Muito obrigado.
É difícil falar depois de alguém
como o Diogo Costa,
mas vou fazer o melhor possível.
Quero abordar a questão
da destruição criativa
num contexto um pouco diferente.
Foram apresentados muitos dados,
falarei rapidamente disso,
mas quero analisá-los
no contexto da globalização,
que é uma outra questão polêmica.
Muitos começam esta discussão supondo
que o termo “globalização”
tem uma conotação negativa.
Eu não acho que seja
ciência social de boa qualidade.
Deveríamos partir de uma conotação neutra,
e depois investigar, no mundo,
se algo tem impacto positivo ou negativo.
A abordagem habitual
para entender a globalização,
que não nos diz se ela é
uma coisa boa ou má,
é a de se referir à redução
ou à eliminação
das restrições impostas
pelo estado ao comércio
através das fronteiras políticas;
entre o Brasil e a Argentina, por exemplo,
ou entre os EUA e o Canadá,
ou o Japão e o Quênia;
e depois, ao sistema global,
cada vez mais complexo e integrado,
de trocas de comércio e produção,
que surgiu como consequência.
Isto não nos diz
se é uma coisa boa ou má,
mas é uma tendência
que podemos identificar no mundo.
Não é algo novo.
Fala-se em globalização há muito tempo.
O filósofo Demócrito de Abdera afirmou:
“Para um sábio, toda a Terra está aberta,
e a terra natal de uma boa alma
é a Terra inteira.”
Podemos indagar: “Isto está acelerando?”
Em vez de enchê-los com dados,
sugiro que vocês mesmos descubram.
Podem ir à internet.
Pela primeira vez
na história da humanidade,
dispomos de um sistema de informação
totalmente globalizado.
Eis algumas coisas que podem
ser verificadas pelo Google
ou outros mecanismos de busca.
O comércio internacional de bens,
em porcentagem do resultado econômico:
tem aumentado ou tem diminuído?
Dica: aumentado, muito acentuadamente.
Comércio internacional de serviços?
Isto é interessante porque,
em grande parte da história da humanidade,
os serviços não podiam ser
comercializados internacionalmente.
Não se podia cortar o cabelo
em um outro país, por exemplo,
ou ser massageado em outro continente,
mas hoje, cada vez mais,
os serviços podem ser
comercializados com o exterior.
Podemos ver o investimento estrangeiro,
isto é, investidores de um país
que possuem ativos
ou negócios em outros países.
A visita de turistas internacionais;
é algo raramente falado
no contexto econômico,
mas há uma curva incrivelmente ascendente
da quantidade de pessoas
que viajam pelo mundo.
Quando eu era jovem,
raramente via-se um turista chinês,
a menos que fosse de Taiwan ou Hong Kong.
Hoje, pessoas da China continental
fazem turismo no mundo todo,
e causam um enorme aumento
em viagens internacionais.
E, por fim, chamadas
telefônicas internacionais;
mais pessoas ligando para amigos,
vizinhos, familiares, em todo o planeta.
Estava em uma conferência como esta,
no Quênia, em Nairobi,
e um dos palestrantes perguntou algo.
Disse: “Quantos de vocês aqui têm
amigos em outros países?”
A maioria dos estudantes
do leste africano levantou as mãos.
Ele disse: “Vocês são a primeira geração
de quem se pode dizer isto.
Vocês têm amigos no Canadá, na Coreia,
na África do Sul e na Alemanha.
Isto nunca aconteceu.”
É uma enorme mudança no mundo,
e podemos medir isto.
Quero, entretanto, situar isto
num contexto cultural;
nem tanto pelo uso de dados econômicos
e como isto aumenta os padrões de vida,
mas geralmene ouvimos dizer
que isto é prejudicial à cultura.
Quero contar uma historinha
sobre as mulheres da Guatemala,
e as roupas que elas usam,
os tradicionais Huipil e Corté.
Huipil é uma espécie de camisa
para a parte superior do corpo,
e o Corté é uma saia que ela enrola
e dobra sobre si mesma.
Eu tive uma oportunidade
enorme na Guatemala.
Eu lecionava na Universidad
Francisco Marroquín,
e um dos professores lá é antropólogo.
Ele fez um grande convite:
"Sabe, a semana que vem,
vou visitar minha família
nas regiões montanhosas maias.”
Ele é de orígem indígena; é um maia.
Ele disse: “Gostaria de ir comigo?”
Ainda bem que eu disse que sim,
porque conheci uma parte do país
que de outra forma eu não visitaria.
Pude ver um modo diferente
de entender aquele país complexo.
Disse-me, enquanto viajávamos,
que recebia muitos estrangeiros
porque é um antropólogo,
e tem visitantes de várias universidades
da França, Inglaterra, EUA, etc.,
que querem “estudar” os indígenas,
e ele fala a língua maia,
o espanhol e o inglês.
Ele disse: “Eles reclamam
sempre de uma coisa,”
do fato das mulheres maias
não usarem Corté e Huipil
tão frequentemente quanto antes.
Dizem: “Dez anos atrás,
todas as mulheres os usavam.
Agora, não são muitas.”
Eles concluíram que as guatemaltecas
estavam sendo roubadas em sua cultura,
que elas eram vítimas da globalização.
Mas o interessante, segundo ele,
era nunca ter ouvido um estrangeiro
perguntar a uma guatemalteca
simplesmente: “Por que você
não se veste como sua avó?”
Isto pode parecer um pouco estranho
e talvez falta de educação,
mas cada vez mais mulheres indígenas
vestem roupas de uso diário
como as mulheres que se vê
nas cidades brasileiras,
e elas reservam seu Corté
para ocasiões especiais:
casamentos, para ir à igreja,
para eventos familiares especiais.
Entretanto, ele é um cientista
e fala a língua local.
Assim, ele perguntou a elas:
“Por que não usam o Corté?”
Disse: “Sempre recebo a mesma resposta,
de uma forma ou de outra.
Elas dizem que ficou muito dispendioso.
É muito caro.
É feito à mão, geralmente por mulheres,
é tradicionalmente considerado
“um trabalho para mulheres”.
E leva muito tempo para ser feito.
É um trabalho de arte muito elaborado.
Para elas, o que significa dizer
que se tornou muito caro?
O que significa “caro”?
Significa trabalhar mais para adquirir um.
Bem, é trabalhar ainda mais.
Para conseguir o quê?
Em termos econômicos,
significa que, pela primeira vez,
o valor do trabalho de uma mulher
indígena está aumentando.
É isto o que significa.
O valor do trabalho dela
está aumentando.
Ela poderia fazer um Corté
para si mesma e usá-lo no dia a dia,
trabalhando no campo,
realizando seu trabalho,
ou poderia confeccioná-lo e vendê-lo
para uma mulher na França.
É muito caro.
Com o dinheiro que ela ganhasse,
poderia comprar cinco ou seis trajes
como os que as brasileiras usam,
e ter dinheiro suficiente
para comprar óculos,
para enxergar longe,
comprar livros escolares
e sapatos para sua filha,
para ela ir à escola aprender
a ler e a escrever,
e poder comprar remédio
contra a febre da dengue,
que não têm na França e nos EUA,
onde se queixam dessas coisas.
Então, a questão é:
sua vida ficou pior
pela oportunidade de fazer negócios
com pessoas da França, dos EUA,
da Alemanha e de outros países?
Agora ela pode comprar mais
com o seu trabalho,
e ela reserva seu Corté para ir à igreja,
e não para o seu trabalho diário.
E a outra questão é:
na visão de quem sua vida
tornou-se melhor ou pior?
Na visão do turista estrangeiro, piorou,
não se vê pessoas nativas
multicoloridas com frequência,
mas talvez, do ponto de vista dela,
seja uma melhoria.
Pessoalmente, ouvi
estrangeiros na Guatemala
reclamando ao verem indígenas sacarem
seus telefones celulares.
“Ah, estragou a experiência inteira!
Não era uma coisa autêntica!”
Esperavam que usassem
“sinais de fumaça” ou algo assim.
(Risos)
Não gostaram, mas não raciocinaram
com a visão dos indígenas.
O que significa ter um telefone celular?
Significa poder chamar
seu pais e falar com eles;
não ficar sabendo que sua mãe adoeceu
somente duas semanas depois
e que não teve tempo para visitá-la;
receber um telefonema de seu pai:
“Sua mãe está doente, venha vê-la.”
Isto é algo positivo ou não,
do ponto de vista daquela pessoa?
Agora, se quiser analisar,
o que está acontecendo no mundo
é o processo de destruição criativa,
do ponto de vista econômico.
Joseph Schumpeter é um dos economistas
mais importantes do século passado.
Ele foi realmente um grande gênio,
e estas são algumas das mais inteligentes
palavras já escritas na economia.
Tratam de uma perspectiva dinâmica,
não de uma visão estática:
“O problema que normalmente
está sendo visualizado
é como o capitalismo administra
as estruturas existentes,
ao passo que o problema relevante
é como ele as cria e as destrói.”
É um processo constante
de destruição criativa.
Acontece na economia,
também acontece no contexto
da vida cultural, da vida artística.
Se desejar visualizá-la,
pensemos sobre a tecnologia.
Eis algo que está desaparecendo:
cabines telefônicas.
Há algumas por aqui,
mas estão desaparecendo
das cidades brasileiras.
Você não as encontra mais nos EUA,
na Europa Ocidental nem no Japão.
A primeira vez em que notei,
estava em um hotel
a que sempre vou para dar palestra.
Alguém que trabalhava no hotel disse:
“Olhe para as paredes.
Parecem diferentes?”
Demorei um pouco para notar.
Estavam sem telefones.
Por quê? Agora todos têm um telefone.
Ele está no bolso; por que investiriam
em telefones comuns?
Eis o que substituiu os telefones.
Meu primeiro celular foi aquele do fim.
Parecia que eu falava
de um sapato gigante.
(Risos)
Era um dispositivo enorme,
muito, muito caro, gigantesco.
Tinha que colocá-lo numa maleta especial.
Hoje, são tão pequenos
que se pode colocá-los no ouvido.
Isto transformou o mundo.
Bem, aqui está outro.
Alguns de vocês podem não ter usado isto.
Quando comecei a escrever,
eu o fazia com caneta e papel,
e depois eu datilografava
com uma máquina como esta.
Eu tinha uma Underwood 5.
Muitos não sabem como usá-la.
Um amigo meu contou-me que seu filho,
quando tinha cinco anos, disse-lhe:
“Papai, tem algo estranho
que eu quero lhe mostrar.”
Ele disse: “O que é?”
E o garoto: “É um computador,
mas ele não tem tela!”
(Risos)
Ele não compreendeu, foi até lá e olhou:
“Ah, sim. É uma máquina de escrever.
Agora elas são mais vistas em museus.
Vou lhes mostrar um grande avanço
na minha vida pessoal:
minha primeira ferramenta
IBM Correcting Selectric.
Ela era capaz de corrigir erros.
Era preciso voltar digitando
e a letra era apagada.
Vocês não fazem ideia do avanço
que isto representou
para os que escreviam muito.
Por falar em atrativos,
podia-se trocar a fonte de letras,
o tipo de letra usado.
Compravam-se essas coisas caras.
Era preciso retirá-la
e substituí-la por outra,
encaixá-la no lugar,
e depois escrever com ela.
Era assim que “tocávamos o barco”,
mas agora eu tenho um Macbook Pro,
e isto é melhor que a máquina de escrever.
Mas lembrem-se: algo era destruído.
Não existem mais fábricas
de máquinas de escrever.
Em toda cidade, havia onde
consertar máquinas de escrever.
Isto não existe mais.
Há anos não vejo uma oficina de reparos
em máquina de escrever.
Quando jovem, cheguei a pensar
em fazer manutenção
de máquina de escrever.
Imaginei: “Sempre haverá serviço.”
Estou feliz por não ter
escolhido aquela carreira.
(Risos)
Com o computador, posso fazer coisas
que não consigo na máquina de escrever,
como assistir a filmes.
Se eu falasse com a máquina de escrever,
achariam que eu fiquei louco.
Falo o tempo todo
com o meu computador,
e ele me responde, através de alguém
que está em um outro país.
Vejamos um outro exemplo.
Quando era um garoto, eu assistia
"Star Trek" com meu pai, na televisão,
o primeiro Star Trek,
e eles tinham os maravilhosos dispositivos
que chamavam de “comunicadores”.
Você o abria e podia falar
com uma pessoa. É isso.
E era tudo o que se podia fazer:
falar com uma pessoa.
Eu pensei: “Puxa! É muito legal!”
No futuro longínquo,
alguém terá um desse.”
(Risos)
Bem, eu tenho um,
e é bem melhor que aqueles
dos filmes de ficção científica,
voando entre as estrelas.
Posso ver filmes, tocar música,
pagar contas, converter moedas,
eu posso ler jornais nele,
posso fazer todas as coisas
que não podiam ser feitas
num comunicador da Star Trek.
Não são apenas produtos
que estão sendo substituídos.
Também o estão modos de se fazer negócios.
Imaginem, há 20 anos, discutir
sobre operações bancárias on-line.
“O que é isso?” As pessoas
não lhe entenderiam.
Transmissões de vídeos
ao vivo, via internet:
seus avós não entenderiam isso.
Linhas aéreas com rede de conexões
que revolucionaram as viagens:
pessoas de baixa renda podem voar
devido a esta tremenda inovação.
E também as empresas:
empresas também são constantemente
destruídas e criadas.
A Standard & Poors
mede as maiores empresas
pelo valor de “capitalização
de mercado” de suas ações.
Quantas empresas que estavam
entre as "Top 100 " em 1960
estavam ainda nesta lista em 2012?
Dez. Apenas dez.
E 25% dessas Top 100
entraram na lista nos últimos anos.
Logo, as firmas surgem e desaparecem,
deixando os negócios, sendo destruídas,
e sendo criadas para substituir outras.
Muitos focalizam a parte destrutiva
da destruição criativa.
Mas quão destrutiva ela é?
Ela tem um saldo destrutivo?
Eu não acredito nisso.
Algum valor é destruído,
mas não é destruição pura,
porque ganha-se algo
que agrega mais valor.
É por isso que há substituição.
Meu computador tem mais valor
do que uma grande máquina de escrever,
ele pode fazer mais coisas,
e custa menos do que eu paguei
pela velha máquina de escrever.
Vou concluir: o que torna possível
a destruição criativa com valor agregado?
Temos uma boa ideia do que é isso.
É a liberdade de empreendimento.
O que significa a liberdade
de empreendimento?
É algo muito especial.
É a liberdade de uma pessoa desconhecida;
não a de uma determinada pessoa, em si,
mas a de pessoas estranhas,
que são chamadas de “geeks”.
Os rapazes que criaram
a indústria de computadores
eram rapazes socialmente
estranhos e mal-ajustados.
Não conseguiam sair com garotas,
porque tinham obsessão por rádios,
computadores e trabalhar na garagem.
Isto mudou.
Eles descobriram que as garotas estavam
mais interessadas em sair com eles
depois que ficaram bilionários.
(Risos)
Friedrich Hayek afirmou claramente:
“O importante não é a liberdade
para o que eu gostaria de fazer,
mas sim a liberdade
de que alguém pode precisar
para fazer coisas benéficas à sociedade.
E podemos garantir esta liberdade
à pessoa desconhecida
somente se ela for para todos."
É um contexto econômico,
mas tem raízes profundas
em nossa sociedade.
“A liberdade é revolucionária
porque é liberdade para todos”,
como disse claramente Joaquim Nabuco
no seu livro sobre abolicionismo.
“Você deve amar a liberdade dos outros.
Quando você amar a liberdade dos outros,
você viverá em uma grande sociedade.”
Obrigado.
(Aplausos)