dentro apenas meia hora antes.
Enquanto a Shawn falava com o motorista
eu fui para as traseiras, onde encontrei
um grupo de vacas bebês
comprimidas em um cercado.
Recentemente tiradas de suas mães, elas estavam
provavelmente aguardando transferência
para a indústria de carne de vitelo ou de vaca.
Seu abate não é uma questão de se, mas quando.
Um homem, a quem chamarei de Chad,
respondeu ao pedido do santuário por um trailer
e se encontrou connosco na parada.
Ficou claro em poucos minutos que ele
não entendeu direito o que se ofereceu para fazer.
Estamos no Iowa.
O centro da agropecuária industrial
nos Estados Unidos.
O primeiro estado a passar leis
de ag gag modernas.
Para muitos residentes, o conceito de um santuário
para animais de criação não é apenas incomum.
É incompreensível.
Mas seria um erro, e um erro que nós ativistas
cometemos com frequência,
descartar ou ser agressivo
com pessoas como o Chad.
Quando a Shawn recebeu outra dica sobre um local
igualmente vago, o motorista do caminhão vazio,
que conhecia bem as paradas da indústria na zona,
se ofereceu para nos acompanhar.
MOTORISTA: Estou indo nessa direção. Vou ligar
a seta para indicar onde vocês devem virar.
SHAWN: Ok, perfeito.
Nós seguiremos você. Muito obrigado.
EMILY: Obrigado!
E assim começamos nossa improvável caravana:
um caminhão de gado guiando duas ativistas veganas
seguidas por um criador de gado com seu trailer,
todos a caminho de salvar algumas vacas.
E desta vez, nós as encontramos.
O responsável, a quem chamarei de Frank,
estava um pouco desconfiado no princípio.
FRANK: É melhor você ir falar com a pessoa
a quem esse gado pertence.
No sistema que criamos, as oito vacas
sobreviventes eram propriedade de alguém.
E como em qualquer negócio, o dono tem que avaliar
se financeiramente vale a pena recuperá-las.
Enquanto a Shawn fez outra ligação para o que
esperávamos ser a empresa com propriedade legal...
SHAWN: Vocês já comunicaram o sinistro
à seguradora?
... eu falei com Frank sobre o local do acidente.
FRANK: Sim, eu pensei que com certeza
ele estaria morto.
Ele foi uma das primeiras pessoas a chegar
e descreveu como inicialmente eles pensaram
que os gritos do motorista eram apenas
mais uma vaca chorando de dor.
FRANK: Eles conseguiam... conseguiam ouvi-lo,
dizendo "Me tirem daqui".
Eles o encontraram preso nos destroços,
com a boca cheia de água do rio,
enquanto gritava por ajuda.
Finalmente, recebemos a aprovação.
SHAWN: Ok, muito obrigado.
Sim, tchau. Ok, vamos lá.
FRANK: Isso mesmo. Para cima.
E lá estavam elas.
Abaladas e aterrorizadas.
Sem saberem que nesta viagem final
de um dia tão longo, elas estariam indo para casa.
EMILY: Obrigada. FRANK: Um bom dia para vocês.
SHAWN: Muito obrigada.
Quando chegamos ao santuário, os moradores
se reuniram para verem os recém-chegados.
E quando os oito irmãos saíram do trailer,
deram os primeiros passos como indivíduos livres.
Libertados... por acidente.
Enquanto as observávamos se concentrando num canto
ao fundo, protegendo as mais machucadas do grupo,
ainda em alerta máximo, Chad, o criador de gado
que respondeu ao pedido desesperado de
ativistas veganos e tornou possível esse resgate,
me fez uma pergunta que eu nunca esquecerei:
CHAD: Elas agora vivem até morrerem, ou o quê?
"Sim", eu disse.
"Elas vivem até morrerem."
Para conseguirmos fazer o que fazemos aos animais
e manter a imagem que temos de nós mesmos
como pessoas boas e decentes,
até mesmo que amam os animais,
tivemos que nos distanciar,
desconectar e distrair.
Construir sistemas tão incrivelmente rebuscados,
que o conceito de uma galinha, porco ou vaca
viver até morrer
está literalmente além da nossa compreensão.
No entanto, ao mesmo tempo, gostamos de acreditar
que os animais que comemos tiveram uma vida boa.
Que foram bem tratados.
Nós nos protegemos das mortes violentas
a que eles estão destinados,
fechando-os em caixas de metal para as quais
não ousamos olhar de muito perto,
para não olharmos nos seus olhos
e nos lembrarmos que eles... são indivíduos.
Mas quando um caminhão capota,
derramando seus corpos e sangue no nosso caminho,
somos confrontados não só com o horror
do seu sofrimento e morte, mas também
com aquilo que tivemos que trabalhar tão duro
para suprimir e evitar: a nossa compaixão.
Esses acidentes expõem a profundidade da nossa
desconexão e a contradição das nossas crenças.
As pessoas estremecem com a notícia
de um acidente de um caminhão de gado,
murmuram "pobres vaquinhas" ou
"que triste para os porquinhos",
sem a menor consciência
do absurdo das suas declarações.
Porque essas mesmas pessoas vão mais tarde
consumir a carne e secreções de alguma outra
"pobre" vaca, porco ou galinha, que teve a grande
sorte de o seu caminhão ter chegado ao matadouro.
Tudo terminou com sobreviventes...
Aquele acidente, apesar de ter sido horrível
e provavelmente uma experiência aterrorizante,
para estas oito vacas foi como um milagre;
sua única chance de viver.
Porque se tudo tivesse corrido conforme o plano,
elas teriam sido mortas, sangradas e desmembradas.
Suas mortes não menos brutais que a dos
seus irmãos que morreram no acidente naquele dia.
Mas, como as outras mais de 822 mil vacas
abatidas naquele dia atrás de portas fechadas,
elas teriam passado pela existência sem um suspiro
de choque, nem mesmo um murmúrio silencioso:
"pobres vaquinhas".
Descubra o que aconteceu com os sobreviventes
na segunda parte.
Para ajudar o IFS a salvar vidas,
visite IowaFarmSanctuary.org.
E para ajudar a Bite Size Vegan a criar
mais vídeos como este,
veja o link de apoio
aqui e na descrição.
Por favor compartilhe este vídeo
e se inscreva para mais conteúdo.
Agora, viva vegano.
E até breve.