Você consegue imaginar
como ficaria a palavra "TED",
se ela existisse durante o Império Romano?
Creio que algo assim.
Um artesão teria passado dias
no sol, esculpindo em pedra.
E na Idade Média?
Um monge, trancado em seu quarto,
escreveria T-E-D com sua pena.
E sem voltar muito no tempo,
como estas letras ficariam nos anos 80?
Elas teriam cores estranhas, elétricas,
assim como nossos penteados.
(Risos)
Se este evento fosse sobre crianças,
eu desenharia as letras assim,
como se fossem peças de montar,
em cores vivas.
E se fosse sobre super-heróis então?
Eu as faria assim,
inspirada no melhor de todos,
na minha opinião:
Super-Homem.
(Risos)
As formas destas letras falam.
Elas nos dizem coisas
que vão além do que representam.
Elas nos remetem a outras épocas,
nos transmitem valores,
nos contam histórias.
Se pararmos para pensar,
nossos dias estão cheios de letras.
Nós as vemos na frente do ônibus,
na fachada da padaria,
no teclado em que escrevemos,
em nossos celulares...
em todo lugar.
Desde os primórdios,
as pessoas sentem a necessidade
de dar uma imagem à língua.
E com razão,
porque a língua é nossa
ferramenta mais importante.
Sem entender o que uma palavra significa,
podemos ver algumas coisas
que ela transmite.
Algumas letras nos diz
que algo é moderno...
ou pelo menos o era, nos anos 70.
Outras comprovam o valor
e grandeza de um local,
e o fazem em letras maiúsculas.
Existem letras que não são
feitas para durar muito...
assim como a oportunidade
que elas comunicam.
E há letras feitas por mãos inexperientes
que, querendo ou não,
nos fazem imaginar como é
esse lugar por dentro.
Quando me mudei para Berlim, senti na pele
todo impacto que as letras desenhadas
podem ter em nosso cotidiano.
Cheguei numa nova cidade, o que foi
emocionante e singular para mim.
Agora, lidar com uma língua desconhecida
foi, por vezes, muito frustrante
e desconfortável.
Várias vezes me vi em festas,
agarrada à taça de vinho,
sem entender uma única palavra
que era dita à minha volta.
Claro, eu sorria como se entendesse tudo.
Eu me sentia limitada na capacidade
de dizer o que pensava,
o que sentia,
em que acreditava.
Além de eu não entender as conversas,
as ruas eram cheias de placas
e textos que eu não compreendia.
Mas os formatos das letras me davam dicas;
elas abriam uma pequena janela
para entender as histórias
que suas formas guardavam.
Eu reconhecia lugares
onde a tradição era importante.
[Padaria Doceria Café Restaurante]
Ou entendia quando alguém
me dava um sinal,
e minha intuição dizia
que aqui era melhor não passar.
[Proibida a entrada]
Também, reconhecia
quando algo era para ser eterno.
As formas das letras me ajudaram
a compreender os arredores
e me guiar pela cidade.
Estive em Paris recentemente,
e algo parecido aconteceu comigo.
Após alguns dias na cidade,
eu estava à procura de algo
saboroso para levar para casa.
Andei, andei e andei
até encontrar a padaria perfeita.
A placa dizia tudo.
[Padaria]
Até hoje, imagino o padeiro-mestre
dedicando a cada pão
o mesmo tempo que o artista
dedicou a cada letra desta palavra.
Consigo ver o pão,
com os ingredientes exatos,
sendo amassado suave e cuidadosamente,
assim como o artista desenhou
as extremidades das letras
com curvas suaves e precisas.
Vejo o padeiro deitar os pães
sobre uma fina camada de farinha
para que não queimem por baixo.
Penso no artista colocando
os mosaicos no forno um por vez,
tomando cuidado para a tinta não escorrer.
A paixão por detalhes que o padeiro tem
se reflete na atenção dada
para a criação desta placa.
Sem mesmo experimentar o pão,
já podemos imaginar que é bom.
E eu posso confirmar; estava delicioso.
Eu sou letrista, esse é meu trabalho...
desenhar letras.
Assim como a preparação de pães,
precisa de cuidado no preparo,
a quantia exata de ingredientes
e paixão por detalhes.
Nosso alfabeto é, ao mesmo tempo,
minha matéria-prima e minha limitação.
A estrutura básica das letras
é para mim um campo de diversão,
em que a única regra é que o leitor,
no fim do caminho,
consiga ler a mensagem.
Deixem-me mostrar meu trabalho,
como eu "amasso meu pão".
Um tempo atrás, fui contratada
para fazer a capa de um livro clássico,
"Alice no País das Maravilhas".
Alice cai num buraco
e começa uma viagem absurda
através de um mundo de fantasia, lembram?
Nesta situação, o título da história
é minha matéria-prima.
De relance, nem tudo é essencial
e posso diminuir alguns elementos.
Por exemplo, escrevo
"no" e "das" em escala menor.
Depois, tento outras ideias.
E se, para passar a ideia de "maravilha",
eu usasse minha melhor caligrafia,
com muitas curvas e floreios aqui e ali?
Ou se eu focasse mais no fato
que o livro é um clássico
e usasse uma escrita mais tradicional,
fazendo tudo parecer um pouco
mais rígido e sério,
como uma enciclopédia ou livros antigos?
Ou como ficaria, considerando
que esse livro tem tanta coisa surreal,
se eu combinasse os dois universos
em uma única composição:
letras rígidas e letras suaves
convivendo na mesma estrutura.
Gosto desta ideia
e vou trabalhar nela com detalhes.
Uso outra folha de papel
para trabalhar com mais conforto.
Marco algumas linhas,
determinando o espaço
onde haverão palavras.
Aí, posso começar a dar
forma a cada letra.
Trabalho com cuidado.
Eu me dedico a cada letra,
sem esquecer o todo.
Desenho as extremidades
das letras com atenção.
São quadradas ou redondas?
São pontudas ou gordinhas e suaves?
Sempre faço vários rascunhos,
onde busco outras ideias
ou troco elementos.
E chega um ponto em que
o desenho toma formas precisas,
com cores, volumes
e elementos decorativos.
Alice, a celebridade aqui,
é colocada à frente,
com volume em suas letras.
Muitos pontos e linhas ao fundo
me ajudam a contar que nesta história
muitas coisas acontecem,
e ajudam a representar
o sentimento que gera,
como se sua cabeça estivesse nas nuvens.
E, claro, tem a Alice olhando
para seu país das maravilhas.
Ao desenhar as letras deste título,
eu recrio um pouco da atmosfera do texto.
Deixo o leitor ver a história
por um buraquinho na porta.
Para fazer isso, eu dei forma
para conceitos e ideias
que já existem em nossa imaginação:
a ideia de sonhos,
de caos,
o conceito de maravilha.
A tipografia e a forma das letras
funcionam um pouco como os gestos
e o tom de voz.
Não é a mesma coisa dizer:
(Voz monótona) "A plateia
do TEDxRíodelaPlata é imensa",
ou dizer: (Voz animada)
"A plateia do TEDxRíodelaPlata é imensa!"
Gestos e tons fazem parte da mensagem.
Dando forma às letras,
posso decidir com mais precisão
o que quero dizer e como,
além do texto literal.
Posso dizer meu palavrão favorito
de uma maneira muito enfeitada
e ser bem brega quando falo de amor.
Posso falar alto e de forma imponente
ou numa voz suave e poética.
E posso falar da diferença
entre Buenos Aires
e Berlim,
duas cidades que conheço muito bem.
Foi justamente em Berlim
que meu trabalho ficou mais colorido,
mais expressivo,
mais preciso ao contar histórias.
Tudo que eu não conseguia
dizer naquelas festas,
ali parada, segurando minha taça de vinho,
explodia em formas e cores no papel.
Sem perceber, essa limitação da língua
se tornou um motor
que me impulsionou para aperfeiçoar
minhas ferramentas de expressão.
Se não conseguia falar,
este era meu jeito de dizer
e contar coisas ao mundo.
Desde então, minha busca tem sido
a de encontrar minha própria voz
e contar histórias com os tons e gestos
exatos da minha vontade.
Nem mais, nem menos.
Por isso, eu misturo cores,
texturas
e é claro, letras,
que são minha paixão.
E por isso, quero que elas sempre
tenham formas lindas de verdade
e requintadas.
Contar histórias desenhando letras...
esse é meu trabalho.
E com isso, busco uma reação do leitor,
para acordá-lo de alguma forma,
para fazê-lo sonhar,
fazê-lo se emocionar.
Acredito que se a mensagem é importante,
ela requer trabalho e perícia.
E se o leitor é importante,
ele também merece beleza e fantasia.
(Aplausos) (Vivas)