Vocês já pensaram sobre o que aconteceria se o mundo fosse um pouquinho diferente? Como suas vidas seriam distintas se tivessem nascido daqui a 5 mil anos em vez de hoje? Como a história seria alterada se os continentes estivessem em latitudes diferentes ou como a vida no Sistema Solar teria se desenvolvido se o Sol fosse 10% maior? Brincar com esse tipo de possibilidade é meu trabalho, mas faço isso com o Universo inteiro. Faço modelos de universos no computador, universos digitais que têm pontos iniciais diferentes e são feitos de diversas quantidades de tipos distintos de materiais. Em seguida, comparo esses universos ao nosso para ver do que é feito e como evoluiu. Esse processo de testar modelos com medidas do céu nos trouxe grandes ensinamentos sobre nosso Universo até agora. Uma das coisas mais estranhas que descobrimos foi que a maior parte do material do Universo é feita de algo totalmente diferente de vocês e de mim. Mas, sem ela, o Universo como conhecemos não existiria. Tudo aquilo que conseguimos ver com os telescópios representa por volta de 15% da massa total do Universo. Todo o resto, ou seja, 85% dele, não emite nem absorve luz. Não podemos enxergar essa matéria a olho nu, ou detectá-la com ondas de rádio, micro-ondas ou qualquer outro tipo de luz. Mas sabemos que ela está lá por causa da sua influência no que podemos ver. É mais ou menos como se quiséssemos mapear a superfície da Terra com tudo o que está sobre ela apenas com o uso desta sua imagem capturada do espaço durante a noite. Temos certas pistas de onde a luz está, mas há muito o que não podemos ver, como pessoas ou até cadeias de montanhas. E precisamos deduzir o que está lá a partir dessas pistas limitadas. Chamamos essa substância invisível de matéria escura. Muitas pessoas ouviram falar sobre a matéria escura, mas, mesmo se vocês já ouviram falar dela, provavelmente é algo que parece abstrato, distante, e talvez até irrelevante. O interessante é que ela está a nossa volta e talvez aqui, mesmo. Inclusive, as partículas de matéria escura provavelmente estão adentrando seus corpos neste instante, enquanto estão sentados nesta sala. Isso porque estamos na Terra, que está girando ao redor do Sol, que por sua vez está se deslocando através da nossa galáxia a aproximadamente 800 mil km/h. Mas a matéria escura não se choca contra nós; ela apenas nos atravessa. Então, como podemos descobrir mais sobre ela? O que ela é, e o que tem a ver com a nossa existência? Para descobrir como passamos a existir, primeiramente precisamos entender como nossa galáxia nasceu. Essa é uma foto da nossa galáxia, a Via Láctea, hoje. Qual era sua aparência há 10 bilhões de anos, ou como ela se parecerá daqui a 10 bilhões de anos? E quanto ao caso das centenas de milhões de outras galáxias que já mapeamos através de grandes pesquisas do céu? Como suas histórias seriam diferentes se o Universo fosse feito de outra coisa, ou se houvesse mais ou menos matéria nele? O fato interessante sobre esses modelos de universo é que eles nos permitem testar essas possibilidades. Vamos voltar ao primeiro momento do Universo... uma pequena fração de segundo após o Big Bang. Nesse primeiro instante não havia nenhum tipo de matéria. O Universo estava se expandindo bem rapidamente. E a mecânica quântica nos diz que matéria é criada e destruída o tempo todo, a cada instante. Nesse momento, o Universo se expandia tão rapidamente que a matéria que se criou não podia ser destruída. Por isso, pensamos que toda a matéria foi criada nesse instante. Tanto a matéria escura quanto a matéria convencional que forma todos nós. Agora, vamos um pouco além, para um momento após a criação da matéria, depois da formação de prótons e nêutrons e do hidrogênio, por volta de 400 mil anos depois do Big Bang. O Universo estava quente, denso, e bem macio, mas não perfeitamente macio. Esta imagem, obtida com um telescópio espacial sonda Planck, nos mostra a temperatura do Universo em todas as direções. E tudo o que vemos é que alguns lugares estavam um pouco mais quentes e densos do que outros. As manchas nessa figura representam os pontos onde havia mais ou menos massa no Universo inicial. Elas cresceram por causa da gravidade. O Universo estava se expandindo e se tornando menos denso, no geral, ao longo dos últimos 13,8 bilhões de anos. Mas a gravidade trabalhou duro nessas manchas, onde havia um pouco mais de massa, e atraiu mais e mais massa para essas regiões. É um pouco difícil imaginar tudo isso, então deixe-me mostrar sobre o que estou falando. Os modelos de computador que mencionei permitem que testemos essas ideias, então observemos um deles. Este filme, que foi feito pelo meu grupo de pesquisa, nos mostra o que aconteceu ao Universo após seus primeiros momentos. Vemos que ele começou bem regular, mas havia algumas regiões com um pouco mais de material. A gravidade se ativou e trouxe cada vez mais massa para aquelas manchas que começaram com um pouquinho a mais. Com o tempo, há substância suficiente em um local para que o gás hidrogênio, que inicialmente estava bem misturado com a matéria escura, começasse a se separar dela, se resfriar, formar estrelas... então, temos uma pequena galáxia. Com o tempo, depois de bilhões e bilhões de anos, essas pequenas galáxias se chocam, se fundem e crescem para se tornarem galáxias maiores, como nossa galáxia, a Via Láctea. E o que acontece sem a matéria escura? Sem sua presença, essas manchas nunca se tornam compactadas o suficiente. Acontece que é necessário pelo menos 1 milhão de vezes a massa do Sol em uma região densa antes que se possa começar a formar estrelas. E, sem a matéria escura, nunca haverá material suficiente em um só lugar. Aqui observamos dois universos, lado a lado. Em um deles, podemos ver que as coisas ficam rapidamente desordenadas. Nesse universo é realmente fácil formar galáxias. No outro, os corpos que começam como pequenos amontoados mantêm-se realmente pequenos. Não acontece muita coisa. Nesse universo, não seria possível ter uma galáxia como a nossa, ou como qualquer outra. Não teríamos a Via Láctea, o Sol, ou mesmo nós; simplesmente não poderíamos existir naquele universo. Tá, essa coisa louca, a matéria escura, compreende a maioria da massa do Universo, está nos atravessando agora, e não estaríamos aqui sem ela. O que ela é? Não temos ideia. (Risos) Temos várias conjecturas e muitas ideias sobre como desvendar mais. A maior parte dos físicos pensa que a matéria escura é uma partícula, em grande parte similar às partículas subatômicas que conhecemos, como prótons, nêutrons e elétrons. Seja como for, ela se comporta de maneira muito parecida em relação à gravidade. Mas ela não emite ou absorve luz, e atravessa diretamente a matéria convencional, como se ela nem estivesse lá. Gostaríamos de saber qual partícula ela é. Por exemplo: qual o peso dela? Ou: acontece alguma coisa quando ela interage com a matéria normal? Físicos têm várias ideias ótimas sobre o que ela pode ser, eles são bem criativos. Mas é bem difícil, porque essas ideias abrangem uma variedade de coisas. Ela poderia ser tão pequena quanto as menores partículas subatômicas, ou tão grande quanto a massa de 100 Sóis. Então, como descobrimos o que ela é? Bem, físicos e astrônomos têm várias maneiras de procurar pela matéria escura. Uma das coisas que estamos fazendo é construir detectores sensíveis em minas subterrâneas profundas, esperando pela possibilidade de uma partícula de matéria escura, que atravessa diretamente a nós e a Terra, se chocar contra um material mais denso e deixar para trás algum tipo de traço de sua passagem. Estamos procurando pela matéria escura no céu, pela possibilidade de que suas partículas se choquem e criem uma luz de alta energia que poderíamos ver com telescópios especiais de raios-gama. Estamos até tentando produzir matéria escura aqui mesmo, na Terra, ao chocar partículas entre si e observar o que acontece, com o acelerador de partículas Large Hadron Collider, na Suíça. Bem, até agora, todos esses experimentos nos ensinaram bastante sobre o que a matéria escura não é, (Risos) mas ainda não sobre o que ela é. Havia muitas ideias ótimas sobre o que ela poderia ser que esses experimentos teriam mostrado. E eles ainda não mostraram, então temos que continuar procurando e quebrando a cabeça. Outra maneira de obter uma pista sobre o que é a matéria escura é pelo estudo das galáxias. Já falamos sobre como nossa galáxia e muitas outras nem estariam aqui hoje sem a matéria escura. Esses modelos também fazem predições para muitas outras coisas sobre galáxias: como elas são distribuídas no Universo, como se movem, e como evoluem com o tempo. E podemos testar essas predições através de observações do céu. Então, deixe-me dar dois exemplos desse tipo de medição que conseguimos fazer com elas. Primeiramente, é possível construir mapas do Universo com as galáxias. Faço parte de uma pesquisa chamada Dark Energy Survey, que fez o maior mapa do Universo até hoje. Medimos as posições e as formas de 100 milhões de galáxias, mais de um oitavo do céu. E esse mapa está nos mostrando toda a matéria nessa região do céu, que é inferida pela luz distorcida dessas 100 milhões de galáxias, luz de toda a matéria que estava entre essas galáxias e nós. A gravidade da matéria é forte o suficiente para curvar o caminho da luz, e isso nos dá essa imagem. Esse tipo de mapa pode nos contar sobre a quantidade de matéria escura que existe, e também nos dizer onde ela está e como ela muda com o tempo. Estamos tentando aprender do que é feito o Universo nas escalas mais grandiosas possíveis. Acontece que as menores galáxias no universo fornecem algumas das melhores pistas. Por que isso acontece? Aqui estão dois exemplos de simulação de universos com dois tipos diferentes de matéria escura. Ambas as figuras mostram uma região ao redor de uma galáxia parecida com a Via Láctea. E podemos ver que há muitos outros materiais em volta dela, pequeninos aglomerados. Na imagem à direita, as partículas de matéria escura se movem mais devagar do que na figura esquerda. Se essas partículas estiverem se movendo muito rápido, então a gravidade nos pequenos amontoados não é forte o suficiente para retardar tais partículas. Assim, elas continuam indo, e nunca colapsam contra os pequenos aglomerados. Então, acabamos com uma menor quantidade delas no universo da direita. Sem esses pequenos aglomerados, há menor quantidade de galáxias pequenas. Se observarmos o céu ao sul, conseguimos enxergar duas dessas pequenas galáxias, as maiores desse tipo que orbitam a Via Láctea: a Grande Nuvem de Magalhães e a Pequena Nuvem de Magalhães. Nos últimos anos, detectamos um número bem maior de galáxias ainda menores. Esse é o exemplo de uma delas, que detectamos com a mesma pesquisa sobre matéria escura que usamos para fazer mapas do Universo. São galáxias realmente pequenas, algumas extremamente diminutas. Algumas têm centenas de estrelas, poucas delas comparadas às centenas de bilhões de estrelas da nossa Via Láctea. Então, isso as torna bem mais difíceis de se encontrar. Mas, na última década, na verdade, encontramos várias delas. Hoje, conhecemos 60 dessas pequeninas galáxias orbitando a Via Láctea. E essas "companheirinhas" são uma grande pista para a matéria escura, pois a própria existência delas nos mostra que ela não pode estar se movendo tão rápido, e que não acontece algo extraordinário quando ela se encontra com matéria normal. Durante os próximos anos, faremos mapas muito mais precisos do céu. Eles nos ajudarão a refinar nossos filmes de todo o Universo e da galáxia inteira. Os físicos também estão fazendo experimentos novos e mais sensíveis para tentar capturar algum sinal de matéria escura em seus laboratórios. Essa matéria ainda é um grande mistério. Mas esse é um momento muito empolgante para se trabalhar com isso. Temos claras evidências de sua existência. E isso vai da escala das menores galáxias até a escala do Universo inteiro. Nós de fato a encontraremos e descobriremos o que ela é? Eu não tenho ideia. Mas será bem divertido descobrir. Temos muitas possibilidades de descoberta, e definitivamente aprenderemos mais sobre o que ela está fazendo e sobre o que não está. Independentemente de encontrarmos essa partícula em breve, espero tê-los convencido de que esse mistério está muito mais próximo do que parece. A procura pela matéria escura pode ser a grande chave para toda uma nova compreensão da física e do nosso lugar no Universo. Obrigada. (Aplausos)