Tudo começou em um bar escuro em Madri. Eu acabava de chegar no bar e encontrei meu colega da universidade de McGill, Michael Meaney. Estávamos bebendo cerveja, e, como cientistas fazem, ele me contou sobre seu trabalho. Ele me disse que estava interessado no jeito que as mães dos ratos lambem seus filhotes depois que eles nascem. Eu estava sentado lá, dizendo: "É aí que meus impostos são desperdiçados". (Risos) "Nesse tipo de ciência fraca." Mas assim que a bebida se intensifica e o álcool entra no cérebro, você vai ficando mais receptivo, e ele começou a me contar que os ratos, como os humanos, lambem seus filhotes de modos muito diferentes. Algumas mães o fazem muito, algumas o fazem muito pouco, e a maioria das mães o faz medianamente. O interessante nisso é que, quando ele acompanha os filhotes até a idade adulta, como anos na vida humana, muito tempo depois de suas mães terem morrido, eles são animais completamente diferentes. Os animais que foram lambidos e limpos com frequência não são estressados, têm comportamento sexual diferente, um modo de viver diferente daqueles que não foram tratados tão intensamente pela mãe. E eu pensava comigo mesmo... isso é mágica? Como isso funciona? Eu sou bioquímico. Eu acredito que há explicações químicas para a natureza. Eu trabalhava numa área chamada epigenética, mas antes de eu chegar àquela conclusão, tivemos que fazer outro experimento. Um geneticista gostaria que você se perguntasse: "Isso é genético?" Talvez a mãe tivesse o gene de "mãe ruim" que fez com que seus filhos fossem estressados, e isso foi transmitido de geração a geração; tudo é determinado pela genética? Ou é possível que outra coisa esteja acontecendo aqui? Nos ratos, podemos fazer essa pergunta e respondê-la. Então o que fizemos foi um experimento de criação cruzada. Essencialmente, separamos uma ninhada ao nascer e colocamos com duas mães diferentes. Não as mães de verdade, mas mães que vão tomar conta deles. Mães que lambem pouco, e mães que lambem muito. E fazemos o contrário com os filhotes que são lambidos poucas vezes. A resposta impressionante foi que o gene recebido da mãe não importava. Não era a mãe biológica quem definia essa propriedade nos ratos, mas a mãe que cuidou dos filhotes. Então como isso funciona? Como eu lhes disse, sou um epigeneticista. Estou interessado no modo em que os genes são marcados quimicamente durante a embriogênese, durante o tempo em que estamos no útero de nossa mãe, o que decide qual gene vai ser expressado em que tecido. Genes diferentes são expressados no cérebro, no fígado e nos olhos. E nós pensamos: é possível que a mãe esteja, de algum jeito, reprogramando o gene de seu filhote através de seu comportamento? Dez anos se passaram, e descobrimos que há uma cascata de acontecimentos bioquímicos nos quais a limpeza e o cuidado da mãe são transformados em sinais bioquímicos que vão até o núcleo e adentram o DNA, e o programam de um jeito diferente. Então agora o animal pode se preparar para a vida. A vida vai ser difícil? Vai ter muita comida? Vão ter muitos gatos e cobras por perto? Ou vou morar em uma vizinhança de classe alta onde tudo que devo fazer é me comportar para ser bem aceito socialmente? Podemos pensar no quão importante esse processo pode ser em nossas vidas. Herdamos nosso DNA de nossos ancestrais. O DNA é antigo, se desenvolveu durante a evolução. Mas ele não diz se você vai nascer em Estocolmo, onde os dias são longos no verão e curtos no inverno, ou no Equador, onde há um número igual de horas para o dia e para a noite durante o ano inteiro, e isso tem um enorme impacto na nossa fisiologia. O que estamos sugerindo é que talvez o que acontece cedo na vida, aqueles sinais que são entregues através da mãe dizem à criança em que tipo de mundo social ela vai viver. Vai ser duro e é melhor você ser ansioso e estressado? Ou vai ser um mundo fácil e você tem que ser diferente? Será um mundo com muita luz ou pouca luz? Será um mundo com muita ou pouca comida? Se não há comida por perto, é melhor desenvolver o seu cérebro para comer sempre que houver comida ou armazenar toda comida que você ingere como gordura. Então isso é bom, a evolução escolheu isso para que nosso DNA estático funcione de modo dinâmico em novos ambientes. Mas às vezes as coisas dão errado. Por exemplo, se você nascer em uma família pobre, os sinais são: "É melhor você comer bastante, coma toda a comida que encontrar". Mas agora nós, humanos, em nossos cérebros, evoluímos, mudamos a evolução ainda mais rapidamente. Agora podemos comprar um hambúrger do McDonald's por US$1. Então a preparação que nossa mãe nos deu não está se adaptando bem. A mesma preparação que surgiu para nos proteger da fome e da inanição causará obesidade, problemas cardiovasculares e doenças metabólicas. A ideia de que nossos genes podem ser marcados pelas nossas experiências, principalmente as primeiras experiências na vida, podem nos dar uma explicação padronizada sobre saúde e doença. Mas isso só se aplica aos ratos? O problema é que não podemos testar isso em humanos, porque eticamente não podemos administrar adversidade na infância de modo aleatório. Então se uma criança pobre desenvolver uma certa propriedade, não sabemos se foi causada pela pobreza ou se as pessoas pobres tem genes ruins. Geneticistas vão tentar te convencer que os pobres são pobres porque seus genes as tornaram pobres. Epigeneticistas vão dizer que pessoas pobres estão num ambiente ruim ou em um ambiente empobrecido que cria esse fenótipo, essa propriedade. Então começamos a dar uma olhada em nossos primos, os macacos. O meu colega Stephen Suomi tem criado macacos de duas formas diferentes. Separou o macaco de sua mãe aleatoriamente e o criou com uma enfermeira em condições de mãe adotiva. Então esses macacos não tinham mãe, mas uma enfermeira. E outros macacos foram criados com suas mães naturais. Quando eles envelheceram, tinham virado animais completamente diferentes. Os macacos que tinham uma mãe não se interessavam em álcool, não eram sexualmente agressivos. Os macacos que não tinham mãe eram agressivos, estressados e eram alcoólatras. Então observamos seu DNA logo depois de seu nascimento para ver se é possível que a mãe esteja deixando uma marca. Há uma assinatura da mãe no DNA de sua prole. Esses são, hoje, 14 macacos, e o que você vê aqui é o jeito moderno de estudarmos epigenética. Agora podemos mapear as marcas químicas, chamadas de marcas de metilação, no DNA em resolução de nucleótido único. Podemos mapear o genoma inteiro. Agora podemos comparar o macaco que teve mãe com o que não teve. E aqui está a representação visual disso. Os genes que receberam mais metilação são vermelhos; os genes que receberam menos metilação são verdes. Você pode ver que vários genes estão mudando. Porque não ter tido uma mãe não é só uma coisa, isso afeta tudo. Isso envia sinais sobre como o mundo vai ser quando você se tornar adulto. E você pode ver dois grupos de macacos separados um do outro. Quão cedo isso se desenvolve? Esses macacos já não viam suas mães, então eles tiveram uma experiência social. Será que sentimos nosso status social até mesmo no nascimento? Nesse experimento, pegamos placentas de macacos que tinham status sociais diferentes. O interessante das classes sociais é que todos os seres vivos vão se estruturar através de uma hierarquia. O macaco número um é o líder. O macaco número quatro é o peão. Se você colocar quatro macacos em uma jaula, sempre haverá um líder e um peão. O interessante é que o macaco número um é bem mais saudável do que o número quatro. Se os colocarmos em uma jaula, o macaco número um não vai comer tanto. O macaco número quatro vai comer bastante. Neste mapeamento de metilação, você vê os animais que tinham alto status social versus os que não tinham. Já nascemos sabendo a informação social, e a informação social não é boa ou ruim, ela apenas nos prepara para a vida porque temos que programar nossa biologia de modo diferente se temos um status social alto ou baixo. Mas como estudar isso em humanos? Não podemos fazer experimentos, não podemos aplicar adversidade em humanos. Mas Deus faz experimentos com humanos, são chamados desastres naturais. Um dos piores desastres naturais na história do Canadá aconteceu na minha província de Quebec. Foi a tempestade de gelo de 1998. Perdemos nossa rede elétrica inteira por causa da tempestade de gelo, com a temperatura, em pleno inverno de Quebec, de 20 a 30ºC negativos, e havia mulheres grávidas naquela época. Minha colega de trabalho, Suzanne King, acompanhou os filhos dessas mulheres durante 15 anos. O que aconteceu é que, quando o estresse aumentou, e aqui haviam medidas objetivas de estresse: quando tempo você ficou sem eletricidade, onde você passou seu tempo? Foi no apartamento da sua sogra ou em alguma casa de campo chique? Tudo isso resulta em uma escala de estresse social e você pode perguntar: como as crianças estavam? Parece que, com o aumento do estresse, as crianças desenvolvem mais autismo, desenvolvem mais doenças metabólicas e mais doenças auto-imunes. Mapeávamos o estado de metilação e, de novo, dá pra ver os genes verdes se tornando vermelhos com o aumento do estresse. Os genes vermelhos se tornando verdes com o aumento do estresse, uma mudança completa do genoma em resposta ao estresse. Se podemos programar genes, se não somos escravos da história de nossos genes, e eles podem ser programados, podemos desprogramá-los? Porque causas epigenéticas podem causar doenças como o câncer, doenças metabólicas e doenças mentais. Vamos falar sobre o vício de cocaína. Esse vício é uma situação terrível que pode levar à morte, à perda da vida humana. Perguntamos: podemos reprogramar o cérebro viciado para curar o vício daquele animal? Usamos um modelo de vício de cocaína que replica o que acontece com humanos. Com humanos, você está no ensino médio, amigos sugerem que você cheire cocaína, você cheira cocaína, nada acontece. Meses passam, alguma coisa te lembra do que aconteceu na primeira vez, um traficante te empurra cocaína, e você se vicia, e a sua vida mudou. Com ratos, fazemos o mesmo. Meu colega Gal Yadid treina animais para se acostumarem com cocaína, e então, por um mês, nada de cocaína. Então ele os lembra da festa na qual eles viram cocaína pela primeira vez através de um sinal, as cores da jaula quando eles viram a cocaína, e eles ficam loucos. Eles puxam a alavanca para conseguir cocaína até morrerem. Primeiro determinamos que a diferença entre esses animais é que, durante aquele tempo em que nada acontece, em que não há cocaína por perto, o epigenoma muda, os genes são marcados novamente de forma diferente, e quando eles recebem o sinal, seu genoma está pronto para desenvolver o fenótipo do vício. Então tratamos esses animais com drogas que aumentam a metilação do DNA, a marca epigenética a ser estudada, ou que diminuem as marcas epigenéticas. E descobrimos que, se aumentarmos a metilação, esses animais ficam ainda mais loucos, querem a cocaína ainda mais. Mas se reduzirmos a metilação do DNA, eles não estão mais viciados. Nós os reprogramamos. E a diferença fundamental entre uma droga epigenética e qualquer outra droga é que com drogas epigenéticas, basicamente removemos a ciência da experiência, e uma vez que isso acontece, ela não volta, a não ser que você tenha a mesma experiência. Então o animal foi reprogramado. Quando visitamos os animais por mais 30, 60 dias, que são, em termos humanos, muitos anos de vida, eles ainda não tinham se viciado, com um único tratamento epigenético. O que aprendemos sobre DNA: o DNA não é só uma sequência de letras, não é apenas um roteiro. O DNA é um filme dinâmico. Nossas experiências estão sendo escritas dentro desse filme, que é interativo. Vocês estão vendo o filme de suas vidas, com o DNA, com seu controle remoto. Vocês podem tirar um ator e adicionar um ator. Então, apesar da natureza determinística da genética, você tem controle sobre seus genes. E isso passa uma tremenda mensagem otimista. A habilidade de encarar algumas doenças fatais, como câncer, problemas de saúde mental, com uma nova abordagem, tratá-las como uma má adaptação. Se conseguirmos intervir epigeneticamente e reverter o filme retirando um ator e criando uma nova narrativa. Então o que eu contei pra vocês hoje é que o nosso DNA é na verdade uma combinação de dois componentes, duas camadas de informação. Uma camada de informação é antiga, decorrente de milhões de anos de evolução; é estável e muito difícil de mudar. A outra camada de informação é a camada epigenética, que é aberta e dinâmica, e constrói uma narrativa interativa. Então mesmo que sejamos definidos por nossos genes, temos um certo grau de liberdade que pode construir uma vida de responsabilidade. Obrigado. (Aplausos)